Agro
de estados governados por Tarcísio, Caiado e Zema terá prejuízo com tarifaço de
Trump
Enquanto
o tarifaço de Donald Trump contra o Brasil tenta ajudar Jair Bolsonaro a
escapar da condenação por tentativa de golpe, o agro de estados governados por
aliados e apoiadores do ex-presidente vai sair no prejuízo se a taxação entrar
em vigor.
É o
caso de São Paulo de Tarcísio de Freitas, do Republicanos, Minas Gerais de
Romeu Zema, do Novo, e Goiás de Ronaldo Caiado, do União Brasil. Esses estados
estão entre os principais produtores de café, carne bovina, açúcar, etanol e
suco de laranja, que são vendidos regularmente aos EUA – e, portanto, pagarão
uma taxa extra de 50%.
O café
é um dos que mais deve sofrer com o tarifaço. Os EUA são o principal destino
das exportações brasileiras – responderam por 16% das vendas em 2024 e 17% nos
primeiros cinco meses de 2025, de acordo com dados do Conselho dos Exportadores
de Café do Brasil, o Cecafé.
No
Brasil, isso significa um impacto direto ao agro de Minas Gerais, governado por
Zema. O estado é o maior produtor do país, com previsão de 26 milhões de
toneladas em 2025, segundo a Companhia Nacional de Abastecimento, a Conab – o
equivalente a 46,9% do total nacional.
Já a
sanção à carne bovina afeta o agro de Goiás, comandado por Caiado. O estado foi
o segundo maior produtor de carne do Brasil em 2024, com 1,26 milhões de
toneladas, só atrás de Mato Grosso (2,24 milhões) e São Paulo (1,19 milhões).
Além disso, conta com o quarto maior rebanho do país, conforme o IBGE: 17,93
milhões de cabeças de gado.
Os EUA
foram o segundo maior destino da carne bovina brasileira em 2024, de acordo com
dados da Associação Brasileira das Indústrias Exportadoras de Carne, a Abiec. O
país governado por Trump representou 7,94% do volume comprado e 10,5% do
faturamento em vendas externas do Brasil neste mercado.
O
tarifaço do presidente estadunidense também impactará os setores de açúcar e
etanol, nos quais São Paulo, governado por Tarcísio, é o maior expoente
nacional. O estado é o maior produtor de cana-de-açúcar do país, e a previsão é
colher 332,9 mil toneladas em 2025, projeta a Conab – o equivalente a 50,2% da
produção nacional.
Neste
mercado, os EUA representam pouco na exportação de açúcar: apenas 2,9% das
vendas brasileiras, segundo a União da Indústria de Cana-de-Açúcar e
Bioenergia, a Unica. Mas vale destacar que São Paulo foi responsável por 63,2%
dos negócios de açúcar do país com o exterior.
No caso
do etanol, o país norte-americano foi o segundo maior comprador do Brasil em
2024: importou 309,7 mil metros cúbicos – 16,41% do total vendido. Isso afeta
diretamente o agro paulista, uma vez que SP foi responsável pela exportação de
83,8% do etanol nacional.
Outro
efeito para o agro de São Paulo se dará na produção de suco de laranja. O
estado governado por Tarcísio responde por 78% da produção de laranja no
Brasil, de acordo com o IBGE, e tem os Estados Unidos como o segundo principal
mercado, só atrás da União Europeia.
Segundo
dados da Associação Nacional dos Exportadores de Sucos Cítricos, a Citrus BR,
os EUA representaram 41,7% das exportações brasileiras de suco de laranja na
safra 2024/25, que terminou em 30 de junho. Os negócios somaram US$ 1,31
bilhão.
De
maneira geral, os Estados Unidos são o segundo principal parceiro comercial do
Brasil tanto em importações quanto exportações, perdendo apenas para a China,
de acordo com o Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços,
o MDIC.
Dados
deste ano mostram que os Estados Unidos têm sido, em faturamento, o principal
parceiro comercial nas exportações de São Paulo e o segundo maior de Minas
Gerais e Goiás.
Apesar
dos impactos no agro e de Trump citar expressamente Bolsonaro como uma das
razões do tarifaço, os três governadores resolveram culpar Lula pela taxação.
Nas redes sociais, Tarcísio disse que o governo do petista agrediu os EUA e
colocou sua “ideologia acima da economia”.
Caiado
também afirmou que Lula atacou Trump e disse que o presidente “não representa o
sentimento patriótico” do povo. Zema, por sua vez, afirmou que o tarifaço deve
ficar na “conta do Lula, da Janja e do STF”.
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Aliada de Bolsonaro, Bancada Ruralista pede socorro a Lula
O
anúncio da tarifa de 50% imposta pelos Estados Unidos aos produtos brasileiros,
feito pelo presidente Donald Trump em carta enviada a Lula, causou mobilização
e pedidos de socorro dos ruralistas ao governo brasileiro.
Prevista
para entrar em vigor a partir do dia 1º de agosto, a medida teve como uma das
justificativas o julgamento de Bolsonaro pelo Supremo Tribunal Federal, o STF,
que Trump classificou como “vergonha internacional”. O presidente dos EUA ainda
creditou a nova alíquota a supostos “ataques insidiosos do Brasil contra
eleições livres e à violação fundamental da liberdade de expressão dos
americanos”.
Eduardo
Bolsonaro, deputado federal pelo PL de SP e “embaixador do bolsonarismo” nos
EUA, saiu em defesa da medida de Trump, e apresentou como solução a “anistia”
para os golpistas. “A carta do presidente dos Estados Unidos apenas confirma o
sucesso na transmissão daquilo que viemos apresentando com seriedade e
responsabilidade”, disse, em nota.
Logo
depois do anúncio, porém, a Bancada Ruralista no Congresso, cujo nome oficial é
Frente Parlamentar Agropecuária, a FPA, divulgou uma nota implorando o
“equilíbrio das relações comerciais e políticas entre os dois países” e pedindo
ao governo Lula uma resposta “firme e estratégica” à imposição da tarifa. Os
parlamentares querem a diplomacia como caminho para abrir novas negociações entre
os países.
Vale
lembrar, no entanto, que o próprio agronegócio está envolvido na tentativa de
golpe que tornou Bolsonaro e seus aliados réus no STF. Em depoimento à
Procuradoria-Geral da República, a PGR, o coronel Mauro Cid, ex-ajudante de
ordens de Bolsonaro, afirmou ter recebido pelo menos R$ 100 mil em espécie do
“pessoal do agro” para financiamento do plano, incluindo bancar dois meses de
monitoramento de atividades de autoridades que eram alvo dos golpistas – com a
participação de seis agentes especiais da ativa do Exército.
Oficialmente,
a Bancada Ruralista é formada por 340 deputados e senadores no Congresso. A
frente parlamentar é aliada de Bolsonaro desde pelo menos 2018, quando aderiram
formalmente à candidatura do ex-presidente.
A atual
vice-presidente da FPA no Senado, a senadora Tereza Cristina, do PP do Mato
Grosso do Sul, foi ministra da Agricultura e Pecuária no governo Bolsonaro. O
plano de golpe de estado, inclusive, previa sua volta ao cargo. Outro
integrante da FPA é citado no inquérito da Polícia Federal, a PF, que
investigou a tentativa de golpe: o deputado Zé Trovão, do PL de Santa Catarina,
indiciado no fim do ano passado.
A FPA é
financiada pelo Instituto Pensar Agro, o IPA, que, segundo reportagem do De
Olho nos Ruralistas, conta com investimento de multinacionais como Bayer, Basf,
BRF, JBS, Bunge, Syngenta e Cargill. Os integrantes da Bancada Ruralista foram
responsáveis por 49,6% dos votos que levaram ao impeachment da ex-presidente
Dilma Rousseff, em 2016.
Além de
ter muitos membros endossando ataques contra a democracia brasileira, a FPA tem
vários integrantes entusiastas do trumpismo. O atual presidente da FPA, o
deputado federal Pedro Lupion, do PP do Paraná, chegou a publicar um post no X,
em novembro de 2024, celebrando a vitória e retorno de Trump à presidência nos
Estados Unidos. Ele também afirmou na época, em sua conta no Instagram, que a
eleição de Trump era “um marco na renovação dos valores e princípios que fundam
a democracia americana”.
Lupion
é conhecido por defender a anistia de Jair Bolsonaro. Em 2022, a maioria dos
doadores individuais da campanha de reeleição do ex-presidente de extrema
direita tinham vínculos com o agronegócio, como mostrou reportagem da Reuters.
Confederações
do agro e da indústria criticam decisão de Trump
Quem
também se posicionou a respeito da tarifa imposta por Trump foi a Confederação
da Agricultura e Pecuária do Brasil, a CNA, entidade presidida pelo pecuarista
João Martins, que defendeu a reeleição de Bolsonaro em 2022.
Para a
CNA, que também pediu diálogo e diplomacia, “a economia e o comércio não podem
ser injustamente afetados por questões de natureza política”. A Confederação
Nacional da Indústria, a CNI, adotou o mesmo tom e afirmou em nota estar
preocupada e surpresa com a decisão de Trump.
“Os
impactos dessas tarifas podem ser graves para a nossa indústria, que é muito
interligada ao sistema produtivo americano”, afirmou Ricardo Alban, presidente
da CNI, em texto divulgado pela entidade. A CNI estimou que cerca de 10 mil
empresas da indústria brasileiras serão afetadas pela nova alíquota.
¨ A reação do
agronegócio, amigo de Bolsonaro, às tarifas de Trump
O
Brasil deve ter uma "resposta firme e estratégica" à decisão do
presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, de impor taxa de 50% sobre as
exportações brasileiras, na avaliação da Frente Parlamentar da Agropecuária
(FPA).
"É
momento de cautela, diplomacia afiada e presença ativa do Brasil na mesa de
negociações", diz a nota da bancada ruralista. "A diplomacia é o
caminho mais estratégico para a retomada das tratativas."
Presidida
pelo deputado Pedro Lupion (PP-PR), a FPA disse que a medida de Trump
"representa um alerta ao equilíbrio das relações comerciais e políticas
entre os dois países" e que "produz reflexos diretos e atingem o
agronegócio nacional, com impactos no câmbio, no consequente aumento do custo
de insumos importados e na competitividade das exportações brasileiras".
Lupion,
que tem no currículo ter defendido a anistia do ex-presidente Jair Bolsonaro,
repostou em suas redes sociais uma mensagem do governador de São Paulo,
Tarcísio de Freitas (Republicanos), publicada na noite de quarta-feira (9/7).
"Não
adianta se esconder atrás do Bolsonaro. A responsabilidade é de quem governa.
Narrativas não resolverão o problema", diz a mensagem de Tarcísio
publicada pelo líder da bancada ruralista.
A
Confederação Nacional da Agricultura (CNA) disse que a "medida unilateral
não se justifica pelo histórico das relações comerciais entre os dois países,
que sempre se desenvolveram em clima de cooperação e de equilíbrio, em estrita
conformidade com os melhores princípios do livre comércio internacional".
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'Natureza política'
Em nota
divulgada nesta quinta-feira (10/7), a CNA destacou ainda que "medidas
desta natureza prejudicam as economias dos dois países, causando danos a
empresas e consumidores" e disse que "economia e o comércio não podem
ser injustamente afetados por questões de natureza política".
"Qualquer
análise das relações entre os Estados Unidos e o Brasil, seja no campo no
comércio ou dos investimentos, terá sempre que concluir que essas relações
sempre serviram aos interesses dos dois países, não havendo nelas qualquer
desequilíbrio injusto ou indesejável."
Diz,
ainda, que os produtores rurais brasileiros consideram que "essas questões
só podem ser resolvidas em benefício comum por meio do diálogo incessante e sem
condições entre os governos e seus setores privados".
"Nossa
esperança é que os canais diplomáticos sejam intensamente acionados para que a
razão e o pragmatismo se imponham para benefício de todos, pois este é o único
caminho que serve ao entendimento e à prosperidade."
A CNA é
presidida por João Martins, que defendeu a reeleição de Jair Bolsonaro em 2022.
Em outubro daquele ano, num evento que contava com a presença de Bolsonaro e do
candidato a vice, Walter Braga Neto, Martins disse a uma plateia de ruralistas
que não havia espaço no Brasil para "o retorno de um candidato que foi
processado e preso como ladrão".
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O anúncio de Trump
Foi por
meio de uma carta que Trump anunciou que as exportações brasileiras sofrerão
uma taxação adicional de 50% a partir do dia 1º de agosto.
Em tom
duro, a carta diz que a decisão é uma resposta à perseguição que o
ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) estaria sofrendo no Brasil, devido ao
processo criminal que enfrenta no Supremo Tribunal Federal (STF), acusado de
liderar uma tentativa de golpe de Estado.
Além
disso, Trump também justifica o aumento de tarifa argumentando que o Brasil
adota barreiras comerciais (tarifárias e não tarifárias) elevadas contra os
EUA, o que estaria desequilibrando o comércio entre os dois países.
O
governo brasileiro refuta essa argumentação, já que a balança comercial tem
sido favorável aos Estados Unidos. O lado americano acumulou saldo positivo de
US$ 43 bilhões nos últimos dez anos, segundo o Ministério do Desenvolvimento,
Indústria, Comércio e Serviços.
Os EUA
são o segundo maior parceiro comercial do Brasil, atrás apenas da China.
De
acordo com dados da Câmara Americana de Comércio para o Brasil (Amcham), os
produtos brasileiros que tiveram maior aumento nas exportações aos EUA em 2025
foram carne bovina (alta de 196%), sucos de frutas (96,2%) e café (42,1%).
Entre
os produtos mais exportados aos EUA de maneira geral, segundo a Agência Brasil,
estão o açúcar, o café, o suco de laranja e a carne.
Na
carta, Trump ameaça elevar ainda mais a tarifa sobre produtos brasileiros, se o
país responder como uma tributação maior sobre importações americanas.
"Se
por qualquer motivo você decidir aumentar suas tarifas, então qualquer que seja
o número que você escolher para aumentá-las, ele será adicionado aos 50% que
cobramos", diz a carta a Lula.
No
início da noite de quarta, o presidente brasileiro se manifestou dizendo que o
Brasil é um país soberano com instituições independentes e "que não
aceitará ser tutelado por ninguém".
"O
processo judicial contra aqueles que planejaram o golpe de estado é de
competência apenas da Justiça Brasileira e, portanto, não está sujeito a nenhum
tipo de ingerência ou ameaça que fira a independência das instituições
nacionais", disse Lula nas redes sociais.
Lula
afirmou ainda que qualquer medida de elevação de tarifas de forma unilateral
será respondida de acordo com a Lei de Reciprocidade Econômica, lei em vigor
desde abril que autoriza o governo a retaliar países ou blocos que imponham
barreiras comerciais a produtos brasileiros.
Nesta
reportagem, a BBC News Brasil mostra como a decisão de Trump de taxar Brasil em
apoio a Bolsonaro pode beneficiar Lula.
Especialistas
em política internacional e brasileira lembram que interferências externas em
assuntos domésticos costumam fortalecer sentimentos nacionalistas.
Por
outro lado, alguns ponderam que a forte polarização política do país pode
limitar esse efeito junto a apoiadores mais fiéis ao bolsonarismo.
• Balança comercial: o que o Brasil vende
e compra dos EUA?
Para o
Brasil, os Estados Unidos são o segundo
maior parceiro comercial, segundo o Ministério do Desenvolvimento, Indústria,
Comércio e Serviços (MDIC). Já para os Estados Unidos, o Brasil é apenas o 15º
na lista de parceiros comerciais, conforme o órgão de estatísticas americano, o
US Census Bureau.
Os
Estados Unidos são tanto o segundo país de quem o Brasil mais compra como o
segundo para quem mais vende. Só a China é um parceiro comercial mais
importante.
Já a
importância do Brasil para os EUA é assimétrica: o Brasil é muito mais
importante como mercado para vender produtos (nono maior comprador de bens
americanos) do que como origem de bens (18º lugar entre os que vendem para os
EUA), segundo os dados de 2024 do US Census Bureau.
Assim,
os Estados Unidos costumam ter superávit na sua relação comercial com o Brasil,
e isso já há vários anos. As informações disponíveis no site do MDIC mostram
quem, de 1997 até 2025 (período para o qual há dados disponíveis), os Estados
Unidos venderam mais do que compraram num total de quase 50 bilhões de dólares.
Desde
2009, a balança comercial é favorável aos Estados Unidos. De lá para cá, o
superávit americano é de 90,3 bilhões de dólares.
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O que se negocia entre EUA e Brasil
Segundo
o Ministério do Desenvolvimento, em 2024, o Brasil vendeu para os Estados
Unidos principalmente petróleo bruto, ferro ou aço semimanufaturado, café em
grão, pastas químicas de madeira (usadas na indústria, por exemplo para
fabricar papel) e aviões e outros veículos aéreos. Carnes bovinas e suco de
laranja também estão entre os produtos brasileiros vendidos aos EUA. O Brasil é
o maior exportador de suco de laranja do mundo.
Já os
principais itens que os Estados Unidos venderam para o Brasil, segundo a lista
do MDIC de 2024, são componentes para a fabricação de aviões (partes de
turborreatores ou de turbopropulsores, bem como turborreatores de empuxo
superior a 25 kN), gás natural liquefeito e petróleo bruto. Óleo diesel, naftas
para petroquímica (líquido derivado do petróleo usado nessa indústria) e carvão
betuminoso também se destacam na lista.
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Produtos de alta concentração
Em
maio, uma análise da consultoria Nexus Pesquisa e Inteligência de Dados mostrou
que, dos dez produtos mais importados pelo Brasil, cinco vêm dos Estados
Unidos, com destaque para os turborreatores usados em aeronaves.
É dos
Estados Unidos que vieram 85% dos turborreatores de empuxo superior a 25 Kn e
66% de partes das turborreatores ou de turbopropulsores usados na construção de
aeronaves. O país também foi fonte de 54,5% das naftas para petroquímica, de
acordo com o levantamento.
Essa
situação de alta concentração em poucos fornecedores sugere que a imposição de
tarifas de importação pelo Brasil, como ameaçado pelo presidente Luiz Inácio
Lula da Silva em retaliação a um novo tarifaço anunciado pelo presidente Donald
Trump, teria um significativo impacto na balança comercial entre os dois
países, concluiu a Nexus.
Fonte:
The Intercept/BBC News Brasil/DW Brasil

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