Ato pró-Bolsonaro: ex-presidente usa
imagens para se contrapor a números, diz pesquisador
O ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) usa imagens de multidões de apoiadores para tentar
contradizer resultados da eleição ou de institutos de pesquisa, diz o professor
de Gestão de Políticas Públicas da Universidade de São Paulo (USP) Pablo
Ortellado.
Durante ato em São Paulo no domingo (25/2), Bolsonaro disse: "Essa fotografia vai rodar o mundo,
tenho certeza disso".
Depois, compartilhou
em rede social imagens aéreas de seus apoiadores, vestidos principalmente de
amarelo, na avenida Paulista.
"Bolsonaro usa as
imagens de multidão para se contrapor aos números — seja da eleição, seja dos
institutos de pesquisa —, porque a tese dele é de que as eleições foram
fraudadas, e ele não tem evidência nenhuma de fraude", diz Ortellado à BBC
News Brasil.
"A evidência que
ele tem é o que ele chama de 'Datapovo', falando 'eu levo multidões para as
ruas'. Ele leva multidões às ruas, só que essas multidões não são numerosas o
suficiente para contradizer os números das urnas ou os números levantados pelos
institutos de pesquisas de opinião sobre voto", afirma.
"Por exemplo, 185
mil pessoas (presentes no domingo), ainda que fossem todas da Grande São Paulo,
não dá 2% dos eleitores (a cidade de São Paulo tem mais de 9,3 milhões de eleitores). Não prova que ele teria vencido as eleições."
O Monitor do Debate
Político Digital da USP, grupo de pesquisa que Ortellado coordena, apontou a
presença de 185 mil pessoas em ato na Avenida Paulista.
O levantamento foi
feito com imagens aéreas do local, analisadas por meio de um programa que
identifica cabeças e estima a quantidade de pessoas. A margem de erro é de 12%
para mais ou para menos.
A Secretaria de
Segurança Pública de São Paulo diz que estimou público de
"aproximadamente" 600 mil pessoas na Avenida Paulista e 750 mil
pessoas "quando levado em conta o público presente nas ruas
adjacentes".
O protesto convocado
por Bolsonaro reuniu políticos e milhares de manifestantes em meio ao avanço
das investigações da Polícia Federal sobre um suposto plano de golpe de Estado
depois da eleição de Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
Como comparação, a
mesma metodologia utilizada pelo grupo de pesquisa da USP apontou a presença de
5,6 mil pessoas em ato contra indicação de Flávio Dino ao STF, em dezembro de
2023.
No ato de 7 de
setembro de 2022, na Praia de Copacabana, no Rio, foram 64,6 mil pessoas.
Ortellado considera
que "serviu de mobilização" para o ato mais recente o fato de
apoiadores do ex-presidente estarem "se sentindo perseguidos
politicamente", além de a manifestação ter sido convocada pelo próprio
Bolsonaro — e não apenas por apoiadores dele, como ocorreu em outros eventos.
Outro fator que
explica o nível de presença no domingo, segundo Ortellado, é que o ato foi
concentrado na cidade de São Paulo — em vez de ocorrer em diversas cidades ao
mesmo tempo.
Play video,
"Protesto de Bolsonaro na avenida Paulista: manifestantes citam suas
motivações", Duration 11,18
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'Custo político'
Para Ortellado,
"o objetivo dessa manifestação é aumentar o custo político da prisão"
de Bolsonaro.
O professor da USP considera
que "essa manifestação é bastante análoga ao ato que o presidente Lula
convocou em frente ao Sindicato dos Metalúrgicos em São Bernardo (SP), no ABC,
um pouco antes da prisão" em 2018.
Ortellado ressalva que
"guardadas todas as diferenças de contexto e das acusações, acho que elas
tiveram o mesmo propósito político".
"Tem custo
político a justiça decretar a prisão de um presidente muito popular, mobiliza
muita gente. E do mesmo jeito que o Lula fez aquela foto, o Bolsonaro fez a
foto dele — com várias diferenças de contexto, do que significava a prisão do
Lula."
No início de
fevereiro, o ex-presidente Bolsonaro — além de militares de alta patente,
ex-ministros e ex-assessores do governo dele — foram alvo de operação da Polícia Federal que investiga
"tentativa de golpe de Estado e
abolição do Estado Democrático de Direito" nos períodos que antecederam e
se seguiram às eleições presidenciais de 2022, em uma tentativa de garantir a
"manutenção do então presidente da República (Jair Bolsonaro) no
poder".
No domingo, do alto de
um trio elétrico, Bolsonaro negou que tenha havido uma tentativa de golpe de
Estado e defendeu que agiu dentro dos limites da Constituição.
"Continuam me
acusando de um golpe, porque tem uma minuta de um decreto de estado de defesa.
Golpe usando a Constituição? Tenha santa paciência", disse Bolsonaro em
seu discurso, que durou 22 minutos.
De acordo com
investigações da PF, Bolsonaro teria se envolvido na confecção de uma minuta de
decreto com medidas que impediriam a posse de Lula para mantê-lo no poder.
Ø
Ataque de Malafaia ao STF incomoda aliados
moderados de Bolsonaro, dizem fontes
Os ataques do pastor
evangélico Silas Malafaia ao Supremo Tribunal Federal (STF) desagradaram os
aliados mais moderados do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).
“É preciso deixar
claro, bem claro, absolutamente claro, que o povo foi à Paulista para ver e
ouvir o presidente Bolsonaro. Qualquer outra palavra na grande festa da
democracia que não seja dele, são palavras, mas não dele. Bolsonaro só um”,
escreveu nas redes sociais o senador Ciro Nogueira (PP-PI).
Ex-ministro de
Bolsonaro e atual presidente do PP, Nogueira não se refere diretamente a
Malafaia, mas, conforme apurou a CNN, o recado era para ele. A avaliação
desse entorno moderado é que a fala de Malafaia foi desnecessária e fora de
contexto.
De todos os que
discursaram, Malafaia foi o único que atacou o STF. Ele acusou, por exemplo, o
ministro Alexandre de Moraes de “esconder” vídeos do 8/1 que supostamente
demonstrariam que o governo Lula sabia dos ataques.
Vídeos do evento na
Paulista também mostram o governador de São Paulo, Tarcisio de Freitas
(Republicanos), incomodado durante a fala de Malafaia, conversando com
Bolsonaro. Em sua intervenção, Tarcisio afirmou que a manifestação era “a favor
do Estado Democrático de Direito”.
Procurado
pela CNN, Malafaia afirmou que “protegeu” o STF no início da sua fala e
que só citou “fatos”.
“Só frouxo para não
gostar do que eu falei. Eu não ataquei o STF, só falei fatos. Qual foi a
acusação mentirosa que eu fiz? Conversa!”, afirmou o pastor.
O ato foi convocado
após Bolsonaro se tornar alvo das investigações da Polícia Federal por uma
suposta trama de golpe de Estado.
Ø
Para fontes do governo, investigações da PF
não perdem força após ato pró-Bolsonaro
Auxiliares do
presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) avaliam que o ato na Paulista não
deve tirar forças das investigações da Polícia Federal (PF) sobre a suposta
tentativa de golpe de Estado.
Eles reconhecem que o
ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) mostrou sua capacidade de mobilização
política, mas reforçam que a PF já mostrou ter evidências da existência de uma
trama golpista.
Fontes no Judiciário
afirmam que as suspeitas sobre Bolsonaro evoluíram de apenas uma “imputação
ideológica”, que inspirasse o 8/1, para um “envolvimento material” depois do
surgimento da minuta do golpe, de reuniões com os chefes militares e da de
mensagens de auxiliares.
Também existe uma
avaliação no Planalto de que falta ao movimento do ato propostas concretas ao
país, e que o único interesse é defender Bolsonaro.
Ø
Flávio Bolsonaro revela que manifestação
foi feita para livrar seu pai da cadeia
O ex-presidente Jair
Bolsonaro afirmou neste domingo ser vítima de "abuso da parte de
alguns" e rejeitou envolvimento em uma tentativa de golpe de Estado, ao
discursar para multidão de apoiadores em um ato que lotou a Avenida Paulista e
foi apontado por ele como uma "fotografia para o mundo" em sua
defesa.
Em fala de cerca de 25
minutos a milhares de apoiadores, Bolsonaro negou participação na suposta trama
golpista sob investigação do Supremo Tribunal Federal (STF) e pela Polícia
Federal, alegando que a derrubada de um governo se faz com tanques e armas e
que não se toma esse tipo de atitude extrema usando a Constituição – que ele
alega jamais ter descumprido.
"O que é golpe? É
tanque na rua, é arma, é conspiração, é trazer classes empresariais para seu
lado, nada disso foi feito no Brasil. Nada disso eu fiz, e continuam me
acusando por golpe", disse.
"Golpe usando a
Constituição? Deixo claro que Estado de Sítio começa com o presidente da
República convocando os Conselhos da República e da Defesa. Apesar de não ser
golpe o Estado de Sítio, não foi convocado ninguém dos conselhos da república e
da defesa", emendou ele, usando uma argumentação legalista.
A PF investiga
Bolsonaro por supostamente articular, mesmo antes de perder a disputa
presidencial em 2022, medidas para impedir a posse do eleito Luiz Inácio Lula
da Silva ao cargo ou derrubá-lo do poder posteriormente, com os ataques às
sedes dos Três Poderes no 8 de janeiro.
Em seu discurso,
Bolsonaro disse que "sempre" foi perseguido mesmo antes de chegar à
Presidência e, embora não tenha citado o STF, afirmou que não tem havido
respeito ao Estado Democrático de Direito.
"É lamentável o
que vem acontecendo o abuso por parte de alguns que traz insegurança para todos
nós", disse.
Bolsonaro aproveitou a
fala para exaltar sua passagem pela Presidência, em busca de demonstrar força
política em meio ao avanço das investigações contra ele.
"Estou muito
orgulhoso e grato por terem aceito esse convite. Para termos uma fotografia
para o Brasil e para o mundo, do que é garra, a determinação do povo
brasileiro", disse.
"Mostramos, com
essa fotografia, que nós até podemos ver um time de futebol sem torcida ser
campeão, mas não conseguimos entender como existe um presidente sem o povo ao
seu lado."
Antes dele, o
organizador do evento, o pastor Silas Malafaia, criticou o ministro do STF
Alexandre de Moraes, responsável pelas principais investigações contra o
ex-presidente, e disse que há em curso uma "engenharia do mal" para
prender Bolsonaro.
"Se eles te
prenderem, não vai ser para a sua destruição, será para a destruição
deles", disse Malafaia, chamando o ex-presidente de o maior perseguido
político da história brasileira.
TARCÍSIO
DE SURPRESA
Outra surpresa no
evento foi o discurso do governador paulista e ex-ministro de Bolsonaro,
Tarcísio de Freitas (Republicanos), em desagravo ao ex-presidente. Bolsonaro
hospedou-se no Palácio dos Bandeirantes, sede do governo estadual, antes de
participar do ato.
"Você não é mais
uma pessoa, um CPF, você representa um movimento", disse ele, que não
estava previsto para falar.
Com Bolsonaro
inelegível até 2030, Tarcísio é apontado como um potencial candidato à sucessão
em 2026, assim como a ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro, que fez um discurso
em defesa do marido com forte tom religioso.
ANISTIA
À multidão que lotou a
Paulista, Bolsonaro disse que quer buscar a pacificação, passar uma
"borracha no passado" para buscar uma maneira para viver em paz. Ele
defendeu a concessão de uma anistia pelo Congresso Nacional a quem chamou de
"pobres coitados" que estão presos por envolvimento nos ataques do 8
de janeiro e considerou exageradas as punições aos já condenados pelos atos.
O Supremo já condenou
86 pessoas pelos ataques por crimes como golpe de Estado e abolição do Estado
Democrático de Direito, com penas que chegaram a 17 anos de prisão.
"Quem por ventura
depredou patrimônio e nós não concordamos com isso, que pague, mas essas penas
fogem ao mínimo da razoabilidade", queixou-se.
Embora tenha defendido
a anistia a outros, Bolsonaro, também poderia eventualmente se beneficiar de um
projeto de lei de anistia aprovado pelo Congresso. Parlamentares bolsonaristas
já chegaram a apresentar uma proposta nesse sentido em favor dele.
Fonte: BBC News
Brasil/CNN Brasil/Brasil 247
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