quarta-feira, 9 de outubro de 2024

Direita tradicional foi a maior vencedora das eleições, avaliam cientistas políticos

Apesar de o primeiro turno das eleições municipais ter resultado em crescimento tanto do PL, de Jair Bolsonaro, quanto do PT do presidente Lula, os partidos com maior número de novas prefeituras foram os da direita tradicional, popularmente conhecidos como “centrão”. Especialistas ouvidos pelo Congresso em Foco ressaltam que o novo cenário municipal é de enfraquecimento do discurso de polarização e de fortalecimento de lideranças fisiológicas.

Em números absolutos, os dois partidos que emplacaram o maior número de prefeitos foram o PSD e o MDB, com respectivamente 882 e 856 municípios. Proporcionalmente, o Republicanos duplicou sua capilaridade, crescendo de 211 prefeitos eleitos em 2020 para 436. O PT aumentou de 182 candidatos eleitos para 248. O PL, de 344 para 512 municípios: um crescimento elevado, mas muito inferior à meta de mil prefeitos desejada pelo seu presidente, Valdemar Costa Neto, que esperava equiparar sua capilaridade municipal à proporção da sigla no Congresso Nacional.

Ainda assim, o PL foi o partido que mais venceu nesse domingo nos municípios com mais de 200 mil eleitores (foram dez eleições em primeiro turno) e o que mais emplacou candidatos no segundo turno, 22. A esquerda foi mal nessas cidades, como mostrou o Congresso em Foco.

“Os partidos com maior número de candidatos eleitos às prefeituras são justamente aqueles que, apesar de majoritariamente alinhados à direita, sentam para conversar com os dois lados”, destacou o economista e cientista político Ricardo de João Braga, professor do curso de Mestrado em Poder Legislativo da Câmara dos Deputados e coordenador do Congresso em Foco Análise. O PSD, presidido por Gilberto Kassab, secretário de Relações Internacionais de São Paulo, é o exemplo mais forte desse comportamento: o partido ocupa, ao mesmo tempo, pastas ministeriais do governo Lula e secretarias de um de seus rivais, o governador paulista Tarcísio de Freitas, apoiado por Jair Bolsonaro.

Também coordenador do Congresso em Foco Análise e cientista político, André Sathler descreve o mais recente resultado eleitoral como parte de um processo de amadurecimento tanto do eleitor quanto de lideranças políticas. “O prefeito Eduardo Paes [Rio de Janeiro] utilizou uma frase que, ao meu ver, bastante precisa: foi uma luta política bastante racional. No cenário geral, ele tem razão. Com exceção de São Paulo, vimos menos daquela polarização dos últimos anos e mais do que costumava ser o Brasil”, apontou.

Sathler destaca que os partidos tradicionais da direita já ocupavam amplos espaços no Congresso Nacional, e o resultado das eleições consolidou uma posição já observada por analistas dentro e fora do Planalto. Com isso, a tendência maior é de continuidade das estratégias de articulação já adotadas pelo governo, como a distribuição de emendas e ministérios em troca de apoio a proposições legislativas.

Por outro lado, para a ala radical, o resultado colhido indicou o início de um processo de fragilização. “Existe nesse grupo uma parcela formada por políticos de velha guarda precisando dividir espaços com uma nova geração que vem da influência digital. Isso cria uma dinâmica diferente dentro da direita que é muito mais volátil, muito mais instável”. Essa disputa interna se refletiu em rachaduras afetando o próprio resultado das eleições.

O principal exemplo citado pelo cientista foi a disputa eleitoral em São Paulo: o emedebista Ricardo Nunes, político tradicional na cidade e coligado a Jair Bolsonaro, precisou disputar espaço com um novo influenciador de extrema-direita, o empresário Pablo Marçal, do PRTB. A rachadura se refletiu no eleitorado, fazendo com que nenhum dos dois alcançasse uma vitória em primeiro turno.

Em Curitiba, a fragilidade interna entre lideranças de direita também resultou em um segundo turno: pelo PSD, o candidato Eduardo Pimentel estava oficialmente coligado ao PL. Nos momentos finais antes do pleito, porém, Bolsonaro direcionou seu apoio à jornalista Cristina Graeml, do PMB. Os dois agora seguem para a disputa em segundo turno.

Duas forças políticas tradicionais, porém, saíram duramente enfraquecidas na disputa eleitoral: o PSDB, partido que já formou a maior bancada de centro-direita do país, elegeu apenas 273 prefeitos, pouco mais da metade dos 523 de 2020. O PDT, partido de centro-esquerda que em diversos momentos rivalizou com o PT por influência, sofreu de forma ainda mais intensa, caindo de 315 para 149 prefeituras.

Sathler considera que, ao menos para os tucanos, a queda é irreversível. “O PSDB é um partido que tende a acabar. Os demais partidos já estão sondando os caciques remanescentes para atrair o capital político restante. É um movimento consequente das últimas reformas eleitorais, que favorecem a consolidação partidária e piora a situação para os partidos pequenos. A tendência é ele desaparecer nos últimos anos”, antecipou.

Para o PDT, por outro lado, o pesquisador acredita que o encolhimento municipal possa ressuscitar o debate interno sobre uma federação ou fusão junto ao PSB, partido ideologicamente mais próximo e que, apesar de ter conseguido colher um saldo positivo nas eleições de domingo, também lida com dificuldades para se manter diante da cláusula de barreira.

<><> Esquerda foi mal no 1º turno

Uma primeira análise dos resultados eleitorais do primeiro turno não deixa dúvidas: os partidos de esquerda apanharam feio das legendas mais conservadoras. Dos 51 municípios com mais de 200 mil eleitores que definiram hoje seus futuros governantes, apenas quatro (8%) elegeram — na verdade, reelegeram — prefeitos de esquerda.

Recife (PE) e Ananindeua (PA) deram mais quatro anos de mandato a João Campos e a Dr. Daniel Santos, do PSB. E os municípios mineiros de Juiz de Fora e Contagem reelegeram, respectivamente, as petistas Margarida Salomão e Marília Campos. Todos os outros 46 prefeitos são de partidos de direita (destacando-se entre eles PL, União Brasil e PP) e de centro (com destaque, nesse caso, para PSD e MDB).

Quando se olha para as 52 cidades que terão segundo turno, a situação melhora um pouco para a esquerda. Dos 104 candidatos que estarão de novo na cédula de votação no próximo dia 27, 21 são filiados a agremiações de esquerda ou de centro-esquerda: 14 do PT, três do PDT, dois do PSB e dois do Psol — exatamente de onde saiu a vitória mais comemorada hoje pelo presidente Lula e por seus aliados mais próximos: a ida do deputado federal Guilherme Boulos (Psol-SP) para a segunda rodada de votação.

Mesmo aí, no entanto, a superioridade das forças de centro e de direita é flagrante. Elas não só reúnem o maior número de postulantes (83, ou 80% do total) como também, na maioria dos municípios, tiveram vantagem sobre seus adversários de esquerda na primeira votação.

Em várias cidades, o segundo turno colocará em confronto direita contra direita, quando não direita contra extrema direita.

Apesar de sido o segundo partido com maior número de candidatos no segundo turno, o PT terá na nova etapa eleitoral pouco mais da metade dos concorrentes do seu maior rival partidário, o PL do ex-presidente Jair Bolsonaro. Em quatro cidades, a disputa será entre os dois partidos: Fortaleza (CE), Cuiabá (MT), Anápolis (GO) e Pelotas (RS). Veja os números.

Com 60,5 milhões de eleitores, os 103 municípios brasileiros mais populosos representam menos de 2% das 5.570 cidades brasileiras, mas somam quase 40% do eleitorado nacional. Também concentram a maior parte das riquezas produzidas no Brasil e aferidas através do Produto Interno Bruto (PIB).

Seguem os resultados do primeiro turno em cada uma dessas cidades, em ordem alfabética, com os nomes (e respectivos partidos) dos eleitos e dos contendores da batalha eleitoral decisiva a se realizar daqui a três semanas.

•        Padilha reconhece avanço do centrão nas eleições e minimiza impacto em 2026

O ministro das Relações Institucionais, Alexandre Padilha, reconheceu nesta segunda-feira (7) o avanço do centrão nas eleições municipais, mas sustentou que não há ligação entre o pleito municipal e nacional. O ministro fez o balanço após uma reunião com o presidente Lula e negou que os resultados da eleição deste ano possam ter repercussões em 2026. “Tentam fazer uma relação direta entre o que é o resultado da eleição municipal com a eleição nacional, que nunca existiu no Brasil. Não existe essa relação direta”, avaliou.

“Reconhecemos um crescimento de partidos que compõem o centro, que já tinham crescido em 2020, crescem agora nesta disputa municipal também e são partidos que apoiam o governo, que estão no governo”, completou Padilha.

Entre as legendas que mais elegeram vereadores estão o MDB, PP, PSD, União Brasil e PL. Para o ministro, o resultado é uma tendência que vem desde a última disputa nos municípios. “Já tinha tido em 2020 um crescimento dos partidos de centro e de centro-direita no país nas eleições municipais. Esse crescimento teve uma continuidade, um aumento de vários destes partidos, e o crescimento também importante do PT e do PSB.”

Segundo Padilha, a avaliação do governo nesse primeiro turno é positiva. Apesar de poucas cabeças de chapa, o PT viu um crescimento no país por meio das federações partidárias para prefeitos. A Federação Brasil Esperança, composta ainda por PCdoB e PV, elegeu mais prefeitos, comparada à última eleição municipal, indo de 179 para 248. O PT não elegeu prefeitos nas capitais, apesar de ter ido para o segundo turno em quatro.

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“O conjunto de partidos que apoiam o governo também teve aumento expressivo, que mostra o enraizamento importante nas eleições municipais”, pontuou ele.

Destacando a “frente ampla”, o ministro citou a vitória de Eduardo Paes (PSD), no Rio de Janeiro, contra Alexandre Ramagem (PL), nome apoiado pelo ex-presidente Jair Bolsonaro. Outro aliado vitorioso de Lula é João Campos (PSB), em Recife, que concorreu contra Gilson Machado (PL), ex-ministro do Turismo de Bolsonaro.

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<><> Lula e o segundo turno

Apesar de ter tido uma participação mais discreta, Lula, como afirma Padilha, irá apoiar os aliados Guilherme Boulos (Psol), em São Paulo; Igor Normando (MDB), em Belém; Evandro Leitão (PT), em Fortaleza; e Fuad Noman (PSD), em Belo Horizonte.

“Às vezes tem-se a imagem fixa de Lula quando ele não era presidente, o que permitia a ele estar mais presente presencialmente. Mas a participação vai continuar, de acordo com o que for possível. O presidente Lula vai continuar viajando os estados, entregando obras e governando o país, e vai continuar participando [das campanhas]. Inclusive, as lideranças que vão para o segundo turno reforçam e pedem esse apoio do presidente”, afirmou o ministro.

“Sabemos da força dessa extrema-direita no país, ninguém nega essa força, ninguém nega a capilaridade nacional dessa força. Agora, acreditamos que, no segundo turno, essas lideranças que compõem essa frente ampla do presidente Lula têm todas as condições de derrotar, inclusive, essas lideranças de extrema-direita”, completou.

 

Fonte: Congresso em Foco

 

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