Forças de defesa ou de ataque? Paradoxo
militar israelense mudou a história do Oriente Médio
Há um ano, as
manchetes mundo afora expõem diariamente os efeitos da guerra promovida por
Israel contra o Hamas na Faixa de Gaza. Para além da destruição quase total do
território, mais de 42 mil palestinos já foram mortos em meio à inércia
internacional. Agora, os olhares se voltaram para o Líbano, onde Tel Aviv
repete a mesma retórica.
Desde os primórdios de
sua criação no Oriente Médio, Israel busca se colocar frente à comunidade
internacional como um Estado que age militarmente só pela esfera defensiva.
Prova disso é o nome do próprio Exército: as Forças de Defesa de Israel (FDI).
Mas acontecimentos recentes colocam em xeque cada vez definição, principalmente
pelo Sul Global: à beira de uma guerra total, Israel passou a atacar o Líbano,
ao mesmo tempo que mantém as hostilidades em Gaza e ameaça o Irã.
Muito antes da atual
guerra, as agressões contra os territórios palestinos sempre foram mais regra
do que uma exceção. Em maio de 2021, após o Hamas exigir a desocupação
israelense em Gaza, confrontos ao longo de 11 dias provocaram mortes de 260
palestinos e 11 israelenses. Já em 2018, um protesto levou as FDI a abrirem
fogo contra a multidão, quando 170 pessoas morreram. Quatro anos antes, um
conflito ainda mais sangrento: o sequestro de três jovens israelenses levou a
ataques que duraram quase dois meses. O resultado foi a morte de 2,1 mil
palestinos e 73 israelenses.
Os registros são
tantos que ocupariam toda esta reportagem. Isso sem contar com os casos da
Cisjordânia, outro território palestino que, apesar de não estar
"oficialmente em guerra", foi alvo de quase 90 ataques aéreos e 697
mortes provocadas por agressões israelenses. O professor de relações
internacionais da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP) Bruno
Huberman acrescenta à Sputnik Brasil que as FDI surgiram no contexto da
expulsão de mais de 750 mil palestinos a partir de 1948, quando mais de 500
vilarejos também foram destruídos.
"Então, Israel,
desde a sua fundação, busca se colocar como um Estado que age exclusivamente de
forma defensiva, para proteger os judeus. Isso tem muito a ver com a proteção
em relação ao antissemitismo, que era bastante genocida naquele contexto, logo
após o Holocausto […]. Israel utiliza-se dos direitos de defesa como uma forma
de justificar qualquer medida agressiva contra os seus inimigos, mesmo quando
ela viola o direito internacional, como é o caso da resposta que a gente vê na
Faixa de Gaza [desde outubro do ano passado]", pontuou.
E mesmo antes das
tensões crescerem nas duas últimas semanas no Líbano, por conta das
hostilidades entre Israel e Hezbollah, um levantamento do Projeto de
Localização de Conflitos Armados e Dados de Eventos (ACLED, na sigla em inglês)
revelou que Tel Aviv já realizava cinco vezes mais ataques no país do que o
contrário.
"Esses dados
evidenciam a desproporcionalidade de poder. Além disso, grupos como o
Hezbollah, que surgiram para resistir à ocupação israelense, por mais que
possam iniciar determinada conflagração de violência, quando a gente olha para
a perspectiva histórica de longo prazo, vemos Israel também como a força
agressiva prioritária nos conflitos", declara.
·
O que está acontecendo em Gaza é genocídio?
Para entender o motivo
das ações militares israelenses provocarem tantas mortes, principalmente nos
territórios palestinos, é necessário voltar ao contexto histórico, aponta o
especialista. Entre 2000 e 2005, durante uma revolta civil dos palestinos contra
a política israelense na região, conhecida como a Segunda Intifada, a
resistência guerrilheira, como Hamas e Hezbollah, passou a se esconder em
ambientes urbanos, como prédios e túneis, segundo Huberman.
"Desde então, a
estratégia israelense tem sido a destruição através de um urbicídio [destruição
de uma cidade]. É o caso da destruição do campo de refugiados de Jenin em 2002,
por exemplo. Isso se tornou uma doutrina militar em 2006, durante a guerra com
o Líbano. Também passamos a ver isso ser usado por países como os Estados
Unidos", diz.
Toda essa
desproporcionalidade de força tem o objetivo principal de tirar a capacidade de
resistência dos palestinos à ocupação israelense. "Tel Aviv busca manter
isso de forma eterna ou até encontrar uma solução provisória que lhe traga
segurança enquanto mantém a colonização da região. Em Gaza, essa medida era o
bloqueio iniciado em 2005, que chega ao seu limite em outubro do ano passado.
Até então, o controle principal era remoto, com bloqueio econômico, além do uso
de drones e bombardeios esporádicos para minar a capacidade de resistir. E
diante da limitação desse modelo anterior, provocaram a destruição completa.
Não tem nada de defesa, porque Israel é força ocupante, agressora, e não existe
direito de defesa em território ocupado, segundo o direito internacional",
justifica.
·
Qual é a situação atual da Palestina?
Desde a década de
1940, os conflitos entre israelenses e palestinos nunca cessaram. Cada vez
mais, a população que não faz parte do Estado judeu esteve confinada nos
limites do seu antigo território, que corresponde a Gaza e Cisjordânia.
Ao longo do tempo,
veio a Autoridade Palestina, que funciona como uma prefeitura na prestação de
serviços públicos, enquanto Israel mantém há décadas o controle das fronteiras
e da economia. Nesse contexto de dominação israelense crescente no Oriente Médio,
surgiu o eixo da resistência, que tem como ator mais forte o Irã, enfatiza o
especialista.
"Então, quando
Israel escalona a violência contra palestinos, tende a haver solidariedade
desses grupos políticos e militares [como o Hezbollah e os houthis do Iêmen].
Se antigamente eram os Estados árabes, hoje, particularmente, são as forças
guerrilheiras e o Irã. Então isso sempre afetou a dinâmica de segurança na
região […]. A permanência da guerra e ausência de um acordo de paz é o que traz
instabilidade. E Israel persegue essa instabilidade que, em certo sentido, traz
também uma aliança muito próxima com os Estados Unidos. Permite ainda ao país
agir de forma violenta contra inimigos comuns aos norte-americanos",
resume.
Já a doutora em
relações internacionais pelo Programa de Pós-Graduação San Tiago Dantas Isabela
Agostinelli pontua que as provocações israelenses, principalmente contra o Irã,
têm justamente o objetivo de provocar uma guerra total no Oriente Médio. Tudo isso
sob os olhares da Organização das Nações Unidas (ONU) que, segundo a
especialista, tem uma atuação limitada, principalmente por conta dos vetos dos
membros permanentes do Conselho de Segurança.
"Embora o próprio
nome diga Forças de Defesa de Israel, o país não só se defende, como acaba
extrapolando diversos limites éticos, morais e do próprio direito internacional
de guerra. São ataques sistemáticos contra infraestruturas, a população civil,
e não só em relação a alvos que diz querer alvejar", conclui.
¨ Um ano de guerra em Gaza: milhares de manifestantes
pró-Palestina marcham em Nova York
Milhares de pessoas se
reuniram na cidade de Nova York segunda-feira (7) para uma manifestação
pró-Palestina, quando se assinala um ano do ataque do Hamas a Israel, que levou
a uma violenta escalada do conflito em Gaza, relata um correspondente da Sputnik.
Aproximadamente às
17h10 em Nova York (18h10 no horário de Brasília), os manifestantes chegaram à
Estação Grand Central, depois de terem marchado por vários outros locais da
cidade. A polícia monitorou o protesto e conduziu operações para controlar o
tráfego.
Não foram registradas
prisões em massa ou grandes confrontos entre os manifestantes e policiais, de
acordo com o correspondente. No entanto, pelo menos algumas prisões foram
vistas em vídeos postados nas redes sociais.
Os ataques ao
território palestino começaram há um ano, depois de um ataque, em 7 de outubro
de 2023, coordenado pelo Hamas a mais de 20 comunidades israelenses, que deixou
aproximadamente 1,1 mil mortos e cerca de 5,5 mil feridos, além de mais de 200
reféns.
Em retaliação, Israel
iniciou uma série de bombardeios contra a Faixa de Gaza, governada pelo Hamas,
que resultaram até agora na morte de mais de 42 mil palestinos.
¨ EUA propôs 'pacote de compensação' para Israel não atacar certas
instalações do Irã, diz mídia
A rádio israelense Kan
informou, citando suas fontes, que Israel teria recebido em 6 de outubro uma
proposta dos EUA de não atingir certas instalações iranianas em suas ações de
retaliação ao ataque do Irã contra Israel de 1º de outubro.
Em troca, a Casa
Branca ofereceu a Israel o chamado "pacote de compensação" que inclui
ajuda militar adicional e apoio diplomático.
Conforme a rádio, as
conversas duraram vários dias, mas as partes não conseguiram chegar a um
acordo.
Por sua vez, o jornal
The New York Times cita antigos e atuais oficiais israelenses de alto escalão
dizendo que Israel provavelmente não vai atacar as instalações nucleares do
Irã, concentrando-se em estruturas militares.
O artigo lembra que o
presidente dos EUA Joe Biden e o secretário de Defesa Lloyd Austin se
manifestaram contra o apoio a possíveis ataques israelenses contra instalações
nucleares do Irã, temendo um agravamento da situação no Oriente Médio.
Além disso, o jornal
diz que "anteriores e atuais altos funcionários israelenses colocaram
dúvidas sobre se o país tem capacidade de causar danos significativos" a
essas instalações.
"É provável que a
primeira retaliação de Israel contra o Irã pelos ataques de mísseis de
terça-feira [1º] se concentre em bases militares e, talvez, em alguns locais de
inteligência ou liderança", afirmam as fontes citadas no artigo.
Como observa a
publicação, as instalações nucleares como alvos foram aparentemente decididas
para serem guardadas para mais tarde, apenas no caso de o Irã tentar agravar
ainda mais o conflito.
Segundo o The New York
Times, Israel pediu repetidamente a Washington para ter acesso a tecnologias
que lhe permitissem atacar com eficácia o território iraniano, mas recebeu
sempre recusa.
Por isso, as
autoridades israelenses recorreram a operações de sabotagem como matar
cientistas iranianos, implantar bombas nas instalações e atacá-las com drones,
ressalta o jornal.
"Um alvo nuclear
é um alvo muito difícil. Há muitas outras alternativas para além desse
alvo", disse o general Frank McKenzie, responsável pelos planos de guerra
contra o Irã quando dirigia o Comando Central dos Estados Unidos, citado pelo
artigo.
Em 1º de outubro, o
Irã submeteu Israel a um ataque maciço de foguetes, chamando-o de ato de
autodefesa.
Os militares
israelenses afirmam que cerca de 180 mísseis balísticos foram disparados, a
maioria dos quais foi interceptada.
Vários meios de
comunicação relataram a morte de uma pessoa, presumivelmente um palestino da
Faixa de Gaza, na Cisjordânia.
O Irã afirma que os
mísseis atingiram alvos militares israelenses, mas Israel diz que os danos
foram "mínimos", prometendo retaliar com a ajuda dos EUA.
A porta-voz do
Ministério das Relações Exteriores da Rússia, Maria Zakharova, disse, após o
ataque, que a administração do presidente dos EUA, Joe Biden, fracassou no
Oriente Médio, demonstrando total impotência na resolução de crises.
¨ Trump promete relacionamento EUA-Israel 'mais forte do que
nunca' se vencer a eleição
O ex-presidente dos
EUA, Donald Trump, disse que, se ele se tornasse presidente novamente, o
relacionamento entre Israel e os Estados Unidos seria ainda mais forte do que
nunca.
"Se e quando eu
for presidente dos Estados Unidos, será, mais uma vez, mais forte e próximo do
que nunca", disse Trump na noite de segunda-feira (7) durante um evento na
Flórida.
Trump acrescentou que
estava comprometido em proteger o Estado judeu e as comunidades judaicas
norte-americanas, prometendo evitar ameaças contra Israel e apoiar sua luta
contra o terrorismo.
Durante o debate
presidencial entre Trump e a vice-presidente Kamala Harris, ambos os candidatos
tentaram se posicionar como o candidato mais pró-Israel.
"Ela odeia
Israel. Se ela for presidente, acredito que Israel não existirá dentro de dois
anos a partir de agora", disse Trump sobre sua oponente.
"Isso não é
verdade", respondeu Harris, que é casada com um judeu. "Em toda a
minha carreira e vida apoiei Israel e o povo israelense", rebateu.
Em 7 de outubro de
2023, Israel foi submetido a um ataque de foguetes sem precedentes da Faixa de
Gaza. Além disso, combatentes do movimento palestino Hamas se infiltraram nas
áreas de fronteira, abriram fogo contra militares e civis e fizeram reféns.
As autoridades
israelenses dizem que cerca de 1.200 pessoas foram mortas durante o ataque. As
Forças de Defesa de Israel (FDI) lançaram a Operação Espadas de Ferro na Faixa
de Gaza e anunciaram um bloqueio completo do enclave. O número de mortos pelos
ataques israelenses na Faixa de Gaza desde 7 de outubro ultrapassa 41.900, de
acordo com o Ministério da Saúde de Gaza.
Fonte: Sputnik Brasil
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