quinta-feira, 30 de outubro de 2025

COP 30 – adaptação ou prevenção?

Como sabemos, a COP 30, a Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas, será realizada este ano, em novembro, em Belém do Pará.

Ela desperta esperança, já que será realizada em um país governado pela esquerda, sob a égide do presidente Lula. Mas é preciso constatar que o maior poluidor do planeta, os Estados Unidos, estára ausente, já que Donald Trump – negacionista fanático das mudanças climáticas – retirou seu país dessa instância internacional

Infelizmente, uma decisão recente das autoridades brasileiras lança uma sombra sobre esta reunião: a autorização para explorar o petróleo localizado no fundo do mar, perto da foz do Amazonas. Os ecologistas brasileiros denunciam essa decisão, que representa um risco enorme — em caso de acidente com as perfurações marítimas — de uma “onda negra” destruir os frágeis ecossistemas da floresta amazônica.

Além disso, se as enormes quantidades de petróleo depositadas no fundo do mar nessa região forem extraídas, comercializadas e queimadas, isso será uma contribuição decisiva para a mudança climática.

Nessas condições, o que se pode esperar dessa COP 30? É preciso dizer que o balanço das 29 anteriores não é glorioso: é verdade que algumas resoluções foram tomadas, mas… nunca foram postas em prática. As emissões nunca pararam de crescer, o acúmulo de gases de efeito estufa atingiu proporções sem precedentes e o limite perigoso de 1,5°C (acima da era pré-industrial) já foi atingido.

Quais são as ambições dos organizadores da nova COP? Podemos ter uma ideia ao ler uma entrevista recente com André Correa do Lago, nomeado por Lula para presidir a COP 30. Diplomata com longa experiência em desenvolvimento sustentável, ele é atualmente Secretário de Clima, Energia e Desenvolvimento do Ministério das Relações Exteriores do Brasil. Nessa entrevista, Corrêa do Lago declara: “Gostaria muito que as pessoas se lembrassem da COP 30 como uma COP da adaptação”.

O que isso significa? Certamente, a adaptação às consequências das mudanças climáticas – incêndios florestais, tornados, inundações catastróficas, temperaturas insuportáveis, secas, desertificação, falta de água doce, aumento do nível do mar, etc. (a lista é imensa) – é necessária, especialmente nos países do Sul, primeiras vítimas desses danos.

Mas dar prioridade à “adaptação” em vez da “prevenção” é uma forma indireta de se resignar à inevitabilidade das mudanças climáticas. É um discurso que se ouve cada vez mais entre os governantes de diferentes países do mundo.

A lógica desse argumento é simples: como é impossível prescindir dos combustíveis fósseis, do transporte globalizado de mercadorias, da agricultura industrial e de outras múltiplas atividades econômicas responsáveis pelas mudanças climáticas, mas necessárias para o bom funcionamento da economia capitalista, só nos resta a possibilidade de nos adaptarmos.

Se, num primeiro momento, a adaptação ainda é possível, a partir de um certo aumento da temperatura – dois graus? três graus? ninguém pode dizer – ela se tornará impossível. Como se adaptar, se a temperatura ultrapassar os 50 graus? Se a água potável se tornar um bem escasso? Podemos multiplicar os exemplos.

Não nos resta muito tempo para impedir uma catástrofe que colocaria em risco a sobrevivência humana neste planeta. E, ao contrário do que pensam habitantes de Marte como Elon Musk, não existe um planeta B. Se a COP 30 privilegiar a adaptação em detrimento da prevenção, ficará na memória das pessoas como a COP da capitulação.

Felizmente, reunir-se-á em Belém do Pará, ao mesmo tempo que a COP, uma Cúpula dos Povos, na qual participarão movimentos ecologistas, camponeses, indígenas, feministas, ecosocialistas e outros, que discutirão as verdadeiras soluções para a crise ecológica e tomarão as ruas de Belém do Pará para protestar contra a inércia dos governos e afirmar a necessidade de romper com o sistema. São semeadores de futuro, que recusam a resignação e o conformismo.

•        COP30 precisa definir novo rumo para a humanidade ou consequências serão devastadoras, diz secretário-geral da ONU

O secretário-geral da Organização das Nações Unidas (ONU), António Guterres, colocou a realização da COP30, em Belém, no Pará, como essencial para o despertar de medidas para evitar uma catástrofe climática. A declaração foi dada em entrevista exclusiva ao jornalista indígena Wajã Xipai, da Sumaúma.

Durante a conversa, a liderança da ONU reforçou a importância de vozes indígenas serem ouvidas durante a conferência, que será realizada entre os dias de 10 e 21 de novembro.

“É absolutamente essencial, e ainda bem que o presidente Lula compreendeu que esta COP tem de ser a COP da verdade, e que, para ser a COP da verdade, tem que ouvir o que as comunidades indígenas têm a dizer sobre a forma como protegem a Natureza, a biodiversidade e como ajudam a evitar as alterações climáticas, mas também [o que elas têm a dizer] das sucessivas violações dos seus direitos a que assistimos em tantas partes do mundo”, disse o secretário-geral.

Para Guterres, a inspiração em quem conhece a natureza de perto deve ser um ponto de partida para evitar consequências devastadoras.

“Por isso mesmo, a voz das comunidades indígenas é um componente essencial da COP e deve inspirar as medidas que são indispensáveis se nós queremos evitar uma catástrofe climática”, continuou.

Entre os pontos a serem debatidos na COP, Guterres apontou a necessidade de os líderes mundiais reconhecerem suas “falhas”. Segundo o secretário-geral, conseguir limitar o aumento da temperatura a 1,5 grau Celsius é um dos tópicos fundamentais.

“Vamos reconhecer nosso fracasso. Os países estão apresentando suas Contribuições Nacionalmente Determinadas [NDCs]. Das recebidas até agora, há uma expectativa de redução de emissões em torno de 10%. Mas precisaríamos de uma redução de 60% [para limitar o aquecimento global a 1,5 grau Celsius]. Portanto, a ultrapassagem do limite agora é inevitável”, lamenta.

Diante do cenário, mudar o curso atual é de extrema importância para diminuir os danos e evitar que a Amazônia entre em ponto de não retorno, quando a mudança no sistema é irreversível.

“Ainda é possível se acelerarmos para chegar a zero emissões líquidas [de gases de efeito estufa] e, se nos tornarmos negativos depois disso até o final do século, ainda é possível chegar ao final do século com 1,5 grau Celsius ou menos”, destaca.

Agora, se nada for feito, Guterres teme pelo cenário de devastação na Amazônia: “Nesse meio-tempo, teremos um avanço do limite. Devemos fazer tudo o que for possível para que esse avanço temporário da meta de aquecimento seja o mais curto e o menos intenso possível, a fim de evitar pontos de não retorno, como na Amazônia. Não queremos ver a Amazônia como uma savana. Mas isso é um risco real se não mudarmos de rumo para fazer uma redução drástica das emissões o mais rápido possível”.

•        Thelma Krug diz que Brasil não fará feio na COP, mas alerta: 'não é sobre floresta, é sobre combustíveis fósseis'

Em meio a polêmicas sobre hospedagens, redução de delegações e atrasos dos países para a entrega de suas novas metas climáticas para a COP30, a cientista Thelma Krug, líder do Conselho Científico da Conferência e ex-vice presidente do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC), se mantém otimista. “O Brasil não vai fazer feio, não vai”, frisou.

Em entrevista ao Terra, ela ressaltou o que chamou de ‘liderança inquestionável’ do Brasil e disse não se preocupar que o encontro em Belém tenha público menor, desde que as negociações não desviem o foco dos combustíveis fósseis, principal fonte de emissões de gases de efeito estufa e agravador da crise climática. No entanto, pondera que o caminho da descarbonização de nações não é uma coisa simples e que há muitas pressões no jogo. “A COP é uma COP de economia. Ela não é ambiental. Nunca foi.”

"A COP é na floresta, mas ela não é das florestas. Não podemos desviar o olhar dos combustíveis fósseis. (...)A gente não pode perder esse momento, essa oportunidade de continuar discutindo e chamando realmente para esse tipo de redução." - Thelma Krug

Thelma já representou o Brasil em mais de dez Conferências das Partes, as COPs, e explica que o País é “extremamente respeitado” por apresentar suas opiniões de forma clara e transparente, garantindo confiança e conforto ao trocar com outros países. E, nessa COP, ela acredita que não será diferente.

Por o evento acontecer na Amazônia pela primeira vez, a avaliação é que a valorização do papel de comunidades indígenas e tradicionais irá proporcionar um ambiente positivo para as negociações. Isso mesmo considerando o pedido feito pela ONU para que, ‘gentilmente’, as delegações fossem reduzidas considerando ‘limitações de capacidade’ de Belém.

“Eu não estou preocupada que venha menos gente. Acho que, às vezes, até pode funcionar um pouco melhor”, disse. Para ela, mesmo que sejam 10 países participantes presentes, vai ser positivo se houver foco.

Além disso, a cientista frisa que “a COP não se encerra em Belém”, pois o resultado real é o que virá a ser construído de forma conjunta ao longo dos meses após a conferência. Para ela, sob o ponto de vista de eficiência, inclusive, pode-se ter mais sucesso com a cobrança da sociedade civil engajada nas discussões pós-COP30 do que com a presença no evento, em si.

Thelma também não critica a escolha de Belém como sede da Conferência. Ela considera que isso vai voltar os olhares do mundo para a região Norte do Brasil e que nos dará a oportunidade de mostrar um “outro lado” do Brasil que vai além do sudeste. “Um lado riquíssimo”.

“Acho que é questionável a gente falar de ‘local certo’. Eu já vi COP em um passado recente que não acho que foi no lugar certo. Não é certo que a gente esteja falando de um problema tão sério [com relação à escolha de Belém]”, disse.

 

Fonte: Por Michae Löwy,em A Terra é Redonda/Portal Terra

 

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