Enxaqueca
é uma das doenças mais incapacitantes do mundo, dizem especialistas
Ter
dor de cabeça é algo corriqueiro – estima-se que 95% das pessoas vão ter ao
menos um episódio ao longo da vida. Estresse, maus hábitos alimentares,
preocupações e às vezes até mesmo a falta de uso de óculos podem provocar a
dor. Mas ela também pode estar relacionada a diversos problemas de saúde mais
sérios. Segundo a Organização Mundial da Saúde, aproximadamente 40% da
população mundial, sofre de distúrbios envolvendo dores de cabeça frequentes,
dentre as quais, a enxaqueca é a mais comum.
Considerada
uma doença neurológica crônica, ela é também uma das mais incapacitantes,
especialmente em adultos com menos de 50 anos. Estima-se que, só no Brasil, as
perdas com produtividade por causa da enxaqueca esteja em torno
de 67 bilhões de reais por ano. O CNN Sinais Vitais – Dr. Kalil
Entrevista desta semana recebeu a neurologista Simone Amorim, do Hospital
das Clínicas de São Paulo, e a neuropediatra Thaís Villa, para falar sobre esse
tema, com dr. Roberto Kalil.
“A
enxaqueca é um tipo muito específico de dor de cabeça, em que a dor é um dos
sinais. Ele tem vários outros sintomas associados à dor. A dor é o ápice”,
explica Simone Amorim. Segundo ela, a crise de enxaqueca é dividida em fases.
“Tem
a fase pré-dor, que é aquela fase em que o paciente se sente cansado,
sonolento, fadigado, associado a sintomas gastrointestinais, irritabilidade.
Então, tem muita gente que nem associa esses sintomas que acontecem um dia, às
vezes horas antes, de uma crise, à dor que ela vai ter daqui a pouco”.
Segundo
Simone, o paciente passa pela crise em si e, por fim, o pós-crise, quando há
uma espécie de exaustão cerebral. “É como se aquele cérebro tivesse trabalhado
demais, foi superexcitado, e aí ele entra nessa exaustão, também com
sonolência, com fadiga, essa ressaca mesmo”.
·
Quanto tempo pode durar uma crise
enxaqueca?
A
neuropediatra Thaís Villa explica que, se contarmos que uma dor de cabeça, na
enxaqueca, por durar até três dias, se incluirmos o antes e o depois, às vezes
o paciente pode ficar uma semana comprometido com uma única crise.
Hoje,
segundo os dados disponíveis, a prevalência da enxaqueca na população
brasileira é considerada alta — cerca de 15%, equivalente a mais de 30 milhões
de pessoas. Segundo as neurologistas, há um componente hereditário importante,
mas mais relevante que isso é aprender a detectar os sinais da doença, não
necessariamente ligados à dor de cabeça.
“A
mulher sofre muito mais com a dor de cabeça do que o homem, porque o hormônio
estrogênio é um facilitador importante de dor. Como ela faz os picos típicos,
as crises extremamente debilitantes, ela acaba sendo mais diagnosticada. No
homem, o problema é o diagnóstico. Porque como ele tem muito menos dor que a
mulher, acaba sendo menos diagnosticado”.
Crianças,
que também tem muito menos episódios envolvendo dor, podem acabar, também,
tendo diagnósticos errados.
“Muitas
vezes, a criança tem náusea, muito vômito, quando ela vai viajar, vai andar de
carro de ônibus, ela vomita muito. Às vezes um cheiro incomoda. E pode ser
também muito disfuncional. É aquela criança que a mãe é chamada na escola para
ir buscar, essa criança precisa ficar lá isolada, porque a luz atrapalha, o
barulho atrapalha”, diz Simone.
Thaís
também alerta para a importância de olhar os outros sintomas. “Porque a criança
abre o quadro de enxaqueca com distúrbio de sono, muito bruxismo – é um sintoma
muito frequente na infância – e déficit de atenção na escola. E aí vem a
cilada. Ela tem isso tudo e ela não tem crise de dor. E aí vêm os diagnósticos
errôneos: TDAH, distúrbios do sono, transtorno de aprendizado. E, na verdade, a
enxaqueca é a doença que está por trás de tudo isso”, afirma.
Segundo
as neurologistas, o tratamento para enxaqueca precisa passar por um treinamento
do paciente. “Ele tem que entender que precisa de um tratamento para blindar o
cérebro”, diz Thaís.
·
Analgésicos e alimentos com cafeína e
chocolate podem piorar enxaqueca
E o
uso de medicamentos analgésicos e o consumo de alimentos com substâncias
estimulantes, como cafeína e chocolate, podem piorar o quadro. “Se você pensar
que nós estamos falando de uma doença em que o cérebro está muito excitado,
você colocar um estimulante, é colocar gasolina na fogueira da doença”.
Juntando
isso ao uso de analgésicos comuns, que muitas vezes têm cafeína, inclusive, na
composição, o que se cria é uma relação de dependência do cérebro com a
dopamina que essas substâncias produzem no organismo, segundo as médicas. Esse
círculo vicioso traz muito sofrimento ao cérebro no longo prazo, segundo Thaís.
“Já
tem estudos mostrando que há perda neuronal, que lá na frente há maior risco
para demência. Um cérebro em sofrimento vai precipitar várias complicações.
Inclusive quadros demenciais, risco para Parkinson, entre outros”.
Por
isso, Simone e Thaís defendem um tratamento com opções não medicamentosas, para
que o paciente possa fazer uso de remédio apenas de maneira pontual e com
substâncias específicas para o tratamento de enxaqueca, e não de dor de cabeça.
Elas ainda explicaram o uso da toxina botulínica, o botox, para controle em que
tem crise mais de 15 dias em um mês.
“É
uma jornada muito dura. O paciente pode levar a vida inteira para ter um mínimo
controle disso. Se fosse só a dor, como dizem meus pacientes… mas é distúrbio
de sono, problema de humor, déficit cognitivo muito severo, déficit de atenção,
memória, tontura”, afirma Thaís.
“Não
é só dor de cabeça, não adianta ficar tomando analgésico e cafeína, tem que
entender que é uma doença, e tem controle desta doença. E a gente tem hoje um
cenário de tratamento impensável há 10, 15 anos. Então ninguém hoje precisa
mais sofrer com a doença. Precisa tratar”, reforça Simone.
¨
Quando a dor de cabeça
pode ser algo mais sério? Veja sinais de alarme
A dor
de cabeça, ou cefaleia, é um sintoma comum de diversas condições de saúde.
Segundo especialistas ouvidos pela CNN, cerca de 96% da população mundial
vai ter o sintoma alguma vez na vida. Muitas vezes, a dor pode ser resolvida
com analgésicos. Porém, em certos casos, o sintoma pode ser um indicativo de algo
mais grave e requer tratamento adequado.
“A
prevalência da cefaleia é alta na população em geral e as condições que
causam dor de cabeça são
muito comuns. Assim, é esperado que uma parcela da população apresente de forma
esporádica esse sintoma”, explica Cesar Castello Branco Lopes, neurologista do
Hospital Nove de Julho, à CNN.
No
entanto, é importante não negligenciar essa dor, nem normalizá-la. De acordo
com o especialista, toda dor que gera impacto na qualidade de vida de uma
pessoa deve ser investigada e tratada adequadamente.
“Considerar
essas dores como normais pode impedir o tratamento adequado e precoce das
cefaleias. Infelizmente, a demora na procura de profissionais capacitados ainda
é muito comum e ocorre quando a dor de cabeça, que antes era considerada
normal, passa a atrapalhar e impactar o dia a dia do indivíduo”, afirma.
·
Principais causas da dor de cabeça
Para
entender quando a dor de cabeça pode ser algo grave, é preciso, antes,
compreender o que pode estar por trás desse sintoma. A cefaleia pode ser
dividida em dois tipos: a primária, que não é causada por uma doença
subjacente, e a secundária, que acontece como decorrência de uma outra
condição de saúde, desde uma infecção viral, até condições mais graves,
como tumores cerebrais.
“Existem
mais de 200 tipos de dor de cabeça, o que é um fato que pouquíssimas pessoas
sabem”, afirma Sophia Costa, chefe da neurologia do pronto-atendimento do
Hospital Alemão Oswaldo Cruz, à CNN.
De
acordo com a especialista, as dores de cabeça primárias estão relacionadas a um
aumento da atividade de sensibilidade dolorosa em estruturas do cérebro. Os
tipos mais comuns de cefaleia primária é a enxaqueca e
a dor de cabeça tensional.
A
enxaqueca é uma doença neurológica crônica caracterizada por episódios
recorrentes de dor de cabeça, que costuma ser unilateral, pulsátil e que piora
com atividades físicas, podendo ser acompanhada de náuseas, vômitos e fotofobia
(sensibilidade à luz). Já a cefaleia tensional é uma “dor em aperto”, nos dois
lados da cabeça, e que não vem acompanhada de outros sintomas.
“No
entanto, mesmo esse tipo de cefaleia pode evoluir com piora caso não seja
identificada e tratada adequadamente”, ressalta Lopes.
·
Quando a dor de cabeça se torna
preocupante?
A
dor de cabeça pode ser um sintoma grave e que merece atenção quando apresenta
alguns sinais específicos, como a mudança de padrão. “É importante que
indivíduos que sofrem com cefaleias primárias conheçam o padrão e frequência
habitual de suas dores. Mudanças nesse padrão devem motivar investigação”,
orienta Lopes.
A piora
progressiva do sintoma também é um sinal de alarme, principalmente quando
a dor não é aliviada com o uso de medicamentos. Dores com início por
posturas específicas, como ficar muito tempo em pé ou após ficar deitado também
devem ser investigadas.
Além
disso, sintomas que ocorrem junto com a dor de cabeça também são alterações que
indicam que a cefaleia pode estar relacionada a uma condição mais grave de
saúde. É o caso de:
- Febre;
- Sonolência;
- Diminuição da força ou sensibilidade da perna ou do braço;
- Crise convulsiva.
“Todas
as dores de cabeça com sinais de alarme devem ser investigadas com exames de
imagem ou, a depender do quadro do paciente, outros exames complementares”,
orienta Costa.
“Existem
diversas condições médicas potencialmente graves que cursam com cefaleia
persistente, como distúrbios da pressão intracraniana, tumores cerebrais,
problemas na vasculatura cerebral, infecções e quadros inflamatórios
cerebrais”, completa Lopes.
·
Dor de cabeça de início súbito também é
sinal de alarme
A
dor de cabeça intensa e de início súbito, ou seja, que começou de forma
repentina, sem nenhuma causa aparente, é um sinal de alarme para uma condição
grave de saúde.
“Esses
quadros levantam suspeita para possibilidade de problemas na vasculatura
cerebral, como rompimento de aneurismas cerebrais ou constrição de artérias
intracraniana”, afirma Lopes.
·
Dor de cabeça pode ser sinal de AVC?
Não
necessariamente. De acordo com a neurologista do Hospital Alemão Oswaldo Cruz,
na maioria das vezes, a dor de cabeça não é um sinal de AVC. Porém, em alguns casos específicos, a
causa do acidente vascular cerebral pode levar à dor de cabeça. “Por exemplo,
existem alguns AVCs que são causados por espasmos nos vasos e isso também causa
dor. Mas não é comum”, explica Costa.
“A
dor de cabeça pode acontecer no AVC do tipo hemorrágico, que são causados por
rompimento de artérias ou aneurismas intracranianos. Essas condições devem ser
suspeitadas em casos de dor de cabeça de início súbito e de forte intensidade e
quando vêm associadas a sintomas neurológicos, como fraqueza muscular, perda de
sensibilidade, dificuldade de visão e para falar, confusão mental, incapacidade
de deambular ou perda de coordenação”, completa Lopes.
·
Como tratar a dor de cabeça corretamente?
Ao
notar qualquer sinal de alarme suspeito na dor de cabeça, é fundamental
procurar um neurologista para investigar a causa. Além disso, o especialista
também deve ser consultado quando a cefaleia passa a afetar a qualidade de vida
e a rotina.
O
tratamento pode variar de acordo com a causa, principalmente na dor de cabeça
secundária. Em situações de cefaleia primária, medidas de autocuidado e
medicamentos analgésicos podem ajudar, como é o caso do paracetamol, ibuprofeno
ou aspirina. (Lembre-se: estes dois últimos medicamentos não são recomendados
em caso de suspeita de dengue).
Fonte:
CNN Brasil
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