segunda-feira, 29 de abril de 2024

Posicionamento do Uruguai sobre 'papel do Estado' ajuda a isolar Milei na América Latina

Quatro meses após a sua posse, o líder argentino ainda não conseguiu estabelecer um diálogo fluido com nenhum dos seus pares na região. Após divergências com López Obrador, Gustavo Petro e Luiz Inácio Lula da Silva, Luis Lacalle Pou do Uruguai também se diferenciou do discurso antiestadista de Milei.

Ao assumir o cargo de presidente da Argentina, em 10 de dezembro de 2023, Javier Milei demonstrou um alinhamento internacional irrestrito com Estados Unidos e Israel, mas decidiu ignorar o capítulo regional: as poucas referências a outros líderes latino-americanos foram, em sua maioria, em termos depreciativos.

As declarações públicas do argentino sobre líderes importantes do continente, como o mexicano Andrés Manuel López Obrador, a quem qualificou de "ignorante"; ou o colombiano Gustavo Petro, tachado de "assassino terrorista"; ou o líder brasileiro Luiz Inácio Lula da Silva, a quem considerava "corrupto" e "ladrão".

Um novo capítulo na saga de idas e vindas de Milei com seus pares regionais contou com a participação do presidente do Uruguai, Luis Lacalle Pou.

Convidado para o jantar anual da Fundação Libertad em Buenos Aires nesta semana, Lacalle Pou fez um discurso no qual enaltece a importância do Estado, indo na contramão das ideias do líder argentino. Diante do auditório onde Milei estava presente, Lacalle Pou considerou que "para haver liberdade, é preciso ter um Estado forte".

"Que difícil aproveitar a liberdade individual se vivemos em uma fazenda sem acesso à boa saúde […], temos que ter um Estado forte para que o indivíduo possa gozar do exercício da liberdade", afirmou o mandatário uruguaio. O contraste com o libertário – cuja premissa durante a campanha eleitoral consistiu em passar uma motosserra sobre a administração pública – é evidente.

Para o analista internacional Juan Venturino, "ao se identificar como anarcocapitalista, Milei praticamente descarta a possibilidade de concordar ideologicamente com outros líderes, além da relação pessoal que possa ter com cada um deles".

Segundo o especialista, entrevistado pela Sputnik, a diplomacia do presidente argentino gira em torno de um único eixo central da sua estratégia: a relação com Washington e seus aliados.

"Não parece haver uma política externa muito boa. É claro que houve um alinhamento explícito com Israel e os Estados Unidos, mas não muito mais. Parece que o resto dos países não são de todo relevantes, incluindo aqueles na região", ponderou Venturino.

Ao mesmo tempo, o especialista Néstor Guzzetti – membro do Instituto Argentino de Estudos Geopolíticos entrevistado pela Sputnik – acrescentou que "o governo Milei assumiu ser o carro-chefe da Casa Branca na região, e por isso, não se identifica muito com os demais países próximos. Raramente vimos um líder que praticamente não tivesse aliados próximos no subcontinente", sublinhou Guzzetti.

De acordo com Venturino, o posicionamento do líder argentino apresenta um denominador comum em relação a outros blocos estratégicos de calibre mundial.

"Milei fechou as portas à consolidação de uma forte aliança sul-americana, tal como se recusou a aderir ao BRICS, em uma decisão altamente condicionada pela sua inclinação ideológica. Ele rejeitou aderir aos BRICS praticamente em troca de nada. Ele nem parece ter exigido ajuda dos Estados Unidos junto ao Fundo Monetário Internacional. O posicionamento é difícil de entender do ponto de vista estratégico", considerou o especialista.

Por exemplo neste cenário, as declarações de Milei podem ser inscritas na última edição do Fórum Econômico de Davos, onde afirmou que "o Ocidente está em perigo porque aqueles que devem defender os seus valores se encontram cooptados por uma visão socialista", afirmou.

Para Venturino, a visão do mandatário faz referência a "uma narrativa de um mundo capitalista enfrentando o comunismo que foi truncada há mais de 40 anos, mas a qual Milei se apega quase cegamente", complementou.

¨      Após depreciar China, Milei envia equipe a Pequim para negociar linha de swap 'com urgência'

O presidente do Banco Central da Argentina, Santiago Bausili, e o secretário de Finanças, Pablo Quirno, devem se reunir com o governador do Banco Popular da China, Pan Gongsheng, na capital chinesa na segunda-feira (29).

As principais autoridades econômicas, que partiram de Buenos Aires na sexta-feira (26), viajam ao lado da ministra das Relações Exteriores, Diana Mondino, em meio a negociações para uma linha de swap cambial de US$ 18 bilhões (R$ 93 bilhões), segundo a Bloomberg.

Ainda de acordo com a mídia, Mondino, que partiu na quinta-feira (25), manterá reuniões bilaterais com o vice-presidente da China, Han Zheng, o representante do Comércio Internacional, Wang Shouwen, e o seu homólogo, Wang Yi, segundo fontes ouvidas pela agência.

A questão mais urgente na agenda bilateral é a troca cambial dos US$ 18 bilhões, visto que Buenos Aires precisa renovar até junho cerca de US$ 5 bilhões (R$ 25,8 bilhões) dessa linha, depois que o ex-ministro da Economia, Sergio Massa, usou os fundos em grande parte para financiar importações em 2023, escreve a agência.

Mondino é acompanhada por uma grande delegação de empresários argentinos que participarão de diversas reuniões para atrair investimentos e aumentar a parceria comercial. Ela também se reunirá na terça-feira (30) com autoridades chinesas de alto nível para promover o investimento em infraestrutura na Argentina.

Em dezembro do ano passado, a China suspendeu o financiamento de US$ 6,5 bilhões (R$ 33,6 bilhões). A decisão de Pequim coincidiu com o início do mandato Milei, que desde a campanha como candidato à presidência dizia que romperia relações com países comunistas, entre eles a China.

As visitas e encontros demonstram um contexto bem diferente do expressado pelo presidente durante sua campanha presidencial. Na época, Milei levantou questões sobre o futuro das relações entre Buenos Aires e Pequim, chamando os chineses de "assassinos".

No entanto, em uma entrevista no começo deste mês à Bloomberg News, adotou um tom muito mais pragmático, evitando comentários incendiários e garantindo que não tocaria nos swaps cambiais.

Antes disso, quando recebeu uma carta do presidente Xi Jinping felicitando sua eleição, Milei baixou o tom e o agradeceu, enviando "os mais sinceros votos de bem-estar ao povo da China", conforme noticiado.

 

¨      Maduro faz balanço de consulta popular e diz que as comunas são 'pilares' da Venezuela

 

O presidente da Venezuela, Nicolás Maduro, disse que a consulta popular realizada no último domingo nas comunas do país foi um "êxito completo". Em discurso na Comuna Socialista, Revolucionária e Chavista de Mamera, em Caracas, o chefe do Executivo celebrou a votação e afirmou que as organizações populares e a democracia participativa são pontos fundamentais para o desenvolvimento da sociedade venezuelana.

"Qual é o pilar da nova democracia do país? O poder popular, o povo, o povo empoderado, o povo organizado, o povo mobilizado. Acredito que esta é a forma de mudar tudo, esta é a forma de abordar o que as pessoas realmente precisam", disse o presidente.

Ao todo, 4.500 projetos foram escolhidos pelas comunas e checados pelo Ministério das Comunas. Eles receberão US$ 10 mil para serem finalizados. De acordo com o Ministério das Comunas, a votação mobilizou ao menos 1,3 milhões de pessoas. 15.617 pontos de votação de 49 mil conselhos comunais em toda a Venezuela receberam eleitores que indicariam projetos de rápida execução que foram enviados ao órgão.

Maduro disse que, dentre os 23 mil projetos que receberam votos, aqueles ligados a serviços públicos, saúde, alimentação, segurança, educação, meio ambiente e economia receberam a maior parte das escolhas dos "comuneros". Ele determinou que os projetos devem ser executados o "mais rápido possível".

"Foram decididos 4.500 projetos priorizados. Não podemos atrasar nem um segundo e os recursos têm que chegar imediatamente às comunidades para iniciar os 4.500 projetos, para começar. Confio no poder popular das comunas e dos conselhos comunitários, vocês são a esperança e a esperança está nas ruas", afirmou.

Em seu discurso, Maduro lembrou que a consulta popular e a organização das comunas é fruto da idealização e do trabalho do ex-presidente Hugo Chávez. As comunas são uma concepção própria do Estado venezuelano criada por Chávez. O objetivo dele era que a gestão do Estado fosse feita de baixo para cima, e que a decisão dos conselhos comunais tivesse peso na decisão coletiva. 

A partir da lei orgânica das comunas, promulgada em 2010, o governo de Chávez institucionalizou a criação dos conselhos comunais que depois se organizaram também em estruturas maiores chamadas de comunas. O objetivo do ex-presidente era que o Estado fosse administrado por uma confederação comunal.

Projeto de sociedade

Para Maduro, a consulta foi um exemplo do que a estrutura de comunas pretende: aproximar a gestão pública do povo para uma participação direta.

"Acredito firmemente que a consulta comunitária foi um sucesso total. Espero que continue a ser uma experiência para nós, estou convencido de que esta é a forma de abordar verdadeiramente o que as pessoas precisam, o que as pessoas clamam", disse.

A dimensão desse tipo de votação para as comunas venezuelanas traz também um debate sobre um projeto de sociedade. Para grande parte dos eleitores, a participação popular é o reflexo mais expressivo da democracia participativa no país. Maduro finalizou seu discurso reforçando também que o único caminho possível para a superação das desigualdades é a articulação social em torno do projeto socialista.

"Tenho certeza que o caminho do poder popular, o caminho da Revolução Bolivariana, da Revolução Socialista, é o único caminho para que o povo possa exercer poder. Para que o povo possa gritar pela sua comunidade nas entranhas mais profundas da Venezuela. Viva a comuna! Até a vitória!", disse.

A participação de observadores internacionais também foi destacada pelo governo. Representantes de mais de 50 países acompanharam o processo e relataram a experiência "única" em torno da organização popular das comunas.

Para o ministro das Comunas, Guy Vernáez, a presença de observadores é importante para mostrar uma forma de organização social que não é comum a outros países e que "fortalece a democracia". De acordo com ele, a consulta popular é a ponta de um trabalho que é realizado constantemente pelas comunas.

"As obras ou projetos que se fazem diariamente numa comunidade fazem parte de um processo transformador que demonstra o nível de empoderamento e soberania do povo", disse o ministro.

 

Fonte: Sputnik Brasil/Brasil de Fato

 

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