quinta-feira, 3 de julho de 2025

Bipolaridade atinge mais de 140 milhões de pessoas no mundo

Alterações bruscas de humor, com alternância entre períodos de depressão, euforia ou sentimentos mistos, divididas em fases bem definidas que podem durar dias ou até meses. Esses são os principais sintomas do Transtorno Afetivo Bipolar (TAB), que afeta mais de 140 milhões de pessoas em todo o mundo, segundo dados da Associação Brasileira de Familiares, Amigos e Portadores de Transtornos Afetivos (ABRATA). No Brasil, estima-se que cerca de 8 milhões de pessoas convivam com o transtorno, de acordo com a Associação Brasileira de Transtorno Bipolar (ABTB).

O transtorno bipolar é uma doença crônica e recorrente que afeta o cérebro. Normalmente, os primeiros sintomas surgem na infância e se desenvolvem mais claramente na adolescência, até os 25 anos. Aos 30, a maioria dos afetados já apresenta o quadro de forma completa. “A principal característica desse transtorno são fases de humor, muito mais intensas do que as variações emocionais comuns, e que podem interferir significativamente na vida do paciente”, explica o psiquiatra Edivarley da Costa Junior. “No período depressivo, é comum que a pessoa sinta uma tristeza profunda, fadiga, dificuldade para dormir ou sono excessivo, problemas de concentração, alterações no apetite e até mesmo ideações suicidas. Na fase de mania, o sentimento é de euforia intensa, com energia exacerbada a ponto de não querer dormir, além de senso de grandiosidade, gastos excessivos, uso de substâncias, atitudes agressivas e planos irreais”, complementa o médico. Em geral, pessoas diagnosticadas com bipolaridade passam, em média, 85% do tempo em estado depressivo e apenas 15% em episódios de mania.

<><> Ação no cérebro

O cérebro de quem convive com o transtorno bipolar sofre uma série de alterações nos impulsos que desorganizam o funcionamento normal do sistema nervoso. Acredita-se que o transtorno esteja enraizado em desequilíbrios de mensageiros químicos, conhecidos como neurotransmissores, responsáveis por transmitir sinais entre as células nervosas. Um descompasso na atuação de substâncias como serotonina, glutamato, norepinefrina e dopamina pode causar os sintomas da doença, incluindo a desregulação do humor.

Como não existe um exame específico para identificar a bipolaridade, o diagnóstico é feito durante a avaliação clínica, por meio da conversa com o paciente e, quando necessário, com seus familiares. Isso porque a tendência é o paciente lembrar apenas dos episódios depressivos. Normalmente, o tratamento envolve o uso de antidepressivos, antipsicóticos e estabilizadores de humor.

<><> Medicamentos

O Divalproato de Sódio, utilizado no tratamento da bipolaridade e também como anticonvulsivante, entrou na lista de medicamentos essenciais da Organização Mundial da Saúde (OMS) em 2000. Em 2003, já figurava entre os 12 fármacos mais prescritos nos Estados Unidos. Atualmente, integra os principais protocolos psiquiátricos do mundo como primeira escolha no tratamento do transtorno bipolar, podendo ser utilizado como monoterapia ou em associação com outros medicamentos, além de ser indicado para profilaxia da enxaqueca.

Neste mês, a farmacêutica paranaense Prati-Donaduzzi lançou o Zeugma XR, versão do divalproato de sódio com liberação prolongada. “Entre os principais benefícios dessa formulação está a possibilidade de o paciente tomar o medicamento apenas uma vez ao dia, já que ele apresenta picos diferenciados de liberação. Outra vantagem é que, por conta do modelo revestido, o produto se dissolve no intestino, evitando o desconforto gástrico”, destaca Edivarley.

A indicação de uso deve ser feita por um especialista após avaliação clínica do paciente. De modo geral, estudos apontam a eficácia do divalproato tanto na fase de mania quanto na fase depressiva aguda e na manutenção do transtorno bipolar.

•        Por que o Transtorno de Personalidade Borderline é frequentemente confundido com bipolaridade? Psicanalista explica os motivos

Segundo levantamento do Google Trends Brasil, as buscas por “bipolaridade” e “transtorno borderline” cresceram significativamente nos últimos doze meses, acompanhando o aumento do debate público sobre saúde mental. Apesar disso, ainda há muita desinformação sobre o que diferencia esses dois diagnósticos. A confusão é comum não apenas entre o público leigo, mas também em ambientes clínicos, o que pode atrasar o início de um tratamento adequado.

A psicanalista Taty Ades, especialista em Transtorno de Personalidade Borderline (TPB), destaca que a principal diferença está na forma como se manifesta a instabilidade emocional. “Na bipolaridade, os episódios são mais duradouros, podendo persistir por dias ou até semanas, com alternância entre fases de depressão e euforia. Já no Borderline, a oscilação ocorre de forma muito mais rápida, às vezes várias vezes no mesmo dia, e geralmente em resposta a eventos externos, principalmente nas relações interpessoais”, explica.

Essa reatividade emocional é um dos traços mais característicos do TPB. Pessoas com o transtorno costumam apresentar dificuldades intensas de regulação emocional, baixa autoestima e um medo crônico de abandono. Isso se reflete em relações instáveis e em padrões de comportamento muitas vezes impulsivos. “É comum a pessoa com Borderline idealizar alguém num momento e, no instante seguinte, desvalorizar totalmente, muitas vezes por um gesto interpretado como rejeição. Essa percepção distorcida dos vínculos afeta diretamente sua estabilidade emocional”, aponta a especialista.

Um estudo publicado pela American Psychiatric Association aponta que até 40% dos pacientes com Borderline já receberam diagnóstico de transtorno bipolar em algum momento, o que pode levar a tratamentos inadequados, como a prescrição excessiva de estabilizadores de humor sem o devido acompanhamento psicoterapêutico.

Para Taty Ades, o diagnóstico correto exige escuta clínica qualificada e sensível. “Não podemos nos basear apenas em listas de sintomas. É fundamental compreender a história de vida do paciente, suas relações primárias e o modo como interpreta e sente o mundo à sua volta. O Borderline tem raízes profundas, geralmente associadas a experiências precoces de rejeição, abandono ou trauma”, afirma.

Outro aspecto que ajuda a diferenciar os dois quadros está na percepção subjetiva da própria condição. Enquanto muitos pacientes bipolares identificam seus episódios como fases distintas e estranhas à sua identidade habitual, os borderline frequentemente se sentem permanentemente à flor da pele, como se estivessem sempre em crise. Isso gera um sofrimento psíquico contínuo e um senso de vazio existencial bastante recorrente.

Embora tanto o TPB quanto o transtorno bipolar requeiram acompanhamento profissional, o tipo de intervenção costuma ser diferente. “O tratamento do Borderline exige um vínculo terapêutico estável e profundo. A psicanálise, por exemplo, permite acessar e ressignificar esses afetos que foram mal elaborados desde a infância. Já na bipolaridade, o foco está também no controle farmacológico das fases e na psicoeducação”, explica Taty.

Ela alerta ainda para os riscos da autodiagnose, cada vez mais comum com a popularização de conteúdos sobre saúde mental nas redes sociais. “É positivo que as pessoas falem mais sobre esses temas, mas é perigoso quando se usam rótulos para justificar comportamentos sem o devido cuidado clínico. O autoconhecimento precisa vir acompanhado de orientação adequada”, conclui.

 

Fonte: Saúde & BemEstar

 

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