quarta-feira, 9 de outubro de 2024

Florestan Fernandes Jr.: ‘As eleições e o futuro da esquerda’

Três milhões e seiscentos mil votos. Essa é a soma dos eleitores que votaram na direita e extrema-direita na cidade de São Paulo. Esse número representa bem mais do que o dobro dos votos de Guilherme Boulos no primeiro turno. Para tirar essa diferença até o dia 27 de outubro não será nada fácil.

Mesmo que todos os 605 mil eleitores de Tabata Amaral decidam votar em Boulos, o psolista ainda teria que convencer 1,2 milhão de eleitores que votaram em Nunes e Marçal a mudarem seus votos. Tarefa complicada para quem tem uma rejeição bem maior que a de seu adversário.

Mas, como dizem os comentaristas políticos, segundo turno é uma nova eleição. Que o diga Geraldo Alckmin, que no 2º turno da eleição presidencial de 2006 obteve 2,4 milhões de votos a menos do que obteve no 1º turno. Vale lembrar que o fato raro aconteceu numa eleição em que o presidente Lula estava muito bem avaliado e obteve no primeiro turno 49% dos votos válidos.

Boulos pode buscar essa diferença junto aos 2,5 milhões de paulistanos que não compareceram às sessões eleitorais no domingo (6/10). Precisa convencê-los a irem votar no próximo dia 27.

Porém, nem tudo está perdido. O jogo foi para a prorrogação e, nela, Nunes ficará mais exposto. O eleitor terá a chance que não teve no 1º turno de avaliar melhor o desempenho da administração do prefeito. Boulos provavelmente irá expor que o atual prefeito é apoiado por Bolsonaro. E Nunes, por sua vez, tentará esconder o ex-presidente ao máximo.

Já Lula terá que aparecer mais, não só em São Paulo, mas também nas cidades onde o PT e os partidos de centro-esquerda disputam o 2º turno. Algo, aliás, que deixou a dever nestas eleições.

Se Nunes conseguir a reeleição na capital paulista, a direita continuará a controlar, como já fez várias vezes nas últimas décadas, o orçamento do principal estado e da maior cidade do país. Agora, com um agravante: ligado à extrema-direita. 

Ao PT e às esquerdas, de maneira geral, fica o alerta: é preciso repensar suas estratégias políticas e de comunicação para não sucumbirem ao avanço do fascismo e dos partidos fisiológicos.

É urgente investir em novas lideranças e em pautas que mobilizem os corações e as mentes dos brasileiros. Não sei se ainda dá tempo. O partido continua pequeno: elegeu no 1º turno apenas 251 prefeitos. O PL de Valdemar da Costa Neto fez 523 prefeitos e o PSD de Kassab 878. Fica a pergunta: o que será das esquerdas quando não tivermos mais o presidente Lula?

 

•        O resultado das eleições municipais e a tendência fascista da sociedade brasileira. Por Ricardo Nêggo Tom

Enquanto boa parte do campo progressista segue tratando a população brasileira mais pobre e periférica como intelectualmente impúbere, a extrema-direita está conseguindo fazer esta mesma população se sentir cada vez mais participativa e decisiva nos processos eleitorais do país. Ainda que isso não seja uma realidade fática e esta população esteja sendo manipulada a acreditar em seus algozes históricos, é inegável que a capacidade de articulação política do fascismo brasileiro vem fazendo com que a esquerda perca eleitores e votos importantes a cada sufrágio universal.

Não vou dourar o texto com o excesso de academicismo que vem sendo uma das causas de a esquerda estar sendo desprezada pelo “povão”, por não conseguir mais se comunicar com uma linguagem mais próxima deste. Podem me tacar pedras, mas o povo trabalhador não tem tempo para saber sobre Marx, Engels ou o escambau da revolução bolchevista. Num país onde a educação é propositalmente sucateada para que os mais pobres não desenvolvam senso crítico e capacidade de avaliação do cenário social onde estão inseridos, isso tudo soa arrogante e presunçoso aos seus ouvidos, e eles respondem nas urnas à não compreensão desse esquerdismo terrivelmente acadêmico.

Alguém pode estar pensando: “uai, Ricardo! Se a população sofre boicote proposital na educação, é óbvio que ela deve ser tratada como incapaz de entender a formação estrutural da nossa sociedade, não?”. Nem sempre. O fato de alguém não entender de economia, por exemplo, não invalida a sua avaliação de como a economia está afetando a sua vida. Se o indivíduo ganha pouco e os preços estão altos, obrigatoriamente ele associará a carestia à política econômica do governo vigente. Porém, enfrentamos um outro fenômeno que a esquerda não tem avaliado como determinante em sua queda de popularidade: a pauta moral e de costumes, também conhecida como hipocrisia conservadora, propagada em aliança entre a extrema-direita e o fundamentalismo evangélico.

Pânico moral estabelecido na sociedade, por meio da conclamação de uma luta do bem contra o mal, tendo o comunismo como o diabo papão que corrompe criancinhas e as incentiva a mudar de sexo, usar drogas e votar na esquerda, o indivíduo pobre que ganha pouco, citado no parágrafo anterior, esquece que a sua principal carência é financeira, abraça a causa divina da defesa moral da sociedade e dos valores cristãos e passa a acreditar que Deus, através da extrema-direita, destruirá os pervertidos e imorais e transformará a nação brasileira num paraíso onde jorra leite e mel. O fato de os vereadores mais votados nas principais cidades do país serem da extrema-direita não me deixa mentir. E além do sucateamento proposital de uma educação que não é libertadora, como preconiza Paulo Freire, precisamos levar em consideração a formação do caráter dessas pessoas. Algo que, normalmente, legitima suas escolhas.

Em São Paulo, Lucas Pavanato, mais um fruto podre da inteligência artificial do MBL, foi o vereador mais votado no ambiente político mais inóspito da atualidade. Um candidato que se elegeu tendo como principal projeto político impedir mulheres trans de usarem o banheiro feminino. Seria conservador se não fosse trágico. Em Belo Horizonte, o vereador mais votado foi Pablo Almeida, do PL, assessor e apadrinhado de Nikolas Ferreira, que se elegeu com uma pauta antiaborto e de bons costumes. As cidades de São Paulo e Belo Horizonte se transformarão nas maiores potências do país se mulheres trans não forem mais ao banheiro e mulheres cisgênero nunca mais abortarem? Não! Mas a ideia de que “Deus” não gosta dessas coisas fala mais alto no imaginário popular. Afinal de contas, “nem só de pão vive o homem”, mas de todo fundamentalismo religioso que sai da boca de falsos profetas, lobistas políticos do fascismo brasileiro.

No Rio de Janeiro, Carlos Bolsonaro, do PL, foi o mais votado, tendo quase o triplo de votos do segundo colocado, Márcio Ribeiro, do PSD, um dos nomes apoiados pelo prefeito reeleito, Eduardo Paes. O filho do comerciante de joias do Estado vai para o seu sétimo mandato e já aprovou na legislatura atual o dia do conservadorismo, além de ter proposto uma medida que impede que insetos sejam servidos na merenda escolar do município. Segundo ele, a medida visa prevenir uma possível alteração de cardápio para as crianças, onde elas seriam usadas como cobaias de experimentos alimentares no futuro. Uma prova de que a crise é também psiquiátrica, e que o pânico moral rende muitos votos. Em Porto Alegre, Jesse Sangalli, do PL, foi o campeão de votos para a Câmara Municipal, defendendo o conservadorismo e os valores da direita. O que nos sugere um dilúvio de mais quatro anos na política local, com a provável reeleição do negacionista climático Sebastião Melo.

O saldo das eleições municipais é desastroso para a esquerda, embora haja quem enxergue com bons olhos conquistas paliativas como as de Boulos e Maria do Rosário, que passaram para o segundo turno em São Paulo e Porto Alegre, respectivamente. Infelizmente, a realidade dos fatos e dos votos não nos permite almejar mais do que isso. Dificilmente, apesar da nossa torcida, ambos conseguirão vencer seus adversários bolsonaristas. Hoje, “São Paulo é como o mundo todo”, como já cantou Caetano, onde caretas e picaretas de Paris e Alphaville se apresentam como defensores da população para mamar nas divinas tetas da vaca estatal. A votação de Pablo Marçal e o circo protagonizado por alguns de seus eleitores, que se ajoelharam nas ruas pedindo para que Jesus desse a vitória ao ladrão da cruz, digo, ao ladrão de bancos, e salvasse a cidade do comunismo de Guilherme Boulos, prova que o fundamentalismo fascista religioso é uma das principais ideologias políticas do país nesse momento.

 

•        'Frente ampla de Lula venceu extrema-direita nas eleições', diz Padilha

O ministro-chefe da Secretaria de Relações Institucionais, Alexandre Padilha, fez um balanço dos resultados das eleições municipais do último domingo (6), afirmando que a frente ampla governista venceu o pleito e derrotou candidatos de extrema-direita que ameaçam a democracia.

Reunião de coordenação na manhã desta segunda-feira (7) entre o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, os líderes do governo no Congresso e o os ministros palacianos, serviu também para uma avaliação do resultado das eleições municipais. Apesar do PT ter tido um crescimento razoável de 2020 para este ano, o partido do presidente ficou abaixo do PL, de Jair Bolsonaro, e mesmo abaixo de outro partido de esquerda, como o PSB.

Segundo Padilha, os resultados demonstram o apoio da população à frente ampla liderada pelo presidente Lula e o rechaço à extrema-direita. "Estamos confiantes de que nas eleições municipais existem vitórias simbólicas importantes de uma frente ampla apoiada pelo presidente Lula contra candidaturas da extrema-direita que tentam perverter o processo democrático brasileiro", disse Padilha a jornalistas nesta segunda-feira (7), segundo o relato publicado pela Folha de São Paulo.

"O conjunto de partidos que apoiam o governo, que inclusive tem ministros, teve um aumento expressivo. Um crescimento significativo não só do PT, que estava em um patamar baixo em 2020, e um crescimento importante do conjunto de partidos que apoia o presidente Lula, do centro, da centro-direita", defendeu Padilha, segundo o relato da agência Reuters.

O ministro afirmou, ainda, que lideranças importantes da base, como Eduardo Paes (PSD), no Rio de Janeiro, e João Campos (PSB), em Recife, venceram nomes fortes do bolsonarismo. No segundo turno, disse Padilha, o presidente Lula vai apoiar diversos nomes que não são do PT, mas são de partidos fortes da base, como Fuad Norman (PSD), que disputa o segundo turno em Belo Horizonte com Bruno Engler (PL), nome de Bolsonaro.

<><>Bolsonaro vê "vitória" da extrema-direita nas eleições municipais

Jair Bolsonaro considera os resultados das eleições do último domingo (6) uma "vitória" para a extrema-direita, apesar das disputas sobre quem foi o real vencedor do pleito. Ao mesmo tempo, o governo do presidente Lula reivindica o triunfo da frente ampla.

“O resultado das eleições foi uma vitória do povo conservador, da direita, dos patriotas do Brasil. O voto da direita não é um voto comprado da população. É um voto dado pelo conhecimento do povo. Essa eleição vai refletir em 2026 com certeza. Em 2026, a direita estará ainda mais forte”, afirmou Bolsonaro à CNN Brasil nesta segunda-feira (7).

O ex-capitão também aproveitou para criticar o ex-coach de extrema-direita Pablo Marçal, que terminou em terceiro lugar na disputa pela prefeitura de São Paulo e não conseguiu avançar para o segundo turno. A disputa agora está entre o atual prefeito Ricardo Nunes, apoiado por Bolsonaro, e Guilherme Boulos, que conta com o apoio do presidente Lula.

“O Marçal não é dono dos votos. Quem votou nele foi iludido. Minha opinião sobre ele, eu tive há dois meses. Conversei com ele, depois ele saiu falando outra coisa. Quem age dessa maneira, vai se desgastando. Ele é inteligente, mas usa a inteligência para o mal. Ele é carta fora do baralho. Quem votou nele foi iludido e os votos vão para o Ricardo Nunes, não vão para o Boulos”, concluiu o ex-capitão.

 

Fonte: Brasil 247

 

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