segunda-feira, 29 de abril de 2024

STF julga suposto “assédio judicial” do governador de Mato Grosso contra jornalistas

A ministra do Supremo Tribunal Federal (STF) Cármen Lúcia liberou para julgamento, entre os próximos dias 3 e 10 de maio, o processo que decide se houve “assédio judicial” do governador de Mato Grosso, Mauro Mendes (União), contra jornalistas de Cuiabá.

Como reportado pela Agência Pública, profissionais e entidades de imprensa denunciaram o bolsonarista por supostamente usar a Delegacia de Repressão a Crimes Informáticos (DRCI), da Polícia Civil do estado, para “criminalizar” quem cobriria “criticamente” sua gestão.

A DRCI moveu uma operação contra os jornalistas Alexandre Aprá e Enock Cavalcanti e apreendeu aparelhos eletrônicos, telefones celulares, além de pedir a prisão preventiva de Aprá.

Segundo decisão da ministra relatora do caso no STF, Cármen Lúcia, a operação do governo Mauro Mendes caracterizou-se como um “cerceamento à liberdade de imprensa” e a apreensão de aparelhos e telefones “pode permitir a exposição de fontes e métodos de investigação jornalísticos” – “revelando censura judicial incompatível com a Constituição”.

Por meio de sessão virtual, na qual os ministros apenas registram seus votos, os membros da Primeira Turma do STF deverão ratificar, ou não, a decisão da relatora. Também fazem parte da Primeira Turma os ministros Alexandre de Moraes, Cristiano Zanin, Flávio Dino e Luiz Fux.

Em 12 de abril de 2024, a ministra do STF deu razão aos jornalistas na reclamação contra o governador e o Núcleo de Inquéritos Policiais da Comarca de Cuiabá, ligada ao Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso (TJMT).

Foi esse setor do TJMT que autorizou a Operação Fake News 3 contra os jornalistas Alexandre Aprá e Enock Cavalcanti e o comunicador e empresário Marco Polo Pinheiro no dia 6 de fevereiro deste ano. Os três são investigados por supostamente formarem uma “associação criminosa”.

Os alvos da operação e entidades de defesa da classe alegam que o governador tem praticado “assédio judicial” contra críticos à sua gestão. Um levantamento do sindicato dos jornalistas no estado (Sindjor-MT) aponta a existência de inquéritos abertos contra pelo menos 18 profissionais da imprensa, incluindo casos com controvérsias envolvendo o Ministério Público de Mato Grosso (MPMT).

Com base na denúncia contra o governador, o grupo de jornalistas formalizou queixas ao Ministério da Justiça e Segurança Pública (MJSP). O Observatório da Violência contra Jornalistas e Comunicadores Sociais, coordenado pelo secretário nacional de Justiça do MJSP, Jean Uema, acompanha o tema desde março – quando o caso chegou ao STF.

A ação dos jornalistas no Supremo conta com o apoio formal da Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj), do Instituto Vladimir Herzog e do Sindicato dos Jornalistas de Mato Grosso (Sindjor-MT).

•        “Milícia digital”: Perante o STF, defesa de Mauro Mendes renova ataques

Segundo apuração da Pública, a defesa de Mauro Mendes tem insistido nos ataques contra os três alvos da Polícia Civil de Mato Grosso. A advogada Natali Nishiyama alega que a reclamação a ser julgada pela Primeira Turma foi criada para ludibriar o Supremo.

A defesa do governador renovou críticas contra os jornalistas, chamando-os de uma “milícia digital contratada para planejar ataques” contra ele, seus familiares e aliados.

Sem apontar quem seriam os possíveis contratantes, os advogados de Mauro Mendes baseiam seu argumento no parentesco de um dos alvos com um desafeto político do governador. Marco Polo Pinheiro é irmão do prefeito de Cuiabá, Emanuel Pinheiro (MDB), outro que contesta decisões do TJMT. Emanuel Pinheiro foi afastado do cargo duas vezes pela Justiça, em 2021 e 2024, por suspeita de irregularidades na Secretaria de Saúde do município e por investigação de suposta participação em organização criminosa.

A defesa de Mendes alega que o inquérito contestado pelos jornalistas teve endosso do MPMT e, em 2022, da Polícia Federal. A única operação da PF local sobre o tema ocorreu em 1º de outubro de 2022, mas não tinha como alvos Aprá, Cavalcanti ou Pinheiro.

Os advogados do governador pedem ao STF que a Procuradoria-Geral da República (PGR) emita novo parecer sobre o caso. A PGR inicialmente deu razão aos jornalistas, manifestando-se pela procedência da reclamação.

O advogado dos jornalistas, André Matheus, afirma ser preocupante “o uso reiterado da máquina pública, via Polícia Civil do Estado de Mato Grosso, para perseguir jornalistas que o governador acredita serem seus opositores, usando o termo ‘fake news’, tentando enquadrá-los na mesma ótica dos que pregam a abolição do sistema democrático de direito, pois isso é um uso deturpado do conceito para tentar criminalizar o trabalho de jornalistas no estado”.

A advogada Natali Nishiyama, representante de Mauro Mendes, não respondeu aos questionamentos da Pública. Caso se manifeste, a reportagem será atualizada.

 

•        Juíza manda prender jornalista de PE por denúncias contra promotor

 

A juíza Andreia Caiado da Cruz, da 11ª Vara Criminal de Pernambuco, determinou a derrubada das redes sociais e a prisão do jornalista Ricardo Antunes, por descumprimento de decisão judicial para retirar do ar denúncia contra promotor do Ministério Público do estado.

A defesa de Antunes afirma que o jornalista é vítima de censura e questiona a legalidade da ação da juíza. Processado por injúria e difamação, ele está na Espanha e espera um habeas corpus contra o mandado de prisão para retornar ao Brasil.

"A exclusão de publicação de matéria jornalística representa censura absolutamente proibida pela Constituição", diz nota publicada em seu blog. "A prisão preventiva, assim como a exclusão de matéria jornalística, são inconstitucionais, ilegais e merecem ser revogadas."

O alvo da ação é reportagem sobre a aquisição de terreno na ilha de Fernando de Noronha pelo promotor Flávio Falcão. A Justiça havia determinado a retirada de qualquer reportagem ou menção ao caso do site e das redes sociais do jornalista.

Em decisão desta sexta-feira (26), a juíza diz que foram encontradas referências ao caso em um story do Instagram e na conta de YouTube do jornalista. A defesa de Antunes disse que cumpriu a determinação, retirando todo o histórico de reportagens das redes sociais.

"Alegou ainda que houve um equívoco por parte da equipe que cuida das redes sociais do jornalista, ora acusado, restando apenas uma chamada em artigos antigos de stories", escreveu a juíza. "Por fim, aduziu que os stories antigos também já foram baixados."

Ainda assim, a juíza decidiu decretar a prisão preventiva de Antunes, alegando que "o acusado possui histórico de ofensas à lei penal, e, em liberdade, encontraria os mesmos estímulos relacionados com a infração cometida".

"Apesar dos delitos descritos na denúncia serem classificados como de menor potencial ofensivo, o somatório das penas, abstratamente consideradas, nos moldes da capitulação ofertada, ultrapassa 4 (quatro) anos, não havendo óbice para o prolação da custódia preventiva", reforçou.

Como argumento, diz ainda que o jornalista deixou de comparecer a audiência sobre o caso alegando estar fora do país sem acesso confiável à internet, mas realizou no mesmo dia uma live em suas redes sociais.

"Desta feita, diante do comportamento evasivo do acusado que demonstra claramente desrespeito ao ordenamento jurídico pátrio não resta outro caminho a não ser a prolação de um decreto constritivo em seu desfavor", afirmou.

Na nota publicada em seu blog, o jornalista diz que "as decisões proferidas nos autos foram efetivamente cumpridas" e que o fato de não haver comparecido a audiência não é motivo para a prisão.

"Não sendo ouvido em juízo, despojou-se de um direito, visto que o interrogatório é peça de defesa. Por mais grave que seja o suposto crime, não é possível a aplicação de pena, por antecipação, sem julgamento formal, garantidos o contraditório e a plena defesa", defende o texto.

Em sua decisão, a juíza cita entendimentos do STF (Supremo Tribunal Federal) no inquérito das fake news, liderado pelo ministro Alexandre de Moraes.

Um dos trechos citados diz que "a liberdade de expressão é consagrada constitucionalmente e balizada pelo binômio liberdade e responsabilidade, ou seja, o exercício desse direito não pode ser utilizado como verdadeiro escudo protetivo para a prática de atividades ilícitas".

 

•        Desembargador suspende punição a promotor acusado de violar 101 vezes protetivas da ex

 

A Corregedoria do Ministério Público do Paraná informou na quinta-feira, 25, a suspensão de decisão que puniu o promotor Bruno Vagaes pelo descumprimento de medidas protetivas de urgência concedidas a sua ex-mulher Fernanda Barbieri, no bojo de processo por violência doméstica. A suspensão foi determinada pelo Órgão Especial do Tribunal de Justiça do Paraná, a pedido do promotor.

A reportagem entrou em contato com a defesa do promotor. O espaço está aberto para manifestações.

Em julho de 2023, o promotor foi afastado por ordem do Conselho Nacional do Ministério Público até a conclusão de processos disciplinares instaurados na Corregedoria-Geral do Ministério Público do Paraná sobre a conduta do promotor. À época, o Conselhão determinou que o órgão do Estado deveria prestar informações sobre o andamento de todos os julgamentos sobre Vagaes.

Assim, os detalhes sobre a suspensão da punição imposta a Vagaes foram encaminhados ontem ao CNMP. O documento cita despacho assinado no início de abril pelo desembargador Paulo Cezar Bellio. Ele suspendeu os efeitos de decisão do Órgão Especial do Colégio de Procuradores de Justiça que negou um recurso lá impetrado por Vagaes e manteve a sanção de disponibilidade com subsídio proporcional ao promotor.

A punição contestada pelo promotor lhe foi imposta em setembro do ano passado, pelo Conselho Superior do Ministério Público do Paraná, em razão do descumprimento de medidas protetivas entre 1º de março a 28 de abril de 2020. Hoje, a ex-mulher de Vagaes – que acusou o promotor de agressões físicas, verbais, psicológicas e sexuais – mora no exterior.

Quando o promotor foi sancionado, o Ministério Público do Paraná lembrou que ele já havia recebido duas sanções disciplinares e já havia sido condenado criminalmente. O caso também chegou à Comissão Interamericana de Direitos Humanos. A pena imposta a Vagaes é a segunda sanção mais grave que pode ser aplicada a um integrante do MP. Ela implica no afastamento do promotor com vencimentos proporcionais.

Vagaes chegou a recorrer duas vezes da decisão, internamente. Ajuizou contestações no Conselho Superior do MPPR e também no Órgão Especial do Colégio de Procuradores do Ministério Público do Paraná. Ambos negaram os pedidos do promotor, sendo a decisão mais recente proferida em março, pelo colégio de procuradores.

No último dia 2 a decisão que puniu o promotor transitou em julgado – se tornou definitiva – e a punição foi lançada no sistema do CNMP. No dia seguinte, o desembargador Paulo Cezar Bellio atendeu o apelo de Vagaes e suspendeu a decisão do Colégio de Procuradores até que a Corte julgue o mandado de segurança lá impetrado pelo promotor.

O principal ponto de contestação da defesa de Vagaes é o voto do procurador Francisco Gmyterco, que se manifestou contra o recurso do promotor no Colégio de Procuradores. Os advogados contestam tal voto em razão de o procurador ter se declarado suspeito para ser relator do processo administrativo disciplinar de Vagaes. Além de Gmyterco, outros três procuradores se declararam impedidos para relatar o PAD do promotor.

O placar do julgamento no Colégio de Procuradores do MPPR foi de 14 a 13, contra Vagaes. Nessa linha, segundo os advogados de Vagaes, uma eventual anulação do voto de Gmyterco levaria a um placar de 13 a 13 e o consequente acolhimento do pedido da defesa do promotor e a reversão da punição a ele aplicada.

O argumento foi acolhido pelo desembargador Paulo Cezar Bellio, que considerou que a participação de um membro ‘impedido’ indica possível ilegalidade da decisão. O magistrado destacou, por exemplo, que a não participação do procurador teria potencial de mudar o voto da votação. Ainda de acordo com o relator, procuradores que integram o colegiado do MP chegaram a propor a declaração de nulidade do julgamento, mas tal entendimento restou vencido.

 

Fonte: Por Caio de Freitas Paes, da Agencia Pública/FolhaPress

 

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