sábado, 27 de abril de 2024

"Burnon": quando o estresse constante leva à depressão

Ao contrário do que ocorre na síndrome de burnout, ao invés de colapsarem, as pessoas com burnon continuam a correr em suas "rodas de hamster", o que pode causar depressão crônica por exaustão.

Muitas pessoas parecem estar constantemente eletrificadas. Elas são apaixonadas por suas profissões; seus celulares são suas companhias constantes e elas sempre podem ser encontradas, à noite ou nos finais de semana. Elas gostam do trabalho, embora seus afazeres continuem acumulando cada vez mais. De um lado, os prazos; de outro, os problemas. Isso tudo além da família, crianças e amigos: eles querem tratar todos da maneira correta. Apesar desse ritmo frenético, ainda querem praticar esportes e comparecer a eventos.

Mas, permanecer o tempo todo "aceso" pode ser perigoso. O estresse constante, sem pausas reais, pode adoecer as pessoas. Essa sobrecarga crônica é descrita como um termo relativamente novo: burnon.

<<< Diferenças entre burnon e burnout:

O termo burnon foi criado pelos psicólogos Timo Schiele e Bert te Wildt, da clínica psicossomática em Kloster Dießen, próximo a Munique, que oferece tratamento a pacientes com síndrome de burnout.

Os sintomas de burnout incluem exaustão, performance reduzida e cinismo – uma distância mental do trabalho.

No caso do burnon, os sintomas são diferentes, explica Timo Schiele à DW. "Ao contrário, as pessoas afetadas descrevem uma conexão demasiadamente próxima e entusiástica com seu trabalho, às vezes mais como uma super excitação. Isso fez com que surgisse a descrição da síndrome de burnon."

•        Sintomas de burnon

As pessoas afetadas possuem paixão pelo trabalho, mas o estresse constante gera tensões constantes. Muitos sofrem inicialmente de dores no pescoço, nas costas, dores de cabeça e bruxismo (ato de ranger os dentes).

A vida exaustiva em suas rodas de hamster os leva ao desespero. Eles perdem a esperança de melhorar suas condições, não conseguem mais se sentir felizes e questionam o sentido das coisas.

"Além das comorbidades psicológicas e doenças secundárias, como depressão, ansiedade ou vícios, também acreditamos que os afetados podem sofrer cada vez mais de fenômenos psicossomáticos, como pressão alta, e suas possíveis consequências", diz, Schiele. A pressão sanguínea alta aumenta significativamente o risco de ataques cardíacos e derrames.

•        Causas mais comuns de burnon

Nossas vidas cotidianas estão cada vez mais frenéticas. O sucesso profissional e o reconhecimento social têm importância central. A competição intensa, as crises econômicas e os preços altos podem aumentar o estresse.

Até agora, existem mais dados sobre o burnout. A empresa alemã de seguros de saúde Provona registrou um aumento de 20% nos casos em 2023, em comparação com o ano anterior, sendo que um quinto dos trabalhadores teme adquirir a síndrome.

Qualquer pessoa que queira não apenas concluir vários afazeres em seu cotidiano frenético, mas também completá-los da melhor maneira possível, está especialmente propensa à síndrome de burnon. "Acreditamos que multas das pessoas afetadas possuem alto nível de motivação para realizar funções e se sentem mal ao cometer erros ou não fazer as coisas de maneira perfeita".

Segundo Schiele, essas pessoas pensam ter uma capacidade de ação reduzida devido a determinadas restrições. "Com frequência, vemos pessoas que impõem muitas restrições a si mesmas, por exemplo, através do perfeccionismo."

•        Como tratar o burnon

Para conseguir escapar da roda de hamster e da tensão crônica constante, é necessário, primeiramente, reconhecer o problema, diz o especialista.

"O primeiro passo no tratamento, como costuma ser o caso, é se tornar consciente do problema. As pessoas com síndrome de burnon com frequência aparentam estar funcionais, motivo pelo qual costumamos nos basear em relatos de familiares ou pessoas próximas. É também importante refletirmos sobre nossos próprios valores pessoais."

Em particular quando as pessoas são apaixonadas pelo trabalho, elas tendem a negligenciar suas necessidades pessoais em meio ao cotidiano estressante.

"Se isso se torna uma condição permanente, ficamos cada vez mais insatisfeitos. Por isso, é importante parar para perguntar a si mesmo: 'O quão importante para mim são as coisas com as quais preencho minha vida diária? Estou usando minha energia nas áreas adequadas para mim?' Se a resposta for negativa, é porque está na hora de mudar algo e tentar ver quais espaços pequenos somos capazes de criar, interna e externamente. Este é, com frequência, um grande passo", diz Schiele.

•        Como reduzir o estresse constante

O tipo de relaxamento que é bom para cada pessoa depende das preferências individuais. Podem ser caminhadas, meditação ou ioga. O fundamental é desacelerar a vida diária e se acalmar.

Também faz sentido buscar ajuda profissional, como cuidados terapêuticos ou médicos.

•        A importância de se dar nome à doença

O burnout é considerado já há algum tempo como uma doença da moda. Até hoje, nem o burnout ou o burnon foram definidos como doenças mentais autônomas, mesmo que seus graves impactos à saúde sejam reconhecidos.

Os sintomas possuem grande variação, o que dificulta classificar as síndromes de maneira uniformizada, como na Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados à Saúde (CID), da Organização Mundial da Saúde (OMS), que também relaciona problemas mentais.

Ainda assim, a existência do termo burnon é de extrema importância para as pessoas afetadas para descrever seus sintomas, diz Schiele.

"Encontrar a si mesmo em um fenômeno definido é um alívio bastante grande para muitas das pessoas atingidas, e um primeiro passo rumo a uma mudança. Essas pessoas sentem que não estão mais sozinhas. Eles podem ganhar esperança ao verem que há outras pessoas que também sofrem do mesmo mal."

 

•        Sete fatores que podem diminuir o risco de depressão, segundo estudo

 

Estudo publicado na revista científica Nature Mental Health apontou sete fatores relacionados ao estilo de vida que podem diminuir o risco de depressão. O trabalho mostrou, por exemplo, que a quantidade de horas dormidas diariamente e a frequência com a qual se interage com outras pessoas influencia mais as chances de desenvolver ou não depressão do que fatores genéticos

Uma equipe internacional de pesquisadores analisou uma combinação de agentes como estilo de vida, genética, estrutura cerebral e funcionamento de sistemas imunológico e metabólico para identificar os mecanismos que podem explicar a incidência da doença.

Eles analisaram dados de quase 290.000 pessoas durante nove anos entre elas, 13.000 tinham depressão. As informações foram retiradas do UK Biobank, que reúne dados genéticos, de estilo de vida e saúde de seus participantes.

Os fatores que diminuem o risco da doença e estão relacionados à vida saudável são:

- Consumo moderado de álcool;

- Dieta saudável;

- Atividade física regular;

- Sono adequado;

- Nunca fumar;

- Comportamento sedentário baixo a moderado;

- Conexão social frequente.

Ter uma boa noite de sono entre sete e nove horas foi o fator de maior impacto, diminuiu o risco de desenvolver o transtorno, incluindo episódios depressivos únicos e a doença resistente ao tratamento, em 22%. Já a conexão social frequente reduziu em 18%.

A descoberta dialoga com a Medicina do Estilo de Vida, abordagem que utiliza hábitos saudáveis como forma de tratar, prevenir e reverter doenças crônicas não transmissíveis.

A abordagem segue seis pilares principais, segundo o psiquiatra Arthur H. Danila, coordenador do Programa de Mudança de Hábito e Estilo de Vida do Instituto de Psiquiatria da USP (Universidade de São Paulo). São eles:

- Sono;

- Alimentação saudável;

- Atividade física (150 minutos por semana);

- Manejo do estresse (práticas que ajudem a administrar o estresse);

- Evitar substâncias de risco como álcool e tabaco;

- Conexão social.

"Depressão é um transtorno multifatorial. Se você tem esse risco de depressão pela genética, mas sempre teve uma vida muito saudável, faz exercícios, esse risco acaba diminuindo por causa de fatores protetivos ou seja, a expressão desses genes é modificada pelo ambiente, que é o estilo de vida", diz o psiquiatra.

No estudo publicado pela Nature, os pesquisadores examinaram o DNA dos participantes, atribuindo a cada um uma pontuação de risco genético. Essa contagem foi baseada no número de variantes genéticas conhecidas pela sua ligação com o risco de depressão que os participantes tinham.

Um estilo de vida saudável pode reduzir o risco da doença mesmo em pessoas com alto risco genético para a depressão. Não se deve, porém, descartar medicações que agem nos neurotransmissores, além da psicoterapia. "Sou psiquiatra, também prescrevo medicações no meu consultório, a questão é que não é só isso [que funciona]", diz Danila.

Um estudo publicado em maio deste ano no periódico Journal of Affective Disorders concluiu que recomendar a prática de corrida a pacientes com transtornos depressivos e de ansiedade é equiparável à prescrição de antidepressivos.

O trabalho, comandado por institutos de psiquiatria de Amsterdã, acompanhou 141 pacientes com depressão e/ou transtorno de ansiedade por 16 semanas. Destes, 45 participantes receberam medicação antidepressiva e 96 passaram praticaram corrida.

Segundo Danila, a recomendação de um estilo de vida saudável deve ser levada tão a sério quanto a prescrição de medicamentos. "A gente estabelece com o paciente as prioridades que ele pode fazer e, no momento que ele está preparado para mudar o comportamento, acompanha com metas atingíveis."

 

Fonte: Deutsche Welle/FolhaPress

 

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