segunda-feira, 20 de janeiro de 2025

Como 15 meses de guerra devastaram Gaza

Um acordo de cessar-fogo firmado no Catar deve dar uma trégua a 15 meses de conflito entre Israel e o Hamas.

A guerra começou após o ataque-surpresa do Hamas em Israel em outubro de 2023, quando 1,2 mil pessoas foram mortas e outras 251 foram tomadas como reféns.

Em resposta, Israel lançou uma ofensiva contra o grupo palestino em Gaza, que agora está praticamente em ruínas.

O impacto humanitário também foi enorme. Mais de 46 mil palestinos foram mortos durante as ações militares israelenses, segundo o ministério da Saúde de Gaza, administrado pelo Hamas.

Israel defende que seus ataques ao território palestino tiveram como alvo combatentes do Hamas e afirma ter tentado evitar ou minimizar as mortes de civis. O Hamas respondeu às operações disparando foguetes contra o território de Israel.

A BBC Verify analisou a escala dos danos causados a Gaza pelo conflito.

·        Mortos e feridos

Autoridades de saúde de Gaza afirmam terem compilado a lista de mortos com os registros dos hospitais e os relatos de familiares. Ao todo, são 46.788 pessoas.

Os registros das vítimas identificadas pelo Ministério até 7 de outubro de 2024 indicam que 59% dos mortos eram mulheres, crianças e idosos. Mas um estudo da ONU em novembro calculou o número de mulheres e crianças em até 70%.

O Ministério da Saúde também afirma que 110.453 palestinos foram feridos no conflito. E a Organização Mundial da Saúde (OMS) informou em 3 de janeiro que 25% deles tiveram lesões graves, que mudaram suas vidas.

A coordenadora da organização Médicos sem Fronteiras, Karin Huster, declarou à BBC que o sistema de saúde de Gaza enfrenta "imensos" desafios para "cuidar adequadamente de todos os pacientes feridos a longo prazo".

E um estudo da revista médica Lancet indicou recentemente que o total de mortos pode ser significativamente maior do que os números publicados pelo Ministério local.

A contagem de mortos do Ministério da Saúde de Gaza não especifica civis e combatentes, mas as Forças de Defesa de Israel (FDI) afirmam terem matado 17 mil combatentes do Hamas até setembro de 2024. O organismo não revelou como chegou a este número.

·        Infraestrutura e hospitais

O conflito trouxe danos significativos e generalizados à infraestrutura de toda a Faixa de Gaza. A imagem verificada abaixo mostra um bairro de Jabalia, no norte do território, antes do conflito e na semana passada.

Os acadêmicos Corey Scher, do Centro de Graduação CUNY, e Jamon Van Den Hoek, da Universidade Estadual de Oregon, ambos dos Estados Unidos, examinaram a extensão dos danos em Gaza com base em imagens de satélite.

Na sua última análise, até 11 de janeiro, eles estimaram que 59,8% das construções da Faixa de Gaza foram danificadas ou destruídas desde o início da guerra.

O mapa abaixo mostra os danos à infraestrutura do território desde o início do conflito. Grande parte dos bombardeios israelenses se concentrou em áreas urbanas e parte da infraestrutura foi atingida diversas vezes.

O Centro de Satélites das Nações Unidas (Unosat, na sigla em inglês) calculou um índice mais alto. Ele informou que 69% de todas as estruturas estavam destruídas ou danificadas no início de dezembro. A ONU também concluiu que 68% da rede de estradas da Faixa de Gaza foram danificadas ou destruídas.

Houve também diversos exemplos de danos em instalações médicas importantes ou nas suas proximidades.

A ONU afirma que 50% dos hospitais estão fechados e os demais funcionam apenas parcialmente. Isso significa que muitas das instalações que ainda estão abertas não têm capacidade de tratar doenças crônicas e lesões complexas.

Israel acusou anteriormente o Hamas de operar em hospitais e perto das suas instalações. Mas agências internacionais como a OMS criticaram a falta de proteção para os profissionais de saúde e as instalações médicas. A ONU estima que tenham sido mortos cerca de 1.060 profissionais médicos na Faixa de Gaza.

A organização Save the Children declarou à BBC que seis centros públicos comunitários de saúde mental e seu hospital de internamento psiquiátrico não estão mais funcionando na Faixa de Gaza. Este é um problema importante, já que a ONU estima que cerca de um milhão de crianças necessitam de tratamento de saúde mental na região.

Huster destacou que muitos serviços médicos especializados agora enfrentam falta de médicos qualificados e de equipamento médico específico.

Instalações educacionais também sofreram considerável nível de destruição. As FDI indicam terem atingido escolas 49 vezes durante suas buscas por combatentes do Hamas, desde meados de julho de 2024.

A BBC verificou filmagens desses ataques em 13 locais desde o início de dezembro. A maioria deles já havia deixado de funcionar como escolas e muitos deles foram transformados em abrigos, mas os danos representarão um desafio para o retorno da educação normal na Faixa de Gaza.

A BBC também noticiou que centenas de instalações de água e esgoto foram danificadas ou destruídas, desde que Israel iniciou suas ações militares.

A reconstrução da infraestrutura pública e doméstica será um desafio crucial nos próximos anos. A ONU estimou em maio que a reconstrução da Faixa de Gaza custaria US$ 40 bilhões (cerca de R$ 242 bilhões).

·        Deslocamento em massa

O Escritório das Nações Unidas para Coordenação de Assuntos Humanitários (OCHA, na sigla em inglês) estima que 1,9 milhão de pessoas foram deslocadas internamente.

Este número representa cerca de 90% da população da Faixa de Gaza. E algumas pessoas se mudaram várias vezes, de uma região para outra.

A BBC monitorou as ordens de evacuação na Faixa de Gaza desde o início do conflito. Quase todos os 2,3 milhões de habitantes precisaram deixar suas casas com os contínuos ataques de Israel em todo o território e suas ordens de evacuação em massa das grandes áreas residenciais.

O mapa abaixo mostra as áreas sujeitas aos avisos de evacuação das FDI desde o início do conflito. Elas cobrem uma maioria significativa do território.

Análises recentes mostraram que cerca de 90% do norte de Gaza ficaram sob ordens de evacuação entre outubro e o final de novembro, quando Israel realizou operações significativas naquela região.

Mesmo dentro da "zona humanitária" indicada pelas FDI para os palestinos em busca de segurança, houve dezenas de ataques.

As novas imagens da região de Al-Mawasi, na zona humanitária, ilustram o impacto do deslocamento sobre a Faixa de Gaza.

As imagens abaixo mostram a mesma área antes da guerra e no início de janeiro. As terras agrícolas vazias agora são ocupadas por milhares de tendas e outras estruturas temporárias.

·        Meses sem auxílio humanitário

Projeções da ONU indicam que 91% dos moradores da Faixa de Gaza enfrentaram altos níveis de insegurança alimentar aguda.

O IPC – um grupo que trabalha junto a governos, agências e organizações beneficentes – concluiu que os limites da fome foram atingidos no norte de Gaza após as recentes operações na região.

Entre os desafios, estão os danos causados às terras agrícolas. Em setembro, agências da ONU declararam que 67,6% da terra arável foram danificados pelos bombardeios, pelo trânsito de veículos e por outras "pressões relacionadas ao conflito".

Houve também redução significativa da chegada de ajuda humanitária à Faixa de Gaza nos últimos meses, segundo números compilados pela ONU.

Antes do conflito, entravam em Gaza, em média, 500 caminhões de ajuda por dia útil. Este número começou a cair em outubro de 2023 e ainda não se recuperou.

Mesmo a ajuda humanitária que consegue entrar em Gaza nem sempre chega ao seu destino. Os trabalhadores envolvidos alertaram sobre gangues de criminosos que interceptam a ajuda fornecida, saqueando as cargas. A lei e a ordem entraram em colapso na região.

A ONU calcula que cerca de 1,9 milhão de pessoas precisam de abrigos de emergência e itens domésticos essenciais.

O cessar-fogo provavelmente facilitará a chegada de ajuda humanitária à Faixa de Gaza, mas a próxima questão é como reconstruir a região.

Depois de 15 meses de uma guerra devastadora, os moradores de Gaza podem levar mais de uma década para reconstruir seu território.

 

¨      Israel está sendo derrotado pelo Povo Palestino. Por Isis Mustafá

Israel está sendo derrotado pelo Povo Palestino.

Ouvi essa afirmação de Rawa Alsagheer, coordenadora no Brasil da Rede Samidoun de Solidariedade aos Prisioneiros Palestinos, quando falava para um público de mais de mil pessoas numa assembleia do Jornal A Verdade, em São Paulo. Rawa falou com punhos cerrados, transmitindo toda a certeza do mundo para quem ouvia seu discurso. Senti meu corpo arrepiar e os olhos encherem d’água.

De todas as provas que expõem a barbaridade da guerra, os relatos sobre a violência dos soldados israelenses que humilha mulheres e crianças, os editoriais escancarando a podridão do jornalismo burguês que justifica o morticínio… e venho aqui falar do incômodo controverso que senti ao ouvir essa fala da companheira palestina, naquela tarde de domingo, no final de dezembro.

Como pode uma mulher palestina refugiada no Brasil, mas que nasceu na Síria porque sua família foi obrigada a se deslocar mesmo antes que ela nascesse, ter coragem de afirmar que Israel está sendo derrotado?

Como pode um povo que foi vítima de 469 dias de terror, com 10% da sua população exterminada, ainda ter forças para sair ao que restou das ruas destruídas pelas bombas para comemorar o cessar-fogo? Sabemos que eles sabem que não existe trégua do lado de lá, fato provado algumas horas após o anúncio do cessar-fogo, com os novos bombardeios na Faixa de Gaza. Mas saíram às ruas, com cabeça erguida e esperança nos olhos.

Então como é possível que um povo tenha forças para mostrar através das telas de celulares o assassinato de 58.759 palestinos, sendo 22.015 crianças e 12.998 mulheres?

<><> De onde vem essa esperança?

A questão fundamental é que não são as armas que vencem uma guerra.

Rawa sabe disso. O Povo Palestino sabe disso, desde 1947. E Israel também sabe disso.

Em junho de 1941, os nazistas invadiram a União Soviética com cerca de quatro milhões de soldados. Até então, os alemães eram invencíveis, devastaram e conquistaram tudo por onde passavam. Por isso, o objetivo de Hitler era tomar Moscou em quatro meses. Mas mesmo com imensa desvantagem em número de soldados e tecnologia de guerra, o povo soviético derrotou a tentativa de invasão de Moscou em janeiro de 1942 e, numa contra-ofensiva que deixou os nazistas embasbacados, avançou até o hasteamento da bandeira vermelha no Reichstag em 1945.

Também os vietnamitas conquistaram a liberdade, após 20 anos de guerra contra a maior potência econômica e militar do globo, em 1975. Enfrentando o imoral poder bélico do imperialismo e o que havia de mais tecnológico em armas de destruição, camponeses e trabalhadores derrotaram as forças norte-americanas com fuzis, facas e explosivos.

Quem venceu essas guerras foi a força moral dos povos explorados, capazes de expor a sordidez das agressões imperialistas, por um lado, e mobilizar o heroísmo em cada ser humano para lutar pela liberdade da classe, pelo outro. Foram capazes de fazer o extraordinário.

Então têm razão os combatentes palestinos que afirmam ser essa geração da humanidade a assistir a derrota de Israel. Não tem mais máquina de propaganda neonazista capaz de esconder, justificar ou distorcer o que está acontecendo em Gaza. Terrorismo é bombardear tendas de ajuda humanitária. E os profetas podem fazer todo o esforço do mundo, porque não tem Deus que permita assassinar bebês em hospitais.

É extraordinário o heroísmo dos palestinos em Gaza e em todos os cantos do globo. Depois de entender que era sobre isso que Rawa estava falando, eu também tive essa mesma certeza histórica.

“Nada é capaz de quebrar o espírito dos palestinos. Em meio às bombas, fuzilamentos, fome e destruição integral de Gaza, persevera o povo palestino e sua capacidade de resistir ao extermínio para conquistar seu direito de retorno às terras de que foram expulsos (…). Entre as covas coletivas de Gaza, jaz também o mito da invencibilidade ‘israelense’.” (Federação Árabe Palestina do Brasil).

“Os poderosos podem matar uma, duas ou três rosas, mas jamais conseguirão deter a primavera inteira.” (Che Guevara)

 

¨      Cessar-fogo em Gaza começa com atraso

O cessar-fogo na guerra entre Israel e Hamas começou neste domingo (19/1) após algumas horas de atraso, devido à demora na entrega da lista de israelenses que serão libertados. A confirmação foi dada pelo gabinete do primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu, segundo a BBC, depois que o governo recebeu a lista com os nomes dos 33 reféns israelenses. Essa é a primeira fase do acordo.

Segundo o grupo palestino, a demora ocorreu em razão de sucessivos ataques de Israel, que deixaram 13 mortos, conforme registrou a agência de defesa civil dirigida pelo Hamas. O cessar-fogo começou por volta das 11h do horário local (6h do horário de Brasília). Três mulheres reféns serão as primeiras libertadas, ainda neste domingo. 

No X (antigo Twitter), a página oficial do governo israelense divulgou a lista de reféns que serão libertados ao longo dos próximos dias. Veja:

Todos eles foram feitos reféns pelo Hamas em 7 de outubro de 2023, em ataque que deixou 1,2 mil mortos e mais de 200 reféns. Na Palestina, o Ministério da Saúde, administrado pelo Hamas, registrou mais de 46 mil mortes. O acordo previa o início do cessar-fogo para as 8h30 do horário do local, mas Israel adiou por não ter recebido a lista. 

<><> Expectativa

Milhares de israelenses se reuniram no sábado (18) em todo o país para pedir a libertação dos reféns mantidos em Gaza e expressar esperança no acordo de cessar-fogo. Muitos dos manifestantes lembraram Kfir Bibas, o refém mais jovem, que completou 2 anos. Ele foi capturado junto ao irmão, mãe e seu pai em 7 de outubro de 2023.

"Hoje tentei escrever uma mensagem de aniversário para Kfir pela segunda vez", disse a tia, Ofri Bibas Levy. "Uma mensagem para uma criança que não pode comemorar (...) Uma criança presa no inferno. Uma criança que talvez já não esteja viva. Mas não vêm palavras, apenas lágrimas", afirmou.

As imagens gravadas pelo Hamas em 7 de outubro mostrando Shiri Bibas, a mãe, abraçando seus dois filhos pequenos, Kfir e Ariel, durante o sequestro no kibutz Nir Oz, tornaram-se um dos símbolos do ataque.

¨      Israel não descarta retomar guerra em Gaza

A poucas horas para o cessar-fogo em Gaza, que começou neste domingo (19/1), o primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu, indicou que Israel se reserva "o direito de retomar a guerra" se o Hamas descumprir parte do acordo. Em declaração televisionada neste sábado (18/1), Netanyahu afirmou que o território contará com apoio dos Estados Unidos caso volte a atacar. 

"Se formos obrigados a retomar a guerra, o faremos com força", destacou. Segundo ele, Israel mudou "a face do Oriente Médio" desde o início do confronto. 

Na primeira fase do acordo, que deve durar 42 dias, o Hamas deve liberar 33 israelenses, que estão mantidos como reféns desde 7 de outubro de 2023. Já Israel deve soltar centenas de palestinos mantidos como prisioneiros. 

Discurso de Netanyahu ainda gerou preocupação entre cidadãos ao exigir que o grupo fundamentalista divulgasse o nome dos reféns que seriam libertos no primeiro dia de acordo. O primeiro-ministro não confirmou se o Hamas atendeu ao critério. 

Neste sábado, milhares de israelenses tomaram as ruas para pedir a liberação dos prisioneiros. Entre eles, o mais novo entre os reféns, Kfir Bibas, de dois anos, foi lembrado entre os manifestantes. O menino foi sequestrado com os pais e o irmão. Em novembro de 2023, o Hamas declarou que os quatro morreram durante um bombardeio israelense, mas Israel não confirmou. O nome de Kfir e da família estão na lista dos 33 reféns que devem ser soltos na primeira fase da trégua. 

¨      3 ministros do gabinete Netanyahu se demitem em protesto contra cessar-fogo com Hamas

O partido de direita israelense Otzma Yehudit deixou a coalizão do primeiro-ministro Benjamin Netanyahu em resultado do acordo de cessar-fogo alcançado com o Hamas na Faixa de Gaza.

Segundo o The Times of Israel, os ministros da Segurança Nacional, Itamar Ben-Gvir, do Patrimônio, Amichai Eliyahu, e de Negev, Galileia e Resiliência Nacional, Yitzhak Wasserlauf, entregaram suas cartas de renúncia, cumprindo a ameaça do partido Otzma Yehudit de deixar a coalizão de Netanyahu após o estabelecimento do acordo de cessar-fogo entre Israel e Hamas.

"A partir de agora, o partido Otzma Yehudit não é mais membro da coalizão", afirmou o partido em declaração.

O presidente do Otzma Yehudit, Itamar Ben-Gvir, afirmou em uma mensagem endereçada a Netanyahu que o "acordo de rendição ao terror do primeiro-ministro, que cruza todas as linhas vermelhas ideológicas" do partido, constitui "uma vitória completa para o terrorismo".

"Não retornaremos à mesa do governo sem uma vitória completa sobre o Hamas e a plena realização dos objetivos da guerra", acrescentou Ben-Gvir.

Ainda de acordo com a apuração, o partido também afirma por meio de sua declaração que os membros do Knesset (parlamento) Zvika Fogel, Limor Son Har-Melech e Yitzhak Kroizer "enviaram cartas de renúncia a seus cargos nos vários comitês ao presidente da coalizão", embora o destino de Almog Cohen ainda seja incerto, já que ele rompeu com o partido para votar com a coalizão inúmeras vezes durante este processo.

Com a saída dos integrantes do Otzma Yehudit, o premiê pode acabar perdendo algum apoio político no futuro próximo. Muito embora o partido tenha afirmado que não pretende derrubar o governo, a saída dos ministros e membros do parlamento pode complicar a capacidade de Netanyahu de manter uma maioria estável.

As partes envolvidas no conflito na Faixa de Gaza, Israel e Hamas, com mediação do Catar, do Egito e dos Estados Unidos, concordaram com um cessar-fogo a partir de 19 de janeiro por 42 dias. Com o atraso de quase três horas, o cessar-fogo entrou em vigor hoje (19), às 11h15 no horário local.

 

Fonte: BBC News Mundo/Opera Mundi/AFP/Sputnik Brasil

 

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