quinta-feira, 10 de outubro de 2024

'O fim da ONU': o que 1 ano da guerra em Gaza tem a nos dizer sobre a ordem mundial?

Nesta segunda-feira (7) completou um ano da escalada do conflito em Gaza, quando forças do Hamas conseguiram superar os muros do enclave e atacar assentamentos israelenses próximos. No dia seguinte, Israel iniciou o contra-ataque que segue até hoje. Qual o balanço da guerra até agora? Quais foram as consequências geopolíticas?

Essas questões foram exploradas hoje no episódio do Mundioka, podcast da Sputnik Brasil apresentado pelos jornalistas Melina Saad e Marcelo Castilho.

Para começar, Ali Abdul Hakam, cientista político especializado em Ásia e roteirista do canal História Islâmica, destacou o peso das vidas perdidas no conflito. Além dos 41.900 mil palestinos mortos em Gaza, ele mencionou que o Lancet, um período acadêmico de medicina, estima que ainda há cerca de 200 mil a 300 mil pessoas mortas soterradas embaixo dos escombros.

"Obviamente nós só vamos ter uma ideia quando a guerra acabar porque as autoridades israelenses e os colonos não estão permitindo que a Organização das Nações Unidas e a Cruz Vermelha atuem e levantem esses dados."

Do lado israelense, o único número oficial divulgado é de mortos no ataque de 7 de Outubro: 1.139, segundo o governo. Não oficialmente, as coisas também não estão bem para Israel. De acordo com Hakam, as Forças de Defesa de Israel (FDI) atualmente têm 70 mil combatentes internados, sem contar os mortos.

O grande número de baixas do lado israelense, acusa o cientista político, se deve ao combate assimétrico enfrentado pelas FDI.

Ainda que seja uma força mais treinada, organizada e tecnológica, é muito difícil uma força militar regular lutar contra uma insurgência, ainda mais agora quando o gap tecnológico diminuiu graças à evolução dos drones e dos mísseis. "Não existe base na literatura da guerra moderna."

Como exemplo, Hakam lembrou da invasão do Vietnã pelos Estados Unidos que atolou o Exército norte-americano, desgastou a opinião pública e "praticamente quebrou a economia dos EUA".

"A qualidade de vida do americano médio foi achatada depois da guerra do Vietnã e desencadeou todos os problemas posteriores. Alguns nós estamos vendo se desenrolar no cenário geopolítico até a atualidade."

Nesse sentido, sublinha o especialista, o risco da economia israelense colapsar é ainda maior do que a estadunidense, uma vez que não só é inúmeras vezes menor e não tem a capacidade industrial norte-americana, como também as FDI são dependentes de reservistas, retirando mão de obra da força de trabalho a cada convocação e a cada perda.

"A situação fica periclitante e o Netanyahu não aceita nenhuma solução política, diplomática. Ele quer uma solução militar, mas não tem jeito."

·        Expansionismo colonial

Para Ramez Philipe Mansour, doutor em geografia pela Universidade de São Paulo (USP) e professor da rede estadual de ensino, o motivo pelo qual o primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu, não cessa as hostilidades é porque está em prática um antigo plano de "expansionismo territorial colonial de Israel".

"O movimento sionista reivindica como seu espaço vital toda a área, todos os territórios entre os rios Nilo e Eufrates […]. É um projeto antigo do qual Netanyahu é a expressão mais cristalina."

Desse modo, afirma o geógrafo, o "contra-ataque" do movimento palestino Hamas em 7 de Outubro foi aproveitado pelo estado israelense como pretexto para ocupar de vez a Faixa de Gaza.

"Isso foi planejado, incluindo o extermínio do povo palestino na Faixa de Gaza e os pogroms contra a população palestina autóctone na Cisjordânia."

Para se sustentar na região, os fundadores de Israel já sabiam que o país necessitaria do apoio de uma potência imperialista, afirma Mansour. No caso, os Estados Unidos surgiram como o principal fiador israelense após a queda das principais potências após a Primeira e Segunda Guerra Mundiais.

Por outro lado, para os EUA, a presença de Israel na região é fundamental para "manter a frente estratégica de contenção da Rússia".

Mansour explica que desde antes da Guerra Fria se desenharam três frentes de combate à Rússia, hoje sucessora da União Soviética no espaço euroasiático.

Há a frente do leste europeu, onde hoje ocorre o conflito ucraniano; existe a frente do extremo-leste asiático, mantida pela tensão entre Taiwan e a República Popular da China; e, também, o Oriente Médio, onde os Estados Unidos não têm controle direto e precisam de Israel para defender seus interesses.

"Uma derrota de Israel nesse contexto é uma derrota dos Estados Unidos, e seria visto como um fracasso nesse projeto dos EUA de dominar todo o espaço euro-asiático."

·        Guerra em Gaza 'sepulta a ordem mundial'

Em sua fala ao Mundioka, Ali Abdul Hakam avaliou as consequências geopolíticas da guerra em Gaza, como a desmoralização da Organização das Nações Unidas (ONU), que se viu incapaz de desenvolver uma solução para o conflito.

"Os Estados Unidos sequestraram a ONU junto de Israel, que já está em um nível de Estado pária nos mesmos moldes que era a África do Sul durante o apartheid e, mesmo assim, não se permite que soluções diplomáticas sejam buscadas."

Hakam lembrou que a Liga das Nações, organização intergovernamental criada após a Primeira Guerra Mundial para impedir mais um conflito de escalas globais, "acabou de forma tremendamente semelhante no século passado".

Para o especialista, uma reforma da ONU não será capaz de reestruturar a ordem internacional.

"Só o fim da ONU. E a construção de alguma outra organização."

Essa nova ordem, por sua vez, dificilmente será liderada pelos Estados Unidos, que mantêm uma visão de realidade como se ainda fosse 1991, destacou Ali Hakan, "quando a União Soviética colapsou e eles eram o único poder."

No mundo atual, multipolar, outras potências crescem cada vez mais seu poder diplomático. Um exemplo é a China, que "está participando ativamente da reconstrução do Afeganistão".

"E lembro a vocês que a China recentemente conquistou, a nível geopolítico, algumas vitórias diplomáticas muito importantes, como fazer o Irã e a Arábia Saudita sentarem para conversar."

¨      Israel afirma que Irã pode terminar como a Faixa de Gaza e o Líbano

O ministro da Defesa de Israel, Yoav Gallant, advertiu neste domingo (6) que qualquer um que atacar seu país receberá uma resposta semelhante à que o Estado hebreu tem perpetrado na Faixa de Gaza e no Líbano nos últimos meses.

Gallant visitou a base militar de Navatim que nesta semana foi atacada com mísseis das Forças Armadas do Irã.

"Foi uma conversa com as equipes aéreas e terrestres da base Navatim da Força Aérea, que têm operado ao longo do último ano em defesa e ataque em todos os setores do combate, e são um elemento-chave no sucesso das Forças de Defesa de Israel [FDI] e no sistema de segurança em diversas áreas", escreveu Gallant em sua conta na rede social X.

"Na minha conversa, deixei claro que é melhor para aqueles que pensam que um intento de nos prejudicar nos dissuadirá observarem o que está acontecendo em Gaza e Beirute e tirarem conclusões", disse Gallant.

As forças israelenses bombardearam nesta semana várias posições em Beirute, capital do Líbano, que supostamente são usadas pelo grupo chiita libanês Hezbollah.

O Irã lançou mísseis contra Israel em 1º de outubro, em retaliação à morte de líderes do Hamas e do Hezbollah, em um ataque ao qual Tel Aviv prometeu responder.

 

¨      'Jogo' da OTAN pode sair do controle e levar a uma catástrofe, diz diplomata russa

O "jogo" da OTAN pode sair do controle e levar ao desastre, disse em entrevista à Sputnik Yulia Zhdanova, chefe interina da delegação russa nas negociações em Viena sobre segurança militar e controle de armas.

"Na realidade, a OTAN tem se preparado há muito tempo para um potencial confronto armado com a Rússia", disse Zhdanova.

Segundo ela, "os planos regionais de 'defesa' foram aprovados pela OTAN, foram formuladas tarefas específicas para todos os comandos militares do bloco", além disso estão sendo verificadas as rotas logísticas de transferência de tropas e armas através do Atlântico para o "flanco oriental".

Também têm sido constantemente treinadas as possíveis opções para o conflito com a Rússia – do Ártico ao mar Negro.

"Enquanto isso, estão sendo dados passos muito provocatórios na direção ucraniana – a retórica sobre um possível envio de tropas da OTAN para a Ucrânia continua (aqui, a propósito, a França está mostrando zelo novamente). Este 'jogo' pode sair fora do controle e levar a um conflito com consequências desastrosas. Nós alertamos claramente sobre isso nas plataformas diplomáticas internacionais", acrescentou a diplomata.

Zhdanova acrescentou que os representantes em Viena dos países do Sul Global demonstram um profundo interesse pela posição russa sobre a situação na zona da operação especial.

Segundo ela, a delegação russa em Viena não tem nenhuma ilusão de que as estruturas internacionais, incluindo a OSCE, possam ter alguma reação adequada aos crimes do Exército ucraniano com o apoio de uma série de países ocidentais, mas para a diplomacia russa isso não é um obstáculo para cobrir a situação real, tanto na área da operação especial como na região de Kursk.

"Especialmente desde que os Estados do Sul Global, representados em outras plataformas de Viena, mostram um profundo interesse na posição russa", disse Zhdanova.

Anteriormente, a diplomata havia afirmado que a liderança da OSCE nunca condenou o ataque do Exército da Ucrânia na região de Kursk.

¨      Sem a expansão da OTAN, a situação de segurança no mundo seria diferente, diz diplomata russo

A situação da segurança global seria diferente se a Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN) não desejasse atrair o maior número possível de países a qualquer custo, disse o vice-ministro das Relações Exteriores da Rússia, Aleksandr Grushko, à Sputnik.

Grushko afirma que a ameaça mítica do Leste é usada pelos Estados Unidos para integrar a Europa a sua ordem mundial e preservar a hegemonia norte-americana no mundo.

Se a OTAN tivesse cumprido sua promessa de não expandir para o Leste Europeu, que ela deu à União Soviética pouco antes de seu colapso, a única fronteira entre a Rússia e a OTAN teria sido uma linha de pouco mais de 100 km com a Noruega no Extremo Norte da Rússia.

"Mas então seria impossível enganar as pessoas com a ameaça mítica do Leste, que até hoje é usada por Washington para controlar os europeus e encaixá-los em uma ordem mundial e europeia favorável aos EUA, e para manter a hegemonia americana no mundo", disse Grushko.

Ele enfatizou que não foi a Rússia, mas a OTAN que entrou no caminho do confronto, recusando-se a negociar as ameaças e desafios reais, e não imaginários, à segurança regional e global.

O alto diplomata lembrou que a Rússia estava oferecendo várias propostas para redução da escalada desde 2016, mas a Aliança Atlântica recusou todas.

Um projeto de tratado de garantias de segurança entregue a Bruxelas, onde a sede da OTAN fica, em dezembro de 2021, pouco antes do início da operação militar especial, também foi rejeitado.

Ele também disse que a adesão da Ucrânia à OTAN é um projeto geopolítico dos Estados Unidos imposto a seus aliados, enquanto muitos europeus levantaram preocupações sobre esses planos.

Agora, nos sentidos conceitual, político e técnico-militar, "os países da OTAN com armas nucleares e o próprio bloco, que se declarou nuclear, estão a caminho de aumentar o papel das armas nucleares na estratégia da aliança".

Assim, a Rússia está atualizando sua doutrina nuclear para que seus adversários não tenham ilusões sobre a disposição de Moscou de garantir sua segurança por todos os meios disponíveis.

Moscou observou repetidamente que a OTAN tem como objetivo o confronto e sua expansão não vai trazer maior segurança para a Europa.

Ao mesmo tempo, o Kremlin enfatizou que a Rússia não representa uma ameaça para nenhum país da OTAN, mas não vai ignorar ações potencialmente perigosas para seus interesses.

No entanto, a Rússia continua aberta ao diálogo, mas em pé de igualdade, e o Ocidente deve abandonar seu curso de militarização do continente.

¨      Casa Branca diz que o principal assunto de Biden na Alemanha será 'a situação na Ucrânia'

As necessidades militares da Ucrânia serão uma "grande parte" da agenda da próxima viagem do presidente dos EUA, Joe Biden, à Alemanha.

É o que disse a porta-voz da Casa Branca, Karine Jean-Pierre, nesta segunda-feira (7).

"Se você pensar na Ucrânia e na autodefesa da Ucrânia, isso vai ser uma grande parte desta visita, e continuar esse apoio, continuar a fazer tudo o que pudermos para parar a agressão russa. E então isso vai ser certamente uma grande parte disso, continuar as contribuições para cumprir a promessa da OTAN [Organização do Tratado do Atlântico Norte]", afirmou aos repórteres durante a coletiva.

<><> MRE russo alerta EUA a 'não brincarem com fogo'

Moscou está alertando Washington e seus aliados "a não brincarem com fogo" e não destruírem completamente o regime da Convenção sobre Armas Químicas (CWC, na sigla em inglês), disse a representante oficial do Ministério das Relações Exteriores, Maria Zakharova.

Nesta segunda-feira (7), comentando informações sobre uma provocação iminente usando produtos químicos tóxicos "com a assistência ativa dos países ocidentais", a representante disse que a Rússia continuará a informar à comunidade mundial a respeito das violações das disposições da CWC pela Ucrânia.

O chefe das Tropas de Defesa Radiológica, Química e Biológica das Forças Armadas da Rússia, tenente-general Igor Kirillov, disse mais cedo que Kiev está preparando uma provocação para acusar a Rússia de usar substâncias tóxicas.

Zakharova também anunciou a provocação iminente, observando que "materiais alegadamente fabricados perto da linha de contato de combate, semelhante à Síria, serão transferidos para especialistas internacionais que chegaram prontamente à Ucrânia".

"O objetivo desta ação é claro. Não existe nenhuma norma de direito internacional que detenha os países da OTAN no seu desejo de alcançar a declarada 'derrota estratégica' da Rússia, especialmente quando falamos do formato das provocações químicas […] que vêm sendo elaboradas há anos na Síria […]. Alertamos que Washington e seus satélites não deveriam brincar com fogo para não destruir completamente o regime da CWC, construído desde 1997", disse a representante.

¨      Harris designa Irã como maior rival dos EUA e diz que só se reunirá com Putin junto com Ucrânia

A vice-presidente e candidata à presidência dos EUA Kamala Harris afirmou, em uma entrevista à CBS News, que o Irã é o maior adversário dos Estados Unidos, afirmando ao mesmo tempo que seu país deve vencer a competição com a China sem um conflito aberto.

Harris acredita que os EUA devem evitar conflitos com a China e manter um canal militar aberto de comunicação com o país asiático.

"Em primeiro lugar, precisamos vencer a competição do século XXI com a China, precisamos ser capazes de competir e vencer. Não devemos buscar o conflito", expressou.

Porém, ela observou que os Estados Unidos precisam proteger os interesses das empresas norte-americanas e ajudar Taiwan a se defender.

Ao mesmo tempo, quando perguntada sobre qual considera ser o maior adversário dos EUA, Kamala Harris referiu o Irã.

Ela diz que "o Irã tem sangue americano em suas mãos" afirmando que sua principal prioridade, caso vença as eleições presidenciais dos EUA em 5 de novembro, será impedir que o Irã tenha armas nucleares.

Em relação à questão ucraniana, Harris disse que a Ucrânia deve ter "uma palavra a dizer" sobre o futuro de seu país, enquanto esse futuro deve ser negociado de acordo com a Carta da ONU.

"Não bilateralmente, sem a Ucrânia, não", disse ela quando perguntada sobre se estaria pronta para uma reunião bilateral com Putin a fim de resolver o conflito na Ucrânia.

Harris também afirmou que a possível adesão da Ucrânia à Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN) vai ser decidida "se e quando" chegar o momento.

O principal rival de Harris, o ex-presidente dos EUA e candidato republicano Donald Trump, por sua vez, criticou repetidamente a atual administração presidencial por se recusar a negociar com a Rússia para resolver a crise na Ucrânia.

Trump declarou várias vezes estar disposto a se reunir com Vladimir Putin e garantiu que conseguiria acabar com o conflito antes mesmo de tomar posse.

 

Fonte: Sputnik Brasil

 

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