sexta-feira, 11 de outubro de 2024

Fundo Amazônia recebeu R$ 643 milhões em 2024, mas apenas 11% foram repassados para projetos

O Fundo Amazônia, mecanismo criado pelo governo federal para o financiamento de ações de preservação e combate a crimes relacionados ao bioma, investiu apenas 11% dos R$ 634 milhões que recebeu em 2024, o equivalente a R$ 73 milhões.

As informações constam em levantamento realizado pelo g1, com base nos dados de transparência disponibilizados pelo fundo.

•        🌳O Fundo Amazônia foi criado em 2008 para financiar ações de redução de emissões provenientes da degradação florestal e do desmatamento.

Mas, ficou paralisado durante a gestão do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL). Ele voltou a funcionar no ano passado, com o anúncio de que o presidente Lula (PT) reativaria o mecanismo e a Noruega confirmar que retomaria as contribuições.

🔎O índice baixo de investimentos é alarmante diante do atual contexto do país. O Brasil vive um período crítico com de índices recorde de queimadas e a maior estiagem em 44 anos (entenda mais aqui).

Questionado pela reportagem, o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), responsável pela aplicação dos recursos, não detalhou o motivo da quantidade limitada de valores investidos.

Em nota, o banco informou que as doações feitas ao Fundo Amazônia "não são destinadas a projetos específicos. Os valores recebidos em doações compõem os recursos do fundo, sendo liberados para projetos contratados de acordo com o cronograma de execução das ações, em parcelas".

"Os desembolsos variam, portanto, de acordo com a carteira de projetos em andamento e os prazos estabelecidos em seus cronogramas físico-financeiros, além da comprovação das atividades realizadas", diz o texto.

<><> Quanto foi doado ao fundo em 2024?

Segundo os dados disponibilizados, as doações recebidas desde janeiro foram realizadas pelos seguintes países:

•        Noruega - R$ 282.532.499,96

•        Estados Unidos - R$ 256.953.700

•        Alemanha - R$ 88.614.000

•        Japão - R$ 14.943.000

Em 2023, o governo federal anunciou que o fundo recebeu, ao todo, R$ 726 milhões em doações. Foram aprovados nove novos projetos, totalizando R$ 553 milhões alocados.

Neste ano, os R$ 73 milhões desembolsados foram destinados para projetos focados em fortalecer o combate aos crimes de desmatamento e queimadas no Acre; apoiar projetos de restauração florestal; e monitorar o uso e cobertura da terra em todos os biomas, entre outros temas (veja mais abaixo).

<><> Novos repasses

Há ainda recursos que já foram anunciados, mas que ainda não foram recebidos, como é o caso da União Europeia, que assinou em julho deste ano uma carta de intenção em doar cerca de R$120 milhões ao Fundo.

Outra doação que ainda não foi efetivada foi a realizada pela Dinamarca, que anunciou um investimento de mais de R$110 milhões em 2023, mas só será efetivada até 2026 e ainda precisa ser aprovada pelo parlamento dinamarquês.

Além disso, há uma doação contratada com o Reino Unido de cerca de R$584 milhões que ainda não foi recebida.

Desde a sua criação, o Fundo Amazônia recebeu mais de R$4,1 bilhões em doações.

<><> Projetos que receberam verbas

Ainda conforme o BNDES, existem recursos empenhados (destinados) para projetos que ainda não foram repassados.

<<<< Mas, da lista dos que já foram investidos, os cinco projetos que mais receberam recursos foram:

➡️ Projeto Rumo ao Desmatamento Ilegal Zero no Acre

•        Estado do Acre, por meio da Secretaria de Estado de Planejamento (SEPLAN)

•        Valor desembolsado - R$ 21.410.888

➡️ Projeto Dabucury: Compartilhando Experiências e Fortalecendo a Gestão Etnoambiental nas Terras Indígenas da Amazônia

•        Coordenadoria Ecumênica de Serviço (CESE)

•        Valor desembolsado R$ 15.140.413

➡️Projeto Amazônia Socioambiental

•        Instituto Socioambiental (ISA)

•        Valor desembolsado - R$ 7.033.091

➡️Projeto MapBiomas

•        Instituto Arapyaú de Educação e Desenvolvimento Sustentável

•        Valor desembolsado: R$ 6.171.000

➡️Projeto Agroecologia em Rede

•        Instituto de Pesquisas Ecológicas (IPÊ)

•        Valor desembolsado - R$ 5.748.854

 

<><> AGU cobra mais de R$ 89 milhões de infratores por queimadas em vegetação nativa no bioma amazônico

A Advocacia-Geral da União (AGU) ajuizou cinco ações civis públicas (ACPs) com multas que somam R$ 89 milhões contra infratores ambientais que destruíram vegetações nativas em municípios do Amazonas, de Rondônia e do Pará.

De acordo com a AGU, foram destruídos cerca de 5 mil hectares do bioma amazônico. As ações foram elaboradas a partir de autos de infração e laudos produzidos pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) em diferentes anos e foram ajuizadas contra particulares e pessoas jurídicas, envolvendo violações registradas nos municípios de Altamira (PA), Boca do Acre (AM), Buritis (RO), Lábrea (AM) e São Félix do Xingu (PA).

Além de buscar a recuperação das áreas, as ações pedem o bloqueio de bens dos acusados, a proibição de explorar de qualquer modo a área desmatada, a suspensão de incentivos ou benefícios fiscais e a restrição do acesso a linhas de crédito concedidas pelo poder público.

Uma das ações propostas busca a reparação de danos ambientais causados pelo desmatamento ilegal e pela realização de queimada agropastoril em cerca de 2,6 mil hectares de floresta nativa, de especial proteção, no Amazonas. O valor de indenização pedido pela AGU é de R$ 49 milhões.

O integrante do AGU Recupera, órgão responsável por medidas jurídicas de proteção e restauração dos biomas e do patrimônio cultural brasileiros, Roberto Picarelli da Silva informou que essa é uma das áreas mais vulneráveis e prioritárias da Amazônia no combate ao desmatamento:

"Os danos ambientais são caracterizados pela emissão de Gases de Efeito Estufa (GEE), que intensificam o aquecimento global e as mudanças climáticas que tanto preocupam a população mundial. Além disso, destroem o habitat natural de várias espécies da fauna e alteram a biodiversidade local e a qualidade dos recursos hídricos", explica. "A ação civil pública é importante para reverter esses danos porque tem por intenção primeira o reflorestamento dessas áreas, com a responsabilização não somente do infrator, mas também dos proprietários das terras", acrescenta.

 

•        A comunidade indígena da floresta amazônica luta por seu pleno reconhecimento

Antes da chegada dos europeus, as terras baixas da Amazônia abrigavam várias centenas de grupos étnicos que viviam em dezenas de milhares de aldeias com uma população estimada entre quatro e quinze milhões de habitantes. Durante milênios, essas sociedades transformaram as paisagens ao longo do curso principal do rio Amazonas e de seus principais afluentes do sul, desenvolvendo práticas agrícolas que criaram solos de terra escura, uma tecnologia que melhorou as propriedades físicas e químicas dos solos tropicais, aumentou sua produtividade e garantiu seu uso sustentável durante séculos.

Essas sociedades rurais, em sua maioria, não tinham grandes centros urbanos, mas eram suficientemente sofisticadas para domesticar dezenas de espécies de plantas, e manipular populações naturais em florestas nativas, para criar bosques manejados dominados por espécies que forneciam alimentos e fibras. Simultaneamente, as culturas que ocupavam a floresta sazonal e as regiões de savana na borda sul da Amazônia criaram paisagens por meio da construção de lomas artificiais, calçadas e sistemas de canais que melhoraram a produção agrícola e criaram sistemas logísticos que sustentaram populações ainda mais densas.

Tragicamente, todas essas sociedades entraram em colapso nos séculos XV e XVI, quando epidemias causadas por patógenos introduzidos durante o Intercâmbio Colombiano devastaram suas comunidades. Embora a arqueologia ainda não tenha descoberto todos os terríveis detalhes, essas sociedades eram particularmente suscetíveis a pandemias devido à sua densidade populacional relativamente alta e a uma rede de comércio que promovia interações culturais. Acredita-se que a população tenha caído para menos de 400.000 indivíduos em um colapso demográfico de proporções gigantescas.

O número de grupos étnicos que existiam antes da “Great Dying” é desconhecido, mas as populações remanescentes eram bastante isoladas umas das outras, o que deu origem à percepção de longa data de que a floresta amazônica era uma região selvagem intacta. A transição para uma floresta selvagem escassamente povoada proporcionou proteção imunológica aos grupos amplamente dispersos devido ao maior isolamento entre eles e os colonizadores europeus. Nos dois séculos seguintes, a população continuou a diminuir devido às intervenções de missionários e agentes coloniais que reintroduziram patógenos em populações que ainda não haviam adquirido defesas imunológicas.

O boom da borracha no final do século XIX levou a outra rodada de dizimação, pois as comunidades indígenas foram escravizadas, deslocadas ou massacradas. A maioria sobreviveu  como entidades étnicas fugindo para o interior da floresta, ocupando paisagens florestais ao longo de afluentes terciários ou vales remotos no sopé dos Andes e nas terras altas da Guiana. Os antropólogos estimam que o Brasil amazônico tinha uma população aproximada de apenas 100.000 indígenas em meados da década de 1970.

O órgão responsável pelo censo brasileiro começou a coletar dados sobre grupos étnicos individuais em 1991 e essa pesquisa inicial sugeriu que seus números haviam aumentado em 50%, uma tendência confirmada pelo censo seguinte, com um aumento adicional de 72% (Tabela 6.1). O aumento refletiu as altas taxas de natalidade e um aumento em sua contagem catalisado pelo emergente movimento indígena.

Não só os indivíduos foram motivados a se identificar como indígenas como também as aldeias mais remotas foram colocadas no mapa pelo Estado brasileiro com a criação de novos territórios indígenas. Se as taxas de crescimento permanecerem as mesmas (cerca de 6% ao ano), o censo de 2022 deverá mostrar uma população indígena total superior a 700.000.

Ocorreram repercussões demográficas semelhantes em outros países onde os incentivos para reivindicar uma identidade indígena motivaram as comunidades a afirmar ou recuperar seu patrimônio cultural. Infelizmente, há também forças sociais que fazem com que alguns indivíduos abandonem sua identidade étnica, principalmente em populações urbanas que sofrem discriminação ou animosidade racial. Na Bolívia, por exemplo, os indivíduos geralmente se identificam pela origem regional em vez da origem étnica; ambas são afetadas por um ambiente político altamente polarizado.

A chave para o renascimento demográfico foi a implementação de políticas que priorizam a formalização dos direitos à terra de comunidades com patrimônio étnico específico. As comunidades Ribeirinhas/Ribereñas, com raízes indígenas evidentes, estão cientes das vantagens legais de ter uma identidade étnica. Isso motivou as comunidades de toda a bacia a redescobrir seu legado indígena. A tendência de aumentar a autoidentificação é um processo contínuo ao longo de vários trechos do tronco principal do rio Amazonas, especialmente perto da junção do Marañón e do Ucayali (Kukama, Yagua), do Solimões (Tikuna, Miranha, Kokama, Kambeba/ Omágua), do médio Amazonas (Mura), e perto da foz do Tapajós (Arapium, Borari, Mawé).

A recuperação demográfica das culturas indígenas da Amazônia deve ser avaliada, no entanto, no contexto da população não étnica, que é o produto de 400 anos de migração e da subsequente fusão social causada pela miscigenação.

 

Fonte: g1/Sputnik Brasil/Mongabay

 

Nenhum comentário: