Paulo Kliass: ‘Quando o governo ousa pouco
na Economia’
A proximidade do
processo das eleições municipais acabou por deixar um pouco à margem nos
grandes meios de comunicação o debate a respeito da perda de popularidade do
presidente Lula e da avaliação de seu governo. É compreensível que a emergência
e a polarização do pleito nas mais de 5.700 cidades terminem por colocar essa
questão em segundo plano na agenda política. No entanto, como haverá segundo
turno em menos de 100 destes locais, é provável que o debate a respeito da
contradição entre a realidade exibida pelas estatísticas oficiais de economia e
a popularidade em queda passe a merecer mais espaço na imprensa.
A dúvida que se coloca
é a respeito de quais são as razões que poderiam explicar a incapacidade de as
pesquisas de opinião pública captarem algum sentimento mais efetivo de melhora
da percepção da maioria da população quanto aos aspectos supostamente positivos
da política econômica comandada por Fernando Haddad. Afinal, os números de
crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) de 2023 superaram – e muito! – as
expectativas apresentadas pela Pesquisa Focus encomendada pelo Banco Central
(BC). O problema é que ali são representadas as opiniões de apenas 171
presidentes e dirigentes de empresas do financismo, todos eles criteriosa e
rigorosamente selecionados para responder ao questionário do órgão encarregado
pela fiscalização e pela regulamentação do próprio sistema financeiro. O
resultado é um misto de torcida uniformizada com chantagem contra propostas que
possam contrariar os interesses do setor.
No começo do ano
passado, esse pessoal dizia que o PIB não iria crescer mais do que 0,8% ao
longo dos 12 meses. Como sempre, a nata da banca privada confundia mais uma vez
seus desejos contra o governo que havia derrotado o candidato apoiado por eles
nas eleições de outubro de 2022 com algum lampejo de análise objetiva da
realidade econômica. Com isso, eles foram mais uma vez desmoralizados com a
divulgação do resultado oficial do IBGE, que registrou um crescimento de 2,9%
no PIB para o ano passado. Um dos fatores que contribuíram para esse quadro
foram as despesas públicas e os investimentos estatais garantidos pela
negociação da PEC da Transição, quando o novo governo conseguiu recursos
orçamentários para executar parte de seus compromissos anunciados durante a
campanha eleitoral. Ou seja, exatamente o oposto da austeridade fiscal burra e
cega que os representantes da banca propõem o tempo todo.
·
Haddad: insistência
cega na austeridade fiscal
Para o ano atual há
uma tendência de manutenção do mesmo ritmo de elevação do PIB. Ao longo dos
meses, o governo e os próprios representantes do assim chamado “mercado” foram
elevando suas projeções. Nos primeiros meses, estes últimos projetavam uma elevação
de apenas 1,60% para o final do presente ano. Mas o povo da Faria Lima terminou
por aceitar a realidade e reajustou suas projeções. Atualmente, o próprio
Ministério da Fazenda refez seus cálculos e passou a trabalhar com uma
expectativa de 3,2% para o encerramento de 2024. Para tentar surfar nessa onda
de boas novidades para o chefe, o pessoal da área da economia tenta emplacar a
narrativa de que tais resultados só estão surgindo por conta da rigidez com que
Haddad vem tratando a questão da austeridade fiscal. Ocorre que a verdade é bem
oposta: essa melhoria está ocorrendo apesar das regras da
austeridade.
Na área do emprego, as
informações divulgadas pelos órgãos governamentais também apresentam um quadro
interessante. Confirma-se uma tendência de redução do desemprego, que atingiu
seu nível histórico mais baixo segundo os dados do IBGE. No segundo trimestre
deste ano, a chamada taxa de desocupação atingiu 6,8% do total da população
economicamente ativa (PEA). Trata-se da menor taxa jamais registrada para esse
período nos últimos 10 anos. Ocorre que há problemas associados à metodologia
utilizada pelo órgão. O questionário pergunta se o indivíduo procurou emprego
durante os últimos 30 dias. Como há muita gente desempregada por um período
mais longo de tempo e que desistiu de procurar um posto de trabalho, geralmente
os dados são subdimensionados.
·
Inflação e
precariedade no emprego: popularidade de Lula em baixa
Esse é o fenômeno que
gera um contingente conhecido como “população desalentada”. Afinal, procurar
emprego, particularmente em cidades com características metropolitanas, custa
dinheiro. E as pessoas terminam desistindo depois de muitas tentativas infrutíferas.
Esta é a razão pela qual os indicadores de entidades como o DIEESE, por
exemplo, apontam taxas de desemprego bem mais elevadas do que a oficial. Na pesquisa que a entidade mantida pelo movimento sindical
realiza para o DF, por exemplo, o desemprego se aproxima de 15% da PEA.
Além disso, os dados
do IBGE apontam um crescimento da informalidade nas posições ocupadas. As
sucessivas mudanças introduzidas na legislação trabalhista nos governos Temer e
Bolsonaro, com vistas a retirar direitos dos assalariados, mascaram a realidade
do mercado de trabalho. As pessoas estão empregadas, mas em condições de
elevada precariedade e, por vezes, recebendo até mesmo uma remuneração mensal
inferior a um salário mínimo. Esse fato pode ser captado também pelo
contingente da população subutilizada. São 18,5 milhões de pessoas que
gostariam de trabalhar mais horas do que estão conseguindo atualmente em sua
jornada laboral.
Outro aspecto que
poderia eventualmente contribuir para melhorar a avaliação do governo refere-se
à redução da taxa de crescimento dos preços. Em 2022, o IPCA registrou um
acumulado de 5,6%. Em 2023, a inflação oficial registrou 4,6%. Atualmente, o
acumulado de 12 meses até agosto aponta 4,2% e uma projeção para encerramento
do ano em um patamar ainda mais elevado. Por outro lado, a desagregação dos
preços em grupos aponta para crescimento acima da média em itens de maior
sensibilidade, tais como alimentação (4,59%), transportes (4,53%), saúde
(5,70%), despesas pessoais (4,45%) e educação (6,91%). Isso significa que todo
o esforço realizado pelo arrocho monetário não tem conseguido reduzir de forma
significativa a inflação para a meta claramente irrealizável de 3% ao ano. Por
isso teria sido fundamental o Conselho Monetário Nacional (CMN) ter se rendido
às evidências da realidade e ter promovido uma alteração na meta oficial para o
crescimento dos preços. Mas Fernando Haddad se opôs radicalmente a tal
iniciativa.
·
Povo não come PIB!
Ora, tudo leva crer
que a combinação oferecida por um crescimento não expressivo do PIB e uma
inflação persistente em setores que mais pesam no bolso da população de baixa
renda não tem logrado arrefecer o descontentamento com a situação de
dificuldades vivenciadas nos setores da base de nossa pirâmide da desigualdade.
Afinal, ao longo da última década, o crescimento do Produto Interno foi pífio.
Entre 2015 e 2024 registrou-se um índice acumulado de 5,7% – o que corresponde
a pouco mais de 0,5% por ano. Para se ter uma ideia da ordem de grandeza, o
crescimento populacional observado ao longo dos mesmos 10 anos foi de 4,4%. Na
verdade, foi uma década de semi-estagnação da economia de forma geral. Ou seja,
por mais que neste mesmo intervalo de tempo tenha havido seis anos entre Temer
e Bolsonaro, o fato é que existe um limite de aceitação de situações de
infortúnio por parte da maioria da população.
O resultado do
primeiro turno das eleições municipais pode ser analisado também por essa
ótica. Como dizia a querida e saudosa mestra, a professora e economista Maria Conceição Tavares, o povo não
come PIB. Isso significa que, com toda a certeza,
as políticas de austeridade fiscal e de arrocho monetário levadas a cabo pela
área econômica não têm contribuído para que o eleitorado avalie de forma
positiva ou compreensiva o governo. Pelo contrário, o que as pesquisas de opinião têm demonstrado é uma insatisfação com o
desempenho de Lula e de seu governo.
·
Lula precisa redefinir
os rumos de seu governo
Estamos nos
aproximando da metade de seu terceiro mandato. Ainda existe tempo para que o
presidente opere uma mudança de linha e de rota com vistas a recuperar a
credibilidade da maioria da população e prepare as forças progressistas para o
grande embate eleitoral que deverá ocorrer em 2026. Caso ele opte pela
manutenção do “mais do mesmo” no que se refere à condução da política econômica
pautada pela austeridade fiscal, é bem provável que assistamos a um aumento das
dificuldades políticas para sua própria reeleição. Afinal, a experiência tem
comprovado que os resultados sociais e políticos provocados pela combinação
austericida de juros elevados com estrangulamento orçamentário só beneficia os
setores do parasitismo financeiro.
Para recuperar as
bases de uma popularidade de seu segundo mandato, quando encerrou o governo com
índices superiores a 80%, Lula precisará realizar mudanças que podem até
desagradar parte das elites do financismo. Mas quem decide as eleições são as
dezenas de milhões de cidadãos que aguardam os efeitos positivos de um governo
desenvolvimentista e comprometido com programas sociais voltados à maioria.
¨ Banco Central não deve "virar as costas ao poder
democraticamente eleito", diz Galípolo em sabatina
O diretor de Política
Monetária do Banco Central (BC), Gabriel Galípolo, indicado para assumir a
presidência do BC a partir do ano que vem, disse, nesta terça-feira (8), que a
missão essencial da autoridade monetária é perseguir a meta de inflação definida
pelo Conselho Monetário Nacional (CMN), e não se deve “virar as costas” para o
“poder democraticamente eleito”.
As declarações do
economista foram dadas durante sabatina promovida pela Comissão de Assuntos
Econômicos (CAE) do Senado. Galípolo precisa ter o nome aprovado tanto pela CAE
quanto pelo plenário do Senado, o que deve ocorrer ainda nesta terça.
Questionado por
senadores sobre a autonomia do BC em relação ao governo, Galípolo deixou claro
que defende uma relação harmônica entre a autoridade monetária e o Executivo,
apesar da independência do órgão.
Questionado sobre as
críticas feitas por Lula a Campos Neto desde que o petista tomou posse,
Galípolo contemporizou e disse que lamenta não ter conseguido ajudar para que
essa relação fosse mais saudável
“Eu aprendi que, nos
debates da vida pública, existem algumas palavras-chave que quase são gatilhos.
Você usa uma palavra e, de repente, vai parar em uma arquibancada de torcida e
aquilo vira uma coisa acalorada. E autonomia é uma dessas palavras que geram um
debate acalorado”, brincou Galípolo.
“Se pegarmos a
literatura essencial sobre autonomia do BC, os cânones vão dizer que o BC tem
autonomia operacional para buscar as metas estabelecidas pelo poder
democraticamente eleito”, explicou.
“As metas e objetivos
estabelecidos são estabelecidos pelo poder democraticamente eleito. Uma vez
estabelecida, cabe ao BC perseguir essa meta. Esta é a definição que existe.”
Indicado por Lula para
a presidência do BC e sabatinado no Senado, o economista disse que “existem
numerosos desafios pela frente, como a construção de uma agenda capaz de tornar
a economia mais equânime”.
Segundo Galípolo,
“você tem de obedecer o arcabouço institucional e legal”. “Sou um daqueles que
defende que o BC nem deveria votar sobre a meta nas votações do CMN. Hoje nós
temos uma meta estabelecida de 3% e cabe ao BC perseguir essa meta de maneira inequívoca,
colocando a taxa de juros em um patamar restritivo pelo tempo que for
necessário para atingir essa meta”, afirmou.
“De maneira nenhuma, a
autonomia deve passar a ideia de que o BC vai virar as costas para o poder
democraticamente eleito”, concluiu Galípolo.
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Galípolo diz que sempre ouviu de Lula a garantia de liberdade na tomada de
decisões no BC
Indicado à presidência
do Banco Central, Gabriel Galípolo afirmou nesta terça-feira que sempre ouviu
do presidente Luiz Inácio Lula da Silva que terá a garantia de liberdade na
tomada de decisão no comando da autarquia.
"Toda vez que me
foi concedida a oportunidade de encontrar o presidente Lula, eu escutei de
forma enfática e clara a garantia da liberdade na tomada de decisões e que o
desempenho da função deve ser orientado exclusivamente pelo compromisso com o
povo brasileiro", disse em sabatina na Comissão de Assuntos Econômicos
(CAE) no Senado.
Galípolo afirmou ainda
que todas as conversas com senadoras e senadores também foram no sentido de
assegurar a liberdade na gestão do BC.
Em discurso na sessão
marcada para avaliar sua indicação, o diretor disse que atuação do BC tem sido
inequívoca na busca pelo atingimento da meta de inflação, ressaltando que
reafirma seu compromisso com o arcabouço estabelecido para o trabalho da autoridade
monetária.
Ele destacou que o
Brasil é hoje reconhecido por sua estabilidade monetária e financeira e
acrescentou que os núcleos de inflação no país nos últimos 12 meses ficaram em
níveis comparáveis aos de economias estáveis como Estados Unidos e Reino Unido.
Após a análise da CAE,
a expectativa é de que a indicação de Galípolo seja avaliada pelo plenário da
Casa na tarde desta terça-feira.
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Lula diz que a inflação está controlada e que taxa alta de juros "haverá
de ceder"
No dia em que seu
indicado para a presidência do Banco Central, Gabriel Galípolo, passa por
sabatina no Senado, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva voltou a falar dos
juros altos, mas sem o tom de crítica que costuma empregar ao tratar do BC sob
o comando de Roberto Campos Neto.
"Eu estou muito
feliz, porque a economia está razoável, a taxa de juros está mais alta, mas ela
haverá de ceder, temos a inflação controlada, temos a massa salarial crescendo,
temos o emprego crescendo", disse.
Galípolo, hoje diretor
de Política Monetária do BC, precisa ser aprovado nesta terça pela Comissão de
Assuntos Econômicos do Senado e depois pelo plenário da Casa para assumir o
cargo. A expectativa do governo é que não haverá grandes dificuldades e o diretor
assumirá a presidência do banco a partir de janeiro.
Em sua última reunião,
o Comitê de Política Monetária do BC (Copom) aumentou a taxa Selic para 10,75%
com voto unânime dos diretores, incluindo Galípolo, que é bastante próximo a
Lula.
Em discurso durante
evento no qual sancionou a lei de criação do combustível do futuro, uma série
de incentivos para desenvolvimento de alternativas a combustíveis fósseis e
para a transição energética no país, Lula defendeu que o Brasil é um dos
países, hoje, mais estáveis do mundo.
"Hoje tem
pouquíssimos países com a estabilidade que tem o Brasil. Tem pouquíssimos com o
crescimento, que vai chegar a 3,5% este ano, como o Brasil", disse Lula,
que contou ter procurado as três principais agências de rating, em Nova York,
para entender os critérios usados para definir grau de investimento.
"Alguns dizem que
é sorte. Eu digo que é muito trabalho e dedicação desses ministros, foi muita
competência da Câmara e do Senado em votar as coisas que precisamos",
continuou.
Fonte: Outras
Palavras/Infomoney/Reuters
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