terça-feira, 30 de abril de 2024

Por que há historiadores que defendem que o Brasil nunca foi colônia de Portugal?

Bem, porque oficialmente o Brasil nunca o foi, no papel nunca foi apesar de que na prática sim, aqui foi só questão de nomenclatura. Os portugueses nunca usaram o termo "colônia" para se referir aos seus territórios ultramarinos, os "tugas" preferiam outros termos como "estado" e "capitania geral". Por exemplo, o Brasil, Angola e a Índia eram classificados como estados enquanto os Açores eram uma capitania geral. Mais tarde, em 1815, o Brasil foi reclassificado como "reino" figurando agora com o mesmo status que Portugal e Algarves. Da mesma maneira, no Quora em espanhol eu também já vi muito pessoas dizendo que as colônias espanholas na América não eram colônias usando o mesmo argumento, o que os castelhanos nunca usaram o termo "colônias" para referir-se aos seus domínios no Ultramar (que é verdade), preferiam chamá-los "vice-reinos" ou "capitanias gerais".

Cada potência colonial tinha sua própria organização político-administrativa no Além-mar, tinha seus próprios termos para classificar os seus territórios no Ultramar apesar de praticamente não existir diferenças entre as diversas categorias de territórios ultramarinos existentes - por exemplo, na prática não havia diferenças entre um "vice-reino" espanhol, um "estado" português e uma "colônia" inglesa. Hoje em dia nós usamos o termo "colônia" para chamar territórios em outros continentes que foram dominados por potências da Europa porque era assim que os britânicos chamavam a maior parte dos seus territórios ultramarinos. A maior parte dos domínios britânicos no Ultramar eram enquadrados na categoria de "colônia da Coroa" como eram os casos das 13 colônias da Nova Inglaterra, que deram origem aos EUA. Além disso, os ingleses tinham as categorias especiais de "domínio da Coroa" e "protetorado da Coroa".

Os protetorados eram considerados como sendo nações ainda independentes no papel tendo ainda suas próprias autoridades políticas mas com os seus governos na prática dependentes dos britânicos por diversas razões fazendo seus governantes declararem uma espécie de vassalagem aos ingleses, que oficialmente era chamada de "proteção", no papel os ingleses estavam "protegendo" aquele país. Os protetorados ingleses eram aquilo que hoje em dia conhecemos como "estado-fantoche", um país no papel independente mas na prática dependente, submisso a outro país, seu governo é um verdadeiro "pau-mandado" que obedece tudo o que a potência estrangeira o mandar fazer, seja porque tem alguma forma de dependência dela (política, geopolítica, econômica, etc), seja porque mesmo que quisesse tentar não poderia resistir por ser fraca demais militarmente.

O Egito era um exemplo de protetorado britânico já que o seu sultão "aceitou" a "proteção" dos britânicos depois de seu exército ter sido derrotado pelos europeus na batalha de Tel el-Kebir em 1882. O sultão do Egito continuou sendo nominalmente o máximo governante do Egito apesar de na prática ele passar a ser um vassalo e súdito de Sua Majestade Britânica. O "domínio da Coroa" era uma colônia especial a qual foi concedida direitos de maior autonomia política podendo montar o próprio governo ao invés de ter um escolhido pela Inglaterra. Os governos dos domínios não subordinavam-se mais ao primeiro-ministro e parlamento de Londres, agora subordinavam-se apenas ao Rei, embora que apenas simbolicamente visto que o sistema parlamentarista britânico foi replicado nos domínios.

Os domínios eram na prática já países independentes apesar de no papel ainda não. O surgimento da categoria dos domínios da Coroa deu início à criação da atual Commonwealth. A primeira colônia da Coroa a ser elevada ao status de domínio foi o Canadá em 1867. Depois veio a Austrália em 1901, a Nova Zelândia em 1907 e a África do Sul em 1910. O Reino Unido reconheceu a independência da Irlanda em 1922 declarando-a domínio, status que usou até proclamar uma república em 49. Ao conseguirem suas independências da Inglaterra, a Índia, o Paquistão e o Ceilão (atual Sri Lanka) também inicialmente aceitaram o status de domínio da Coroa britânica do qual renunciaram após proclamarem repúblicas para substituir o Rei do Reino Unido como seus chefes de Estado.

 

•        Se não fosse pelos Andes, teriam os brasileiros colonizado quase toda a América do Sul?

 

Não, mesmo que os Andes não existissem havia outros empecilhos para uma conquista brasileira de toda a América do sul. Fora uma ideia aleatória que passou pela cabeça de Dom Pedro I no fim do seu reinado, os brasileiros nunca desenvolveram intenções de expandir mais o seu território com o intuito de conquistar toda a América do sul ou pelo menos alcançar a costa do oceano Pacífico como fizeram os americanos e o seu "Destino Manifesto". Os poucos interesses brasileiros em expandir as fronteiras concentravam-se no sul, onde pretendia-se fixar nossa fronteira no rio da prata e assegurar o acesso BR ao Mato Grosso via rios Paraná e Paraguai.

Há diversas razões para isso. Por exemplo, o Brasil já era muito grande, não precisava de mais terras, as que já tinha já eram suficientes. Além disso, mesmo que o Brasil quisesse avançar mais suas fronteiras não poderia, era algo impraticável para a realidade BR há um século atrás porque a população brasileira era muito pequena no século XIX e início do XX. Hoje, o Brasil tem 203 milhões de pessoas, o que dá uma densidade populacional de 23,86 habitantes por km2 (em Portugal por exemplo a densidade é de 112), mas em 1822 só tinha 4.5 milhões (densidade de 0,53 por km2) e em 1889 14 milhões (1,65/km2) e chegaria aos 40 milhões (4,7/km2) apenas na era Vargas.

O tamanho da população refletia no tamanho das forças armadas. O exército brasileiro em 1824 contava 27 mil soldados (proporção de 1 militar para cada 166 civis), em 1852 eram 35 mil (1 a cada 200), mas a partir daqui o exército começou a diminuir de tamanho ao invés de continuar crescendo e quando aumentava não acompanhava o crescimento da população. Em 1864 (quando começou a guerra do Paraguai), eram 17 mil (1 a cada 553) e em 1889 13 mil (1 a cada 1077). Com a República voltou a crescer chegando aos 50 mil (1 a cada 800) só na era Vargas. Como vê, um exército muito pequeno para pensar em ocupar toda a América do Sul. Hoje o EB tem menos de 220 mil (1 a cada 922).

Assim, o território brasileiro era grande demais para tão pouca gente ocupar. Essas poucas pessoas concentravam-se no litoral enquanto o interior do território brasileiro na época era deserto, quase não morava ninguém e quase não tinha tropas deixando até as fronteiras perigosamente expostas, especialmente as do sul. Essa foi a principal razão do porquê o Brasil ter começado a estimular a imigração de europeus, árabes e orientais pra cá direcionando-os principalmente para o sul e sudeste - na verdade, esse estímulo à imigração começou ainda no período em que D. João esteve no Brasil. A prioridade do Brasil era primeiro ocupar o vasto território que já tinha, depois é que poderia PENSAR em empurrar mais a fronteira para o oeste.

O Brasil mal dava conta do território que já tinha (vide as diversas revoltas regionais como a guerra dos farrapos e a guerra da Cisplatina) por que então ele iria atrás de mais trabalho e problemas pra ele? Basta você ver que durante o reinado de Dom Pedro II o Brasil teve duas oportunidades para reanexar o Uruguai, uma na guerra contra Oribe e Rosas (1851–1852) e a outra na guerra do Uruguai (1864), mas dispensou as duas, derrubou os governos uruguaios em vigor e os substituiu por outros mais alinhados aos interesses brasileiros optando por não reanexar a Banda Oriental mantendo-a como estado tampão e estado fantoche.

Na guerra do Paraguai, teve a oportunidade de dividir o Paraguai com a Argentina mas recusou. Na guerra de 1851–1852, o Brasil também teve a oportunidade de conquistar a nossa arquirrival Argentina mas também dispensou optando por apenas constituir um novo governo argentino mais alinhado aos interesses do Rio de Janeiro em substituição a um outro anti-Brasil.

 

Fonte: Quora

 

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