STF julga suposto “assédio judicial” do
governador de Mato Grosso contra jornalistas
A ministra do Supremo
Tribunal Federal (STF) Cármen Lúcia liberou para julgamento, entre os próximos
dias 3 e 10 de maio, o processo que decide se houve “assédio judicial” do
governador de Mato Grosso, Mauro Mendes (União), contra jornalistas de Cuiabá.
Como reportado pela
Agência Pública, profissionais e entidades de imprensa denunciaram o
bolsonarista por supostamente usar a Delegacia de Repressão a Crimes
Informáticos (DRCI), da Polícia Civil do estado, para “criminalizar” quem
cobriria “criticamente” sua gestão.
A DRCI moveu uma
operação contra os jornalistas Alexandre Aprá e Enock Cavalcanti e apreendeu
aparelhos eletrônicos, telefones celulares, além de pedir a prisão preventiva
de Aprá.
Segundo decisão da
ministra relatora do caso no STF, Cármen Lúcia, a operação do governo Mauro
Mendes caracterizou-se como um “cerceamento à liberdade de imprensa” e a
apreensão de aparelhos e telefones “pode permitir a exposição de fontes e
métodos de investigação jornalísticos” – “revelando censura judicial
incompatível com a Constituição”.
Por meio de sessão
virtual, na qual os ministros apenas registram seus votos, os membros da
Primeira Turma do STF deverão ratificar, ou não, a decisão da relatora. Também
fazem parte da Primeira Turma os ministros Alexandre de Moraes, Cristiano
Zanin, Flávio Dino e Luiz Fux.
Em 12 de abril de
2024, a ministra do STF deu razão aos jornalistas na reclamação contra o
governador e o Núcleo de Inquéritos Policiais da Comarca de Cuiabá, ligada ao
Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso (TJMT).
Foi esse setor do TJMT
que autorizou a Operação Fake News 3 contra os jornalistas Alexandre Aprá e
Enock Cavalcanti e o comunicador e empresário Marco Polo Pinheiro no dia 6 de
fevereiro deste ano. Os três são investigados por supostamente formarem uma “associação
criminosa”.
Os alvos da operação e
entidades de defesa da classe alegam que o governador tem praticado “assédio
judicial” contra críticos à sua gestão. Um levantamento do sindicato dos
jornalistas no estado (Sindjor-MT) aponta a existência de inquéritos abertos
contra pelo menos 18 profissionais da imprensa, incluindo casos com
controvérsias envolvendo o Ministério Público de Mato Grosso (MPMT).
Com base na denúncia
contra o governador, o grupo de jornalistas formalizou queixas ao Ministério da
Justiça e Segurança Pública (MJSP). O Observatório da Violência contra
Jornalistas e Comunicadores Sociais, coordenado pelo secretário nacional de
Justiça do MJSP, Jean Uema, acompanha o tema desde março – quando o caso chegou
ao STF.
A ação dos jornalistas
no Supremo conta com o apoio formal da Federação Nacional dos Jornalistas
(Fenaj), do Instituto Vladimir Herzog e do Sindicato dos Jornalistas de Mato
Grosso (Sindjor-MT).
• “Milícia digital”: Perante o STF, defesa
de Mauro Mendes renova ataques
Segundo apuração da
Pública, a defesa de Mauro Mendes tem insistido nos ataques contra os três
alvos da Polícia Civil de Mato Grosso. A advogada Natali Nishiyama alega que a
reclamação a ser julgada pela Primeira Turma foi criada para ludibriar o
Supremo.
A defesa do governador
renovou críticas contra os jornalistas, chamando-os de uma “milícia digital
contratada para planejar ataques” contra ele, seus familiares e aliados.
Sem apontar quem
seriam os possíveis contratantes, os advogados de Mauro Mendes baseiam seu
argumento no parentesco de um dos alvos com um desafeto político do governador.
Marco Polo Pinheiro é irmão do prefeito de Cuiabá, Emanuel Pinheiro (MDB),
outro que contesta decisões do TJMT. Emanuel Pinheiro foi afastado do cargo
duas vezes pela Justiça, em 2021 e 2024, por suspeita de irregularidades na
Secretaria de Saúde do município e por investigação de suposta participação em
organização criminosa.
A defesa de Mendes
alega que o inquérito contestado pelos jornalistas teve endosso do MPMT e, em
2022, da Polícia Federal. A única operação da PF local sobre o tema ocorreu em
1º de outubro de 2022, mas não tinha como alvos Aprá, Cavalcanti ou Pinheiro.
Os advogados do
governador pedem ao STF que a Procuradoria-Geral da República (PGR) emita novo
parecer sobre o caso. A PGR inicialmente deu razão aos jornalistas,
manifestando-se pela procedência da reclamação.
O advogado dos
jornalistas, André Matheus, afirma ser preocupante “o uso reiterado da máquina
pública, via Polícia Civil do Estado de Mato Grosso, para perseguir jornalistas
que o governador acredita serem seus opositores, usando o termo ‘fake news’,
tentando enquadrá-los na mesma ótica dos que pregam a abolição do sistema
democrático de direito, pois isso é um uso deturpado do conceito para tentar
criminalizar o trabalho de jornalistas no estado”.
A advogada Natali
Nishiyama, representante de Mauro Mendes, não respondeu aos questionamentos da
Pública. Caso se manifeste, a reportagem será atualizada.
• Juíza manda prender jornalista de PE por
denúncias contra promotor
A juíza Andreia Caiado
da Cruz, da 11ª Vara Criminal de Pernambuco, determinou a derrubada das redes
sociais e a prisão do jornalista Ricardo Antunes, por descumprimento de decisão
judicial para retirar do ar denúncia contra promotor do Ministério Público do
estado.
A defesa de Antunes
afirma que o jornalista é vítima de censura e questiona a legalidade da ação da
juíza. Processado por injúria e difamação, ele está na Espanha e espera um
habeas corpus contra o mandado de prisão para retornar ao Brasil.
"A exclusão de
publicação de matéria jornalística representa censura absolutamente proibida
pela Constituição", diz nota publicada em seu blog. "A prisão
preventiva, assim como a exclusão de matéria jornalística, são
inconstitucionais, ilegais e merecem ser revogadas."
O alvo da ação é
reportagem sobre a aquisição de terreno na ilha de Fernando de Noronha pelo
promotor Flávio Falcão. A Justiça havia determinado a retirada de qualquer
reportagem ou menção ao caso do site e das redes sociais do jornalista.
Em decisão desta
sexta-feira (26), a juíza diz que foram encontradas referências ao caso em um
story do Instagram e na conta de YouTube do jornalista. A defesa de Antunes
disse que cumpriu a determinação, retirando todo o histórico de reportagens das
redes sociais.
"Alegou ainda que
houve um equívoco por parte da equipe que cuida das redes sociais do
jornalista, ora acusado, restando apenas uma chamada em artigos antigos de
stories", escreveu a juíza. "Por fim, aduziu que os stories antigos
também já foram baixados."
Ainda assim, a juíza
decidiu decretar a prisão preventiva de Antunes, alegando que "o acusado
possui histórico de ofensas à lei penal, e, em liberdade, encontraria os mesmos
estímulos relacionados com a infração cometida".
"Apesar dos
delitos descritos na denúncia serem classificados como de menor potencial
ofensivo, o somatório das penas, abstratamente consideradas, nos moldes da
capitulação ofertada, ultrapassa 4 (quatro) anos, não havendo óbice para o
prolação da custódia preventiva", reforçou.
Como argumento, diz
ainda que o jornalista deixou de comparecer a audiência sobre o caso alegando
estar fora do país sem acesso confiável à internet, mas realizou no mesmo dia
uma live em suas redes sociais.
"Desta feita,
diante do comportamento evasivo do acusado que demonstra claramente desrespeito
ao ordenamento jurídico pátrio não resta outro caminho a não ser a prolação de
um decreto constritivo em seu desfavor", afirmou.
Na nota publicada em
seu blog, o jornalista diz que "as decisões proferidas nos autos foram
efetivamente cumpridas" e que o fato de não haver comparecido a audiência
não é motivo para a prisão.
"Não sendo ouvido
em juízo, despojou-se de um direito, visto que o interrogatório é peça de
defesa. Por mais grave que seja o suposto crime, não é possível a aplicação de
pena, por antecipação, sem julgamento formal, garantidos o contraditório e a plena
defesa", defende o texto.
Em sua decisão, a
juíza cita entendimentos do STF (Supremo Tribunal Federal) no inquérito das
fake news, liderado pelo ministro Alexandre de Moraes.
Um dos trechos citados
diz que "a liberdade de expressão é consagrada constitucionalmente e
balizada pelo binômio liberdade e responsabilidade, ou seja, o exercício desse
direito não pode ser utilizado como verdadeiro escudo protetivo para a prática
de atividades ilícitas".
• Desembargador suspende punição a
promotor acusado de violar 101 vezes protetivas da ex
A Corregedoria do
Ministério Público do Paraná informou na quinta-feira, 25, a suspensão de
decisão que puniu o promotor Bruno Vagaes pelo descumprimento de medidas
protetivas de urgência concedidas a sua ex-mulher Fernanda Barbieri, no bojo de
processo por violência doméstica. A suspensão foi determinada pelo Órgão
Especial do Tribunal de Justiça do Paraná, a pedido do promotor.
A reportagem entrou em
contato com a defesa do promotor. O espaço está aberto para manifestações.
Em julho de 2023, o
promotor foi afastado por ordem do Conselho Nacional do Ministério Público até
a conclusão de processos disciplinares instaurados na Corregedoria-Geral do
Ministério Público do Paraná sobre a conduta do promotor. À época, o Conselhão determinou
que o órgão do Estado deveria prestar informações sobre o andamento de todos os
julgamentos sobre Vagaes.
Assim, os detalhes
sobre a suspensão da punição imposta a Vagaes foram encaminhados ontem ao CNMP.
O documento cita despacho assinado no início de abril pelo desembargador Paulo
Cezar Bellio. Ele suspendeu os efeitos de decisão do Órgão Especial do Colégio
de Procuradores de Justiça que negou um recurso lá impetrado por Vagaes e
manteve a sanção de disponibilidade com subsídio proporcional ao promotor.
A punição contestada
pelo promotor lhe foi imposta em setembro do ano passado, pelo Conselho
Superior do Ministério Público do Paraná, em razão do descumprimento de medidas
protetivas entre 1º de março a 28 de abril de 2020. Hoje, a ex-mulher de Vagaes
– que acusou o promotor de agressões físicas, verbais, psicológicas e sexuais –
mora no exterior.
Quando o promotor foi
sancionado, o Ministério Público do Paraná lembrou que ele já havia recebido
duas sanções disciplinares e já havia sido condenado criminalmente. O caso
também chegou à Comissão Interamericana de Direitos Humanos. A pena imposta a
Vagaes é a segunda sanção mais grave que pode ser aplicada a um integrante do
MP. Ela implica no afastamento do promotor com vencimentos proporcionais.
Vagaes chegou a
recorrer duas vezes da decisão, internamente. Ajuizou contestações no Conselho
Superior do MPPR e também no Órgão Especial do Colégio de Procuradores do
Ministério Público do Paraná. Ambos negaram os pedidos do promotor, sendo a
decisão mais recente proferida em março, pelo colégio de procuradores.
No último dia 2 a
decisão que puniu o promotor transitou em julgado – se tornou definitiva – e a
punição foi lançada no sistema do CNMP. No dia seguinte, o desembargador Paulo
Cezar Bellio atendeu o apelo de Vagaes e suspendeu a decisão do Colégio de Procuradores
até que a Corte julgue o mandado de segurança lá impetrado pelo promotor.
O principal ponto de
contestação da defesa de Vagaes é o voto do procurador Francisco Gmyterco, que
se manifestou contra o recurso do promotor no Colégio de Procuradores. Os
advogados contestam tal voto em razão de o procurador ter se declarado suspeito
para ser relator do processo administrativo disciplinar de Vagaes. Além de
Gmyterco, outros três procuradores se declararam impedidos para relatar o PAD
do promotor.
O placar do julgamento
no Colégio de Procuradores do MPPR foi de 14 a 13, contra Vagaes. Nessa linha,
segundo os advogados de Vagaes, uma eventual anulação do voto de Gmyterco
levaria a um placar de 13 a 13 e o consequente acolhimento do pedido da defesa
do promotor e a reversão da punição a ele aplicada.
O argumento foi
acolhido pelo desembargador Paulo Cezar Bellio, que considerou que a
participação de um membro ‘impedido’ indica possível ilegalidade da decisão. O
magistrado destacou, por exemplo, que a não participação do procurador teria
potencial de mudar o voto da votação. Ainda de acordo com o relator,
procuradores que integram o colegiado do MP chegaram a propor a declaração de
nulidade do julgamento, mas tal entendimento restou vencido.
Fonte: Por Caio de
Freitas Paes, da Agencia Pública/FolhaPress
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