Mesmo
após 'indireta', partidos do Centrão com cargos no governo não garantem apoio a
Lula em 2026
Depois que o presidente Lula deu uma “indireta” a partidos do Centrão com
espaço na Esplanada — ao questionar na última reunião ministerial se as siglas
querem “continuar trabalhando” com o governo na próxima eleição —, ministros,
parlamentares e presidentes dessas siglas avaliam que ainda é cedo para cravar
apoio ao governo em 2026.
O recado de Lula acontece em um momento em que
partidos do Centrão cobram mais espaço na Esplanada dos Ministérios, ainda que
não deem garantia de que estarão juntos para além de 2025.
Embora ocupem ministérios no governo, partidos como
União Brasil (3 ministérios), PSD (3 ministérios), MDB (3 ministérios), PP (1
ministério) e Republicanos (1 ministério) se dividem entre situação e oposição
e guardam nomes com interesses opostos ao do Palácio do Planalto, até mesmo em
uma futura eleição presidencial.
Por exemplo, os governadores do Paraná, Ratinho
Junior (PSD); de Goiás, Ronaldo Caiado (União); e de São Paulo, Tarcísio de
Freitas (Republicanos), são todos cogitados como pré-candidatos à presidência
da República.
A avaliação de ministros do Centrão é que qualquer
anúncio agora seria apenas uma “carta de intenções” que pode não se cumprir lá
na frente. Tudo vai depender do cenário: “Se o governo se sair forte de 2025,
será mais fácil advogar internamente” no partido para que fechem com o governo
em 2026, nas palavras de um ministro.
A costura futura passará tanto pela governabilidade
no Congresso Nacional ao longo de 2025 quanto pelo resultado de pesquisas
eleitorais e da popularidade do governo até lá, por exemplo.
“Em todos os partidos, há setores que se aliam e
setores refratários. Se o partido decidir apoio sobre 2026 agora, isso estimula
a fragmentação. E eu não quero levar metade do partido, nem 1/4 do partido. Quero
levar o partido inteiro”, disse um ministro do Centrão.
Outro ministro afirma que “nenhum partido definirá
isso agora” e que a definição vai depender de escolhas internas de cada sigla.
“Meu apoio pessoal será de Lula, mas o [apoio]
partidário não depende apenas de mim”, diz este ministro, também
reservadamente.
O presidente de um dos partidos com ministério na
Esplanada também diz que a sigla se divide hoje em três vertentes e, por isso,
não há como se comprometer com o governo.
"Hoje, não há essa definição porque tem várias
correntes no partido. Tem corrente que quer apoiar a reeleição do presidente
Lula, tem corrente que quer lançar candidatura própria, tem corrente que quer
se juntar a um candidato de centro-direita. Vamos tomar decisão mais pra frente,
sem açodamento, ouvindo a todos e seguindo o instinto democrático do
partido", disse.
De oposição e com a intenção de concorrer ao
Planalto em 2026, o governador de Goiás, Ronaldo Caiado, disse à Globonews que
não vê espaço para apoio do União Brasil a Lula no próximo pleito.
“As decisões partidárias são deliberadas em quase
totalidade na Executiva. O meu sentimento é que o União Brasil, pela quase
totalidade de seus filiados e ocupantes de cargos eletivos, não tem nenhuma
identidade com o governo do presidente Lula e muito menos com o PT”, afirmou,
apesar da sigla ter três ministérios no governo petista.
No MDB, o governo conta com importantes aliados no
Congresso Nacional, como o líder da sigla na Câmara, Isnaldo Bulhões (AL), e o
senador Renan Calheiros (AL) - este último que crava que o partido estará com o
presidente Lula em 2026.
Há quem diga que a vice-presidência da chapa com
Lula em 2026 poderia ser oferecida ao MDB, por exemplo. O líder da sigla no
Senado, Eduardo Braga (AM), já falou publicamente sobre a possibilidade. Por
outro lado, o prefeito de São Paulo, Ricardo Nunes (MDB), que faz oposição ao
governo, já defendeu que o partido não esteja alinhado a Lula.
Ex-ministro do governo de Jair Bolsonaro e
abertamente da oposição, o presidente do PP, senador Ciro Nogueira, diz que o
recado de Lula “não tem nada a ver” com o partido e que a sigla não irá apoiar
o governo em 2026.
Atualmente, o PP tem um ministério na Esplanada, o
dos Esportes, chefiado por André Fufuca. Ciro Nogueira já disse anteriormente
que o cargo não significa apoio do partido ao governo, mas sim uma escolha da
bancada do partido na Câmara dos Deputados.
Fufuca é deputado licenciado e muito próximo do
ex-presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL). Sua entrada no governo foi uma tentativa
de ampliar o apoio da sigla em votações no Congresso.
Na avaliação destas fontes, um componente
geográfico também influencia na decisão: o partido que cravar apoio a Lula
agora pode facilitar a vida dos políticos nordestinos — onde o governo Lula tem
uma popularidade maior — e dificultar a dos políticos do Sul e do Sudeste, por
exemplo.
·
Reforma ministerial
Além da pressão do próprio Centrão, um importante
parlamentar do governo defende que é preciso redistribuir as pastas e dar mais
espaço ao PP e ao Republicanos, que hoje têem apenas um ministério cada. O
Republicanos ganhará uma importância ainda maior agora que deve ser o partido
do próximo presidente da Câmara, Hugo Motta (PB), que já está virtualmente
eleito.
Na terça-feira (21), o ministro das Relações
Institucionais, Alexandre Padilha, almoçou com Hugo Motta e com o deputado
licenciado do PP Ricardo Barros, no escritório de Motta em Brasília.
Segundo interlocutores do Planalto, Motta e Padilha
falaram sobre os espaços do Republicanos no governo, mas foi apenas uma
“primeira conversa”, sem que tenha havido uma oferta formal do governo ou um
pedido do partido.
Motta teria prometido consultar a bancada do
partido sobre a participação no Executivo, não necessariamente para um novo
ministério, mas para avaliar a relação com o governo e a pauta convergente no
Congresso. Hoje, o Republicanos tem um ministério, o de Portos e Aeroportos,
comandado por Silvio Costa Filho.
Além disso, o PSD também demanda mais espaço no
governo, principalmente após mágoas da bancada diante do rápido apoio que o
Planalto deu a Hugo Motta na candidatura para presidência da Câmara, em
detrimento do deputado Antonio Brito (PSD-BA).
A avaliação de parlamentares da sigla é que o
partido na Câmara sempre foi fiel ao governo, mas não tem recebido uma resposta
à altura. A bancada defende, por exemplo, uma troca de ministérios: deixar o da
Pesca, que não tem tanta relevância orçamentária, pelo do Turismo.
Hoje, o Ministério do Turismo está com o União
Brasil e é comandado por Celso Sabino. Mas parlamentares do PSD argumentam que
a pasta guarda maior identidade com o partido.
¨
Eleição de consenso na Câmara dá estabilidade interna,
mas não facilita a vida do governo, apontam especialistas
A eleição para a presidência da Câmara deve confirmar
Hugo Motta (Republicanos-PB) na cadeira mais importante da Casa com o apoio de
governistas, mas o Executivo continuará a ter problemas para tentar controlar a
pauta do plenário.
A exemplo do atual presidente, Arthur Lira (PP-AL),
Motta construiu um arco de alianças que engloba partidos de esquerda, centro e
direita. Até agora, apenas o PSOL decidiu lançar outro candidato, e anunciou o
deputado Pastor Henrique Vieira (RJ) como postulante.
Especialistas ouvidos pelo g1 afirmaram
que, apesar de num primeiro momento o cenário parecer favorável ao governo, a
eleição de um presidente com ampla maioria vai manter difícil a tarefa do
Palácio do Planalto em emplacar suas pautas e evitar a votação de projetos
“ideológicos” da direita.
“Presidentes de Câmara que são eleitos com ampla
maioria impõem desafios de governabilidade. O futuro presidente da Câmara terá
responsabilidade com a pauta defendida por setores da oposição, por partidos
que deram sustentação ao governo Bolsonaro”, explicou o cientista político da Universidade
de Brasília (UNB) Murilo Medeiros.
Lira, embora tenha colocado em votação projetos de
interesse do governo Lula, como o novo arcabouço fiscal e o pacote de corte de
gastos, também pautou a proposta que limitou a demarcação de terras e fragilizou
os direitos dos indígenas.
Medeiros afirmou que o governo terá que “redobrar”
a articulação política para fazer valer sua vontade na pauta da Câmara.
“O futuro presidente, eleito com ampla maioria, com
o apoio do governo e da oposição, tende a ter maior independência na condução
da agenda da Câmara dos Deputados”.
Creomar de Souza, consultor de risco político da
consultoria Dharma, um presidente da Câmara eleito de forma quase unânime
fortalece da Casa perante os outros poderes.
Isso, por outro lado, não favorece a influência do
governo nas votações no legislativo. "Esse processo alimenta um
descolamento: a Câmara vai se tornando mais robusta que a Presidência da
República, mais robusta que o Senado e, em algum momento, talvez, mais robusta
que a própria Câmara, se tornando o locus onde se
dá a palavra final sobre uma série de temas”, disse. “O Executivo se torna um
passageiro desse processo.”
Segundo ele, a força das candidaturas de consenso
permite esse ganho na correlação de forças. “Muita concentração de votos em
torno da figura de um presidente dá muita robustez à Câmara para um
enfrentamento ao Senado Federal, como por exemplo não haver ainda um rito para
a apreciação de medidas provisórias.”
Ele avalia que, nesse processo, a Câmara perde
pluralidade. “Há um risco para a própria institucionalidade da Câmara, como o
que gente tem visto dos procedimentos normais da Câmara serem atropelados pelo
grupo que detém o poder."
<><> Base frágil
O governo tem uma base frágil na Câmara. Cerca de
130 dos 513 deputados são fiéis ao governo. Esse número, no entanto, é ainda
menor a depender do texto em votação, porque o PSOL contraria orientações do
governo com frequência na Casa .
Por isso, ao longo de 2023 e 2024 muitas das pautas
de interesse do Executivo foram negociadas individualmente, por meio da
liberação de emendas ou nomeações na Esplanada.
Foi assim, por exemplo, que Lula negociou a entrada
do PP e do Republicanos, partidos do Centrão, na base do governo.
Em troca de governabilidade na Casa, o Republicanos indicou o deputado Silvio Costa Filho para o Ministério
de Portos e Aeroportos, enquanto o PP emplacou o deputado André Fufuca (MA) no
Esporte.
<><> Governistas
Deputados governistas e que dão sustentação à pauta
do Executivo na Casa minimizaram a questão.
Para o líder do PT, Odair Cunha (MG), Motta será
presidente da Casa e não da oposição ou da base.
“Ele vai garantir o funcionamento democrático,
civilizado, institucional, do Poder Legislativo. Essa questão de compor maioria
pró-governo, é tarefa do líder do governo. Não tem esforço adicional. É um
esforço do governo para compor maioria”.
Já a deputada Fernanda Melchionna (PSOL-RS)
criticou as alianças pragmáticas em torno de Motta.
“Uma composição contraproducente. Como foi com
Lira, que custou caro a várias pautas reacionárias que tramitaram no Congresso
sob a gestão de Lira, como o Marco Temporal e projetos anti-movimentos
sociais.Traz mais instabilidade com certeza”.
A deputada Erika Kokay (PT-DF) pediu atenção da
sociedade civil para barrar pautas que representam retrocessos.
“Acho que tivemos pautas importantes para o governo
aprovadas na Câmara, mas você teve retrocessos, como o Marco Temporal. Penso
que é preciso que haja uma organização do governo e da sociedade civil, para
barrar essas pautas. A sociedade civil organizada conseguiu, por exemplo,
barrar o PL do estupro”, lembrou a parlamentar.
Coordenador da Frente Ambientalista, o deputado
Nilto Tatto (PT-SP) afirmou que, embora Motta tenha se comprometido com pautas
da bancada Ruralista, ele prometeu valorizar os debates de propostas nas
comissões da Câmara, o que na gestão Lira foi abreviado com um grande número de
requerimentos de urgências aprovadas em plenário.
“Eu tenho uma expectativa melhor do que tivemos com
o Lira. Esses projetos estratégicos importantes para área ambiental são
propostas que a gente precisa contar com debate amplo com a sociedade e o Motta
vai valorizar os instrumentos da Câmara com espaço para debates dos projetos
nas comissões”, afirmou.
Fonte: g1
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