Os
possíveis efeitos de decisão do STF sobre porte de maconha
A
decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) de fixar parâmetros que diferenciem o
usuário do traficante de maconha pode ter impacto de reduzir a quantidade de
pessoal presas por tráfico, dizem os defensores da medida.
No
entanto, não haverá soltura automática de presos, já que as pessoas presas que
possam ser beneficiadas pela nova decisão terão que apresentar um recurso à
Justiça pedindo sua liberdade, explicou à BBC News Brasil a
subprocuradora-geral da República Luiza Frischeisen.
Em
julgamento encerrado nesta quarta-feira (26/6), a maioria da Corte decidiu
descriminalizar o porte de maconha para consumo.
Com
a decisão, portar a droga passa a ser um ilícito administrativo e o usuário não
poderá mais ser submetido a um processo penal, nem terá um registro na sua
ficha criminal. Também não haverá mais a possibilidade de ser submetido à pena
de prestação de serviços à comunidade.
Por
outro lado, o STF manteve a possibilidade de aplicação de medidas educativas,
como o comparecimento a um curso preventivo sobre consumo de drogas. Além
disso, a polícia deverá apreender a droga.
O
julgamento não tratou da venda de drogas, que continua sendo ilegal no país.
Mas o STF decidiu estabelecer parâmetros para diferenciar usuários e
traficantes, com objetivo de padronizar a atuação das polícias no país e evitar
que pessoas com a mesma quantidade de drogas sejam tratadas de forma diferente.
A
Corte estabeleceu que, até que o Congresso aprove uma lei sobre o tema, o
parâmetro para diferenciar uso pessoal de tráfico será a quantidade de 40
gramas de cannabis sativa ou a posse de seis plantas fêmeas.
Isso
significa que uma pessoa identificada pela polícia portando até 40 gramas de
droga não poderá ser enquadrada como traficante, a não ser que existam outros
elementos além da presença da droga que apontem para esse crime, como posse de
arma, caderno com anotações sobre vendas ou balança para pesar a substância.
Defensores
da medida, como a associação que representa os peritos da Polícia Federal
(APCF) e integrantes da Procuradoria-Geral da República, afirmam que a falta de
parâmetros objetivos para que policiais, promotores e juízes diferenciem o
consumo da venda faz com que muitas pessoas detidas no país com pequenas
quantidades de maconha, por exemplo, acabem presas por tráfico, mesmo quando
não há outros elementos que apontem para esse crime.
Estatísticas
citadas pelos ministros no julgamento mostram que o problema afeta
principalmente pessoas negras e pobres.
"Na
falta de critério, a mesma quantidade de drogas nos bairros mais elegantes das
cidades brasileiras é tratada como consumo e, na periferia, é tratada como
tráfico. O que nós queremos é acabar com essa discriminação entre ricos e
pobres, basicamente entre brancos e negros", disse Barroso.
Os
ministros ressaltaram, porém, que os parâmetros adotados servirão como uma
referência básica, podendo o juiz considerar o indivíduo como usuário, mesmo
que esteja com quantidade maior, ou ainda enquadrá-lo como traficante, mesmo
que tenha quantidade menor.
• 'Não haverá soltura automática de
presos'
Há
mais de 180 mil pessoas presas hoje no país por tráfico de drogas. A decisão do
STF pode beneficiar pessoas que foram detidas com até 40 gramas de maconha, sem
outras provas do crime de tráfico.
No
entanto, não deve ocorrer uma liberação automática de presos, explicou a
subprocuradora-geral da República Luiza Frischeisen à BBC News Brasil, em
entrevista em 2023, quando a Corte já analisava o caso
Cada
pessoa detida pelo crime de tráfico de drogas e potencialmente impactada pelo
julgamento, ressalta, terá que apresentar um recurso à Justiça solicitando a
revisão de sua pena.
"O
que vai acontecer [após a decisão do STF] é que, nos casos em que houver
pequena quantidade [de droga apreendida], as defesas vão arguir que aquilo não
seria crime. E isso vai ser analisado caso a caso. Então, será um impacto de
médio prazo", afirmou.
"O
efeito mais imediato é que pessoas com pequenas quantidades não seriam mais
presas e processadas, se não estiverem presentes outros elementos que denotem
tráfico, como por exemplo, anotações de contabilidade [da venda de drogas], a
balança [usada para pesar a droga vendida], o dinheiro, a arma, a
munição", acrescentou, na ocasião.
A
fixação de parâmetros é apoiada também pela associação que representa os
peritos da Polícia Federal (APCF).
Segundo
Davi Ory, advogado que representa a associação, a APCF avalia que "o
principal fator para o aumento do encarceramento foi a adoção de critérios
subjetivos demasiadamente amplos e que transferiram à estrutura do Poder
Judiciário o ônus de definição de quem seria usuário e traficante tendo por
base 'as circunstâncias sociais e pessoais', bem como o ‘local e condições em
que se desenvolveu a ação'".
Isso,
ressalta, estaria gerando prisões indevidas, principalmente, de pessoas negras
e pobres.
Já
o advogado Cid Vieira, que representa a Federação Amor Exigente no julgamento
do STF, questiona o impacto do julgamento na redução dos presos.
A
organização, que atua como apoio e orientação aos familiares de dependentes
químicos, foi uma das instituições aceitas pelo Supremo para atuar no
julgamento como amicus curiae (colaborador da Justiça que detém algum interesse
social no caso, mas não está vinculado diretamente ao resultado).
"Eu
não tenho notícia que dependente químico esteja preso. O artigo 28 da atual
legislação de drogas não prevê a prisão daqueles que sejam surpreendidos com
posse de droga para consumo pessoal. É uma colocação que não existe. Não é sob
esse aspecto que as prisões vão estar mais lotadas ou não", afirmou
Vieira, que conversou em 2023 sobre esse tema com a BBC News Brasil.
• Presos por tráfico são quase um terço
da população carcerária
Estudos
indicam, no entanto, que a atual Lei de Drogas, sancionada em 2006 pelo
presidente Luiz Inácio Lula da Silva, contribuiu para o aumento do número de
pessoas presas por crimes relacionados ao tráfico de drogas.
Essa
lei acabou com a pena de prisão para usuários e aumentou a punição para
traficantes. A expectativa era que isso reduziria o número de prisões, mas o
efeito foi o oposto, afirma o advogado Pierpaolo Bottini, que era secretário de
Reforma do Judiciário do Ministério da Justiça naquela época.
"A
impressão que se tinha é que isso ia desencarcerar, porque as pessoas que
estavam presas por uso iam sair [da prisão]. Mas acabou aumentando o
encarceramento porque justamente as autoridades policiais acabaram jogando tudo
para o tráfico, então acabou tendo efeito absolutamente inverso", disse em
entrevista à BBC News Brasil em maio de 2023.
Segundo
dados da Secretaria Nacional de Políticas Penais, órgão do Ministério da
Justiça e Segurança Pública, quase um terço da população carcerária no país
está preso por crimes previstos na Lei de Drogas.
No
caso das prisões estaduais, por exemplo, onde havia um total de 644.316 pessoas
detidas provisoriamente ou condenadas no segundo semestre de 2023 (dado mais
recente), 199.731 estavam presas por esse tipo de delito, 31% do total.
Um
estudo de 2023 do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), que analisou
uma amostra dos processos julgados na primeira instância judicial de todo o
país no primeiro semestre de 2019, estimou que 58,7% dos réus que respondiam
por tráfico de maconha portavam até 150 gramas. E apenas 11,1% levavam mais de
dois quilos da droga.
Uma
análise semelhante dos réus em processos por tráfico de cocaína identificou que
62,3% dos processos se referem a 100 gramas ou menos, enquanto 6,8% dos casos
tratavam de apreensões de mais de um quilo.
• Limite de 40g poderia impactar 33%
dos condenados por tráfico de maconha
Esse
mesmo estudo estimou quantas pessoas condenadas por tráfico de maconha poderiam
ter sua pena revista caso fossem fixadas quantidades máximas de porte para
consumo dessas drogas.
Foram
analisados processos de 5.121 réus por tráfico de drogas julgados na primeira
instância judicial no primeiro semestre de 2019, uma amostra representativa do
total de pessoas presas por esse crime no país.
A
conclusão do estudo do Ipea foi que, com o parâmetro de 40 gramas, 33% dos
condenados por tráfico de maconha podem ter sua pena revista.
Os
cenários testados pelo Ipea levaram em conta parâmetros propostos em uma nota
técnica do Instituto Igarapé, de 2015, que analisou pesquisas sobre uso de
drogas no Brasil e experiências internacionais de fixação de quantidades para
diferenciar tráfico e consumo.
No
caso da cocaína, 31% dos condenados por tráficos poderiam ter sua pena revista
caso o STF fixasse um parâmetro de 10 gramas para consumo – o que não ocorreu
neste julgamento.
"Os
cenários acima constituem um exercício interpretativo para projetar o alcance
de referidos parâmetros exclusivamente aplicados à quantidade de drogas, mas
somente a análise dos casos concretos permitiria a reclassificação da conduta
como consumo pessoal", ressalta o estudo.
As
conclusões desse estudo, no entanto, não permitem calcular o potencial de
presos que poderiam ser soltos caso o STF adote parâmetros para diferenciar
tráfico e consumo, pois nem todos os réus processados por tráfico de drogas são
condenados a regime fechado ou semiaberto, explicou a BBC News Brasil a
coordenadora da pesquisa, Milena Karla Soares.
Soares
ressalta que um elemento que dificulta essas análises é a falta de padronização
do registro das quantidades apreendidas nos processos criminais.
Para
identificar as quantidades apreendida com cada réu, a equipe do Ipea pesquisou
diversos documentos processuais, como laudos periciais, denúncias do Ministério
Pública e as sentenças dos juízes. Foi selecionada, então, "a melhor
informação disponível" nesses vários documentos, em cada caso, para
realizar o estudo.
Por
isso, uma das recomendações da pesquisa é "o estabelecimento de um
protocolo nacional para padronização das informações de natureza e de
quantidade de drogas nos processos criminais".
• Entenda melhor o que foi julgado
O
julgamento do STF analisou um recurso extraordinário com repercussão geral. Ou
seja, a decisão tomada pelos ministros vale pra todos os casos judiciais
semelhantes.
A
discussão girava em torno do artigo 28 da Lei de Drogas, que prevê que é crime
adquirir, cultivar, guardar ou transportar droga para consumo pessoal.
O
recurso foi movido pela Defensoria Pública de São Paulo em favor de um réu
flagrado com três gramas de maconha na prisão e condenado a prestar serviços
comunitários.
A
Defensoria argumentava que a lei fere o direito à liberdade, à privacidade, e à
autolesão (direito do indivíduo de tomar atitudes que prejudiquem apenas a si
mesmo), garantidos pela Constituição Federal.
Alguns
ministros como Gilmar Mendes e Toffoli chegaram a defender a descriminalização
do porte para consumo de todo tipo de droga, mas a maioria dos ministros
preferiu restringir a decisão à maconha, que era o caso concreto em julgamento.
• Os planos do Congresso para anular
decisão do STF na descriminalização da maconha
A
decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) de descriminalizar o porte de maconha
para uso pessoal foi sucedida por fortes reações no Congresso Nacional —
formado, atualmente, por uma maioria conservadora.
A
mobilização em reação ao julgamento do Supremo já vinha ocorrendo desde março,
quando o caso foi retomado pela Corte.
Poucas
horas após os ministros da Corte formarem maioria pela descriminalização, o
presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), anunciou a criação de
uma comissão especial para avaliar a Proposta de Emenda à Constituição (PEC)
que criminaliza a posse e o porte de qualquer quantidade de drogas ilícitas no
país.
A
PEC das Drogas, como ficou conhecida a medida, já foi aprovada pelo Senado e
tem no presidente da Casa, o senador Rodrigo Pacheco (PSD-MG) um dos seus
autores.
Logo
após a decisão do STF, Pacheco criticou a descriminalização ao afirmar que a
Corte estaria invadindo uma competência do Legislativo, e foi rebatido pelo
ministro Gilmar Mendes, que afirmou que o Supremo estava cumprindo seu papel de
julgar a constitucionalidade de um artigo da Lei de Drogas, que criminaliza o
porte de drogas.
A
criação da comissão especial na Câmara é a próxima etapa da tramitação da PEC
das Drogas. Caso seja aprovada na comissão, vai à votação no plenário.
Se
o texto aprovado na Câmara for o mesmo já votado pelo Senado, a PEC entra em
vigor — por ser uma emenda constitucional, ela não precisa passar pela sanção
presidencial como outros projetos de lei.
Apesar
de Lira e alguns dos apoiadores da PEC das Drogas negarem que a criação da
comissão especial na Câmara seja uma "reação" ao julgamento do STF,
parlamentares contrários à proposta, juristas e cientistas políticos ouvidos
pela BBC News Brasil avaliam que a comissão é, sim, uma resposta do Congresso
ao STF, que acontece em meio a embates recentes entre o Legislativo e o
Judiciário.
Especialistas
avaliam, no entanto, que ainda que o Congresso aprove uma PEC em direção
contrária ao julgamento do Supremo, no final, a palavra final sobre o assunto
continuará sendo do STF.
• Reação esperada
Para
Marco Antonio Teixeira, professor de ciência política da Fundação Getulio
Vargas (FGV), a criação da comissão especial sobre a PEC das Drogas foi uma
"reação esperada" do Congresso ao julgamento do STF.
"Há
algum tempo, o Congresso tem deixado de legislar [sobre determinados assuntos]
e, ao fazer isso, abre lacunas a serem preenchidas pelo Supremo", diz
Teixeira.
"Quando
o Legislativo deixa de debater e decidir sobre os temas relevantes da
sociedade, o Supremo acaba sendo chamado a decidir. Não adianta reclamar
depois."
O
deputado federal Nilto Tatto (PT-SP) também vê o movimento de Lira como uma
ação reativa ao Supremo.
"Lira
está reagindo assim como o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, reagiu em
março, colocando o assunto na pauta do Parlamento", afirma o deputado à
BBC News Brasil.
Pacheco
colocou a PEC das Drogas em votação no Senado em março, e a proposta obteve
ampla maioria na Casa e, depois, foi encaminhada à Câmara.
Apesar
de o anúncio da criação da comissão especial sobre a PEC das Drogas ter
ocorrido logo após a formação de maioria no STF sobre o tema, Lira negou, na
terça-feira (25/6), que a decisão de criá-la tenha sido uma retaliação.
"Ela
nem será apressada e nem será retardada porque haverá um trâmite normal para
que o Parlamento possa se pronunciar sobre este assunto", disse o deputado
a jornalistas.
A
posição de Lira é semelhante à do presidente da Frente Parlamentar Evangélica,
o deputado federal Silas Câmara (Republicanos-AM).
"Não
é reação. Ela vai ter a tramitação adequada a um tema dessa complexidade. A
decisão pela criação da comissão já estava tomada. É que nós não convocamos
entrevistas coletivas para anunciar todas as etapas de tudo o que
fazemos", afirma o parlamentar à BBC News Brasil.
Apesar
de afirmar que a criação da comissão não é necessariamente uma reação ao
Supremo, o deputado criticou a decisão da Corte sobre a descriminalização do
porte para uso pessoal da maconha.
"Esse
movimento do STF é uma intromissão nas atribuições do Poder Legislativo. O STF
constitucionalizou um assunto que não era constitucional e por isso o Congresso
está fazendo uma emenda", diz.
Questionado
sobre a decisão do STF, Arthur Lira evitou se contrapor diretamente à Corte.
"Não
faz parte da minha obrigação e função comentar decisões do STF", disse o
parlamentar.
Tanto
Lira quanto Câmara avaliam que, independente da velocidade com a qual a PEC
será votada, haverá maioria para aprová-la.
"O
que existe é uma maioria que hoje se coloca razoavelmente favorável ao texto da
PEC. Mas isso a gente só vai ver quando e se a PEC estiver pronta para ir ao
plenário", afirmou Lira.
• 'Tiro pela culatra'
Para
o deputado petista Nilto Tatto, o Supremo errou ao julgar a descriminalização
do porte para uso pessoal de maconha neste semestre.
"Foi
um erro. Não era para ter colocado isso em votação agora, às vésperas de uma
eleição municipal. Isso dará ainda mais combustível para a maioria conservadora
aprovar uma PEC em sentido contrário, pois vão usar isso como argumento
eleitoral na disputa deste ano. A direita conservadora vai ter um palanque
muito visível", afirma.
Em
outubro deste ano, o Brasil vai realizar eleições municipais.
Tatto
afirma temer que, com a atual configuração política do Congresso, uma PEC
criminalizando o porte e a posse de qualquer tipo ou quantidade de drogas terá
muitas chances de ser aprovada.
"Acho
que esse julgamento do STF pode ser um tiro pela culatra. Pode ser que valha
por algum tempo, mas o Congresso hoje tem maioria para aprovar uma PEC em
sentido contrário", diz.
Marco
Antonio Teixeira, da FGV, avalia de forma diferente.
Ele
diz não acreditar que haja ânimo na Câmara dos Deputados para votar uma PEC
sobre este assunto às vésperas das eleições municipais.
"As
eleições para as prefeituras do Brasil, historicamente, não giram em torno de
temas nacionais como este. Normalmente, as questões que mobilizam o eleitor são
mais locais e regionalizadas", diz.
Para
Tatto, o destino da PEC das Drogas deverá diferente do projeto de lei que
imputava penas a mulheres que se submetiam ao aborto superiores à dos
estupradores.
A
Câmara dos Deputados chegou a aprovar um pedido para que o projeto fosse votado
em regime de urgência, mas acabou perdendo tração no Parlamento após uma ampla
reação popular contra a matéria.
"Os
assuntos são diferentes. No PL do estupro, a situação era diferente. Previa-se
uma punição absurda para mulheres vítimas de estupro. No caso da PEC das
Drogas, a situação é diferente. Acho que o consenso sobre os dois assuntos na
sociedade é distinto", diz o parlamentar.
• Congresso pode reverter decisão do
STF?
Embora
o Congresso possa alterar a Constituição com uma PEC, mesmo uma emenda
constitucional pode ser questionada e eventualmente considerada
inconstitucional pelo STF.
Isso
porque a Constituição tem as chamadas cláusulas pétreas, pontos centrais que
não podem ser alterados nem por emendas constitucionais. O Supremo pode decidir
que uma PEC é inconstitucional se considerar que ela visa alterar um desses
pontos.
"O
Direito não aceita tudo. Há princípios que nem emendas podem mudar na
Constituição", diz Belisário dos Santos Junior, especialista em Direito
Público e ex-secretário de Justiça de São Paulo. "Então, se aprovada, essa
PEC não garante o fim da discussão."
"Para
que uma PEC seja considerada inconstitucional, é necessário que ela viole de
forma clara e direta um ou mais dispositivos da Constituição Federal",
Beatriz Alaia Colin, especialista em direito penal.
São
cláusulas pétreas, por exemplo, os direitos e garantias individuais tratados no
artigo 5º da Constituição.
Na
decisão desta semana, o STF determinou que criminalizar o usuário de maconha é
inconstitucional com base em uma "interpretação mais abrangente e
sistemática de diversos princípios e artigos constitucionais", explica
Colin, advogada do escritório Wilton Gomes.
Um
dos artigos considerados, explica Colin, é justamente o 5º, especialmente nos
incisos 10 — que garante o direito à intimidade e à vida privada, protegendo a
autonomia individual sobre o próprio corpo e as escolhas pessoais — e 12 — que
assegura o princípio da proporcionalidade, exigindo que as medidas estatais
sejam adequadas, necessárias e mínimas para alcançar seus objetivos.
Mas
isso não significa necessariamente que a questão envolvendo a criminalização do
usuário seja uma cláusula pétrea — isso também dependeria de uma deliberação da
Corte caso alguém questionasse a PEC.
"A
constitucionalidade da PEC poderia ser questionada por meio de uma Ação Direta
de Inconstitucionalidade (ADI)", explica Colin, com o argumento de que a
emenda "viola os mesmos princípios e dispositivos constitucionais que
fundamentam a decisão do STF sobre a descriminalização".
Ou
seja, caso uma nova ação no STF questione a validade da PEC, os efeitos da
emenda dos deputados ficariam suspensos até o julgamento final do Supremo sobre
ela, explica Colin.
Mesmo
com a aprovação da PEC, a palavra final sobre o tema ainda será do Supremo,
pois é a corte que tem o poder de decidir sobre a interpretação da
Constituição.
Fonte:
BBC News Brasil
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