Os
boicotes funcionam: marcas de Israel não conseguem atrair consumidores
Vem
havendo uma queda impressionante na efetividade dos bilhões de dólares
gastos pelas empresas israelenses nas plataformas do grupo Meta, segundo dados
internos confidenciais da gigante das redes sociais, obtidos pelo Drop Site
News. Em decorrência disso, e em meio à crescente reação internacional contra o
genocídio promovido pelo governo de Israel na Faixa de Gaza, as empresas
israelenses estão sendo obrigadas a gastar cada vez mais para atrair potenciais
clientes para seus sites, ao mesmo tempo em que percebem um engajamento cada
vez menor dos usuários.
O
aumento do custo de marketing para as marcas israelenses, fornecido ao Drop
Site por denunciantes internos da Meta, coloca em números a crescente
toxicidade da reputação internacional de Israel. Os dados são divididos em
várias categorias, mostrando o valor total gasto anualmente por empresas
israelenses em publicidade desde 2023, os gastos anuais de outros países nesse
mesmo período, o custo médio para impulsionar o engajamento dos usuários
individuais, os principais países consumidores de publicidade israelense, e as
40 principais empresas de Israel que anunciam nas plataformas da Meta, por
total de gasto em propaganda.
A
métrica conhecida como “custo por clique”, ou CPC, é fundamental para os
anunciantes online. O CPC representa o valor em dólares que as empresas
precisam pagar para convencer um potencial cliente a clicar em seus anúncios —
um número que é então usado para avaliar quanto do seu gasto em publicidade
está se traduzindo com sucesso em faturamento. A Meta, procurada, não se
manifestou.
Entre
2023 e 2025, o CPC das empresas israelenses teve um impressionante aumento de
155,3%, subindo de US$0,094 (R$0,52) para US$0,24 (R$1,32), necessários para
convencer um potencial cliente individual a acessar os sites dessas empresas.
Esse
aumento nem de longe representa uma tendência geral de subida; Israel foi o
país com o maior aumento nos gastos anuais de CPC entre 2023 e 2024, segundo os
dados, seguido por Iraque e Paquistão. As empresas israelenses gastam em média
um total de US$1,8 bilhão (R$9,89 bilhões) e US$1,9 bilhão (R$10,44 bilhões) em
publicidade nas plataformas da Meta ao longo desses anos, e a efetividade desse
gasto vem diminuindo rapidamente.
Entre
as empresas israelenses que mais gastam nas plataformas da Meta está uma
eclética mistura da empresas de jogos eletrônicos, empresas de serviços de TI,
empresas de marketing de conteúdo, e fornecedores físicos de comércio
eletrônico. Várias das empresas listadas foram atingidas por campanhas de
Boicote, Desinvestimento e Sanções (BDS). Outras, embora não sejam abertamente
israelenses, começaram a se identificar com causas pró-Israel imediatamente
após os ataques de 7 de outubro, inclusive em suas postagens de rede social e
anúncios publicitários. Muitas das empresas de marketing de conteúdo com sede
em Israel, listadas como grandes anunciantes na Meta, não divulgam seus
clientes na documentação online, o que dá a entender que boa parte de sua
publicidade também pode estar concentrada em torno de Israel. O governo
israelense, assim como grupos pró-Israel do setor privado, anunciaram grandes
iniciativas com o objetivo de defender a reputação online do país ao longos dos
últimos dois anos, diante das reiteradas críticas às ações de Israel em Gaza.
Novembro
e dezembro logo se seguiram a outubro de 2023, a contagem de vítimas civis
disparou, e as empresas israelenses começaram a tentar se distanciar da marca do
país em sua publicidade online, com medo dessa reação. Os dados da Meta
permitem inferir que essas iniciativas não foram eficazes. Até agora, em 2025,
o número de cliques que as empresas israelenses tiveram em seus anúncios é
apenas 39,2% do total registrado em 2023, o que explica por que as empresas de
Israel agora precisam pagar mais que o dobro em custos de publicidade para
atrair clientes.
Isso se
demonstrou em praticamente todos os países onde as empresas israelenses
anunciam. Para usuários dos EUA que receberam anúncios israelenses, o CPC entre
2023 e 2024 aumentou 93,32%, para o mesmo período; o CPC para as empresas não
israelenses que anunciam nos EUA só aumentou 2,8%. Grandes aumentos de CPC
também foram observados em outros dos principais países que recebem publicidade
israelense, como Reino Unido (163,22%), Canadá (106,61%), Austrália (115,87%),
Alemanha (144,39%), Brasil (89,60%), França (102,68%), México (39,91%), e Índia
(40,32%). Em comparação, o CPC das empresas israelenses nos anúncios para o
público de Israel subiu apenas 12%, que provavelmente se explica pela economia
em declínio. Da mesma forma, o CPC para empresas mundiais permaneceu bastante
consistente em todos os mercados onde a Meta anuncia. Por exemplo, o aumento do
CPC no Reino Unido para empresas não israelenses foi de apenas 9,7%; no Canadá,
8,83%; Austrália, 8%; Alemanha, 10,9%, e assim em praticamente todos os países —
mostrando uma diferença significativa entre a taxa de aumento do CPC para
Israel e para outras empresas globais.
Os
dados da Meta oferecem uma rara perspectiva dos ventos contrários que a
economia israelense vem enfrentando após 20 meses dos ataques na Faixa de Gaza
que resultaram em acusações formais de genocídio contra o país nos tribunais
internacionais. Vários dos principais anunciantes israelenses da Meta também
foram incluídos em campanhas online de boicote e desinvestimento, enquanto o
movimento BDS oficial propõe o desinvestimento em empresas israelenses de forma
geral.
Apesar
do apoio sem precedentes da Meta a Israel durante a guerra em Gaza, incluindo
a cumplicidade na censura em grande
escala de
conteúdo pró-Palestina e de críticas a Israel, os dados internos mostram que o
sentimento global dos consumidores está se voltando fortemente contra as marcas
israelenses, e a receita da Meta que se original de Israel está caindo — já
houve uma queda de 8% no gasto em anúncios israelenses durante o período de
2023-2024. À medida que o genocídio em Gaza continua, a crescente recusa global
de se envolver com marcas israelenses impõe um custo econômico que nem a
censura da Meta consegue apagar.
Outras
métricas refletem o mesmo duro colapso da marca de Israel no mundo. No
relatório anual Global Soft Power Index (Índice de Soft Power Global),
publicado no início deste ano pela consultoria de marketing Brand Finance, com
sede em Londres, Israel caiu para a posição mais baixa até hoje. “Mais de um
ano após o ataque de 7 de outubro do Hamas em Israel, e da invasão de Israel em
Gaza como resposta, o conflito Israel-Palestina continua a impactar fortemente
a percepção global do país, o que é demonstrado por um acentuado declínio de 42
posições de reputação, chegando ao 121º lugar”, observou o relatório.
Em meio
à crescente reação aos planos declarados pelos líderes israelenses de anexar a
Faixa de Gaza e expulsar ou matar sua população, países europeus que vinham
apoiando os esforços de guerra israelenses começaram a ameaçar sanções e outras
medidas com o objetivo de obrigar Israel a parar com o massacre. A União
Europeia e o Reino Unido anunciaram separadamente
este mês planos para suspender negociações comerciais e rever os acordos
econômicos existentes, em protesto contra as ações israelenses.
As
pesquisas mostram que a opinião pública sobre Israel nos EUA continuam a se
deteriorar. Uma pesquisa de opinião do Centro de Pesquisas Pew, realizada em
abril, mostrou que 53% dos estadunidenses atualmente têm uma visão desfavorável
de Israel, contra 42% em março de 2022. O declínio na favorabilidade é
especialmente acentuado entre a população mais jovem dos EUA, e as visões
negativas são representadas com intensidade bem maior na faixa etária entre 18
e 49 anos. Nessa categoria, até 50% das pessoas que se autoidentificam como
republicanas agora declaram uma visão desfavorável de Israel.
Essa
queda acontece a despeito dos esforços gigantescos empreendidos pelo governo
israelense para moldar a opinião pública mundial. No final de 2024, o
Ministério das Relações Exteriores de Israel aumentou o orçamento dos
esforços diplomáticos em 150 milhões de dólares (R$823 milhões) sobre os
valores já existentes, ao mesmo tempo em que o governo implementava cortes
sobre os serviços sociais para cobrir os gastos com defesa, entre outros. O
ex-chefe do banco central do país alertou em maio que
poderia haver colapso de infraestrutura essencial do setor público de Israel.
“Pelo novo orçamento, o Ministério das Relações Exteriores receberá US$150
milhões, além do que já recebe pelas atividades em curso, para o que
oficialmente se considera diplomacia pública, ou hasbara, em
hebraico”, observou uma matéria do Times of Israel sobre o aumento dos recursos
para hasbara. “Esse valor é mais de 20 vezes o que foi
habitualmente destinado a essas iniciativas nos últimos anos.”
¨
UE cita 'indícios' de que Israel está violando obrigações
de direitos humanos devido à conduta em Gaza
A UE
disse que "há indícios" de que Israel está violando obrigações de direitos humanos devido
à sua conduta em Gaza, mas não chegou a pedir sanções imediatas.
“Há
indícios de que Israel estaria violando suas obrigações de direitos humanos sob
o artigo 2 do acordo de associação UE-Israel”, afirma um documento vazado do
serviço de política externa da UE, visto pelo Guardian.
Redigido
na linguagem tipicamente cautelosa de Bruxelas, o documento, no entanto,
representa um momento significativo nas relações da Europa com um aliado de
longa data.
O
documento, muito bem guardado, que será apresentado pela chefe de política
externa da UE, Kaja Kallas, aos ministros das Relações Exteriores europeus na
segunda-feira, cita avaliações do Tribunal Internacional de Justiça, do
Gabinete do Alto Comissariado para os Direitos Humanos e de vários outros
órgãos da ONU, ao mesmo tempo em que afirma que não representa "um
julgamento de valor" de nenhuma autoridade da UE.
A
descoberta foi vista como uma conclusão precipitada desde que uma revisão do
acordo UE-Israel foi colocada na agenda no mês passado por 17 estados-membros
da UE, liderados pela Holanda, um aliado tradicional de Israel.
As
autoridades da UE foram encarregadas de verificar se as relações internas e
internacionais de Israel eram baseadas no “respeito pelos direitos humanos e
pelos princípios democráticos”, tendo como pano de fundo os tiroteios fatais
quase diários contra civis palestinos em busca de
comida .
A
revisão foi desencadeada pelo bloqueio israelense à Faixa de Gaza , em meio ao horror generalizado sobre
o bombardeio em andamento que devastou o território e matou mais de 55.600
pessoas — a maioria civis — desde 7 de outubro de 2023, de acordo com o
Ministério da Saúde de Gaza.
A
discussão na UE é complicada pelos ataques aéreos de Israel ao Irã, o que pode
impedir alguns governos de pressionar Israel.
Logo
após Israel começar a travar uma guerra contra o Irã, a presidente da Comissão
Europeia, Ursula von der Leyen, "reiterou o direito de Israel de se
defender". Ela já havia sido criticada por não se manifestar sobre as
consequências humanitárias da ofensiva israelense para os palestinos.
O
acordo de associação UE-Israel, assinado em 1995, sustenta uma relação
comercial de € 68 bilhões (£ 58 bilhões) entre 27 países europeus e o país do
Oriente Médio. A UE é o maior mercado de Israel e representa cerca de um terço
do seu comércio. Israel também é membro do programa de financiamento de
pesquisa Horizon da UE e obteve subsídios no valor de € 831 milhões desde o
início do programa atual em 2021.
O
documento surgiu depois que mais de 100 grupos de campanha pediram à comissão
esta semana que suspendesse o acordo de associação.
“Uma
revisão fraca ou inconclusiva do cumprimento do artigo 2 por Israel e/ou a
falha da comissão e do conselho em suspender pelo menos parte do acordo de
associação acabaria por destruir o que resta da credibilidade da UE [e]
encorajaria ainda mais as autoridades israelenses a continuar com seus crimes
de atrocidade”, diz a declaração, assinada por 113 grupos da sociedade civil,
incluindo a Anistia Internacional e a Human Rights Watch.
Eve
Geddie, chefe do escritório da Anistia Internacional na UE, disse que a decisão
de lançar uma revisão chegou "tragicamente e devastadoramente tarde"
e que, embora fosse importante, com o passar do tempo as forças israelenses
ficaram "cada vez mais encorajadas".
Separadamente,
oito estados-membros da UE escreveram a Kallas instando-a a considerar a
interrupção do comércio de bens e serviços dos territórios palestinos ocupados .
A
carta, organizada pela Bélgica, declara que a UE é obrigada a responder a um
parecer do Tribunal Internacional de Justiça, emitido em julho passado, ordenando que Israel encerre a
ocupação dos
territórios palestinos o mais rápido possível. Em uma decisão histórica –
embora não vinculativa –, o tribunal afirmou que outros Estados têm a obrigação
de não reconhecer a ocupação como legal.
"Não
vimos uma proposta sobre como interromper efetivamente o comércio de bens e
serviços com os assentamentos ilegais", afirma a carta, solicitando que a
UE estabeleça um cronograma para atingir "total conformidade" com o
parecer consultivo por volta de seu primeiro aniversário.
A
Holanda lançou um apelo para a revisão do acordo de associação UE-Israel após
os protestos do mês passado, que continuaram (foto: Haia, 15 de junho de
2025). Fotografia: Paulo Amorim/VW Pics/Zuma Press Wire/Shutterstock
A
política da UE sobre Israel tem sido prejudicada pelas dificuldades em
encontrar unanimidade entre 27 estados-membros com visões totalmente
diferentes, desde países que reconheceram a Palestina, incluindo Espanha e Irlanda , até aliados
fiéis do presidente israelense, Benjamin Netanyahu, como Hungria e República
Tcheca.
A maré
mudou no mês passado quando a Holanda, um forte aliado de Israel, lançou um apelo para revisar o
acordo de associação UE-Israel, após os maiores protestos nas ruas
holandesas sobre
uma questão de política externa em décadas.
O
ministro das Relações Exteriores holandês, Casper Veldkamp, ex-embaixador em
Israel, argumentou que o bloqueio israelense à Faixa de Gaza
violava o direito internacional e, portanto, o acordo de associação.
Um número inesperadamente grande de países
concordou, embora a questão não tenha sido submetida a votação.
A UE
está longe de estar unida quanto ao que fazer a seguir. Uma suspensão total do
acordo, que exige unanimidade, é vista como impossível, dada a certeza de um
veto da Hungria, República Tcheca ou Alemanha.
A UE
precisa apenas de uma maioria ponderada para suspender termos comerciais
favoráveis ou a participação
de Israel no Horizon, mas mesmo esses resultados são
altamente incertos.
Hildegard
Bentele, eurodeputada alemã de centro-direita que preside a delegação
israelense no Parlamento Europeu, criticou as tentativas de questionar o
acordo. "Isso não terá nenhuma influência sobre o governo israelense.
Tenho certeza disso. Isso nos colocará em uma posição menos influente",
disse ela em uma entrevista no início deste mês.
O
antecessor de Kallas, Josep Borrell, no entanto, criticou a Europa por se
esquivar de suas responsabilidades morais em relação a Gaza. Em um discurso
tipicamente franco, ele argumentou que a UE deveria usar o acordo de
associação como uma alavanca para exigir que o direito
humanitário seja respeitado.
Em mais
uma ilustração dos problemas da política externa da UE, a Hungria está
bloqueando as sanções da UE contra colonos israelenses violentos.
No
início desta semana, Kallas expressou frustração com os críticos que acusaram a
UE de silêncio e inação, citando a necessidade de encontrar consenso.
"Sanções precisam de unanimidade. E, novamente, estou representando 27
[países]."
Ela
argumentou que apresentar sanções que inevitavelmente fracassariam era inútil:
"Eu mesma me sinto melhor por ter feito algo, mas, na verdade, sei que
isso não vai acontecer... e isso só mostrará que não temos uma posição
comum".
Fonte: Murtaza Hussain, em The Intercept/The Guardian

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