Ato bolsonarista serve de alerta para Lula:
ou muda ou há grande risco à reeleição
Se a Justiça Eleitoral
resolvesse marcar novas eleições presidenciais para daqui a 15 dias e os
candidatos fossem Lula e Bolsonaro, o resultado seria absolutamente incerto. Há
menos de dois anos ambos se enfrentaram e Lula por uma margem mínima conseguiu
a vitória. Uma diferença de menos de dois pontos percentuais, algo ínfimo para
um País que tem mais de 156 milhões de eleitores aptos a votar. Nesse
sentido, a manifestação deste domingo, 25, sem uma bandeira muito clara, mas
com o objetivo de ser um desagravo ao ex-presidente, mostrou de maneira
substancial que a força mobilizacional do bolsonarismo segue intacta e que essa
porção da sociedade brasileira continuará garantindo vida às pretensões
políticas de Jair Bolsonaro, independentemente de qualquer coisa.
Com esse eleitorado
fixado na oposição e sem qualquer mostra de desmembração, Lula não pode perder
quem garantiu a ele a vitória em 2022. Dois grupos fundamentais que estão sob
ameaça de dispersão, em função de um governo que tem sido menos amplo do que a
propaganda eleitoral garantia e entregado muito menos resultado prático do que
se esperava. O primeiro deles foi uma classe A/B1, que temeu a ameaça de uma
tirania bolsonarista, caso o ex-presidente fosse eleito. O segundo, mais
numeroso, a chamada classe C2, que pode ser alcunhada de swing vote brasileiro
e tem mostrado níveis de insatisfação com o cômputo econômico e de serviços
essenciais.
Lula se escorou na
construção de uma frente democrática para enfrentar a ameaça que representaria
o bolsonarismo. Houve uma parcela considerável da população nas classes mais
altas, que, por medo do que seria o resultado de um segundo governo Bolsonaro, acabou
votando em Lula. Isso se expressa em algumas lideranças políticas, que foram
grandes opositoras ao petismo, durante seus governos anteriores e que
declararam voto em Lula. João Amoêdo, Roberto Freire, José Serra, Fernando
Henrique Cardoso, são alguns desses exemplos. Lula venceu Bolsonaro em zonais
da região mais rica da capital paulista, por exemplo. Na Vila Mariana, o atual
mandatário ganhou por 54 x 46. Em Perdizes, outra região de alta concentração
de classe A/B1, mais uma vitória – 56 x 44. Esses bairros, no primeiro turno
tinham mostrado grande força da terceira via, tendo Simone Tebet desempenhado
grande votação.
Já no governo, Lula
tem tomado posições que desagradam a parte desse eleitorado que lhe foi
fundamental para a vitória. Ao flertar com o grupo terrorista Hamas e atacar
Israel de maneira absolutamente despropositada, fazendo comparações com um dos
períodos mais sombrios da história da humanidade, sofrido justamente pelo povo
judeu, o Holocausto, Lula se mostra muito menos amplo e aberto ao diálogo do
que se propôs durante o pleito eleitoral.
• Tarcísio é o favorito dos apoiadores de
Bolsonaro para disputar a Presidência
A maioria dos manifestantes que foram neste
domingo à Avenida Paulista expressar apoio a Jair Bolsonaro defende que, caso o
ex-presidente não esteja apto a disputar as eleições de 2026, o governador de
São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), deve ser o nome do bolsonarismo
na disputa presidencial.
Segundo pesquisa do
Monitor do Debate Político no Meio Digital, da Escola de Artes, Ciências e
Humanidades (EACH) da USP, 61% dos bolsonaristas que estiveram na Paulista
apoiam que o ex-ministro tente trocar o Palácio dos Bandeirantes pelo Planalto.
Tarcísio acompanhou Bolsonaro no trio elétrico onde o ex-presidente discursou.
Bolsonaro está inelegível por força de duas decisões do Tribunal Superior
Eleitoral (TSE), ambas por abuso de poder político.
A
ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro foi citada por 19% dos apoiadores do
ex-presidente como candidata ideal à Presidência em 2026. Michelle chorou ao
discursar neste domingo e reclamou do que chamou de “ataques e injustiças”
contra seu marido.
Também presente ao ato
na Paulista, o governador de Minas Gerais, Romeu Zema (Novo), foi escolhido por
7% dos entrevistados como melhor representante do bolsonarismo para 2026.
Marcaram 1% das menções cada um dos seguintes nomes: Eduardo Bolsonaro, Damares
Alves, Flávio Bolsonaro, e general Braga Netto. Foram 6% os que disseram não
saber e 3% declararam que nenhum desses nomes é o ideal para substituir
Bolsonaro nas urnas.
Lula precisa entender que Bolsonaro move
multidões e está dividindo o país. Por Eliane Cantanhêde
O ato deste domingo na
Avenida Paulista confirma o que todos sabiam: o ex-presidente Jair Bolsonaro
tem base popular, move multidões e divide o País ao meio, como já mostraram os
votos de 2022. Isso, porém, não muda a realidade e as investigações da Polícia
Federal e da Justiça contra Bolsonaro, seus generais, minutas de intervenção no
TSE, anúncio de Estado de Sítio e a longa preparação de um golpe, que,
frustrado, virou a invasão e depredação das sedes dos Três Poderes.
Compareceram ao ato de
domingo os governadores da linha de frente do bolsonarismo, como Tarcísio de
Freitas, anfitrião, Ronaldo Caiado, de Goiás, Jorginho Mello, de Santa
Catarina, e Romeu Zema, de Minas Gerais. Ok. O passado diz bastante do que eles
foram fazer lá e o futuro dirá se a presença valeu a pena. No final das contas,
a história colocará tudo isso em contexto.
PAÍS DIVIDIDO
O Brasil estava e
continua dividido, logo, nada muda com a nova demonstração de força popular de
Bolsonaro, que repetiu as grandes aglomerações de carreatas, motociatas e
passeatas na própria Paulista. Por maiores que tenham sido, não refletiam a
maioria da população, tanto que ele perdeu em 2022 e se tornou o primeiro
presidente derrotado na disputa pela reeleição.
De toda forma, a forte
adesão é um recado para o governo Lula, o PT e os antibolsonaristas em geral,
de esquerda, centro e direita. Bolsonaro pode ser o que é, pode ter feito tudo
o que fez de mal, antes, durante e depois da pandemia, mas o bolsonarismo paira
sobre o País, preparando-se para inverter o prato da balança e voltar ao poder.
Isso aumenta a
responsabilidade de Lula, que precisa fortalecer suas ações e melhorar seus
resultados em áreas em que Bolsonaro foi uma tragédia, como ambiente, defesa
dos povos originários, saúde, educação, política externa.
Não basta ter
ministros e gestores incomparavelmente melhores, Lula tem de mostrar os efeitos
em fatos, números e declarações certas, na hora certa.
Bolsonaro chegou até
onde chegou com palanques e grandes multidões País afora, mas também apoiado
por uma máquina de discursos, realidades paralelas, desqualificação de
adversários. Se Lula apresentar resultados expressivos, isso fica mais difícil.
Com resultados que deixam a desejar, por exemplo, no desmatamento e nas terras
Yanomami, Bolsonaro nada de costas.
O principal efeito do
ato na Paulista – sem os cartazes e faixas golpistas – foi jogar luzes num fato
real: apesar de tudo o que todos sabemos e com Bolsonaro candidato ou não, o
Brasil continua dividido ao meio e o bolsonarismo está vivo. O centro? O gato
comeu.
Lula evita falar sobre ato de Bolsonaro,
e jornalista é vaiada após pergunta
O presidente Lula (PT)
evitou comentar nesta segunda-feira (26) o ato promovido no dia anterior pelo
ex-mandatário Jair Bolsonaro (PL), que reuniu milhares de pessoas na avenida
Paulista, em São Paulo.
O petista foi
questionado diretamente sobre o assunto durante um evento no Palácio do
Planalto, mas optou por não responder. A jornalista que realizou a pergunta
acabou vaiada por militantes de movimentos sociais presentes.
Ministros do governo
buscaram minimizar a quantidade de pessoas presente no ato. Rui Costa (Casa
Civil) afirmou que a única surpresa foi a confissão em praça pública de crimes
praticados, em referência à fala de Bolsonaro sobre a minuta do golpe.
Lula participou na
manhã desta segunda-feira de uma entrevista a jornalistas, no Palácio do
Planalto, para a apresentação de um programa para dar uso social a imóveis
abandonados da União, com a ministra Esther Dweck (Gestão e da Inovação em
Serviços Públicos).
Após a fala inicial do
mandatário e da ministra, foi aberto espaço para perguntas. No entanto, a Secom
(Secretaria de Comunicação Social da Presidência) informou que as perguntas
seriam destinadas apenas para Esther Dweck e para o ministro da Casa Civil, Rui
Costa.
Uma jornalista
aproveitou a presença de Lula ao lado dos ministros e então questionou sobre o
ato promovido por Bolsonaro após ter realizado
perguntas para os ministros também. Ela foi vaiada por militantes que estavam presentes no
evento.
Os ministros então
responderam as respectivas perguntas e o questionamento endereçado a Lula
acabou ignorado. Pouco depois, o presidente deixou o evento, antes de seu
término.
A reportagem não pôde
participar da entrevista. A Secom apenas permitiu a participação na entrevista
de jornalistas da área que haviam sido previamente convidados e não aceitou a
substituição dos nomes previamente definidos pela secretaria por outros indicados
pelo jornal.
Após o evento, o
ministro Rui Costa foi questionado sobre o assunto e afirmou que a única grande
surpresa relacionada com os atos foi a suposta confissão de que havia uma trama
golpista para manter Bolsonaro no poder.
Ele ainda acrescentou
que o ato teve menos gente do que o esperado pelos organizadores.
"Nenhuma surpresa
[com a quantidade de pessoas], foi muito aquém do que os próprios organizadores
estavam divulgando que teria de presença. Surpresa nenhuma. A surpresa se
refere apenas ao conteúdo da confissão dos crimes praticados", afirmou o
ministro.
"É o que todos,
não só nós, acho que o Brasil inteiro, ficaram surpresos de você [...] talvez
seja a primeira vez na história que pessoas que cometeram atos criminosos chama
um evento em praça pública e na multidão confessam o crime e vão além disso,
pedem perdão, anistia, pelos crimes cometidos. É alto talvez para ficar
registrado na história do Brasil", completou.
O ministro depois
voltou a falar da participação nos atos e creditou a líderes religiosos a
quantidade de pessoas que compareceu à avenida Paulista.
"Todos conhecem e
sabem que o país ainda se encontra em um grau de polarização grande e de
pregação do ódio e, eventualmente, onde setores religiosos são mobilizados por
seus líderes religiosos para pedir anistia a crimes cometidos", afirmou.
Já Paulo Pimenta
(Secom) apenas disse que não iria comentar o ato, porque não era do governo e
nem de seu partido. E depois ironizou a questão, afirmando que assistiu a jogos
de futebol no domingo e não se informou sobre a manifestação.
"Quem tem que
fazer avaliação é eles. Não temos que fazer avaliação dos atos", afirmou o
ministro.
"Só sei que os
vermelhos ganharam tudo ontem. O Liverpool ganhou, o Inter ganhou, o Flamengo
ganhou. Só deu vermelho ontem", completou.
Neste domingo (25),
Bolsonaro reuniu governadores, parlamentares e milhares de apoiadores em um ato
na avenida Paulista. A manifestação de força acontece justamente no momento em
que avançam as investigações contra Bolsonaro e seus aliados a respeito de uma
trama golpista para mantê-lo no poder.
Acuado pelas
investigações, Bolsonaro buscou maneirar um pouco no tom de sua fala. Não
desferiu a sua tradicional agressividade contra o STF (Supremo Tribunal
Federal), falou em pacificação, disse que as eleições presidenciais de 2022
eram "página virada da nossa história" e pediu anistia aos presos
pelo ataque golpista de 8 de janeiro de 2023.
O ex-presidente também
negou a existência de uma trama golpista.
"O que é golpe? É
tanque na rua, é arma, conspiração. Nada disso foi feito no Brasil",
disse. "Agora o golpe é porque tem uma minuta do decreto de estado de
defesa. Golpe usando a Constituição? Tenha paciência", afirmou o
ex-presidente diante de seus apoiadores.
Moraes não comenta ato na Paulista, mas
diz que o país conseguiu evitar a ditadura
O ministro Alexandre
de Moraes, do STF (Supremo Tribunal Federal), citou nesta segunda-feira
(26.fev.2024) uma série da Netflix sobre ditadores para criticar ataques às
instituições democráticas no Brasil. Ele não citou nomes, mas a declaração foi
feita um dia depois do ato do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) em São Paulo.
Segundo o ministro, o país conseguiu resistir às investidas extremistas e
fortaleceu sua democracia.
Em um evento da
Faculdade de Direito da USP (Universidade de São Paulo), Moraes afirmou que o
país “não pode baixar a guarda” para o autoritarismo.
“Há um documentário na
Netflix, o ‘Manual do Ditador’ [referindo-se à série ‘Como Se Tornar um
Tirano’]. Eles não são nem criativos. Em alguns países, os extremistas quando
chegam ao poder atacam os pilares da Democracia”, disse Moraes.
ACENDER O ALERTA
Segundo o ministro, o
que fazem os líderes autoritários é atacar a imprensa livre ao espalhar
notícias falsas, colocam em dúvida a credibilidade do sistema eleitoral e
tentam impedir a independência dos Poderes. Em seu pronunciamento, Moraes
aproveitou para exaltar o trabalho da Justiça Eleitoral. O presidente do TSE
(Tribunal Superior Eleitoral) declarou ser necessário acender o alerta para
fortalecer a democracia.
“E foi o que foi feito
no Brasil: um ataque frontal. E em outros países onde o Judiciário também
resistiu. Por que no Brasil isso foi mais sentido? Porque no Brasil existe a
Justiça Eleitoral”, disse.
“É o Poder Judiciário,
por meio da Justiça Eleitoral, que organiza, realiza, administra e julga as
eleições. Então, o inimigo do segundo e do terceiro pilares que levam à
Democracia para o populismo extremista, no Brasil, eram o mesmo. E os canhões
foram direcionados para isso.”
SÉRIE NA TV
Embora exista um livro
chamado “Manual do Ditador” (“The Dictator’s Handbook”, publicado em 2011), o
ministro se referia a uma série da Netflix lançada em 2021.
Com apenas uma
temporada, a série é produzida pelo ator norte-americano Peter Dinklage, famoso
por “Game Of Thrones”.
Cada episódio da série
documental mostra as técnicas utilizadas por ditadores ao longo da história
para enfraquecer a democracia e erradicar seus inimigos. Dentre os ditadores
que aparecem na série estão Adolf Hitler, Saddam Hussein, Josef Stalin, Muammar
Gaddafi e Kim Jong-un.
Fonte: Estadão
Conteúdo/O Globo/FolhaPress/Poder 360
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