sábado, 21 de junho de 2025

"Morri por oito minutos": entenda relação entre cigarro e parada cardíaca

A auxiliar de saúde bucal Meiry Vilela, de 63 anos, fumava desde os 25. Em 2023, sentiu uma dor no braço esquerdo ao acordar. Continuou realizando as tarefas do dia, mesmo com sua filha insistindo para ir ao hospital. Ao decidir, finalmente, procurar ajuda médica, desmaiou durante o caminho até o local, teve um infarto e uma parada cardiorrespiratória que durou oito minutos.

Ela acordou 10 dias depois, após permanecer internada em Unidade de Terapia Intensiva (UTI), sem nenhuma sequela. Os médicos lhe disseram que seu caso é um milagre. Depois desse episódio, Meiry decidiu parar de fumar.

"Tomei essa decisão porque tenho pessoas que eu amo muito ao meu redor. Tinha acabado de virar avó e queria muito ver meu neto crescer. Eu sabia que, se continuasse fumando, não iria conseguir acompanhar seu crescimento", conta Meiry em entrevista à CNN. "Não era justo fazer minha família sofrer por isso."

Assim que saiu do hospital, Meiry jogou todos seus maços de cigarro no lixo. "Falei para minha filha: 'Eu não vou colocar mais um cigarro na minha boca. A partir de hoje, não quero mais saber de cigarro'", relembra.

A história de Meiry representa uma das possíveis complicações decorrentes do cigarro: o infarto, que pode levar à parada cardiorrespiratória.

"O tabagismo é responsável por mais de 50 doenças, entre elas o câncer, doenças respiratórias e doenças cardiovasculares, incluindo o infarto agudo do miocárdio", explica Maria Vera Cruz de Oliveira, pneumologista do Hospital do Servidor Público Estadual de São Paulo (HSPE).

O cigarro possui substâncias que, além de causar dependência, provocam o estreitamento, inflamação e formação de placas de gordura e cálcio em artérias. Além disso, o tabagismo também está relacionado ao maior risco de hipertensão arterial, o que também eleva as chances de infarto.

<><> Sinais de alerta de infarto

Segundo Oliveira, entre os sinais de alerta que um paciente tabagista deve ficar atento em relação ao infarto é a chamada dor precordial. "Essa dor, em geral, não é contínua. Ela dura alguns segundos ou minutos, desaparece e depois volta a aparecer", explica.

Outros sintomas de infarto incluem:

•        Falta de ar ao realizar alguma atividade física;

•        Fadiga;

•        Dor no estômago;

•        Dor no peito;

•        Náusea e tontura;

•        Espasmos no pescoço e na mandíbula;

•        Dor no braço;

•        Tosse;

•        Inquietação;

•        Batimentos cardíacos rápidos e irregulares;

•        Inchaço corporal.

<><> "Eu tinha muita ansiedade": os desafios de parar de fumar

Assim que tomou sua decisão de parar de fumar, Meiry não colocou mais um cigarro em sua boca. Ela decidiu cessar o hábito de vez, ao invés de fazer um processo gradual. "Comecei a ficar ansiosa e, para lidar com a ansiedade, eu fazia caminhadas, tomava muita água e comia aquelas cenouras pequenas", conta.

"Quando eu ficava muito ansiosa, procurava algum trabalho para fazer. Comecei a ajudar em um trabalho social em uma paróquia perto da minha casa. Fazia sopa para distribuir para pessoas em situação de rua, e isso me ajudou muito", continua.

Além disso, Meiry também começou a fazer terapia psicológica. A terapia-cognitivo-comportamental, inclusive, é uma das estratégias usadas para o tratamento do tabagismo, somado ao uso de medicamentos como repositores de nicotina -- que podem vir na forma de adesivos, pastilhas ou gomas de mascar --, a brupropiona e a nortreptilina, ambos antidepressivos que podem ser usados como tratamento de segunda linha para a cessação do fumo.

Segundo Oliveira, após a interrupção do tabagismo, os riscos cardiovasculares diminuem. "Após um ano [sem fumar], os riscos diminuem em 50%. Então, ainda há um risco. Mas após cinco a dez anos, esse perigo vai ser igualar a uma pessoa que nunca fumou", afirma a pneumologista.

Há dois anos sem fumar, Meiry tem um único conselho para quem deseja largar o cigarro: "Não espere o amanhã. Não espere chegar ao mesmo ponto que eu cheguei. Tome uma decisão. É a nossa decisão que faz a diferença. A nossa vida é muito mais importante do que acender um cigarro."

•        Cigarro é inimigo da saúde do coração

Em um país onde as doenças cardiovasculares continuam a ser a principal causa de morte, o tabagismo surge como um dos grandes vilões da saúde do coração. Só em 2023, o Brasil registrou mais de 105 mil óbitos por acidente vascular cerebral (AVC), segundo dados oficiais do Datasus, considerando-se diagnósticos de I60 a I69 e G45 e G46, conforme o CID-10 (códigos que se referem às Doenças Cerebrovasculares, Acidentes Vasculares Cerebrais Isquêmicos Transitórios e Síndromes Vasculares Cerebrais).

Quando somamos ao infarto agudo do miocárdio, o resultado é uma verdadeira epidemia silenciosa, que acomete pessoas de todas as idades, mas tem um protagonista indiscutível: o cigarro.

<><> Tabagismo e o impacto direto no coração e no cérebro

O tabagismo não é um hábito inofensivo. Embora a imagem do fumante tenha mudado ao longo dos anos, os riscos associados ao ato de fumar permanecem alarmantes. Estudos demonstram que quem fuma chega a triplicar o risco de sofrer um infarto ou um AVC em comparação com não fumantes. E não são apenas os idosos que estão expostos: jovens adultos, cada vez mais, aparecem nas estatísticas de hospitalizações e até mesmo óbitos precoces por essas doenças.

No Brasil, o tabagismo está associado a aproximadamente 25% dos casos de infarto agudo do miocárdio e quase metade dos derrames cerebrais. E os números são ainda mais preocupantes quando olhamos para o efeito do fumo passivo, que também aumenta o risco cardiovascular para aqueles que, mesmo não fumando, acabam expostos à fumaça.

O dado de que o tabagismo é responsável por cerca de 8 milhões de mortes por ano no mundo, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), reforça a urgência de políticas públicas efetivas e do engajamento individual na busca por hábitos mais saudáveis. Só no Brasil, estima-se que o tabaco seja responsável por cerca de 440 mortes por dia relacionadas a doenças associadas ao fumo, incluindo o infarto e o AVC.

Estatísticas recentes:

•        Brasil, 2023: 105.173 óbitos por AVC;

•        Brasil, 2022 e 2023: Infarto e AVC seguem como principais causas de morte;

•        Mundialmente: Tabagismo mata 8 milhões de pessoas por ano, sendo 1 milhão de vítimas não fumantes expostas ao fumo passivo.

<><> Efeitos da nicotina e do vape sobre o sistema cardiovascular

A nicotina age rapidamente no organismo. Em poucos segundos após a primeira tragada, ela atinge o cérebro e desencadeia efeitos que, embora proporcionem sensação de bem-estar passageira, causam estragos duradouros ao coração e sistema circulatório.

Ela provoca aumento da pressão arterial por meio da liberação de adrenalina, que acelera o coração e contrai os vasos sanguíneos. Além disso, contribui para o aumento do colesterol LDL e a redução do HDL, facilitando a formação de placas de gordura nas artérias.

O cigarro também interfere na coagulação sanguínea, tornando o sangue mais espesso e propenso a formar coágulos. Isso aumenta o risco de obstrução dos vasos, levando ao infarto ou AVC isquêmico. Fumantes frequentemente apresentam outras comorbidades, como diabetes e dislipidemia, o que agrava ainda mais os efeitos nocivos sobre o coração.

A chegada dos cigarros eletrônicos (vapes) elevou a preocupação entre médicos e famílias. O líquido dos dispositivos contém nicotina em doses muitas vezes superiores ao cigarro tradicional, além de substâncias como formaldeído e acroleína. Estudos indicam que jovens usuários de vape têm maior risco de dependência, aumento da pressão arterial e frequência cardíaca elevada, além de casos já documentados de infarto e doenças pulmonares inflamatórias.

<><> Prevenção, conscientização e escolhas para um coração saudável

Apesar de todos os riscos, há espaço para otimismo: os efeitos do tabagismo podem ser revertidos com mudança de hábitos e apoio profissional.

Dicas dos cardiologistas:

•        parar de fumar é sempre possível — o risco cardiovascular começa a cair nas primeiras horas sem cigarro

•        busque apoio profissional — programas estruturados aumentam as chances de sucesso

•        alimente-se bem e pratique exercícios — isso potencializa os efeitos da cessação

•        controle a pressão, o colesterol e os níveis de glicose — medidas essenciais para quem quer proteger o coração

O tabagismo, tradicional ou eletrônico, não é um problema apenas individual. Ele gera custos altos ao sistema de saúde e compromete a qualidade de vida das famílias. O SUS gasta bilhões de reais por ano com internações e tratamentos relacionados ao cigarro.

O futuro da saúde do coração dos brasileiros depende das decisões de hoje. Parar de fumar é possível, e os benefícios são acumulativos. O desafio está em educar, conscientizar e incentivar a busca por ajuda. O coração agradece.

 

Fonte: CNN Brasil

 

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