Quase 30% das crianças e dos adolescentes
sentem dor em músculos, ossos e ligamentos, aponta estudo
Cerca de 27% das
crianças e adolescentes brasileiros sofrem com dores sem causa específica em
ossos, ligamentos e músculos – a chamada dor musculoesquelética –, de acordo
com estudo publicado recentemente no Brazilian Journal of Physical Therapy.
Além de contribuir para desmistificar o problema, que, segundo os autores, é
frequentemente subestimado por pais e profissionais da saúde, conhecer sua
extensão permite planejar melhor os gastos com dor crônica em adultos,
considerada a principal causa de incapacidade em todo o mundo.
No Brasil, o
Ministério da Saúde estima que mais de 35% dos brasileiros com mais de 50 anos
sofram de dor crônica. No ano passado, inclusive, foi sancionada a lei
14.705/23, que determina as diretrizes para o atendimento desses pacientes pelo
Sistema Único de Saúde (SUS).
Embora grande parte
dos fatores de risco para a condição sejam pouco conhecidos, um dos mais bem
estabelecidos é o histórico de dor prévia – com relatos na literatura
científica sobre seu aparecimento na adolescência.
“Ainda assim, ao redor
do mundo, há poucos estudos sobre a prevalência de dor musculoesquelética entre
jovens, com dados incertos, variando de 4% a 40%, porque não utilizam conceitos
padronizados”, afirma Tiê Parma Yamato, pesquisadora associada da Universidade
Cidade de São Paulo (Unicid) e da Universidade de Sydney (Austrália) que
coordenou a investigação.
“No Brasil, esse
número parece variar de 20% a 45% de acordo com estudos prévios, porém, a
grande maioria dos trabalhos investigou condições musculoesqueléticas
específicas, não considerou o impacto da dor nas atividades de vida diária das
crianças e adolescentes e foi realizada em cidades de pequeno porte.”
Na pesquisa coordenada
por Yamato, que recebeu financiamento da Fapesp por meio de três projetos,
2.688 crianças e adolescentes com idade média de 12 anos, provenientes de 28
escolas públicas e privadas dos Estados do Ceará (cidade de Fortaleza) e de São
Paulo (cidades de Itu, Salto, São Sebastião e São Paulo), responderam a um
questionário com perguntas sobre a ocorrência de dor no corpo capaz de causar
impacto em sua vida cotidiana, como faltar na escola e/ou impedir a realização
de atividades do dia a dia e/ou esportivas.
Entre esses jovens,
728 (27,1%) relataram ter sentido dor musculoesquelética incapacitante nos 30
dias anteriores. As costas foram a parte do corpo mais citada, por 51,8% dos
entrevistados, seguida pelas pernas (41,9%) e pelo pescoço (20,7%).
“Ao mesmo tempo que
trazem um alerta para essa condição de saúde nas crianças e adolescentes, que
no momento não conta com um protocolo de tratamento específico no sistema de
saúde, esses números já nos estimulam a olhar para o futuro: precisaremos cuidar
da população jovem também se quisermos diminuir a dor crônica nos adultos.”
O trabalho trouxe
ainda outros dados importantes sobre as características das crianças que mais
sentiam dor: eram mais velhas (final da adolescência), mantinham pior
relacionamento com a família, apresentavam mais sintomas negativos
psicossomáticos, tinham menos qualidade de vida (também avaliada por
questionários) e pareciam gastar mais tempo assistindo televisão e jogando
videogame. “Mas vale lembrar que não observamos relação de causa nesse estudo”,
diz Yamato.
• O mito da dor do crescimento
Além da participação
das crianças no estudo, seus pais também preencheram um formulário sobre a
condição de saúde dos filhos e sua percepção sobre esse tipo de dor.
“A literatura mostra
que os pais tendem a subestimar as queixas das crianças possivelmente por não
possuírem um entendimento claro do que é dor na infância e nós confirmamos que
isso ocorre em 17% dos casos”, relata Yamato.
Um dos fatores que
podem explicar essa atitude e também camuflar, de certa forma, a dor
musculoesquelética é a crença na popular “dor do crescimento”, que se refere a
um possível incômodo das crianças nos membros, especialmente inferiores.
“Crescemos com esse conceito, mas, hoje, na literatura científica, não há
nenhum estudo que consiga provar que o crescimento cause de fato dor.”
De acordo com a
pesquisadora, se o seu filho relatar dor, é importante ter a consciência de que
ela pode trazer impactos, mas que também há formas de abordá-la – a maior parte
das medidas é baseada em atividade física. “Não há motivo para preocupação excessiva,
mas é importante conhecer a condição, validar o sintoma e possivelmente buscar
ajuda para aqueles que têm suas vidas impactadas pela condição. Lembrando
sempre que se trata de um problema comum.”
Um estudo seguinte
conduzido pelo mesmo grupo, cujos resultados devem ser divulgados em breve,
acompanhou essas crianças por um ano e meio para entender a duração da dor e
também seu impacto financeiro no sistema de saúde.
Fonte: Agencia Estado
Nenhum comentário:
Postar um comentário