Como Brasil foi chave para América Latina
bater recorde de exportação para China em 2023
O comércio entre a China e os países latino-americanos bateu
um recorde histórico em 2023.
A troca de mercadorias
entre a região e o gigante asiático ultrapassou US$ 480 bilhões, segundo
cálculos elaborados pela BBC News Mundo, serviço de notícias em espanhol da
BBC, com base em dados da Administração Aduaneira da República Popular da China
(AGA, na sigla em inglês).
A balança comercial
foi relativamente equilibrada, com um ligeiro superávit favorável à América Latina de US$ 2
bilhões (cerca de R$ 10 bilhões).
O novo recorde no
comércio de mercadorias com a China constitui mais um passo em uma tendência
ascendente que tem sido registrada ao longo deste século.
O intercâmbio
bilateral do país asiático com a América Latina e o Caribe (ALC) mal girava em
torno de US$ 14 bilhões no ano 2000, segundo a Comissão Econômica para a
América Latina e o Caribe (CEPAL).
Assim, o aumento foi
exponencial neste quase quarto de século.
“No período de 2000 a
2022, o comércio de mercadorias entre a região e a China foi multiplicado por
35, enquanto o comércio total da região com o mundo apenas foi multiplicado por
4”, afirmou a CEPAL em seu relatório Perspectivas do Comércio Internacional
2023.
Graças a este aumento,
a China se tornou o segundo parceiro comercial da América Latina como um todo,
ultrapassando a União Europeia, como
principal parceiro da América do Sul.
Esta intensificação
dos laços comerciais com Pequim tem sido desigual, o que resultou no fato de
que, enquanto alguns países da região desfrutam de um superávit comercial,
outros registram um déficit.
Mas quais são os
países latino-americanos que mais exportam para a China, e o que eles vendem
para ela?
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Matérias-primas e
manufaturados
>>>
Países latino-americanos que mais exportaram para a China em 2023
- US$122 bilhões - Brasil
- US$43 bilhões - Chile
- US$25 bilhões - Peru
- US$18 bilhões - México
- US$7.9 bilhões - Equador
Fonte: Administração
Aduaneira da República Popular da China
Segundo a CEPAL, o
grosso das exportações latino-americanas para a China se concentra em seis
produtos (soja, cobre e minérios de ferro, petróleo, cátodo de cobre e carne
bovina), que juntos correspondem a 72% do total.
Já as importações da
região provenientes da China, por outro lado, consistem principalmente em
produtos manufaturados, o que “ampliou o acesso das famílias e das empresas,
mas também deslocou a produção regional”, observa a CEPAL.
A seguir, confira os
cinco países latino-americanos que mais exportaram para o gigante asiático,
segundo dados da Administração Aduaneira Chinesa relativos ao ano de 2023.
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1. Brasil
O Brasil é, de longe, o principal parceiro
comercial da China na América Latina.
Em 2023, o intercâmbio
bilateral totalizou US$ 181 bilhões (cerca de R$ 939 bilhões), dos quais US$
122 bilhões (R$ 629 bilhões) representaram exportações do país sul-americano,
que obteve um superávit comercial de US$ 63 bilhões (R$ 356 bilhões).
Estes resultados não
apenas fazem do Brasil o país latino-americano que mais exporta para a China,
como também “um dos poucos países do mundo que tem superávit comercial com a
China”, segundo indicou a consultoria internacional Dezan Shira & Associates,
em seu relatório China Briefing, de 2023.
E é possível que esta
relação continue a crescer, a julgar pelos 15 acordos comerciais bilaterais
avaliados em cerca de US$ 10 bilhões (R$ 51 bilhões), que foram assinados pelos
dois países durante a visita oficial do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT)
à China, em 2023.
Mas o que o Brasil
vende para a China?
Entre os principais
produtos exportados, estão: soja (35,4% do total), ferro (20,2%), petróleo
(18,6%), carne bovina congelada (8,82%) e polpa de celulose (3,36%), segundo
dados do Observatório de Complexidade Econômica (OEC, na sigla em inglês).
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2. Chile
O Chile é o segundo país latino-americano que
mais exporta para a China — e é também o segundo na lista dos que têm maior
superávit comercial.
Em 2023, as
exportações chilenas para a China ultrapassaram US$ 43 bilhões (R$ 22 bilhões),
enquanto seu superávit com o país asiático alcançou US$ 23 bilhões (R$ 119
bilhões), segundo dados da Administração Aduaneira da República Popular da
China.
O gigante asiático é o
principal parceiro comercial do Chile.
O cobre (bruto e
refinado) é de longe o principal produto que o Chile exporta para a China, de
acordo com dados da OEC.
Outro produto que se
destaca são as frutas sem caroço, das quais o Chile é o principal exportador a
nível mundial — e a China, a maior importadora. Em 2022, o Chile enviou o
equivalente a US$ 2,45 bilhões (R$ 13 bilhões) deste tipo de fruta para o país
asiático, suprindo mais de dois terços das importações chinesas, de US$ 3,58
bilhões (R$ 18 bilhões).
Também chamam atenção
os números das exportações chilenas de produtos químicos inorgânicos, como
compostos de metais preciosos e isótopos.
Em 2005, o Chile foi o
primeiro país latino-americano a assinar um acordo de livre comércio com a
China e, segundo o pesquisador Evan Ellis, deve grande parte de seus bons
resultados à sua estratégia de marketing.
“O sucesso do Chile se
deve em parte à promoção da sua 'marca nacional' na República Popular da China.
O Chile comercializou com sucesso suas uvas, cerejas e mirtilos na China como
'bens de luxo', associados às festividades natalinas e à troca de presentes,
permitindo a eles vendê-los a um preço mais alto, incluindo sua importação e
envio por meios (de transporte) caros, como aviões e contêineres refrigerados”,
observou Ellis, em artigo publicado em dezembro de 2023.
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3. Peru
Com exportações que em
2023 ultrapassaram US$ 25 bilhões (R$ 129 bilhões), o Peru ocupa o terceiro lugar na lista dos
países latino-americanos que mais vendem para a China— e entre aqueles que
alcançaram o maior superávit comercial (mais de US$ 13 bilhões / R$ 67 bilhões,
segundo dados da AGA).
A partir de 2009,
quando ambos os países assinaram um acordo de livre comércio, a potência
asiática tornou-se o principal parceiro comercial do Peru.
Entre 2010 e 2023, as
exportações do Peru para a China quadruplicaram, segundo uma análise recente da
Fundação Andrés Bello – Centro de Pesquisa Chinês Latino-Americano.
Os principais produtos
que o Peru exporta para a China são minerais, além de alimentos para animais.
Embora o Peru venda
uma grande variedade de minerais à China, incluindo ferro, zinco e metais
preciosos, a maior parte destas exportações é de cobre, que representou mais de
60% do total em 2019.
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4. México
Entre os cinco países
latino-americanos que mais exportam para a China, o México é a grande exceção, uma vez que sua
balança comercial com o gigante asiático é desfavorável.
Em 2023, as
exportações do país norte-americano para a China totalizaram mais de US$ 18
bilhões (R$ 93 bilhões), mas suas importações somaram US$ 81 bilhões (R$ 418
bilhões). O resultado? Um déficit comercial para o México de US$ 62 bilhões (R$
320 bilhões).
A relação comercial do
México com a China também é diferente porque entre os seus produtos mais
vendidos, estão bens manufaturados — e não apenas matérias-primas.
Então, por exemplo, em
fevereiro de 2024, as principais exportações mexicanas para o gigante asiático
foram de circuitos integrados (US$ 232 milhões / R$ 1, 2 bilhões), instrumentos
médicos (US$ 150 milhões / R$ 775 milhões), metais preciosos (US$ 91 milhões /
R$ 470 milhões), cobre (US$ 73 milhões / R$ 377 milhões), assim como de
motores, peças e acessórios para veículos (US$ 71 milhões / R$ 366 milhões),
segundo dados da OEC.
Há anos, a relação
entre o México e a China tem sido complexa porque, devido ao seu perfil
exportador, ambos os países têm sido concorrentes, especialmente desde a adesão
da China à Organização Mundial do Comércio (OMC). Esta concorrência é bastante
acirrada, sobretudo no que diz respeito ao fornecimento de produtos
manufaturados ao mercado dos EUA.
De acordo com Liu
Xuedong, professor da Faculdade de Economia da Universidade Nacional Autônoma
do México, as relações entre estas economias são cada vez mais
interdependentes.
Isso é parcialmente
explicado pelo fato de a China ter um papel de destaque na cadeia de
abastecimento que permite ao México produzir muitos dos bens que exporta para
os EUA.
"Neste contexto,
os fluxos comerciais em questão não são apenas os bilaterais entre a China e o
México, e o México e os Estados Unidos, mas também os fluxos comerciais
trilaterais China-México-Estados Unidos que conectam os três países, nos quais
o México se tornou um “trampolim e local de montagem” com uma presença
crescente de produtos no mercado norte-americano”, escreveu o acadêmico em um
artigo recente publicado pela revista digital ThinkChina.
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5. Equador
Com exportações que em
2024 somaram mais de US$ 7,9 bilhões (R$ 41 bilhões), o Equador é o quinto país
da América Latina que mais exporta para a China, com quem teve um superávit
comercial de mais de US$ 1,9 bilhões (R$ 10 bilhões).
Ambos os países
assinaram um acordo de livre comércio em maio de 2023 — e estima-se que este
acordo vai ajudar a aumentar as exportações equatorianas em 30% durante os
primeiros três anos da sua entrada em vigor.
A China já é o
principal comprador de produtos não petrolíferos equatorianos.
Entre os produtos
equatorianos mais exportados para a China, estão: crustáceos, minério de cobre
e minérios de metais preciosos, segundo dados da OEC.
Entre outros produtos
que se destacam — e que devem se beneficiar do acordo
comercial —, estão a banana, cuja expectativa é duplicar as vendas, e o cacau.
O mercado chinês
tornou-se um dos mais rentáveis para a
venda de cacau graças, entre outras
coisas, ao fato de os consumidores estarem dispostos a pagar mais para obter um
produto de qualidade premium, conforme explicou Francisco Miranda, presidente
da Associação Nacional
de Exportadores de Cacau do Equador, quando o acordo comercial foi assinado.
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Empresas chinesas usam
o México como porta de entrada para os EUA
As poltronas
reclináveis e os sofás de couro macio
provenientes da linha de produção da fábrica da Man Wah
Furniture na cidade mexicana de Monterrey são 100% "made in Mexico".
Eles são destinados a
grandes varejistas dos EUA, como a Costco e o Walmart. Mas a empresa
é chinesa, e sua fábrica mexicana foi construída com capital do país asiático.
A relação triangular
entre os EUA, a China e o México está por trás da palavra da moda nos
negócios mexicanos: nearshoring.
A expressão em inglês
é usada para se referir à estratégia das empresas de levar a produção para mais
próximo dos mercados onde será vendida.
A Man Wah é uma das
dezenas de empresas chinesas que se mudaram para parques industriais no norte
do México nos últimos anos, com o intuito de aproximar a produção do mercado
dos EUA.
Além de pouparem no
frete, seu produto final é considerado completamente mexicano — o que significa
que as empresas chinesas podem evitar as tarifas e sanções impostas pelos EUA
aos produtos chineses em meio à guerra comercial entre os dois países.
Enquanto o gerente
geral da empresa, Yu Ken Wei, me mostra as vastas instalações da fábrica, ele
afirma que a mudança para o México fez sentido do ponto de vista econômico e
logístico.
“Esperamos triplicar
ou até mesmo quadruplicar a produção aqui”, diz ele em espanhol.
“A intenção aqui no
México é elevar a produção até o nível da nossa operação no Vietnã."
A empresa só chegou à
cidade de Monterrey em 2022, mas já emprega 450 pessoas no México. Yu Ken Wei
afirma que espera empregar mais de 1.200 funcionários, para operar novas linhas
de produção na fábrica nos próximos anos.
“As pessoas aqui no
México são muito trabalhadoras e aprendem rápido”, diz Yu.
"Temos bons
operários, e a produtividade deles é alta. Então, do ponto de vista de mão de
obra, acho que o México também é estrategicamente muito bom."
Não há dúvida de que
o nearshoring proporciona um importante impulso à economia mexicana —
em junho do ano passado, as exportações totais do México haviam aumentado 5,8%
em relação ao ano anterior, chegando a US$ 52,9 bilhões (R$ 275 bilhões).
A tendência está
mostrando poucos sinais de desaceleração. Em apenas dois meses deste ano, os
anúncios de investimento de capital no México corresponderam a quase metade do
total no ano de 2020.
A fábrica de sofás Man
Wah está localizada dentro do Hofusan, um parque industrial chinês/mexicano. A
demanda pelos lotes é altíssima: todos os espaços disponíveis foram vendidos.
Na verdade, a
Associação de Parques Industriais do México afirma que todas as instalações
previstas para serem construídas no país até 2027 já foram adquiridas. Não é de
se admirar que muitos economistas mexicanos digam que o interesse da China no
país não é uma moda passageira.
“As razões estruturais
que estão trazendo capital para o México vieram para ficar”, avalia Juan Carlos
Baker Pineda, ex-vice-ministro do Comércio Exterior do México.
“Não tenho nenhuma
indicação de que a guerra comercial entre a China e os EUA vai arrefecer tão
cedo.”
Baker Pineda fez parte
da equipe de negociação do México envolvida no estabelecimento do acordo de
livre comércio USMCA (que substituiu o antigo Nafta).
"Embora a origem
chinesa do capital que entra no México possa ser desconfortável para as
políticas de alguns países, de acordo com a legislação comercial internacional,
estes produtos são, para todos os efeitos, mexicanos", diz ele.
Isso ofereceu ao
México uma posição estratégica clara entre as duas superpotências: o México substituiu recentemente a China como principal parceiro
comercial dos EUA, uma mudança significativa e simbólica.
O crescimento das
relações comerciais do México com os EUA também aconteceu, em parte, por meio
de um segundo aspecto fundamental do nearshoring no país:
empresas americanas também se instalaram no México, muitas vezes depois de
transferirem a produção de fábricas na Ásia.
Talvez o anúncio de
maior destaque tenha sido o do empresário Elon Musk, que revelou planos
no ano passado de construir uma nova Tesla Gigafactory nos arredores de
Monterrey. Mas a empresa de carros elétricos ainda não iniciou a construção da
fábrica de US$ 10 bilhões.
E, embora a Tesla
aparentemente ainda esteja comprometida com o projeto, ela desacelerou seus
planos em meio a preocupações com a economia global e às recentes demissões na
montadora.
Mas no que diz
respeito ao investimento chinês, alguns especialistas pedem cautela pelo fato
de o México ter sido arrastado para a luta geopolítica mais ampla entre os EUA
e a China.
“O velho rico da
cidade, os EUA, está tendo problemas com o novo rico da cidade, a China”, diz
Enrique Dussel, do Centro de Estudos China-México da Universidade Nacional
Autônoma do México.
“E o México — sob a
gestão de governos anteriores e nesta [gestão] — não tem uma estratégia face a
esta nova relação triangular.”
Com as eleições se
aproximando em ambos os lados da fronteira entre os EUA e o México, pode haver
novos aspectos políticos pela frente. Mas quer seja Donald Trump ou Joe Biden no comando da
Casa Branca nos próximos quatro anos, poucos esperam que haja qualquer avanço
nas relações entre os EUA e a China.
Dussel acredita que
o nearshoring é melhor definido pelo que ele chama de “security-shoring”,
uma vez que Washington colocou as preocupações de segurança nacional acima de
todos os outros fatores na sua relação com a China.
O México, argumenta
ele, deve ter cuidado para não ser pego no meio deste fogo cruzado.
“O México está
levantando um grande cartaz para a China dizendo: 'Bem-vinda ao México!'. Não é
preciso ter doutorado para saber que isso não vai acabar bem para as relações
bilaterais entre os EUA e o México no médio prazo”, acrescenta Dussel.
Outros são mais
otimistas. “Na minha opinião, a questão não é se esta tendência vai continuar —
mas, sim, o quanto podemos tirar proveito desta tendência”, afirma Juan Carlos
Baker Pineda.
"Tenho certeza de
que as pessoas estão tendo essas mesmas discussões na Colômbia, no Vietnã, na
Costa Rica. Por isso, precisamos garantir no México que essas condições que
estão alinhadas andem de mãos dadas com as decisões corporativas e governamentais
para sustentar essa tendência no longo prazo."
De volta a Monterrey,
as talentosas costureiras mexicanas da Man Wah Furniture dão os últimos
retoques em outro sofá antes de ser despachado para os EUA.
Quando uma família
americana comprar o sofá em uma loja do Walmart perto dela, pode não fazer
ideia da complexa geopolítica por trás da sua produção.
Mas quer o nearshoring seja
uma saída inteligente para os EUA, ou parte de uma guerra onerosa entre
superpotências, é atualmente a principal vantagem do México nestes tempos
hostis para o comércio global.
Fonte: BBC News Brasil
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