Como
prisão de brasileira gerou investigação sobre monitoramento 'secreto' do
serviço de imigração de Trump
Uma
investigação interna da polícia do Colorado revelou que a brasileira Caroline Dias Gonçalves, de 19 anos, foi
presa em 5 de junho nos Estados Unidos após detalhes sobre ela serem
compartilhados por um policial em um grupo no aplicativo de troca de mensagens
Signal que,
segundo os investigadores, estaria sendo secretamente monitorado pelos Serviço
de Imigração e Alfândega americano (ICE, na sigla em inglês).
Caroline
foi solta sob fiança nesta quarta-feira (18/6), segundo o advogado dela,
Jonathan M. Hyman, e deverá responder ao caso agora em Salt Lake City, capital
de Utah, Estado onde ela vive e estuda.
A
brasileira mora nos EUA desde criança e tem autorização para trabalhar e
estudar — ela e sua família fizeram um pedido de asilo às autoridades
americanas, segundo reportagem do jornal The Salt Lake
Tribune.
O
possível monitoramento secreto do ICE ao canal de comunicação da polícia no
Signal foi revelado em um comunicado oficial do Gabinete do
Xerife do Condado de Mesa, no Colorado, divulgado no fim da tarde de
segunda-feira (16/8).
Segundo
o comunicado, o investigador Alexander Zwinck compartilhou informações sobre
Caroline em um grupo de comunicação compartilhado entre diferentes forças
policiais, voltado ao combate ao tráfico de drogas.
"Nosso
agente fazia parte de um grupo de comunicação que incluía parceiros locais,
estaduais e federais de segurança pública, que participavam de um esforço
conjunto de combate ao tráfico de drogas nas rodovias do oeste do
Colorado", diz o Gabinete do Xerife, no comunicado.
"Não
tínhamos conhecimento de que o grupo de comunicação estava sendo utilizado para
qualquer finalidade além do combate ao tráfico de drogas, incluindo questões
imigratórias. Desde então, removemos todos os membros do Gabinete do Xerife do
Condado de Mesa desse grupo de comunicação", completou a autoridade
policial.
A BBC
News Brasil entrou em contato com o ICE por email, solicitando um
posicionamento sobre as descobertas da investigação conduzida pelo Gabinete do
Xerife do Condado de Mesa. Caso uma resposta seja enviada pelo serviço de
imigração americano, a reportagem será atualizada.
Estudante
de enfermagem na Universidade de Utah, Caroline foi detida pelo ICE numa
quinta-feira (5/6), após ser parada por um policial por uma pequena infração de
trânsito, enquanto dirigia o carro do pai para visitar amigos em Denver,
capital do Colorado, Estado vizinho a Utah.
Minutos
depois desta primeira abordagem, ela foi novamente parada por um agente do ICE e foi então
detida, passando quase duas semanas presa num centro federal para detenção de
imigrantes em Aurora, nas proximidades de Denver.
O caso
levantou suspeitas sobre uma possível colaboração entre a polícia local e o
serviço de imigração, levando à investigação conduzida pelo Gabinete do Xerife.
De
acordo com a legislação do Colorado, a polícia não pode investigar o status de
residência das pessoas abordadas em nenhuma interação policial.
"A
natureza da abordagem levanta preocupações sobre se o Gabinete do Xerife do
Condado de Mesa violou a legislação estadual ou se a comunicação do agente por
meio da força-tarefa acabou notificando inadvertidamente agentes do ICE sobre o
status migratório de Caroline", afirma Jonathan M. Hyman, advogado de
Caroline no caso.
"Agentes
do ICE não deveriam agir com base nessas informações, a menos que estejam
relacionadas a uma investigação criminal mais ampla", considera o
representante legal.
Segundo
Hyman, os resultados preliminares da investigação interna da polícia deixam
ainda muitas questões em aberto que terão de ser respondidas pelas autoridades
do Condado no Colorado.
"Todo
motorista abordado em uma parada de trânsito é inserido em um banco de dados
multiagências e tem seu status migratório divulgado? Há quanto tempo esse grupo
está em operação? O Condado de Mesa tomou medidas para retirar imediatamente
seus funcionários desse grupo, mas e quanto às outras agências?",
questiona Hyman, em declaração à BBC News Brasil por email.
O
Gabinete do Xerife reforçou que o uso da informação pelo ICE é contrário à
legislação do Colorado e afirmou que a investigação administrativa para
garantir a conformidade com a legislação estadual e com a política interna do
departamento continua em andamento.
·
Imagens da câmera corporal
O
gabinete também divulgou no YouTube a filmagem completa produzida pela
câmera corporal do policial durante a abordagem a Caroline.
As
imagens mostram que a abordagem durou cerca de 20 minutos e aconteceu como os
amigos e familiares da jovem relataram à imprensa.
O vídeo
começa com o agente Alexander Zwinck dizendo a Caroline que ela estava
dirigindo perto demais de um caminhão na rodovia Interstate-70, próximo a Loma,
no Colorado.
Ela
entrega ao policial a carteira de motorista e o documento de registro do
veículo, que o agente leva com ele para a viatura, conforme mostrado nas
imagens.
Mais
tarde, ele pede para que Caroline o acompanhe e sente-se no banco do passageiro
de sua viatura, onde ele faz perguntas sobre o seguro do carro.
Zwinck
também pergunta onde ela nasceu, após comentar que ela parece ter "um leve
sotaque". Caroline diz a Zwinck que mora em Utah há 12 anos. O policial
insiste, perguntando onde ela nasceu, e Caroline conta então que é do Brasil.
A
prisão da brasileira ocorre em meio ao endurecimento da política de imigração
nos Estados Unidos que tem marcado o segundo mandato de Donald Trump.
Cerca
de 51 mil imigrantes indocumentados estavam detidos pelo ICE no início de junho
— maior número já registrado desde setembro de 2019.
Inicialmente,
as autoridades americanas insistiam que as operações do ICE eram direcionadas a
criminosos e potenciais ameaças à segurança pública.
Mas um
número significativo de imigrantes detidos pelo governo Trump não tem
antecedentes criminais, como é o caso de Caroline.
¨
'Nunca vi algo tão grave e cruel'
A mais
nova de quatro irmãos, Caroline vive nos Estados Unidos desde os 7 anos.
Ela
estuda na Universidade de Utah com uma bolsa de estudos por mérito concedida
pela TheDream.US, organização sem fins lucrativos dedicada a oferecer bolsas de
estudos para jovens imigrantes.
Segundo reportagem do jornal The Salt Lake
Tribune sobre
o caso, a família da jovem entrou nos Estados Unidos com um visto turístico de
seis meses, mas ficou no país além deste prazo.
Há três
anos, segundo um parente de Caroline que falou ao jornal sob condição de
anonimato, a família entrou com um pedido de asilo e ainda aguardava uma
decisão.
Ao
solicitar o asilo, Caroline e seus pais receberam permissões para trabalhar,
carteiras de habilitação "limitadas" e números de seguridade social
(documento americano equivalente ao CPF no Brasil).
Não
está claro sob quais argumentos a família entrou com o pedido de asilo, mas ao
The Salt Lake Tribune o parente de Caroline disse que a família se mudou para
os Estados Unidos há 12 anos após passar por situações de violência no Brasil,
incluindo assaltos e terem sido feitos reféns por criminosos.
Após a
detenção da estudante, amigas dela organizaram uma coleta de doações para ajudar a
família a arcar com os custos com o advogado e a fiança de Caroline.
A
TheDream.US também lançou um comunicado público sobre o caso e
um abaixo-assinado pela liberdade
de Caroline, que reuniu quase 7 mil assinaturas até esta quarta-feira (18/6).
"Eu
trabalho com o tema de imigração há duas décadas e vi repetidamente a
criminalização de migrantes e imigrantes, mas nunca vi algo tão grave e cruel
como estou vendo nesta administração", disse Gaby Pacheco, CEO da
TheDream.US, em entrevista à BBC News Brasil no sábado (14/6).
¨
Suprema Corte dos EUA se recusa a acelerar contestação às
tarifas de Trump
A Suprema Corte dos EUA se recusou na
sexta-feira a acelerar sua análise sobre se deve ou não contestar as tarifas abrangentes de Donald Trump
, mesmo antes que os tribunais inferiores decidam sobre a disputa.
A
Suprema Corte negou um pedido de uma empresa familiar de brinquedos, a Learning
Resources, que entrou com uma ação judicial contra as tarifas de Trump para agilizar a
revisão da disputa pelo principal órgão judicial do país.
A
empresa, que fabrica brinquedos educativos, obteve uma decisão judicial em 29
de maio, determinando que Trump não pode impor tarifas unilateralmente,
utilizando a autoridade legal de emergência que ele havia citado para elas.
Essa decisão está atualmente suspensa, mantendo as tarifas em vigor por
enquanto.
A
Learning Resources solicitou à Suprema Corte que tomasse a rara medida de ouvir
o caso imediatamente para decidir a legalidade das tarifas, efetivamente
ultrapassando o tribunal de apelações dos EUA para o circuito do Distrito de
Columbia, em Washington, onde o caso está pendente.
Dois
tribunais distritais decidiram que as tarifas de Trump não se justificam pela
lei que ele citou para elas, a Lei de Poderes Econômicos de Emergência
Internacional. Ambos os casos estão em fase de apelação. Nenhum tribunal ainda
apoiou a ampla autoridade tarifária de emergência reivindicada por Trump.
Fonte:
BBC News Brasil/The Guradian

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