sexta-feira, 11 de julho de 2025

Tarifas de Trump são 'megalomaníacas' e não afetam o Brasil tanto quanto ele espera, diz Nobel de Economia

O economista americano Paul Krugman usou palavras contundentes para classificar as tarifas impostas por Donald Trump contra o Brasil.

Em carta enviada a Luiz Inácio Lula da Silva (PT), o presidente dos Estados Unidos anunciou uma taxa de 50% sobre as exportações brasileiras a partir de 1° de agosto.

Num artigo publicado no site Substack, Krugman diz que essas tarifas representam um "programa de proteção a ditadores".

Segundo o especialista, que ganhou o Nobel de Economia em 2008 e é professor da Universidade da Cidade de Nova York, nos EUA, a última cartada de Trump "marca um novo rumo" das políticas tarifárias, que ele classifica de "demoníacas e megalomaníacas".

Krugman entende que o presidente dos EUA "nem sequer disfarça que exista uma justificativa econômica para sua decisão".

"Tudo se resume a punir o Brasil por levar [o ex-presidente] Jair Bolsonaro [PL] a um julgamento", escreve ele.

Logo no início da carta endereçada a Lula, Trump diz: "Conheci e lidei com o ex-presidente Jair Bolsonaro, e o respeitei muito, assim como a maioria dos outros líderes de países. A forma como o Brasil tem tratado o ex-presidente Bolsonaro, um líder altamente respeitado em todo o mundo durante seu mandato, inclusive pelos Estados Unidos, é uma vergonha internacional. Este julgamento não deveria estar acontecendo. É uma caça às bruxas que deve acabar IMEDIATAMENTE!"

O professor de Economia destaca que essa não é a primeira vez que os EUA usam tarifas com um propósito político.

"O sistema internacional de comércio que estabelecemos depois da Segunda Guerra Mundial foi em parte motivado pela crença de representantes americanos de que essas trocas, além de serem benéficas do ponto de vista econômico, seriam uma força de paz e poderiam fortalecer a democracia ao redor do mundo. Eles provavelmente estavam corretos e, em todo caso, tratava-se de um objetivo nobre", pondera Krugman.

"Mas agora Trump tenta usar tarifas para ajudar outro pretendente a ditador. Se você pensa que os EUA são um dos 'bons moços' do mundo, essa última decisão mostra o lado em que estamos atualmente", complementa o professor.

<><> Por que Krugman acha que tarifas aplicadas ao Brasil são megalomaníacas?

Para justificar o título de "megalomaníaco" que ele deu para o anúncio de Trump, o especialista usa estatísticas da Organização do Comércio (OMC), que indicam quais são os principais parceiros comerciais do Brasil.

Segundo os dados relativos ao ano de 2022, a China é o principal parceiro comercial de nosso país e recebe 26,8% das exportações.

Na sequência, aparecem União Europeia (15,2%), EUA (11,4%), Argentina (4,6%), Chile (2,7%) e outros países/blocos (39,3%).

Krugman calcula que as exportações para os EUA representam menos de 2% do Produto Interno Bruto (PIB) do Brasil.

"Trump realmente acredita que pode usar tarifas para intimidar uma nação enorme, que nem sequer depende do mercado americano, a abandonar a democracia?", questiona ele.

Para o economista, se os EUA "ainda tivessem uma democracia funcional, essa aposta contra o Brasil seria por si só uma base para um impeachment" de Trump.

"De qualquer forma, não ignore esse fato. Estamos diante de mais um passo terrível na espiral descendente do nosso país", conclui ele.

•        Ofensiva de Trump contra Brasil tumultua o bom momento na economia

A ofensiva de Donald Trump contra o Brasil, impondo taxa de 50% sobre produtos brasileiros, tumultua o bom momento da economia.

💵A inflação está em queda gradual e o dólar vinha recuando. Agora, o dólar apresenta forte alta. Se persistir esse movimento, novas pressões inflacionárias virão no horizonte.

Analistas avaliam, porém, que é preciso ter calma neste momento. É necessário aguardar os próximos passos desta guerra. Se o Brasil radicalizar, o cenário pode piorar.

A tendência, no entanto, é que o governo Lula reaja, mas selecionando os setores que terão alíquotas mais elevadas na entrada de produtos norte-americanos.

🫱🏼‍🫲🏼O que pode compensar esse momento de turbulência seria um entendimento entre equipe econômica e Congresso para adoção de medidas que garantam o cumprimento da meta fiscal deste e do próximo ano.

Ou seja, a responsabilidade aumenta no campo fiscal como uma forma de aliviar as pressões que podem vir de fora.

Dentro do governo, assessores presidenciais dizem que o governo Lula não quer guerra com Trump, mas quer respeito do presidente dos Estados Unidos.

Por isso, divulgou nota forte nesta quarta-feira (9) criticando a carta assinada por Trump, que foi classificada como política e irresponsável.

Em reunião no Palácio do Planalto, a equipe de Lula chamou Trump de “louco” e “irresponsável”, que tenta dobrar os joelhos do Brasil. Isso, disse Lula à sua equipe, não irá acontecer de forma alguma. A ordem é insistir nas negociações, mas sem se submeter às pressões dos Estados Unidos.

“Ele acha que é um imperador, manda no mundo, mas os países são soberanos. Não vamos nos submeter a seus caprichos, ainda mais para defender alguém que tramou um golpe no país e está sendo julgado no STF”, disse um assessor presidencial.

•        Quais setores brasileiros mais perdem com novas tarifas de Trump

O anúncio de tarifas de 50% a produtos brasileiros nos Estados Unidos — feito em carta enviada por Donald Trump a Luiz Inácio Lula da Silva na quarta-feira (9/7) — acontece em um momento em que o Brasil batia recorde de exportações aos EUA, mesmo diante de tarifas americanas que já estão em vigor contra produtos brasileiros desde abril.

Agora diversos setores já estão preocupados com os efeitos de uma possível guerra comercial entre Brasil e EUA, já que o governo brasileiro sugeriu que pretende retaliar, impondo tarifas sobre produtos importados americanos. E Trump anunciou que retaliações brasileiras seriam seguidas de mais tarifas americanas.

A Câmara Americana de Comércio para o Brasil (Amcham Brasil) — entidade sediada no Brasil que reúne empresas brasileiras e americanas com atuação nos dois países — divulgou no mês passado que as exportações brasileiras para os EUA atingiram US$ 16,7 bilhões no acumulado dos primeiros cinco meses desse ano.

Issa representa um aumento de 5% em relação ao mesmo período de 2024 e estabelece um recorde para o período.

Segundo a Amcham Brasil, esse recorde de exportações brasileiras reforça "o papel estratégico dos EUA como principal destino de bens industrializados brasileiros".

O Brasil também comprou mais dos EUA nesse período. As compras somaram US$ 17,7 bilhões — um aumento de 9,9% em relação a 2024. Ainda assim, o Brasil teve prejuízo na relação comercial — o que contradiz Trump, que em sua carta fala que os EUA têm "déficits comerciais insustentáveis " com o Brasil.

Nesses meses, houve um aumento nas tensões comerciais — com o anúncio de diversas tarifas por Trump, e temores de uma guerra comercial generalizada no mundo.

Em 2 de abril, Trump anunciou tarifas contra praticamente todos os parceiros comerciais americanos. Alguns países receberam tarifas mais altas — já o Brasil recebeu a menor alíquota, de 10%, aplicada à maioria dos países. Essa tarifa entrou em vigor três dias depois. O Brasil optou por não retaliar.

A Amcham notou que mesmo com aumento de tarifas, Brasil e EUA continuaram comprando e vendendo mais produtos nesse período, batendo um novo recorde.

"Mesmo em um cenário mais desafiador, o comércio bilateral tem se mostrado resiliente, com crescimento consistente nas trocas entre os dois países. Isso reforça o papel do Brasil como parceiro estratégico para atender às demandas da indústria e dos consumidores norte-americanos — e vice-versa", disse Abrão Neto, presidente da Amcham Brasil.

Agora o Brasil se vê diante da possibilidade de tarifas de 50% sobre todos seus produtos exportados aos EUA a partir de 1º de agosto.

<><> Setores ameaçados

Segundo dados da Confederação Nacional da Indústria (CNI), hoje há 3.662 empresas americanas com investimentos no Brasil e 2.962 empresas brasileiras com presença nos EUA.

A CNI estima que, em 2024, a cada R$ 1 bilhão exportado ao mercado americano foram gerados 24,3 mil empregos, R$ 531,8 milhões em massa salarial e R$ 3,2 bilhões em produção no Brasil.

Entre janeiro e maio, 79% das exportações brasileiras para os EUA foram compostas por bens industriais, como aeronaves, combustíveis, alimentos processados, químicos e máquinas — alguns deles de alto valor agregado, segundo dados da Amcham.

Os produtos que tiveram maior aumento nas exportações foram carne bovina (alta de 196%), sucos de frutas (96,2%), café (42,1%) e aeronaves (27%).

Segundo a câmara de comércio, esses produtos conseguiram manter a competitividade no mercado dos EUA mesmo diante de ameaça de tarifas. A entidade atribuiu isso à competitividade brasileiras, mas também a um aumento de demanda nos EUA e questões climáticas que tem afetado a produção doméstica americana, especialmente no caso de carnes e sucos.

Dados da Agência Brasil indicam que setores brasileiros que mais exportam para os EUA são de petróleo bruto, minério de ferro, aço, máquinas, aeronaves, produtos eletrônicos, além de açúcar, café, suco de laranja e carne. Empresas brasileiras com grandes vendas aos EUA incluem Embraer e Petrobras.

Alguns setores já tiveram retração nas vendas para os EUA com a tarifa de 10% — e podem sofrer ainda mais caso se concretize a nova tarifa de 50%.

É o caso de celulose, ferro-gusa e equipamentos de engenharia. A Amcham atribui isso às tarifas de até 10% e também à concorrência de países com acesso preferencial aos EUA — como o Canadá.

Outros setores da indústria brasileira já vem sofrendo com tarifas de 50%. É o caso do aço e alumínio, que passaram a ser taxados com essa alíquota no mês passado.

Entre janeiro e maio, houve aumento de volume e valor exportado — 7,3% e 28,4% respectivamente — de aço semiacabado. Mas analistas dizem que já é possível observar que pode estar havendo um declínio nos embarques aos EUA e ainda aguardam para observar os efeitos das tarifas sobre o aço e o alumínio.

A Confederação Nacional da Indústria (CNI) prevê "muitos prejuízos" caso haja uma quebra na relação comercial entre Brasil e EUA.

Segundo a entidade, quem mais deve sofrer é o setor de insumos produtivos, que representam 61,4% das exportações e 56,5% das importações brasileiras.

"Brasil e Estados Unidos sustentam uma relação econômica robusta, estratégica e mutuamente benéfica alicerçada em 200 anos de parceria. Os EUA são o 3° principal parceiro comercial do Brasil [atrás da China e União Europeia] e o principal destino das exportações da indústria de transformação brasileira", diz nota da CNI.

"Não existe qualquer fato econômico que justifique uma medida desse tamanho, elevando as tarifas sobre o Brasil do piso ao teto. Os impactos dessas tarifas podem ser graves para a nossa indústria, que é muito interligada ao sistema produtivo americano", disse Ricardo Alban, presidente da CNI.

A CNI diz que os EUA mantêm superávit com o Brasil há mais de 15 anos, e que o Brasil é um dos poucos países em que a balança comercial é favorável aos EUA.

A Confederação também alega que a tarifa real de importação do Brasil a produtos americanos era de 2,7% em 2023 — cerca de um quarto da tarifa nominal de 11,2% assumida no âmbito da Organização Mundial do Comércio (OMC).

•        Lula ameaça tarifar 50% produtos dos EUA em retaliação à imposição de Trump ao Brasil

O Brasil ameaçou reagir ao plano de Donald Trump de introduzir tarifas de 50% sobre suas exportações com sua própria tarifa de 50% sobre produtos norte-americanos, preparando o cenário para uma guerra comercial precipitada.

"Se ele cobrar 50% da gente, nós cobraremos 50% dele", disse o presidente brasileiro, Luiz Inácio Lula da Silva, ao canal de notícias local Record, um dia depois de Trump ameaçar impor altas taxas sobre produtos brasileiros e acusar o país de conduzir uma "caça às bruxas" contra seu ex-presidente Jair Bolsonaro, que está enfrentando um julgamento por sua tentativa de reverter sua derrota eleitoral de 2022.

O Brasil poderia recorrer à Organização Mundial do Comércio, propor investigações internacionais e "exigir explicações", sugeriu Lula. "Mas o principal é a Lei da Reciprocidade, aprovada pelo Congresso", disse ele à Record, referindo-se à legislação recente criada para defender a maior economia da América Latina de ataques tarifários.

A afirmação de Trump de que a relação econômica do Brasil com os EUA estava "longe de ser recíproca" também era "imprecisa", disse Lula em um comunicado na quarta-feira. Os aumentos de tarifas dos EUA "serão tratados" pelo Brasil, disse ele.

Na manhã de quinta-feira, Lula reuniu ministros brasileiros para discutir como seu governo deveria lidar com a ameaça de tarifa de 50% de Trump. A Casa Civil informou que um grupo de estudos seria formado para decidir como reagir.

Trump já prometeu retaliar caso o Brasil reaja ao seu ataque, com as tarifas americanas entrando em vigor em 1º de agosto. "Se, por qualquer motivo, vocês decidirem aumentar suas tarifas , qualquer que seja o valor que vocês escolherem aumentá-las, será adicionado aos 50% que cobramos", escreveu ele em carta a Lula na quarta-feira, publicada nas redes sociais.

As tarifas ameaçadas ao Brasil fazem parte de uma onda de propostas de impostos dos EUA reveladas por Trump esta semana. Embora a Casa Branca tivesse programado aumentar as tarifas sobre dezenas de países na quarta-feira, ele ordenou um novo adiamento de três semanas, até 1º de agosto.

Junto com o último atraso, Trump escreveu cartas para uma série de países, incluindo Bangladesh, Japão e Coreia do Sul, informando-os sobre as novas tarifas americanas que eles enfrentarão, a menos que cheguem a um acordo com seu governo.

 

Fonte: BBC News Brasil/g1/The Guardian

 

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