Antropólogos propõem incluir povo indígena
em debate sobre bioeconomia
O estudo Bioeconomia
indígena: saberes ancestrais e tecnologias sociais, destaca que a bioeconomia,
embora tenha chegado há pouco tempo no Brasil, já era praticada há milhares de
anos pelos povos originários do país e deve destacar o protagonismo indígena
nas discussões sobre esse tema.
A publicação, lançada
em Brasília nesta semana, foi produzida pelos antropólogos indígenas Braulina
Baniwa e Francisco Apurinã, ou Yumuniry, em colaboração com o instituto de
pesquisa WRI Brasil, faz parte do World Resources Institute.
Segundo Braulina, a
pesquisa foi construída em conjunto com lideranças indígenas da Amazônia. O
objetivo é trazer a diversidade de entendimento sobre o que significa economia
para os povos indígenas. Para esse trabalho, foi considerado o conhecimento das
mulheres do povo Baniwa. “E tudo que é escrito nesse lugar, a partir das
grafias, é nossa ciência”.
“O desafio para a
academia ainda é demarcar nossos processos, enquanto povos indígenas, a partir
do nosso entendimento. Muitas pessoas fora da Amazônia falam da Amazônia. Mas
nunca saberão o que de fato é ser da Amazônia. Nós também nos desafiamos a ocupar
esses lugares para trazer as nossas realidades”, disse a antropóloga.
Braulina afirmou que
os povos indígenas têm a sua economia, que precisa de valorização,
reconhecimento, a partir do lugar ocupado por esses povos.
“Precisamos superar a
palavra povos indígenas participam e dizer povos indígenas também produzem e
colaboram para construir uma economia a partir do entendimento deles. Acho que
esse é o grande desafio. É uma alegria poder mostrar a tecnologia social, mostrar
que as mulheres têm esse conhecimento e suas ciências, que precisam de
valorização”.
• Ciência milenar
Brasulina afirmou que
a bioeconomia é apenas um conceito dos não indígenas para falar dos
conhecimentos indígenas. “Então, precisamos trazer nossos conceitos para esse
lugar”. Ela disse que não se deve esquecer que as mulheres indígenas, por
várias gerações, têm assegurado que são produtoras de uma ciência milenar, que
precisa ser valorizada e fortalecida para que esse conhecimento não se perca.
O antropólogo
Francisco Apurinã, por sua vez, enfatizou que não existe bioeconomia indígena
dissociada dos territórios, que são constituídos por vários ecossistemas,
protegidos por guardiões e seres que ali habitam.
“Não tem como falar
sobre bioeconomia, educação, saúde, sem dissociar dos territórios. Para nós, o
que existe é um diálogo entre todos os territórios e todos os seres, e os povos
indígenas são mais um componente”.
Apurinã disse que por
não entender o alcance da ciência indígena, todas as ações feitas dentro dos
territórios indígenas sem a sua participação não vão dar certo, porque “tudo
tem de ser construído a partir da participação dos povos indígenas”. Indicou que
a partir do momento em que os órgãos fazedores de leis olharem e respeitarem as
leis que existem nos mais de 300 povos indígenas no Brasil, talvez tenham algo
mais próximo da realidade.
• Sustentabilidade
Braulina lembrou que é
necessário que os pesquisadores indígenas tenham a oportunidade de defender não
só a Amazônia, mas os povos de todos os territórios no Brasil, de todos os
biomas, e que todos no país saibam que os pesquisadores e mulheres indígenas
produzem ciência e fazem parte do processo de sustentabilidade.
Segundo Apurinã, as
primeiras pessoas a perceber mudanças na região foram os indígenas, os povos
originários, os seringueiros. Para ele, as mudanças climáticas e do meio
ambiente são um problema planetário. “E a gente precisa encontrar o remédio
para curar essa doença”. Se não existir mais floresta, não haverá mais vida,
sinalizou.
“Os cientistas não
indígenas devem aprender com os indígenas, apesar destes serem tão
marginalizados historicamente no país. A ciência branca tem falhado nas
soluções propostas e deve aproveitar o conhecimento dos povos indígenas de
todos os biomas do Brasil”, disse diretor do WRI, Rafael Barbieri.
A conclusão é que o
conceito de bioeconomia tem sido debatido por diferentes setores da sociedade
brasileira sem dar, entretanto, a devida importância e espaço para os povos
originários, que são profundos conhecedores desse tema. Para os povos
indígenas, o conceito de bioeconomia se confunde com o conceito indígena de
economia. “Garantir o fortalecimento da bioeconomia por meio do conhecimento
ancestral indígena é o mesmo que garantir o manejo, a manutenção e
sustentabilidade da natureza ou daquilo que se convencionou chamar de meio
ambiente e biodiversidade”, ressalta Apurinã.
O estudo indica também
que, ao contrário da lógica capitalista, que via o lucro, a economia indígena
se baseia na produção sustentável, em harmonia com a natureza e com base na
garantia do bem viver da coletividade.
Fonte: Agencia Brasil
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