quarta-feira, 28 de fevereiro de 2024

Obsolescência programada: por que o modelo ONU — e seu Conselho de Segurança — não funcionam mais?

Há um monumento em Genebra, na Suíça, que representa uma cadeira quebrada gigante, localizado do outro lado da rua onde se encontra o principal órgão de direito e cooperação internacional, as Nações Unidas. A perna que falta nessa cadeira reflete o poder destrutivo das minas terrestres, mas poderia muito bem simbolizar o estado da própria ONU.

Parece bastante claro para qualquer observador mais atento que, nos últimos tempos, o modelo ONU não está sendo eficiente para cumprir a principal função para a qual foi criado, a saber, prevenir conflitos e evitar a eclosão de guerras pelo mundo. Como organização, todo o ecossistema da ONU é mantido por um orçamento enorme no valor de cerca de US$ 50 bilhões (R$ 246,7 bilhões) anuais. As contribuições financeiras para a instituição, por sua vez, são calculadas de acordo com o PIB de cada país. Os Estados Unidos são o maior contribuinte, seguidos por China, Japão, Alemanha, Grã-Bretanha e assim por diante.

No entanto, apesar das tentativas bem-intencionadas ao longo dos anos por parte das grandes potências, as Nações Unidas não têm conseguido reformar seu estatuto, nem se adequar às realidades de nossos novos tempos. E esses novos tempos trouxeram mudanças significativas para as relações internacionais. O mundo mudou de uma ordem bipolar a partir da década de 1940 para uma ordem unipolar nos anos 1990 e agora apresenta-se como uma ordem multipolar de Estados.

No entanto, as Nações Unidas permanecem presas em seus velhos hábitos. Hoje, quando as pessoas se perguntam se a ONU ainda é adequada para a realização de seus objetivos, muitos direcionam seus olhares para o Conselho de Segurança. Este é, talvez, o órgão mais disfuncional da organização na atualidade. O Conselho de Segurança originalmente foi concebido para ser o órgão mais poderoso da ONU, capaz de impor sanções e aprovar resoluções juridicamente vinculantes para todos os demais membros da organização.

Se o pior acontecesse em alguma parte do globo, o Conselho poderia aprovar o envio dos famosos "capacetes azuis" para atuação em missões de paz e de estabilização de conflitos. Durante a Guerra dos Seis Dias (em 1967) e a Guerra do Kuwait (em 1990), os cinco membros permanentes do Conselho de Segurança conseguiram chegar a um consenso e chancelar medidas para conter os efeitos negativos dessas conflagrações armadas no Oriente Médio.

Infelizmente, porém, na maioria das vezes chegar a um consenso dentro do Conselho torna-se uma tarefa árdua e praticamente impossível. Afinal, o uso do veto pelos membros permanentes é constantemente aplicado para proteger seus interesses nacionais em detrimento dos interesses da comunidade internacional. Em 1982, por exemplo, a Grã-Bretanha vetou resoluções referentes às reivindicações da Argentina sobre as ilhas Malvinas, enquanto a França, em décadas anteriores, vetou diversas resoluções que versavam sobre suas colônias na África. Essa prática, vale frisar, continua até os dias de hoje. A China costuma vetar qualquer resolução relacionada ao Tibete, a Taiwan e a suas minorias étnico-religiosas no oeste do país. Enquanto isso, os Estados Unidos frequentemente vetam decisões relativas a Israel, em especial no período recente de acirramento do conflito em Gaza. A Rússia, por outro lado, é o país que mais usou o direito ao veto durante toda a história do Conselho de Segurança, em especial com relação a decisões que versavam sobre o espaço pós-soviético ou mesmo sobre a Síria a partir de 2011.

Assim sendo, no âmbito do Conselho de Segurança os interesses particulares das grandes potências — bem como suas ideologias políticas distintas — criam uma situação quase intransponível para a resolução de conflitos graves, como é o caso das conflagrações hoje testemunhadas no Leste Europeu e em Gaza. Nesse ínterim, a Rússia e a China tendem a adotar um entendimento similar a respeito dos principais problemas de nossa época, enquanto os Estados Unidos, a Grã-Bretanha e a França frequentemente formam uma frente única do outro lado do Conselho, o que parece simbolizar mais uma vez a divisão geopolítica do mundo entre Ocidente e Oriente.

Não à toa, nos últimos tempos o Conselho de Segurança falhou em tomar medidas referentes a Ucrânia, Israel, Iêmen, Síria e Sudão, e inúmeros outros conflitos em vista da oposição de um ou mais membros, que usaram o poder de veto para deter ações que viessem a contrariar seus interesses nacionais. É devido a isso que grupos como o BRICS advogam desde 2009 uma reforma do Conselho, de forma que ele possa operar com maior eficiência e representatividade perante a comunidade internacional. Afinal, toda a composição do Conselho de Segurança data do final da Segunda Guerra Mundial, uma época em que os cinco membros permanentes estavam do mesmo lado, o lado vencedor, da história. Algumas das potências regionais e globais de hoje nem sequer faziam parte dos cálculos políticos sistêmicos naquele período.

Países que ganharam bastante notoriedade desde então, como Japão, Brasil e Índia, não têm um lugar de destaque dentro do Conselho, formando — em meados dos anos 2000 — o G4 para brigar justamente por maior participação nos processos de tomada de decisão das Nações Unidas. Não obstante, continentes e regiões como a África, a América do Sul e mesmo o Oriente Médio também se veem sub-representados na organização.

Considerando essa flagrante e desigual distribuição de poder no âmbito da ONU, o Conselho de Segurança faria muito bem se atendesse aos clamores pela reforma defendida por grande parte das potências emergentes de nosso tempo. Claro, isso por si só não resolveria instantaneamente todos os problemas com os quais a ONU e o mundo se defrontam hoje, mas reduziria bastante o contraste e a assimetria de poder existente entre as grandes potências (que hoje têm cadeira permanente no Conselho) e as potências regionais, que brigam por maior reconhecimento no sistema. Afinal, se nenhuma mudança for introduzida e a ONU continuar fora de contato com a ordem mundial contemporânea, mais e mais nações optarão por contornar os seus mecanismos decisórios, gerando ainda mais instabilidade internacional.

É por isso que os conflitos armados têm regressado de forma bastante clara durante os últimos anos, tendência essa tornada possível devido justamente ao estado disfuncional do Conselho de Segurança, assim como da própria ONU. Em última análise, é preciso entender que subir em direção ao topo da escada do poder faz parte da ordem natural das coisas. Aqueles que estão embaixo olham para cima com aspirações de ascender. Aqueles que estão no meio se esforçam para chegar ao cume. Por fim, aqueles que estão no topo resistem em dividir sua liderança.

 

Ø  Analista: 'postura' de Macron sobre OTAN na Ucrânia geraria 'conflito em grande escala' com a Rússia

 

As recentes observações do presidente francês, Emmanuel Macron, sobre não descartar o envio de tropas do Ocidente ao conflito na Ucrânia desencadearam uma enxurrada de alertas sobre os perigos que esse tipo de retórica pode gerar. Um funcionário da Casa Branca teria negado quaisquer planos de enviar tropas dos EUA ou da OTAN para a Ucrânia.

A declaração beligerante de Emmanuel Macron sobre a possibilidade de enviar tropas da Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN) para a Ucrânia é "principalmente uma postura", disse à Sputnik o ex-político do setor de defesa e chefe de gabinete dos Democratas Suecos, Mikael Valtersson.

No entanto, "mesmo a postura pode assumir vida própria e iniciar um processo perigoso em uma ladeira escorregadia", alertou. O especialista sugeriu que o presidente francês estava usando "a paralisia dentro do sistema político dos EUA em relação ao apoio à Ucrânia" para tentar substituir a América do Norte como principal potência pró-Kiev na União Europeia (UE).

"A OTAN está parcialmente incapacitada, especialmente no que diz respeito à Ucrânia […]. As nações de segundo nível tentam agora preencher o espaço vazio criado", disse Valtersson.

"Uma vez que a OTAN está fora de questão porque funciona apenas como uma organização defensiva, e qualquer nação pode vetar decisões, e a UE não tem militares, deve haver países que individualmente participariam. Macron provavelmente se refere aos países que assinaram recentemente tratados de segurança com a Ucrânia, por exemplo França, Reino Unido, Alemanha, Itália, etc. Países do leste e do norte da Europa", acrescentou.

"Mesmo que essa sugestão seja provavelmente uma postura, ela abre uma porta para falar sobre o envolvimento militar direto do Ocidente na Ucrânia", alertou o ex-oficial das Forças Armadas/Defesa Aérea sueca.

O resultado poderia ser "uma declaração de guerra de fato" e, potencialmente, "um conflito militar em grande escala entre a Rússia e vários países europeus".

Enquanto Paris acolheu uma reunião de cerca de 20 líderes europeus para discutir a situação na Ucrânia nesta terça-feira (27), Emmanuel Macron escolheu fazer algumas declarações que provocaram arrepios na espinha de muitos políticos no seu próprio país.

"Estamos convencidos de que a derrota da Rússia é indispensável para a segurança e a estabilidade na Europa", disse Macron aos jornalistas. "Não há consenso hoje para enviar tropas oficiais e endossadas para o terreno. Mas em termos de dinâmica, nada pode ser descartado", afirmou o presidente.

Flexionando os músculos de papel

As recentes observações "pseudomarciais" de Emmanuel Macron sobre "não descartar" o envio de tropas ocidentais para lutar na Ucrânia não podem ser levadas a sério, disse à Sputnik o ex-coronel do Grupo de Trabalho das Forças Especiais Francesas sob o comando da OTAN no Kosovo Jacques Hogard.

A "megalomania" do presidente francês parece estar superando a razão, disse Hogard, que se questionou sobre se o líder francês estaria "enlouquecendo!". Macron deve estar ciente de que é um "fim de jogo" para as Forças Armadas de Zelensky, apesar de terem sido apoiadas pela OTAN e, em particular, por "certos países da Europa Ocidental vassalos dos Estados Unidos", sublinhou Hogard.

Mesmo que o líder francês tenha a ilusão de que está "exibindo os seus músculos", eles são os de "um fantoche de papel", acrescentou o especialista.

Quando se trata de enviar tropas "aliadas" para a Ucrânia, "Macron está sonhando", sublinhou Hogard, que serviu por 26 anos no Exército francês como oficial aerotransportado da Legião Estrangeira e das Forças Especiais.

Segundo ele, o fato ocorreu, em primeiro lugar, porque "os EUA e a OTAN não querem entrar abertamente na guerra, preferindo agir através de representantes". Em segundo lugar, "os governos europeus estão extremamente divididos nesta questão" e "a unidade da UE é, na realidade, apenas uma ilusão".

Além disso, "o Exército francês é hoje um exército 'modelo', adequado para intervenções militares ocasionais, mas totalmente subdimensionado em termos de pessoal, equipamento e munições para embarcar em uma aventura de guerra de alta intensidade".

 

Ø  Rússia está pronta para oferecer apoio a aliados latino-americanos, diz Conselho de Segurança russo

 

Conselho de Segurança da Rússia garante apoio à segurança de aliados latino-americanos e ressalta combate a interferência externa e garantia da soberania.

O secretário do Conselho de Segurança da Rússia, Nikolai Patrushev, realizou consultas de segurança com representantes de Nicarágua, Cuba, Venezuela e Bolívia em Manágua, na Nicarágua, e transmitiu a prontidão de Moscou para fornecer apoio abrangente aos seus aliados latino-americanos.

As partes trocaram opiniões sobre questões de segurança regional. "Medidas para combater a interferência externa nos assuntos internos dos Estados soberanos foram discutidas em detalhe", disse o comunicado emitido, nesta terça-feira (27), pelo Conselho de Segurança da Rússia.

"Da nossa parte, estamos prontos a prestar todo o apoio possível e abrangente aos nossos amigos latino-americanos. É necessário reforçar a nossa coordenação nas plataformas internacionais, para estarmos ombro a ombro pela igualdade soberana dos Estados, pelo Estado de Direito, pela indivisibilidade da segurança, a inadmissibilidade de interferência nos assuntos internos e para se opor à pressão de sanções ilegais", disse Patrushev.

Patrushev acrescentou ainda que os Estados Unidos aumentarão a pressão sobre vários países latino-americanos que não satisfazem Washington com as suas políticas independentes.

 

Fonte: Sputnik Brasil

 

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