O que a
ciência diz sobre tratamentos e produtos que prometem combater celulite
Cerca
de 90% das mulheres têm celulite. Mas ainda não conseguimos representá-la como
uma característica anatômica normal na cultura popular.
No
filme de sucesso de Greta Gerwig, por exemplo, a Barbie Estereotipada
interpretada por Margot Robbie desenvolve ondulações na parte superior da coxa, dentro da sua crise existencial
– além de outros defeitos humanos, como mau hálito, pé chato e irreprimíveis
pensamentos de morte.
Quando
a Barbie Estereotipada pergunta à sábia boneca Barbie Estranha o que são
aquelas ondulações, ela explica: "É celulite. E vai se espalhar
por tudo. Você vai começar a ficar sentimental, chorosa e complicada."
Foi
assim que a suave perfeição plástica de Barbie ficou comprometida.
Apesar
da sua frequente ocorrência, a celulite é considerada um defeito que precisa de
correção. E parece que as consumidoras concordam, principalmente quando recebem
uma enxurrada de imagens de pele suavizada por
Photoshop – de modelos, influenciadoras e estrelas de Hollywood.
A
celulite normalmente ocorre em áreas com maior quantidade de gordura
subcutânea. Seus depósitos atravessam o tecido conectivo embaixo da pele,
gerando a aparência de caroços. Ela é comum, normalmente indolor e inofensiva.
A
pele humana é o maior órgão do corpo humano. Ela é composta de três camadas.
Na
superfície, a epiderme age como nossa primeira linha de defesa contra o
ambiente. Esta camada impermeável mais externa é composta de células que são
constantemente renovadas e eliminadas, protegendo nosso corpo contra os
elementos externos.
Abaixo
da epiderme, fica a derme, uma camada resistente que contém fibroblastos – as
células responsáveis pela produção de proteínas essenciais, como colágeno e
elastina. Estas proteínas fornecem estrutura e elasticidade, colaborando para a
resistência e flexibilidade da pele.
Ainda
mais profunda é a hipoderme, também conhecida como camada subcutânea. Esta
camada é rica em tecido adiposo, que é composto principalmente de gordura e
desempenha um papel fundamental no amortecimento e isolamento do corpo. Ela
também armazena gordura que pode ser usada quando necessário.
Abaixo
dessas três camadas de pele, existem os músculos. Dos músculos até a derme,
correm faixas de tecido conectivo, que retêm o tecido adiposo em
"bolsas".
A
celulite não prejudica a saúde. Mas algumas pessoas afirmam que ela afeta sua
autoestima e imagem do corpo.
Isso
tem muito a ver com a pressão social imposta sobre as mulheres, para que elas
sejam fisicamente perfeitas – ou para que gastem dinheiro, tempo e energia,
tentando atingir a máxima perfeição possível.
Por
isso, a celulite se tornou um grande negócio para a indústria da beleza.
Especialmente
no período que antecede o verão, as empresas promovem todo tipo de produtos, de
cremes e soros até artefatos e pílulas, voltados à criação de membros
suavemente perfeitos.
A
pergunta mais comum parece ser: "Estes tratamentos funcionam?"
Mas,
como anatomista, acho que a questão mais importante é: "Por que os corpos
de mulheres saudáveis devem ser considerados algo que precisa ser tratado,
curado ou corrigido?"
A
indústria da beleza e do bem-estar capitalizou, há muito tempo, os padrões
sociais de beleza.
A
ideia de que a celulite é algo indesejável e deve ser corrigida foi perpetuada
desde que a revista Vogue se tornou a primeira revista em língua inglesa a usar
o termo "celulite", apresentando o conceito para milhares de
mulheres.
Esta
estratégia de marketing se baseia na insegurança dos consumidores,
particularmente das mulheres, e promove a infinita busca da
"perfeição" de corpos que possuem variações anatômicas normais.
Ao
definir a celulite como uma condição que precisa de tratamento, as empresas
podem vender uma ampla variedade de produtos e serviços. Eles são reforçados
pelo apoio de celebridades, que emprestam sua credibilidade e valor
aspiracional a produtos pseudomedicinais "suavizantes".
Mas
as evidências científicas que sustentam a eficácia desses suplementos no
tratamento da celulite são limitadas.
Na
verdade, o primeiro estudo científico sobre a celulite foi publicado em 1978 e
se referia a ela como "a chamada celulite: a doença inventada".
Os
produtos mais recentes incluem o Lemme Smooth, o último lançamento da linha de
vitaminas e suplementos da atriz e empresária Kourtney Kardashian Barker.
Os
materiais promocionais do produto afirmam que as cápsulas "reduzem
visivelmente a celulite em 28 dias". Mas o que nos diz a ciência a
respeito?
Suplementos
como o Lemme Smooth afirmam melhorar a textura da pele e reduzir a celulite de
dentro para fora. Especificamente, o suplemento de Kardashian Barker contém uma
mistura de melão cantaloupe francês, ácido hialurônico, vitamina C e cromo,
entre outros ingredientes.
A
capacidade do corpo de absorver e utilizar estes ingredientes de forma que
afete a celulite ainda é objeto de debate.
Existem
evidências de que o ácido hialurônico ingerido pode migrar para a pele,
estimulando a produção de colágenos no interior da derme. E se demonstrou que a
vitamina C causa espessamento da camada superficial da pele.
Mas
a falta de padronização dos testes de uso desses ingredientes no tratamento da
celulite significa que ainda não se sabe ao certo se eles irão trazer efeitos
significativos.
Outros
produtos comercializados para reduzir o surgimento da celulite incluem loções e
cremes tópicos, que contêm ingredientes como cafeína, retinol e extratos de
ervas. Mas os produtos cosméticos não conseguem penetrar o suficiente na
epiderme para causar efeitos significativos sobre os depósitos de gordura e
tecidos conectivos subjacentes.
Alguns
tratamentos invasivos, como terapia a laser, subcisão e terapia com ondas
acústicas, podem oferecer resultados mais promissores.
Estes
procedimentos decompõem as faixas de tecido conectivo que causam o inchaço e
estimulam a produção de colágeno na derme, para aumentar a elasticidade da
pele. São métodos que podem ser mais eficazes, mas costumam ser mais caros,
exigem diversas sessões para atingir os resultados e não estão livres de
riscos.
Manter
uma alimentação saudável, beber muita água e praticar atividade física
regularmente pode ajudar a melhorar a aparência geral da pele e reduzir a
visibilidade da celulite.
Perder
peso e fortalecer os músculos das pernas, nádegas e abdômen pode tornar a
celulite menos visível, mas não irá fazer com que ela desapareça totalmente.
O
principal é que a celulite não precisa ser tratada. É uma variação anatômica
normal que foi transformada em uma condição para gerar um mercado lucrativo de
curas que não existem.
Meu
conselho de especialista para o verão? Cuidado com o que dizem as empresas de
cosméticos e economize seu dinheiro.
Fonte:
Por Rebecca Shepherd, para The Conversation
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