segunda-feira, 30 de junho de 2025

Eugênio Bucci: Como se formam os golpistas?

Pela primeira vez na história do Brasil, militares de alta patente, acompanhados de um ex-presidente da República, tomam assento no banco dos réus. Eles são acusados de organização criminosa armada e tentativa de abolição violenta do Estado democrático de direito, entre outros crimes. A notícia é tão inusitada que parece boa, mas, na verdade, é apenas um começo.

Por certo, o processo que corre no Supremo Tribunal Federal reluz pelo ineditismo. Diferentemente do que se via no passado, o Brasil não deixa mais por isso mesmo. Agora, há um esforço para responsabilizar os que atentaram contra a normalidade democrática. As coisas avançam semana a semana. Os integrantes do “núcleo crucial” da trama, conforme o nomeou a Procuradoria Geral da República, tiveram de comparecer aos interrogatórios. Agora, houve uma acareação momentosa entre o tenente-coronel Mauro Cid e o general Walter Braga Netto.

O andamento, contudo, é difícil. Para atrapalhar os ritos, surgiram lances de clamoroso cinismo. O réu Jair Bolsonaro, enquanto era interrogado, deu de convidar o ministro Alexandre de Moraes, que conduzia a sessão, para figurar como vice em sua chapa para a Presidência da República em 2026. O tom foi jocoso: piada à queima-roupa. O magistrado apenas sorriu, num clima de quase descontração judicial, e, no seu linguajar característico, declinou. Pilhéria indeferida.

O que nos aguarda? O processo vai transcorrer em risadas? Vai transitar em julgado amaciado? Vai dar cadeia? Virá uma anistia? Uma pizza? Não há como saber. O enredo que nos trouxe até aqui, misturando degradação institucional, escárnio escrachado e realismo fantástico, tem se mostrado imprevisível.

Primeiro, tentou-se derrubar a República numa tramoia que incluiu acampamentos à frente de quartéis, fake news torrenciais sobre as urnas eletrônicas, depredação dos palácios dos três poderes e um plano para assassinar o chefe de Estado, seu vice e um ministro do Supremo. Depois, no julgamento, veio o espetáculo acintoso. Os acusados não se envergonham do que é vergonhoso. Desdenham da autoridade judiciária. Agem como se estivessem acima das leis dos comuns.

O historiador Carlos Fico estuda há décadas “o desprezo dos militares pela política, seu autoentendimento como superiores aos civis”. O retrato que ele nos entrega dessa história, no livro Utopia autoritária brasileira: Como os militares ameaçam a democracia brasileira desde o nascimento da República até hoje (Editora Planeta do Brasil), é desalentador. A virada de mesa tem sido uma constante das Forças Armadas. Trata-se de um vício que se reproduz impunemente.

“Todas as crises políticas brasileiras caracterizadas por ruptura da legalidade constitucional (vou denominá-las ‘crises institucionais’) foram causadas por militares”, afirma Carlos Fico. “As Forças Armadas violaram todas as constituições da República. (…) Indisciplina e subversão marcam a trajetória dos militares no Brasil. Eles foram responsáveis por todas as crises institucionais do país desde a Proclamação da República e jamais foram efetivamente punidos”.

O livro demonstra que, neste país, o golpe compensa – mesmo quando fracassa. Com a palavra, o historiador: “Quando afirmo que nunca houve, no Brasil, a efetiva punição de militares golpistas, me refiro às anistias que foram aprovadas pelo Congresso Nacional beneficiando os oficiais envolvidos nas tentativas fracassadas de 1904, 1922, 1924, 1956, 1959 e 1961. É claro que não cabe falar em punição no caso dos golpes bem-sucedidos (1889, 1930, 1937, 1945, 1954, 1955 e 1964)”.

Por que “não cabe falar em punição no caso dos golpes bem-sucedidos”? Muito simples: quando o golpe dá certo, o ordenamento jurídico que poderia puni-lo não fica de pé para aplicar a lei. Passa a valer o inverso. Por exemplo: com a tomada do poder pelas tropas em 1964, quem fixou residência na prisão não foram os golpistas, mas os que se opunham à quartelada. Eis por que a legislação atual, com acerto, estabelece como crime a tentativa de golpe, não o golpe consumado. A tentativa basta para configurar o tipo penal.

Fora o acerto da lei, o que vemos hoje na corte não é bom. Algo na voz dos réus, na sua maneira de olhar ou de desviar o olhar, deixa ver que, para eles, o golpismo é um ato de bravura. A fixação maníaca na ideia de assalto ao poder constitui um traço cultural que se mantém intacto no ideário das tropas. O que explica essa permanência? De onde vem isso?

A resposta lógica aponta para as escolas em que se formam os oficiais. Se a formação fosse outra, a mentalidade da farda já seria diferente. Será razoável que o currículo das academias das Forças Armadas e das Polícias Militares fique inteiramente a cargo da caserna? Ou será que isso deveria ser da competência da sociedade e do Estado Democrático de Direito?

De forma respeitosa, dialogada e serena, é preciso enfrentar a questão. Ou o Brasil encara essa agenda espinhosa ou talvez não tenhamos como sair dessa espiral em que o populismo de coturnos, quando vai ao banco dos réus, vai em trajes de galhofa.

•        Golpe de estado em marcha: Rui Costa Pimenta denuncia ofensiva contra o presidente Lula

O presidente do Partido da Causa Operária (PCO), Rui Costa Pimenta, advertiu que o Brasil vive “um novo golpe de Estado” contra o presidente Lula. A avaliação foi feita em entrevista à TV 247. Logo no início da conversa, Pimenta sustentou que “nós estamos de novo enfrentando um golpe de Estado”, apontando a atuação do deputado Hugo Mota (Republicanos-PB), presidente da Câmara, e de setores do Congresso Nacional como núcleo da escalada para inviabilizar a reeleição de Lula em 2026.

O dirigente vê na ofensiva parlamentar uma repetição, “tão grave quanto a que derrubou Dilma Rousseff”, mas agora combinada, segundo ele, a decisões do Supremo Tribunal Federal (STF) que “blindam” o Legislativo e restringem a ação do Executivo.

<><> Congresso, STF e orçamento

Para o líder do PCO, as emendas impositivas se transformaram em “privatização do orçamento federal”. Ele criticou a submissão do governo a esse mecanismo: “O orçamento federal deveria ir para saúde, para educação”, declarou, qualificando o atual arranjo como “clientelismo que sustenta uma oligarquia”. Pimenta reprovou ainda a tentativa do Palácio do Planalto de recorrer ao STF contra o avanço do Legislativo: “Chamar a população a apoiar o STF contra o Congresso é uma loucura”, afirmou, defendendo que a resposta passe pela mobilização popular nas ruas, não pelo Judiciário.

<><> Classe média sob pressão

Questionado sobre a taxação do IOF sobre gastos no exterior, Pimenta alertou para o risco de alienar camadas médias: “A classe média tem de ser levada em consideração… a luta do trabalhador não pode ser contra todo mundo que tenha um fogão em casa”. Ele propõe diminuir o peso tributário sobre pequenos negócios e ampliar o crédito produtivo como forma de evitar que esses segmentos sejam capturados pela extrema-direita.

Ao diagnosticar a “falência do sistema político”, o dirigente do PCO qualificou o atual ordenamento como “uma aberração” que permite a eleição do presidente sem maioria no Congresso. Para ele, a chamada Nova República “já acabou”, e o impasse será resolvido pela correlação de forças nas ruas. “Esse regime político é uma aberração”, resumiu.

<><> Geopolítica e Irã

No plano internacional, Pimenta analisou o recente confronto entre Irã e Israel: “O Irã mostrou que isso aí acabou”, disse, referindo-se à suposta supremacia militar israelense no Oriente Médio. Ele avaliou que a derrota do “sionismo” altera o tabuleiro geopolítico e fortalece a agenda multipolar impulsionada por Rússia e China.

A entrevista também abordou o caso do médico Rick Jones, defensor do parto humanizado, preso sob acusação de negligência. Pimenta classificou o processo como “perseguição política” movida por “lobby poderoso da indústria da cesariana” e anunciou uma campanha em defesa do profissional, destacando que “barbaridades de injustiça flagrante” ainda são usadas como instrumentos de lawfare no país.

Por fim, o presidente do PCO convocou ato em São Paulo em solidariedade ao Irã — iniciativa que, segundo ele, reforça a necessidade de “manter o povo mobilizado” diante de ameaças externas e internas. Sem essa pressão, advertiu, “o rolo compressor contra o governo do PT” tende a avançar.

•        País perde credibilidade nesse embate entre poderes. Por José Carvalho

Uma das principais perdas para o Brasil nesse contexto está na credibilidade do País. Houve uma enorme deterioração, a partir do “impeachment” Dilma, das Instituições de Estado. Abriu-se uma temporada de guerras e enfrentamentos, que quase ruiu com todo o arcabouço constitucional. As relações entre os poderes passou a ser verdadeira queda de braços. Foi nesse quadro que o Congresso passou a aumentar seu espaço, desconfigurando o equilíbrio de forças em relação aos demais poderes. O Congresso Nacional assumiu a condição de supra-poder. Está criando um regime de exceção, sem nenhuma legitimidade. Não é a questão de fazer ou não fazer, se trata daquilo que pode e não pode fazer. É o cabível e o incabível. É estar dentro da Constituição ou infringindo a Constituição. Existe uma atribuição a cada poder, a cada uma das instituições em cada um dos poderes, existem atribuições para toda a sociedade. Não dá pra viver num lugar onde não é reconhecido o direito, onde tudo é questionável e judicializado porque ninguém aceita as normas. Eu mudo o que quero para servir ao que quero, na hora que quero. O Brasil tem que se aceitar como Nação. Se submeter às próprias regras , e sem dar cavalo de pau.

 

Fonte: A Terra é Redonda/Brasil 247/Jornal GGN

 

Nenhum comentário: