Agora
Tem Especialistas mobiliza hospitais universitários
Em uma
ação para publicizar seu esforço pela redução da fila de cirurgias do SUS, o
governo federal realizou o “Dia E”, um mutirão de procedimentos em saúde que
marcou a entrada da Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares (Ebserh), que
gere os hospitais universitários (HUs), no programa Agora Tem Especialistas.
No dia
5 de julho, mais de 10 mil consultas, exames e intervenções operatórias foram
realizados pela rede de hospitais universitários gerenciada pela estatal
vinculada ao Ministério da Educação. Não à toa, Arthur Chioro, seu presidente,
e Camilo Santana, ministro da Educação, participaram do seu anúncio ao lado de
Alexandre Padilha.
“A rede
Ebserh, assim como todos os equipamentos públicos do pais – federais, estaduais
e municipais – tem capacidades adicionais que podem e devem ser utilizadas,
alinhadas às políticas do Ministério da Saúde. Nada mais lógico nisso”, afirmou
Gilberto Scarazatti, médico que trabalha na área regulatória hospitalar de
Campinas, em conversa com o Outra Saúde.
Para
Scarazatti, também consultor do Ministério da Saúde, o uso desta rede de 45
hospitais é estratégico para os propósitos do programa, inclusive no aspecto de
ampliar vagas para residentes, um dos gargalos da atenção especializada
reconhecidos pelo próprio governo.
“Isso é
importante demais, pois somente após um tempo de 3 a 5 anos temos um novo
especialista atuando. Hoje, apenas 40% dos médicos formados serão especialistas
e, destes, 80% ficarão nas cidades onde se especializaram. Como levar
especialistas aos locais onde a demanda não tem acesso? O programa tem intenção
de interiorizar os especialistas das áreas mais relevantes”, afirmou.
Sua
análise foi corroborada pelo próprio ministro Padilha, ao comemorar os números.
“O envolvimento dos hospitais universitários federais, coordenados pela Ebserh,
é decisivo para garantir a formação de novos especialistas e a ampliação da
capacidade de atendimento à população”, resumiu na quarta (9).
“Temos
espaço para ampliar nossos espaços de formação, alunos, residentes, enfim,
mobilizar a comunidade universitária”, corroborou Arthur Chioro.
<><>
Enquanto a saúde de negócios não entra em cena…
Há duas
semanas, o governo anunciou o plano de inclusão da rede de hospitais geridos
por entidades filantrópicas que já atendem o SUS, numa engenharia avaliada em
cerca de R$ 2 bilhões anuais, que sairiam do abatimento de dívidas consideradas
impagáveis por esta rede.
A
seguir, ficou prometida a apresentação de um plano de troca de dívidas por
procedimentos especializados na rede de hospitais geridos pelo setor privado
comercial. O adiamento da apresentação deste plano, que incluiria a
participação do Ministério da Fazenda, parece ter feito o governo ampliar a
importância da Ebserh no programa – que na prática já existe desde meados de
março, quando ainda se chamava Mais Acesso a Especialistas.
“De
janeiro a junho tivemos ampliação de 89 mil de cirurgias, 3,2 milhões de
consultas, 5,4 milhões de exames. Até abril, uma ampliação de 17% de serviços
prestados pelos HUs. E queremos aumentar 40%”, informou Arthur Chioro.
Uma das
promessas de campanha do governo, a redução da espera por cirurgias é
considerada um dos principais desafios históricos do SUS. Com seu crônico
subfinanciamento, uma rede de hospitais parcialmente financiada por recursos do
MEC contribui para as necessidades em saúde da população. Mas Scarazatti não se
ilude quanto a isso, até porque seus serviços são em boa parte pagos pela pasta
da Saúde.
“O uso
da rede não está relacionado ao subfinanciamento e sim à oportunidade de
utilizar recursos potenciais que devem ser ampliados ao máximo. O
subfinanciamento tem outras origens. É histórico e constitucional. É
ideológico, como mostra a questão das emendas parlamentares’”, contextualizou.
<><>
…É possível mudar cultura “gerencialista”?
Uma das
novidades do Agora Tem Especialistas é a possibilidade de contratação de
serviços hospitalares pela AgSUs, isto é, diretamente pelo governo federal.
Questionado se isso atropela atribuições de estados e municípios, seus
representantes alegam que estará diretamente subordinada às demandas destes
entes.
No
entanto, Scarazatti pensa que o programa se torna oportunidade de mexer no
atual modelo de produção de saúde, baseado em metas e considerado
“gerencialista”, uma vez que conta com pouca participação social em sua
formulação. Sua experiência na atenção hospitalar em Campinas é exemplo.
“A
Unicamp tem o Hospital das Clínicas ‘contratado’ pela Secretaria de Estadual da
Saúde. Frequentemente, as metas não são cumpridas e ocorrem descontos nos
repasses. Isso se tornou natural para os recursos hospitalares no SUS, em seus
próprios hospitais. E é rotineiro.”
Para
ele, o Agora Tem Especialistas e a entrada de entes federais no sistema de
contratações podem mudar esta abordagem, e colocá-la a serviço da sociedade de
forma mais realista.
“Um contrato
deve estar ajustado às necessidades e sua capacidade de produção, sem ser um
‘carrasco’. Com comissão de avaliação e representações dos trabalhadores e
usuários, as metas deixam de ser impositivas para serem acordadas e ajudam
muito no ajuste entre demanda e oferta, como é natural nos diferentes sistemas
públicos mundiais.”
Para
ele, o atual modelo é claramente fruto de uma cultura de mercado, embutida no
SUS através dos modelos de gestão privada supostamente sem fins comerciais, que
acabam se tornando parâmetro.
“Quando
as metas significam produtividade, lucro e resultados, deixa-se de fazer saúde
para se tornar ‘empresa produtiva’. O gerencialismo tem um prato feito na
condição acima”, criticou.
Em sua
visão, se a meta é ampliar a estrutura pública na atenção especializada, e
fixar futuros especialistas no SUS, deve-se ter em conta uma abordagem menos
produtivista, ainda que num primeiro momento o governo esteja obcecado por
resultados e números.
“Defendo
o conceito da gestão da clínica, onde ações cuidadoras devem encontrar nos
saberes multidisciplinares (e não somente médicos) e necessidades dos usuários,
que precisam ser sujeitos do seu próprio cuidado, opinar e decidir sobre a
autonomia possível quando enfermos. Não é simples. Isso deve mediar os
contratos e não somente os indicadores de produtividade e qualidade. Assunto
difícil, mas necessário de ser debatido”, refletiu.
Fonte:
Por Gabriel Brito em Outra Saúde

Nenhum comentário:
Postar um comentário