terça-feira, 28 de outubro de 2025

Lula sobre tarifaço: 'Trump me garantiu que fará acordo, e vai ser mais rápido do que muita gente pensa'

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) afirmou nesta segunda-feira (27/10) na Malásia que Donald Trump se comprometeu a negociar rapidamente um acordo com o Brasil sobre as tarifas de 50% impostas pelos EUA a produtos brasileiros.

"Ele [Trump] garantiu que vamos ter um acordo. E acho que será mais rápido do que muita gente pensa", disse Lula durante uma coletiva de imprensa.

Lula afirmou que Brasil e EUA devem participar de novas rodadas de negociações sobre as tarifas "nas próximas semanas" em Washington.

"Estou convencido de que, em poucos dias, teremos uma solução definitiva entre Estados Unidos e Brasil, para que a vida siga boa e alegre, do jeito que dizia Gonzaguinha em sua música", disse o brasileiro.

As declarações foram feitas um dia após Lula se encontrar com Trump na Malásia.

Na reunião com Trump, o brasileiro disse ter pedido ao americano "a suspensão da taxação e revisão das punições aos nossos ministros", referindo-se a sanções aplicadas pelos EUA a magistrados do Supremo Tribunal Federal (STF) e autoridades de seu governo.

O brasileiro voltou a chamar as sanções de "infundadas e baseadas em informações erradas".

Lula disse que Trump "ficou surpreso" ao ouvir que as sanções americanas haviam atingido até a filha de 10 anos do ministro da Saúde, Alexandre Padilha (PT).

Padilha foi sancionado em agosto por ter participado da elaboração do programa Mais Médicos. Segundo o governo americano, o programa consistiu em um "esquema de exportação de trabalho forçado do regime cubano", em referência à participação de médicos cubanos no programa entre 2013 e 2018.

O ministro, sua esposa e filha tiveram os vistos americanos cancelados.

Já oito magistrados do STF - entre os quais o ministro Alexandre de Moraes - foram sancionados com base na Lei Magnitsky, criada para punir estrangeiros que os EUA consideram autores de graves violações de direitos humanos.

Na entrevista coletiva, Lula disse que questões políticas entre Brasil e Estados Unidos - incluindo as sanções aos ministros - serão tratadas apenas por ele e por Trump, ao passo que assessores dos dois governos negociarão temas comerciais, como as tarifas a produtos brasileiros.

Lula disse ainda ter defendido na reunião com Trump a legitimidade do julgamento no STF que condenou Bolsonaro a 27 anos e 3 meses de prisão por golpe de Estado e outros crimes. O americano já fez várias críticas ao julgamento e o usou como um dos argumentos para aplicar as tarifas de 50% contra o Brasil.

"Eu disse que foi um julgamento muito sério, com provas contundentes", afirmou Lula.

Referindo-se a Bolsonaro, Lula disse que Trump sabe que "rei morto, rei posto".

"Bolsonaro faz parte do passado da política brasileira. Eu disse [a Trump]: com três reuniões que você fizer comigo, vai perceber que Bolsonaro não era nada", disse o petista.

Lula disse que a reunião com Trump foi importante para que pudessem se conhecer pessoalmente.

"Quando você se conhece [por intermédio] das pessoas que falam, é mais difícil. Tem que sentir, pegar na mão, olhar, ver a reação da pessoa. Acho que houve sinceridade na nossa relação", afirmou.

O encontro ocorrido no domingo foi a primeira reunião formal entre os dois, que mantinham relação distante desde o início do governo Trump.

A situação se agravou em julho, quando Washington anunciou o tarifaço contra o Brasil. Mas o diálogo melhorou a partir de setembro, quando ambos tiveram breve contato durante a Assembleia Geral da ONU, em Nova York, o que abriu as negociações para o encontro bilateral.

Numa rápida conversa com jornalistas antes do início da reunião, Trump disse ser "uma honra estar com o presidente do Brasil".

"Acredito que seremos capazes de fazer ótimos acordos para os dois países", disse ele.

Após o encontro, o perfil da Casa Branca no X publicou uma foto dos dois presidentes se cumprimentando e a seguinte fala de Trump: "Acho que seremos capazes de fechar alguns bons acordos para ambos os países... Sempre tivemos um bom relacionamento e acredito que isso continuará."

Também depois do encontro, o secretário-executivo do Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (MDIC), Márcio Rosa, disse que a questão de Bolsonaro não foi discutida diretamente e que Trump não mencionou o aliado na conversa.

<><> Por que reunião entre os líderes importa

Do ponto de vista brasileiro, as tarifas foram percebidas como arbitrariedade, já que os EUA acumulam superávit em sua balança comercial com o Brasil. Em diversas declarações, Lula questionou a lógica das medidas, alegando que "a tese pela qual se taxou o Brasil não tem sustentação em nenhuma verdade", e prometeu apresentar argumentos nessa linha durante o encontro. As tarifas, que entraram em vigor em 6 de agosto, afetam diretamente setores estratégicos — especialmente exportadores agrícolas e pecuaristas. A Câmara Americana de Comércio para o Brasil (Amcham Brasil) reforçou que, mesmo com a isenção a uma série de produtos, ainda há um impacto expressivo sobre setores estratégicos da economia brasileira.

Em agosto, o governo Lula anunciou um pacote de medidas para mitigar o impacto econômico do tarifaço. As ações incluem linhas de crédito subsidiadas, adiamento da cobrança de impostos e compras governamentais de alimentos dos setores impactados. Do lado americano, a taxação pode inibir a importação de produtos do Brasil, levando os EUA a tentar aumentar a produção interna, a buscar mercados substitutos ou, caso essas duas alternativas não sejam bem-sucedidas, a reduzir a oferta interna desses itens. Nesse último cenário, se não houver redução da demanda, a menor oferta pode ter como consequência aumento de preços.

Essa estratégia é arriscada no caso de alguns produtos, como café, já que os EUA não têm as condições climáticas adequadas para produção em larga escala como o Brasil. Além do comércio e sanções, a regulação das big techs e da mineração de terras raras, são dois pontos centrais para os americanos. O acesso ao mercado de etanol no Brasil é outra prioridade.

¨      'Otimismo comedido', 'avanço concreto': as reações da indústria e do agro ao encontro Lula-Trump

Associações da indústria e do agronegócio receberam com otimismo a reunião entre os presidentes Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e Donald Trump, neste domingo (26), e esperam que o encontro acelere as negociações para reverter ou diminuir o tarifaço de 50% imposto aos produtos brasileiros. Após a reunião, diversas entidades do setor privado se manifestaram.

  • A Confederação Nacional da Indústria (CNI) disse que o encontro foi um "avanço concreto" rumo às negociações do tarifaço e que é "possível esperar redução da sobretaxa de 40%";
  • A Câmara de Comércio Americana para o Brasil afirmou que espera que as negociações levem a um "entendimento no curto prazo" entre os dois países;
  • A Associação Brasileira da Indústria do Café (ABIC) disse que está otimista e que quer uma reavaliação técnica da tarifa imposta ao café;
  • O Conselho dos Exportadores de Café do Brasil (Cecafé) celebrou a reunião entre Lula e Trump, e disse "aguardar por resultados concretos para a isenção das tarifas";
  • A Associação Brasileira das Indústrias de Calçados afirmou que está com "otimismo comedido" e que espera que "medidas concretas sejam tomadas nos próximos dias";
  • A Associação Brasileira das Indústrias Exportadoras de Carnes disse que a reunião mostrou disposição de ambos os governos em avançar nas discussões sobre as tarifas.

<><> O que diz a indústria

Logo após o encontro entre Lula e Trump, a CNI disse que o encontro representou um avanço no sentido de reverter o tarifaço imposto ao Brasil pelo governo americano. "O diálogo entre os dois líderes representa um avanço concreto nas tratativas bilaterais e reforça o compromisso de ambos os governos com a construção de soluções equilibradas para o comércio entre Brasil e Estados Unidos", afirmou a entidade. Segundo a CNI, o anúncio do início das negociações sobre o tarifaço pode representar um "passo relevante". Ricardo Alban, presidente da entidade, afirmou acreditar que será construída uma solução capaz de devolver previsibilidade e competitividade às exportações brasileiras. À GloboNews, Alban declarou que a negociação ocorreu de forma célere, apesar do que muitos acreditavam. Ele disse ainda que é possível esperar uma possível redução da sobretaxa de 40% para entrada de produtos brasileiros nos EUA, em vigor desde agosto, por determinado prazo, para que as negociações evoluam. O setor de autopeças, máquinas e equipamentos seriam os mais impactados financeiramente pela suspensão temporária da taxação, segundo o presidente da CNI. Alban afirmou que é preciso que o setor industrial se fortaleça cada vez mais para que o Brasil se insira na geopolítica comercial.

<><> Câmara de Comércio Americana

Já a Amcham, a Câmara Americana de Comércio para o Brasil, pede que intensificação das negociações leve a um acordo bilateral com agilidade. “Reforçamos a importância de que a intensificação das negociações, com novas rodadas previstas a partir de hoje, leve a um entendimento em curto prazo, com foco na ampliação de oportunidades de comércio e investimentos entre as duas maiores economias das Américas”, disse Abrão Neto, presidente da Amcham Brasil. Para a Amcham Brasil, a reunião representa um avanço importante no diálogo de alto nível entre os dois governos, além de fortalecer as perspectivas de um acordo bilateral voltado à redução de tarifas sobre as exportações brasileiras.

<><> 'Estamos otimistas', diz indústria do café

A Associação Brasileira do Café (Abic) também recebeu com otimismo a reunião entre Lula e Trump e disse que espera uma "reavaliação técnica" das tarifas impostas ao café, produto agrícola que o Brasil mais exporta aos EUA. "Os últimos encontros entre os Presidentes dos EUA e do Brasil têm sido mais positivos e ABIC estamos otimistas. As relações de longo prazo entre Brasil e Estados Unidos permitirão uma reavaliação equilibrada e responsável dessas tarifas, com base em critérios técnicos e em benefício mútuo", disse Pavel Cardoso, presidente da ABIC. "Embora o novo cenário traga desafios imediatos às exportações, a ABIC destaca que o café brasileiro mantém posição sólida no mercado internacional, sustentada por sua competitividade, qualidade reconhecida e relevância para a balança comercial dos dois países", acrescentou a entidade.

<><> Exportadores de carne bovina

A Associação Brasileira das Indústrias Exportadoras de Carnes (ABIEC) também avaliou de forma positiva a reunião. "O encontro reforça a importância do diálogo para o fortalecimento das relações comerciais entre Brasil e Estados Unidos e demonstra a disposição de ambos os governos em avançar nas discussões sobre as tarifas atualmente em vigor, que afetam diferentes setores do comércio bilateral, incluindo as exportações de carne bovina brasileira." A associação disse que acredita que o entendimento entre os dois países pode preservar a competitividade do produto brasileiro e garantir previsibilidade aos exportadores Os EUA são o segundo maior comprador de carne bovina do Brasil, depois da China, e um importante destino para o setor.

<><> Setor de calçados tem 'otimismo comedido'

A Associação Brasileira das Indústrias de Calçados (Abicalçados) disse que, neste momento, tem um "otimismo comedido" em relação à reunião e que espera que "medidas concretas sejam tomadas nos próximos dias". Apesar disso, disse que enxerga com "bons olhos os avanços nas negociações" entre Brasil e EUA neste domingo.

<><> Exportadores de café

O Conselho dos Exportadores de Café do Brasil (Cecafé) celebrou a reunião entre Lula e Trump, e disse "aguardar por resultados concretos para a isenção das tarifas".

A entidade destacou ainda que tem participado presencialmente de reuniões com a equipe do governo federal, levando informações estratégicas que possam contribuir com a reversão das tarifas.

<><> Do tarifaço ao encontro na Malásia

Em julho, os Estados Unidos anunciaram tarifas de até 50% sobre produtos brasileiros, atingindo especialmente exportações agrícolas e de carne bovina. Na época, o governo Trump deixou claro diversas vezes que essas punições tinham natureza política. Além das tarifas, o Escritório do Representante de Comércio dos Estados Unidos (USTR) abriu uma investigação contra o Brasil, acusando o país de adotar "práticas comerciais desleais". A Casa Branca também impôs restrições de visto a autoridades brasileiras e sanções financeiras ao ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Alexandre de Moraes, e à mulher dele, Viviane Barci de Moraes. As medidas foram tomadas em meio julgamento que condenou o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) por incitar ataques às instituições brasileiras.

O governo brasileiro classificou as sanções como um ataque à soberania nacional e uma tentativa de interferir na independência do Judiciário. As sanções tiveram como pano de fundo a atuação do deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL-SP), filho do ex-presidente brasileiro. O deputado se mudou para os Estados Unidos no início do ano e iniciou articulações junto à Casa Branca para buscar medidas contra o Brasil que pudessem pressionar pela absolvição e pela anistia do pai.

Em setembro, no entanto, Lula e Trump se cruzaram brevemente durante a Assembleia Geral da ONU, em Nova York, mantendo contato próximo desde então.

No dia 6 de outubro, os líderes fizeram uma videoconferência de aproximadamente 30 minutos. Na conversa, Lula pediu a Trump a retirada da tarifa imposta aos produtos brasileiros e das medidas restritivas aplicadas contra autoridades brasileiras. Na ocasião, Trump não teria respondido diretamente ao pedido de Lula para a retirada das tarifas e das sanções econômicas e de vistos. O presidente americano teria se limitado a dizer que o tema seria conduzido pelas equipes técnicas dos dois países. Já em 16 de outubro, o ministro das Relações Exteriores do Brasil, Mauro Vieira, e o secretário de Estado americano, Marco Rubio, se reuniram por uma hora na Casa Branca, em Washington. Em uma breve declaração à imprensa, o chanceler brasileiro disse que encontro foi "muito produtivo, num clima excelente de descontração e de troca de ideias e posições de uma forma muito clara e muito objetiva". Segundo Vieira, houve "muita disposição para trabalhar em conjunto para traçar uma agenda bilateral de encontros para tratar de temas específicos de comércio". Pelo lado americano, Rubio e o representante de comércio dos EUA, Jamieson Greer, disseram em um comunicado conjunto que tiveram com o ministro brasileiro "conversas muito positivas sobre comércio e as questões bilaterais em curso". Segundo a nota, os três "concordaram em colaborar e conduzir discussões em múltiplas frentes no futuro imediato e estabelecer um plano de ação".

Mesmo com os esforços do encontro para tentar selar a paz, os dois líderes também deram sinais de que não pretendiam recuar de suas posições durante a semana que antecedeu o encontro. Na quarta-feira (22/10), Trump afirmou que os pecuaristas americanos "estão indo bem" graças à tarifa imposta sobre o gado de outros países, como o Brasil. "Os pecuaristas, que eu adoro, não percebem que a única razão pela qual estão indo tão bem — pela primeira vez em décadas — é porque impus tarifas sobre o gado que entra nos Estados Unidos, incluindo uma tarifa de 50% sobre o Brasil", escreveu em sua rede social. O republicano acrescentou que, se não fosse por ele, os criadores de gado americanos "estariam na mesma situação dos últimos 20 anos", que classificou como "péssima".

Já Lula, na quinta (23/10), voltou a defender alternativas ao dólar no comércio global. Durante a visita que faz à Indonésia, o presidente afirmou que tanto o Pix quanto o sistema de pagamentos indonésio têm potencial para facilitar o intercâmbio entre os dois países e entre os membros do Brics. "O século 21 exige que tenhamos a coragem que não tivemos no século 20", disse Lula, ao defender "uma nova forma de agir comercialmente, para não ficarmos dependentes de ninguém", sem citar diretamente os Estados Unidos. A defesa de moedas alternativas à americana, reforçada pelo Brasil durante a cúpula dos Brics em julho, foi apontada por Trump como um dos motivos para a imposição das tarifas às exportações brasileiras.

<><> Por que reunião entre os líderes importa

Do ponto de vista brasileiro, as tarifas foram percebidas como arbitrariedade, já que os EUA acumulam superávit em sua balança comercial com o Brasil. Em diversas declarações, Lula questionou a lógica das medidas, alegando que "a tese pela qual se taxou o Brasil não tem sustentação em nenhuma verdade", e prometeu apresentar argumentos nessa linha durante o encontro. As tarifas, que entraram em vigor em 6 de agosto, afetam diretamente setores estratégicos — especialmente exportadores agrícolas e pecuaristas. A Câmara Americana de Comércio para o Brasil (Amcham Brasil) reforçou que, mesmo com a isenção a uma série de produtos, ainda há um impacto expressivo sobre setores estratégicos da economia brasileira.

Em agosto, o governo Lula anunciou um pacote de medidas para mitigar o impacto econômico do tarifaço. As ações incluem linhas de crédito subsidiadas, adiamento da cobrança de impostos e compras governamentais de alimentos dos setores impactados. Do lado americano, a taxação pode inibir a importação de produtos do Brasil, levando os EUA a tentar aumentar a produção interna, a buscar mercados substitutos ou, caso essas duas alternativas não sejam bem-sucedidas, a reduzir a oferta interna desses itens. Nesse último cenário, se não houver redução da demanda, a menor oferta pode ter como consequência aumento de preços.

Essa estratégia é arriscada no caso de alguns produtos, como café, já que os EUA não têm as condições climáticas adequadas para produção em larga escala como o Brasil. Além do comércio e sanções, a regulação das big techs e da mineração de terras raras, são dois pontos centrais para os americanos. O acesso ao mercado de etanol no Brasil é outra prioridade.

 

Fonte: BBC News Brasil/g1

 

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