sexta-feira, 24 de janeiro de 2025

Mesmo após 'indireta', partidos do Centrão com cargos no governo não garantem apoio a Lula em 2026

Depois que o presidente Lula deu uma “indireta” a partidos do Centrão com espaço na Esplanada — ao questionar na última reunião ministerial se as siglas querem “continuar trabalhando” com o governo na próxima eleição —, ministros, parlamentares e presidentes dessas siglas avaliam que ainda é cedo para cravar apoio ao governo em 2026.

O recado de Lula acontece em um momento em que partidos do Centrão cobram mais espaço na Esplanada dos Ministérios, ainda que não deem garantia de que estarão juntos para além de 2025.

Embora ocupem ministérios no governo, partidos como União Brasil (3 ministérios), PSD (3 ministérios), MDB (3 ministérios), PP (1 ministério) e Republicanos (1 ministério) se dividem entre situação e oposição e guardam nomes com interesses opostos ao do Palácio do Planalto, até mesmo em uma futura eleição presidencial.

Por exemplo, os governadores do Paraná, Ratinho Junior (PSD); de Goiás, Ronaldo Caiado (União); e de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), são todos cogitados como pré-candidatos à presidência da República.

A avaliação de ministros do Centrão é que qualquer anúncio agora seria apenas uma “carta de intenções” que pode não se cumprir lá na frente. Tudo vai depender do cenário: “Se o governo se sair forte de 2025, será mais fácil advogar internamente” no partido para que fechem com o governo em 2026, nas palavras de um ministro.

A costura futura passará tanto pela governabilidade no Congresso Nacional ao longo de 2025 quanto pelo resultado de pesquisas eleitorais e da popularidade do governo até lá, por exemplo.

“Em todos os partidos, há setores que se aliam e setores refratários. Se o partido decidir apoio sobre 2026 agora, isso estimula a fragmentação. E eu não quero levar metade do partido, nem 1/4 do partido. Quero levar o partido inteiro”, disse um ministro do Centrão.

Outro ministro afirma que “nenhum partido definirá isso agora” e que a definição vai depender de escolhas internas de cada sigla.

“Meu apoio pessoal será de Lula, mas o [apoio] partidário não depende apenas de mim”, diz este ministro, também reservadamente.

O presidente de um dos partidos com ministério na Esplanada também diz que a sigla se divide hoje em três vertentes e, por isso, não há como se comprometer com o governo.

"Hoje, não há essa definição porque tem várias correntes no partido. Tem corrente que quer apoiar a reeleição do presidente Lula, tem corrente que quer lançar candidatura própria, tem corrente que quer se juntar a um candidato de centro-direita. Vamos tomar decisão mais pra frente, sem açodamento, ouvindo a todos e seguindo o instinto democrático do partido", disse.

De oposição e com a intenção de concorrer ao Planalto em 2026, o governador de Goiás, Ronaldo Caiado, disse à Globonews que não vê espaço para apoio do União Brasil a Lula no próximo pleito.

“As decisões partidárias são deliberadas em quase totalidade na Executiva. O meu sentimento é que o União Brasil, pela quase totalidade de seus filiados e ocupantes de cargos eletivos, não tem nenhuma identidade com o governo do presidente Lula e muito menos com o PT”, afirmou, apesar da sigla ter três ministérios no governo petista.

No MDB, o governo conta com importantes aliados no Congresso Nacional, como o líder da sigla na Câmara, Isnaldo Bulhões (AL), e o senador Renan Calheiros (AL) - este último que crava que o partido estará com o presidente Lula em 2026.

Há quem diga que a vice-presidência da chapa com Lula em 2026 poderia ser oferecida ao MDB, por exemplo. O líder da sigla no Senado, Eduardo Braga (AM), já falou publicamente sobre a possibilidade. Por outro lado, o prefeito de São Paulo, Ricardo Nunes (MDB), que faz oposição ao governo, já defendeu que o partido não esteja alinhado a Lula.

Ex-ministro do governo de Jair Bolsonaro e abertamente da oposição, o presidente do PP, senador Ciro Nogueira, diz que o recado de Lula “não tem nada a ver” com o partido e que a sigla não irá apoiar o governo em 2026.

Atualmente, o PP tem um ministério na Esplanada, o dos Esportes, chefiado por André Fufuca. Ciro Nogueira já disse anteriormente que o cargo não significa apoio do partido ao governo, mas sim uma escolha da bancada do partido na Câmara dos Deputados.

Fufuca é deputado licenciado e muito próximo do ex-presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL). Sua entrada no governo foi uma tentativa de ampliar o apoio da sigla em votações no Congresso.

Na avaliação destas fontes, um componente geográfico também influencia na decisão: o partido que cravar apoio a Lula agora pode facilitar a vida dos políticos nordestinos — onde o governo Lula tem uma popularidade maior — e dificultar a dos políticos do Sul e do Sudeste, por exemplo.

·      Reforma ministerial

Além da pressão do próprio Centrão, um importante parlamentar do governo defende que é preciso redistribuir as pastas e dar mais espaço ao PP e ao Republicanos, que hoje têem apenas um ministério cada. O Republicanos ganhará uma importância ainda maior agora que deve ser o partido do próximo presidente da Câmara, Hugo Motta (PB), que já está virtualmente eleito.

Na terça-feira (21), o ministro das Relações Institucionais, Alexandre Padilha, almoçou com Hugo Motta e com o deputado licenciado do PP Ricardo Barros, no escritório de Motta em Brasília.

Segundo interlocutores do Planalto, Motta e Padilha falaram sobre os espaços do Republicanos no governo, mas foi apenas uma “primeira conversa”, sem que tenha havido uma oferta formal do governo ou um pedido do partido.

Motta teria prometido consultar a bancada do partido sobre a participação no Executivo, não necessariamente para um novo ministério, mas para avaliar a relação com o governo e a pauta convergente no Congresso. Hoje, o Republicanos tem um ministério, o de Portos e Aeroportos, comandado por Silvio Costa Filho.

Além disso, o PSD também demanda mais espaço no governo, principalmente após mágoas da bancada diante do rápido apoio que o Planalto deu a Hugo Motta na candidatura para presidência da Câmara, em detrimento do deputado Antonio Brito (PSD-BA).

A avaliação de parlamentares da sigla é que o partido na Câmara sempre foi fiel ao governo, mas não tem recebido uma resposta à altura. A bancada defende, por exemplo, uma troca de ministérios: deixar o da Pesca, que não tem tanta relevância orçamentária, pelo do Turismo.

Hoje, o Ministério do Turismo está com o União Brasil e é comandado por Celso Sabino. Mas parlamentares do PSD argumentam que a pasta guarda maior identidade com o partido.

 

¨      Eleição de consenso na Câmara dá estabilidade interna, mas não facilita a vida do governo, apontam especialistas

A eleição para a presidência da Câmara deve confirmar Hugo Motta (Republicanos-PB) na cadeira mais importante da Casa com o apoio de governistas, mas o Executivo continuará a ter problemas para tentar controlar a pauta do plenário.

A exemplo do atual presidente, Arthur Lira (PP-AL), Motta construiu um arco de alianças que engloba partidos de esquerda, centro e direita. Até agora, apenas o PSOL decidiu lançar outro candidato, e anunciou o deputado Pastor Henrique Vieira (RJ) como postulante.

Especialistas ouvidos pelo g1 afirmaram que, apesar de num primeiro momento o cenário parecer favorável ao governo, a eleição de um presidente com ampla maioria vai manter difícil a tarefa do Palácio do Planalto em emplacar suas pautas e evitar a votação de projetos “ideológicos” da direita.

“Presidentes de Câmara que são eleitos com ampla maioria impõem desafios de governabilidade. O futuro presidente da Câmara terá responsabilidade com a pauta defendida por setores da oposição, por partidos que deram sustentação ao governo Bolsonaro”, explicou o cientista político da Universidade de Brasília (UNB) Murilo Medeiros.

Lira, embora tenha colocado em votação projetos de interesse do governo Lula, como o novo arcabouço fiscal e o pacote de corte de gastos, também pautou a proposta que limitou a demarcação de terras e fragilizou os direitos dos indígenas.

Medeiros afirmou que o governo terá que “redobrar” a articulação política para fazer valer sua vontade na pauta da Câmara.

“O futuro presidente, eleito com ampla maioria, com o apoio do governo e da oposição, tende a ter maior independência na condução da agenda da Câmara dos Deputados”.

Creomar de Souza, consultor de risco político da consultoria Dharma, um presidente da Câmara eleito de forma quase unânime fortalece da Casa perante os outros poderes.

Isso, por outro lado, não favorece a influência do governo nas votações no legislativo. "Esse processo alimenta um descolamento: a Câmara vai se tornando mais robusta que a Presidência da República, mais robusta que o Senado e, em algum momento, talvez, mais robusta que a própria Câmara, se tornando o locus onde se dá a palavra final sobre uma série de temas”, disse. “O Executivo se torna um passageiro desse processo.”

Segundo ele, a força das candidaturas de consenso permite esse ganho na correlação de forças. “Muita concentração de votos em torno da figura de um presidente dá muita robustez à Câmara para um enfrentamento ao Senado Federal, como por exemplo não haver ainda um rito para a apreciação de medidas provisórias.”

Ele avalia que, nesse processo, a Câmara perde pluralidade. “Há um risco para a própria institucionalidade da Câmara, como o que gente tem visto dos procedimentos normais da Câmara serem atropelados pelo grupo que detém o poder."

<><> Base frágil

O governo tem uma base frágil na Câmara. Cerca de 130 dos 513 deputados são fiéis ao governo. Esse número, no entanto, é ainda menor a depender do texto em votação, porque o PSOL contraria orientações do governo com frequência na Casa .

Por isso, ao longo de 2023 e 2024 muitas das pautas de interesse do Executivo foram negociadas individualmente, por meio da liberação de emendas ou nomeações na Esplanada.

Foi assim, por exemplo, que Lula negociou a entrada do PP e do Republicanos, partidos do Centrão, na base do governo.

Em troca de governabilidade na Casa, o Republicanos indicou o deputado Silvio Costa Filho para o Ministério de Portos e Aeroportos, enquanto o PP emplacou o deputado André Fufuca (MA) no Esporte.

<><> Governistas

Deputados governistas e que dão sustentação à pauta do Executivo na Casa minimizaram a questão.

Para o líder do PT, Odair Cunha (MG), Motta será presidente da Casa e não da oposição ou da base.

“Ele vai garantir o funcionamento democrático, civilizado, institucional, do Poder Legislativo. Essa questão de compor maioria pró-governo, é tarefa do líder do governo. Não tem esforço adicional. É um esforço do governo para compor maioria”.

Já a deputada Fernanda Melchionna (PSOL-RS) criticou as alianças pragmáticas em torno de Motta.

“Uma composição contraproducente. Como foi com Lira, que custou caro a várias pautas reacionárias que tramitaram no Congresso sob a gestão de Lira, como o Marco Temporal e projetos anti-movimentos sociais.Traz mais instabilidade com certeza”.

A deputada Erika Kokay (PT-DF) pediu atenção da sociedade civil para barrar pautas que representam retrocessos.

“Acho que tivemos pautas importantes para o governo aprovadas na Câmara, mas você teve retrocessos, como o Marco Temporal. Penso que é preciso que haja uma organização do governo e da sociedade civil, para barrar essas pautas. A sociedade civil organizada conseguiu, por exemplo, barrar o PL do estupro”, lembrou a parlamentar.

Coordenador da Frente Ambientalista, o deputado Nilto Tatto (PT-SP) afirmou que, embora Motta tenha se comprometido com pautas da bancada Ruralista, ele prometeu valorizar os debates de propostas nas comissões da Câmara, o que na gestão Lira foi abreviado com um grande número de requerimentos de urgências aprovadas em plenário.

“Eu tenho uma expectativa melhor do que tivemos com o Lira. Esses projetos estratégicos importantes para área ambiental são propostas que a gente precisa contar com debate amplo com a sociedade e o Motta vai valorizar os instrumentos da Câmara com espaço para debates dos projetos nas comissões”, afirmou.

 

Fonte: g1

 

Nenhum comentário: