quarta-feira, 28 de fevereiro de 2024

Brasil na Caricom: Lula vai à cúpula se mostrar como alternativa aos EUA, dizem analistas

Focado na agenda interna do país, o presidente Lula encerrará as viagens internacionais comparecendo a eventos que focam o Caribe, a América do Sul e Central. Ouvidos pela Sputnik Brasil, analistas apontam que sua presença nesses encontros reafirma o desejo de maior integração regional e de neutralizar a influência dos Estados Unidos na região.

No quarta-feira (28), o presidente brasileiro, Luiz Inácio Lula da Silva, chega a Georgetown, capital da Guiana, para a cúpula da Comunidade do Caribe (Caricom). Depois, na sexta-feira (1º), Lula vai ao encontro da Comunidade de Estados Latino-Americanos e Caribenhos (CELAC) em São Vicente e Granadinas.

O peso político que o Brasil terá nesses eventos foi discutido pelos jornalistas Melina Saad e Marcelo Castilho, apresentadores do Mundioka, podcast da Sputnik Brasil, com dois especialistas.

·        Foco na integração regional

Em meio a eleições municipais neste ano, Lula afirmou que vai focar em viagens nacionais, o que faz de sua aparição nesses encontros regionais um forte indicativo de suas prioridades, afirma Carolina Pedroso, professora de relações internacionais na Universidade Federal de São Paulo (Unifesp).

Nos dois primeiros mandatos de Lula, lembra a especialista, sua estratégia internacional teve como ênfase aumentar e fortalecer os laços com a América Latina. "No sentido de tornar o Brasil uma liderança da região e, consequentemente, aumentar a nossa importância em termos globais."

A opinião é compartilhada por Guilherme Frizzera, doutor em relações internacionais pela Universidade de Brasília (UnB) e coordenador de relações internacionais do Centro Universitário Internacional (Uninter). "Desde o início do primeiro governo, Lula sempre tentou aproximar a América do Sul e depois a América Latina da região do Caribe", afirmou.

"O Brasil, historicamente pelo seu peso na economia, na política, por sua participação no ambiente internacional, […] é um líder nato da América Latina", disse Frizzera.

·        Qual a força política do Caribe?

Um dos pontos de se aproximar da região, apontam os especialistas, está na sua força política enquanto bloco. A região tem tendência em articular seus votos nos fóruns em que esses países fazem parte, como a Assembleia Geral das Nações Unidas (AGNU) e a Organização dos Estados Americanos (OEA), em que possuem 40% das cadeiras.

"O Brasil tem uma agenda importante de democratização do sistema ONU [Organização das Nações Unidas]", lembrou Pedroso, e um apoio quase majoritário como esse em questões da região "pode ser um respaldo importante para as iniciativas brasileiras".

Em seus mandatos, Lula tem tentado reformar os instrumentos de governança global, como o Conselho de Segurança das Nações Unidas (CSNU), de modo que ele não fique mais refém das decisões de cinco potências.

"Esse respaldo dos países caribenhos é sempre um ativo político importante para a diplomacia brasileira em relação a esses temas mais amplos."

O CSNU, argumenta Frizzera, "não está oferecendo respostas" aos conflitos atuais, uma vez que basta o veto de um dos cinco membros permanentes para as propostas serem bloqueadas.

Nesse sentido, é como se Lula estivesse dizendo: "É uma instituição que tem princípios, regras e procedimentos muito bonitos", descreveu Frizzera, "mas que não respondem mais aos conflitos geopolíticos existentes, e a gente precisa buscar uma alternativa".

·        Lula deve mediar questão de Essequibo

Participando como convidado especial da Caricom, Lula deve se encontrar com o presidente da Guiana, Irfaan Ali, para discussões bilaterais. No dia seguinte, durante a reunião da CELAC, o presidente brasileiro se encontrará com o presidente venezuelano, Nicolás Maduro.

Segundo os especialistas ouvidos, a questão de Essequibo certamente será um tema nas conversas de Lula com os líderes. O tamanho e o peso político do Brasil o tornam um "mediador natural" de conflitos na América do Sul, segundo Frizzera.

Procurado por ambos os líderes para mediar o conflito, aponta Pedroso, o Itamaraty tem a tradição de sempre buscar uma solução pacífica, respeitando os atores presentes. Até porque "essas crises que acontecem ao nosso redor de alguma maneira sempre repercutem em nós".

"Então é importante que o Brasil se coloque como responsável como mediação desses conflitos porque nós temos por um lado expertise […]. E, por outro, temos interesse real em que as coisas se resolvam pacificamente."

"A gente não tem como fugir dos nossos vizinhos", reforçou o especialista.

·        Brasil quer substituir EUA no Caribe

O Caribe, apontaram os analistas, funciona há séculos como um laboratório de imperialismo dos Estados Unidos. "Os Estados Unidos sempre foram um ator que interviu no processo político e, principalmente, econômico do Caribe", afirmou Frizzera.

Até hoje eles mantêm Porto Rico como uma colônia e detêm controle da baía de Guantánamo em Cuba, onde também aplicam sanções econômicas. "Suas primeiras ações imperialistas foram ali no Caribe e, depois, foram se ampliando", explicou Pedroso. "Então o Caribe não é uma região desprezível para os Estados Unidos."

"Por que Cuba é tão importante para os Estados Unidos? Porque Cuba até hoje continua a ser uma pedra no sapato para a diplomacia norte-americana", analisou Pedroso.

É exatamente por essa importância que os Estados Unidos dão ao Caribe que a região é tão dependente deles, avalia a professora da Unifesp. "Eles têm muita dificuldade de conseguir outras parcerias porque o peso que os Estados Unidos dão àquela região é muito grande."

A aproximação brasileira pode, assim, servir como outro polo de poder multilateral para onde essas nações podem se voltar. Um que, como afirmaram os analistas, respeite as decisões domésticas dos países.

"Esse é um papel que, a curto prazo, até médio prazo, dificilmente alguém vai substituir", disse Frizzera, destacando que outro polo que se aproxima da região é a China.

Para o professor de relações internacionais, ao menos por enquanto, o Brasil pode ser esse segundo polo de influência regional no Caribe, logo atrás dos Estados Unidos.

De acordo com Frizzera, isso pode ser feito por meio de projetos de financiamento de infraestrutura, como foi feito em Cuba pelo BNDES e, também, pela determinação de que "os processos de integração regional onde o Brasil lidera", como o Mercosul, a União de Nações Sul-Americanas (Unasul) e a CELAC, passem a ter "uma presença maior do Caribe".

·        Lula chama Netanyahu de cidadão e diz que 'não esperava que Israel fosse compreender' sua declaração

Ao fazer novos comentários relacionados às suas declarações sobre o governo de Israel, o presidente disse que, ao comparar as mortes em Gaza às mortes de judeus na Segunda Guerra Mundial, não usou a palavra "holocausto", e que o termo foi parte da interpretação das autoridades israelenses.

Os comentários do presidente Luiz Inácio Lula da Silva desta terça-feira (27) fazem parte de uma entrevista concedida ao jornalista Kennedy Alencar, que ainda não foi divulgada na íntegra.

"Eu diria a mesma coisa. Porque é exatamente o que está acontecendo na Faixa de Gaza. A gente não pode ser hipócrita de achar que uma morte é diferente da outra. Você não tem na Faixa de Gaza uma guerra de um Exército altamente preparado contra outro Exército altamente preparado. Você tem uma guerra de um Exército altamente preparado contra mulheres e crianças […]. Quantas pessoas do Hamas já foram apresentadas mortas? Você inventa determinadas mentiras e passa a trabalhar como se fosse verdade. Primeiro porque eu não disse nem a palavra holocausto. Holocausto foi a interpretação do primeiro-ministro de Israel, não foi minha […]", afirmou Lula.

Seguindo suas explanações, o presidente reafirmou a posição do Brasil em condenar os ataques do Hamas, mas disse que não podia "ver o Exército de Israel fazendo com inocente a mesma barbaridade".

O petista ressaltou que desde o começo do conflito está pedindo o cessar-fogo e um corredor humanitário para a entrada de alimentos e socorro médico.

"O Brasil foi o primeiro país a condenar o gesto terrorista do Hamas. O primeiro país. Mas eu não posso condenar o gesto terrorista do Hamas e ver o Estado de Israel através do seu Exército, do seu primeiro-ministro fazendo com inocente da mesma barbaridade. Ou seja, o que nós estamos clamando: que parem os tiroteios, que se permita que se tenha a chegada de alimento, remédio, de médico, enfermeiro, para que a gente tenha um corredor humanitário e tratar das pessoas. É isso", afirmou.

Em seguida, sem citar diretamente o premiê israelense, Benjamin Netanyahu, Lula declarou que não esperava que o governo de Israel fosse "compreender" os pedidos porque "conhece o cidadão já há algum tempo" e sabe "o que ele pensa ideologicamente".

"Agora veja, eu não esperava que o governo de Israel fosse compreender. Eu não esperava. Porque eu conheço o cidadão historicamente já há algum tempo, eu sei o que ele pensa ideologicamente."

Na semana passada, Lula disse que "o que está acontecendo na Faixa de Gaza e com o povo palestino nunca aconteceu em nenhum outro momento histórico. Na verdade aconteceu: quando Hitler decidiu matar os judeus. Não é uma guerra entre soldados e soldados. É uma guerra entre um Exército altamente preparado e mulheres e crianças".

A fala do presidente teve grande repercussão, tanto dentro quanto fora do país.

Israel rejeitou a declaração, disse que Lula era persona non grata e utilizou as mídias sociais para criticar o petista. No Brasil, deputados da oposição abriram pedido de impeachment contra o presidente.

O Itamaraty, através do chanceler Mauro Vieira, afirmou que as manifestações do governo israelense foram "inaceitáveis" e "mentirosas" e convocou o embaixador brasileiro no país, Frederico Meyer, para consultas.

Vieira enfatizou a gravidade das distorções das declarações e das alegadas mentiras, descrevendo a abordagem da chancelaria israelense como uma "vergonhosa página da história da diplomacia de Israel".

No final da semana passada, Lula sustentou as declarações durante um evento no Rio de Janeiro, além de endossar a criação do Estado palestino.

De acordo com o Ministério da Saúde da Faixa de Gaza, o número de palestinos mortos chegou a 29.782. Do lado israelense, há cerca de 1.350 mortes e 250 pessoas foram sequestradas.

 

Ø  Polêmica de López Obrador com mídia norte-americana impacta campanhas presidenciais

 

A polêmica entre o presidente mexicano, Andrés Manuel López Obrador, e o veículo de imprensa norte-americano The New York Times teve um impacto nas campanhas presidenciais do país. No contexto da controvérsia, números de telefone de vários políticos e personalidades do país foram divulgados nas redes sociais.

A situação afetou diretamente as candidaturas presidenciais de Claudia Sheinbaum, do partido governista Morena, e Bertha Xóchitl Gálvez Ruiz, da coalizão opositora 'Força e Coração por México', que denunciaram que, durante o fim de semana, seus números de telefone foram divulgados nas redes sociais e, desde então, estavam congestionados.

Sheinbaum afirmou que recebeu em seu telefone pessoal "chamadas incessantes e mensagens de ódio", como a recebida por homem identificado como "José Martín", que dizia: "Não sou um robô, você não me representa. Candidata narcotraficante Claudia, ditador narcotraficante López Obrador. Se quer culpar alguém, vá ao Palácio e reclame com seu chefe".

"É óbvio o que eles querem fazer, mais uma vez seus ataques são tão grosseiros quanto inofensivos. Os números que deveriam preocupá-los são os das pesquisas", disse a candidata governista.

·        Oposição aproveita o escândalo para impulsionar campanha

Já a opositora Gálvez aproveitou o escândalo para impulsionar sua campanha eleitoral e publicou um vídeo. "Como resultado do péssimo exemplo dado pelo presidente López Obrador, muitos mais números de telefone foram divulgados com má intenção. Também vazaram meu número e, desde então, as mensagens não pararam de chegar. Se você ainda não tem, aqui está (...) decidi não mudar", comentou.

Gálvez disse que, apesar de receber mensagens criticando seu "excesso de peso" e seus "dentes tortos", não estava preocupada, pois "isso pode ser corrigido".

"O que não pode ser corrigido é o carinho das centenas de mensagens de apoio, incentivo e solidariedade que tenho recebido, e essas permanecem. Então, preocupem-se, porque isso ninguém pode parar", acrescentou.

·        Divulgação de números de políticos

Na última quinta-feira (22), o presidente López Obrador informou em coletiva de imprensa que recebeu uma solicitação "em tom ameaçador", "prepotente" e "com ultimato" da chefe de correspondentes do The New York Times no México, Natalie Kitroeff, que pedia comentários em menos de oito horas, sobre uma reportagem na qual estavam trabalhando.

O artigo revelava uma investigação já encerrada feita pelo governo dos Estados Unidos sobre um suposto financiamento do narcotráfico a López Obrador em sua campanha eleitoral de 2018, que também envolvia os filhos do presidente. Por isso, o presidente mexicano denunciou que o jornal norte-americano era um "panfleto sujo" que usava temas "falsos" para fazer publicações "enganosas".

Mas a controvérsia aumentou quando López Obrador comentou a carta enviada por Kitroeff e leu publicamente o número de telefone da jornalista, causando tumulto e reações contrárias de Washington e até de uma plataforma de vídeos que removeu a conferência de imprensa do presidente mexicano.

"Este vídeo foi removido porque viola a política do YouTube sobre assédio e 'bullying'", dizia uma mensagem nos canais oficiais de Andrés Manuel López Obrador e Governo do México.

No entanto, minutos depois, o vídeo do evento foi republicado com uma versão editada que não continha mais o trecho em que o presidente mencionava o número da jornalista.

·        Escândalo gerou reação da ONU

O escândalo gerado pela divulgação dos contatos telefônicos chegou a tal ponto que o Escritório do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos no México alertou que a proteção dos dados pessoais "é uma obrigação" que recai "especialmente" sobre aqueles que têm "uma responsabilidade pública".

"Proteger os dados pessoais é uma obrigação que deve ser observada por todos, especialmente por aqueles que detêm uma responsabilidade pública. Juntamo-nos aos apelos para não divulgar informações que prejudicam os direitos à privacidade e dignidade das pessoas", defendeu o escritório da ONU.

 

Fonte: Sputnik Brasil

 

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