Obsolescência programada: por que o modelo
ONU — e seu Conselho de Segurança — não funcionam mais?
Há um monumento em
Genebra, na Suíça, que representa uma cadeira quebrada gigante, localizado do
outro lado da rua onde se encontra o principal órgão de direito e cooperação
internacional, as Nações Unidas. A perna que falta nessa cadeira reflete o
poder destrutivo das minas terrestres, mas poderia muito bem simbolizar o
estado da própria ONU.
Parece bastante claro
para qualquer observador mais atento que, nos últimos tempos, o modelo ONU não
está sendo eficiente para cumprir a principal função para a qual foi criado, a
saber, prevenir conflitos e evitar a eclosão de guerras pelo mundo. Como organização,
todo o ecossistema da ONU é mantido por um orçamento enorme no valor de cerca
de US$ 50 bilhões (R$ 246,7 bilhões) anuais. As contribuições financeiras para
a instituição, por sua vez, são calculadas de acordo com o PIB de cada país. Os
Estados Unidos são o maior contribuinte, seguidos por China, Japão, Alemanha,
Grã-Bretanha e assim por diante.
No entanto, apesar das
tentativas bem-intencionadas ao longo dos anos por parte das grandes potências,
as Nações Unidas não têm conseguido reformar seu estatuto, nem se adequar às
realidades de nossos novos tempos. E esses novos tempos trouxeram mudanças
significativas para as relações internacionais. O mundo mudou de uma ordem
bipolar a partir da década de 1940 para uma ordem unipolar nos anos 1990 e
agora apresenta-se como uma ordem multipolar de Estados.
No entanto, as Nações
Unidas permanecem presas em seus velhos hábitos. Hoje, quando as pessoas se
perguntam se a ONU ainda é adequada para a realização de seus objetivos, muitos
direcionam seus olhares para o Conselho de Segurança. Este é, talvez, o órgão
mais disfuncional da organização na atualidade. O Conselho de Segurança
originalmente foi concebido para ser o órgão mais poderoso da ONU, capaz de
impor sanções e aprovar resoluções juridicamente vinculantes para todos os
demais membros da organização.
Se o pior acontecesse
em alguma parte do globo, o Conselho poderia aprovar o envio dos famosos
"capacetes azuis" para atuação em missões de paz e de estabilização
de conflitos. Durante a Guerra dos Seis Dias (em 1967) e a Guerra do Kuwait (em
1990), os cinco membros permanentes do Conselho de Segurança conseguiram chegar
a um consenso e chancelar medidas para conter os efeitos negativos dessas
conflagrações armadas no Oriente Médio.
Infelizmente, porém,
na maioria das vezes chegar a um consenso dentro do Conselho torna-se uma
tarefa árdua e praticamente impossível. Afinal, o uso do veto pelos membros
permanentes é constantemente aplicado para proteger seus interesses nacionais
em detrimento dos interesses da comunidade internacional. Em 1982, por exemplo,
a Grã-Bretanha vetou resoluções referentes às reivindicações da Argentina sobre
as ilhas Malvinas, enquanto a França, em décadas anteriores, vetou diversas
resoluções que versavam sobre suas colônias na África. Essa prática, vale
frisar, continua até os dias de hoje. A China costuma vetar qualquer resolução
relacionada ao Tibete, a Taiwan e a suas minorias étnico-religiosas no oeste do
país. Enquanto isso, os Estados Unidos frequentemente vetam decisões relativas
a Israel, em especial no período recente de acirramento do conflito em Gaza. A
Rússia, por outro lado, é o país que mais usou o direito ao veto durante toda a
história do Conselho de Segurança, em especial com relação a decisões que
versavam sobre o espaço pós-soviético ou mesmo sobre a Síria a partir de 2011.
Assim sendo, no âmbito
do Conselho de Segurança os interesses particulares das grandes potências — bem
como suas ideologias políticas distintas — criam uma situação quase
intransponível para a resolução de conflitos graves, como é o caso das
conflagrações hoje testemunhadas no Leste Europeu e em Gaza. Nesse ínterim, a
Rússia e a China tendem a adotar um entendimento similar a respeito dos
principais problemas de nossa época, enquanto os Estados Unidos, a Grã-Bretanha
e a França frequentemente formam uma frente única do outro lado do Conselho, o
que parece simbolizar mais uma vez a divisão geopolítica do mundo entre
Ocidente e Oriente.
Não à toa, nos últimos
tempos o Conselho de Segurança falhou em tomar medidas referentes a Ucrânia,
Israel, Iêmen, Síria e Sudão, e inúmeros outros conflitos em vista da oposição
de um ou mais membros, que usaram o poder de veto para deter ações que viessem
a contrariar seus interesses nacionais. É devido a isso que grupos como o BRICS
advogam desde 2009 uma reforma do Conselho, de forma que ele possa operar com
maior eficiência e representatividade perante a comunidade internacional.
Afinal, toda a composição do Conselho de Segurança data do final da Segunda
Guerra Mundial, uma época em que os cinco membros permanentes estavam do mesmo
lado, o lado vencedor, da história. Algumas das potências regionais e globais
de hoje nem sequer faziam parte dos cálculos políticos sistêmicos naquele
período.
Países que ganharam
bastante notoriedade desde então, como Japão, Brasil e Índia, não têm um lugar
de destaque dentro do Conselho, formando — em meados dos anos 2000 — o G4 para
brigar justamente por maior participação nos processos de tomada de decisão das
Nações Unidas. Não obstante, continentes e regiões como a África, a América do
Sul e mesmo o Oriente Médio também se veem sub-representados na organização.
Considerando essa
flagrante e desigual distribuição de poder no âmbito da ONU, o Conselho de
Segurança faria muito bem se atendesse aos clamores pela reforma defendida por
grande parte das potências emergentes de nosso tempo. Claro, isso por si só não
resolveria instantaneamente todos os problemas com os quais a ONU e o mundo se
defrontam hoje, mas reduziria bastante o contraste e a assimetria de poder
existente entre as grandes potências (que hoje têm cadeira permanente no
Conselho) e as potências regionais, que brigam por maior reconhecimento no
sistema. Afinal, se nenhuma mudança for introduzida e a ONU continuar fora de
contato com a ordem mundial contemporânea, mais e mais nações optarão por
contornar os seus mecanismos decisórios, gerando ainda mais instabilidade
internacional.
É por isso que os
conflitos armados têm regressado de forma bastante clara durante os últimos
anos, tendência essa tornada possível devido justamente ao estado disfuncional
do Conselho de Segurança, assim como da própria ONU. Em última análise, é
preciso entender que subir em direção ao topo da escada do poder faz parte da
ordem natural das coisas. Aqueles que estão embaixo olham para cima com
aspirações de ascender. Aqueles que estão no meio se esforçam para chegar ao
cume. Por fim, aqueles que estão no topo resistem em dividir sua liderança.
Ø
Analista: 'postura' de Macron sobre OTAN na
Ucrânia geraria 'conflito em grande escala' com a Rússia
As recentes
observações do presidente francês, Emmanuel Macron, sobre não descartar o envio
de tropas do Ocidente ao conflito na Ucrânia desencadearam uma enxurrada de
alertas sobre os perigos que esse tipo de retórica pode gerar. Um funcionário
da Casa Branca teria negado quaisquer planos de enviar tropas dos EUA ou da
OTAN para a Ucrânia.
A declaração
beligerante de Emmanuel Macron sobre a possibilidade de enviar tropas da
Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN) para a Ucrânia é
"principalmente uma postura", disse à Sputnik o ex-político do setor
de defesa e chefe de gabinete dos Democratas Suecos, Mikael Valtersson.
No entanto,
"mesmo a postura pode assumir vida própria e iniciar um processo perigoso
em uma ladeira escorregadia", alertou. O especialista sugeriu que o
presidente francês estava usando "a paralisia dentro do sistema político
dos EUA em relação ao apoio à Ucrânia" para tentar substituir a América do
Norte como principal potência pró-Kiev na União Europeia (UE).
"A OTAN está
parcialmente incapacitada, especialmente no que diz respeito à Ucrânia […]. As
nações de segundo nível tentam agora preencher o espaço vazio criado",
disse Valtersson.
"Uma vez que a
OTAN está fora de questão porque funciona apenas como uma organização
defensiva, e qualquer nação pode vetar decisões, e a UE não tem militares, deve
haver países que individualmente participariam. Macron provavelmente se refere
aos países que assinaram recentemente tratados de segurança com a Ucrânia, por
exemplo França, Reino Unido, Alemanha, Itália, etc. Países do leste e do norte
da Europa", acrescentou.
"Mesmo que essa
sugestão seja provavelmente uma postura, ela abre uma porta para falar sobre o
envolvimento militar direto do Ocidente na Ucrânia", alertou o ex-oficial
das Forças Armadas/Defesa Aérea sueca.
O resultado poderia
ser "uma declaração de guerra de fato" e, potencialmente, "um
conflito militar em grande escala entre a Rússia e vários países
europeus".
Enquanto Paris acolheu
uma reunião de cerca de 20 líderes europeus para discutir a situação na Ucrânia
nesta terça-feira (27), Emmanuel Macron escolheu fazer algumas declarações que
provocaram arrepios na espinha de muitos políticos no seu próprio país.
"Estamos
convencidos de que a derrota da Rússia é indispensável para a segurança e a
estabilidade na Europa", disse Macron aos jornalistas. "Não há
consenso hoje para enviar tropas oficiais e endossadas para o terreno. Mas em
termos de dinâmica, nada pode ser descartado", afirmou o presidente.
Flexionando os
músculos de papel
As recentes
observações "pseudomarciais" de Emmanuel Macron sobre "não
descartar" o envio de tropas ocidentais para lutar na Ucrânia não podem
ser levadas a sério, disse à Sputnik o ex-coronel do Grupo de Trabalho das
Forças Especiais Francesas sob o comando da OTAN no Kosovo Jacques Hogard.
A
"megalomania" do presidente francês parece estar superando a razão,
disse Hogard, que se questionou sobre se o líder francês estaria
"enlouquecendo!". Macron deve estar ciente de que é um "fim de
jogo" para as Forças Armadas de Zelensky, apesar de terem sido apoiadas
pela OTAN e, em particular, por "certos países da Europa Ocidental
vassalos dos Estados Unidos", sublinhou Hogard.
Mesmo que o líder
francês tenha a ilusão de que está "exibindo os seus músculos", eles
são os de "um fantoche de papel", acrescentou o especialista.
Quando se trata de
enviar tropas "aliadas" para a Ucrânia, "Macron está
sonhando", sublinhou Hogard, que serviu por 26 anos no Exército francês
como oficial aerotransportado da Legião Estrangeira e das Forças Especiais.
Segundo ele, o fato
ocorreu, em primeiro lugar, porque "os EUA e a OTAN não querem entrar
abertamente na guerra, preferindo agir através de representantes". Em
segundo lugar, "os governos europeus estão extremamente divididos nesta
questão" e "a unidade da UE é, na realidade, apenas uma ilusão".
Além disso, "o
Exército francês é hoje um exército 'modelo', adequado para intervenções
militares ocasionais, mas totalmente subdimensionado em termos de pessoal,
equipamento e munições para embarcar em uma aventura de guerra de alta
intensidade".
Ø
Rússia está pronta para oferecer apoio a
aliados latino-americanos, diz Conselho de Segurança russo
Conselho de Segurança
da Rússia garante apoio à segurança de aliados latino-americanos e ressalta
combate a interferência externa e garantia da soberania.
O secretário do
Conselho de Segurança da Rússia, Nikolai Patrushev, realizou consultas de
segurança com representantes de Nicarágua, Cuba, Venezuela e Bolívia em
Manágua, na Nicarágua, e transmitiu a prontidão de Moscou para fornecer apoio
abrangente aos seus aliados latino-americanos.
As partes trocaram
opiniões sobre questões de segurança regional. "Medidas para combater a
interferência externa nos assuntos internos dos Estados soberanos foram
discutidas em detalhe", disse o comunicado emitido, nesta terça-feira
(27), pelo Conselho de Segurança da Rússia.
"Da nossa parte,
estamos prontos a prestar todo o apoio possível e abrangente aos nossos amigos
latino-americanos. É necessário reforçar a nossa coordenação nas plataformas
internacionais, para estarmos ombro a ombro pela igualdade soberana dos Estados,
pelo Estado de Direito, pela indivisibilidade da segurança, a inadmissibilidade
de interferência nos assuntos internos e para se opor à pressão de sanções
ilegais", disse Patrushev.
Patrushev acrescentou
ainda que os Estados Unidos aumentarão a pressão sobre vários países
latino-americanos que não satisfazem Washington com as suas políticas
independentes.
Fonte: Sputnik Brasil
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