Pesquisadores
brasileiros avançam nos estudos sobre uso de exoesqueletos e IA na reabilitação
física e neurológica
Mais de 2 bilhões de pessoas necessitam de algum tipo
de reabilitação no mundo. No Brasil, cerca de 25% da população, o equivalente a
52 milhões de pessoas, possuem algum tipo de deficiência física ou neurológica,
conforme apontado pelo Censo de 2010. As limitações da funcionalidade podem ser
congênitas ou adquiridas após problemas como acidentes vasculares cerebrais,
por enfermidades degenerativas ou acidentes graves.
Fatores como o aumento da expectativa de vida e da
violência urbana e o impacto crescente das guerras reforçam a compreensão da
reabilitação enquanto um componente cada vez mais central para garantir
inclusão social e qualidade de vida.
No Instituto de Medicina Física e Reabilitação
(IMREA), que integra a Rede de Reabilitação Lucy Montoro – iniciativa que
idealizei e presido no conselho –, os avanços recentes em pesquisa e
desenvolvimento estão inaugurando uma nova era na reabilitação.
A tecnologia desempenha um papel fundamental nesse
processo, com inovações como
exoesqueletos, realidade aumentada e inteligência artificial sendo incorporadas
aos tratamentos. Essas soluções vão além da recuperação da
mobilidade, promovendo melhorias na condição funcional dos pacientes, ampliando
sua autonomia e fortalecendo sua inclusão social.
Oferecer novas tecnologias que promovam a
funcionalidade é, acima de tudo, uma
estratégia para melhorar a qualidade de vida das pessoas e mitigar os impactos
sociais e econômicos da dependência. No Brasil, cerca de 12% do PIB
está vinculado à economia informal de cuidados, composta por familiares que
muitas vezes precisam deixar o trabalho para assistir pessoas com limitações
funcionais.
Os exoesqueletos estão entre os avanços mais
transformadores em uso. Trata-se de uma estrutura robótica vestível que combina
tecnologia avançada, como sensores, motores, inteligência artificial e novos
materiais leves e resistentes, aplicados por meio da engenharia biomédica para
auxiliar a mobilidade e reabilitação.
Os primeiros protótipos utilizados no Brasil vieram
de países como França, Coreia do Sul e China, que possuem equipamentos avançados
nesse campo. A importação desses equipamentos foi fundamental para entender o
que já foi feito e buscar o estado da arte no desenvolvimento de um produto
brasileiro.
Os modelos desenvolvidos nos nossos laboratórios
são mais leves, ajustáveis e acessíveis, utilizando ligas metálicas e compostos
que reduzem o peso sem comprometer a resistência. Possuem um sistema de
registro eletrônico que armazena as configurações personalizadas de cada
paciente, facilitando seu uso e tornando a adaptação mais eficiente.
Os protótipos nacionais, desenvolvidos em
colaboração com a Escola Politécnica e a Escola de Engenharia de São Carlos da
USP, já estão em fase de testes clínicos, com resultados iniciais promissores.
Essa tecnologia tem o potencial de se transformar em um recurso cotidiano,
tanto para reabilitação em centros especializados quanto para uso doméstico no
futuro.
Além disso, esses dispositivos são adaptados para pessoas de diferentes estaturas e
pesos, características que muitas vezes não são consideradas nos modelos
importados. Mais uma prioridade é reduzir o custo, permitindo que mais
pessoas tenham acesso à tecnologia, tanto nos centros de reabilitação quanto em
suas próprias casas.
Outros avanços em pesquisa incluem dispositivos que
utilizam realidade aumentada e sensores para monitorar remotamente o progresso
dos pacientes.
A realidade aumentada, em particular, permite criar
cenários virtuais nos quais o paciente interage durante os exercícios. Por
exemplo, simuladores podem recriar situações do dia a dia, como atravessar ruas
ou alcançar objetos, ajudando o paciente a desenvolver habilidades motoras
específicas e a ganhar confiança.
Todas essas ferramentas tornam o processo de
reabilitação mais envolvente e divertido, aumentando a adesão e o comprometimento
com os exercícios.
A conectividade é mais um aspecto importante, pois
permite que os dispositivos estejam integrados a plataformas de acompanhamento
remoto. Com isso, profissionais de saúde podem fazer o monitoramento do
paciente em tempo real e ajustar os tratamentos conforme a necessidade.
Nessa área, já estamos testando dispositivos de
conectividade para exercícios em casa, como esteiras adaptadas e equipamentos
de fortalecimento muscular com sensores integrados. Esses sistemas registram
dados em tempo real, como força aplicada, amplitude de movimento e frequência
de uso, oferecendo relatórios detalhados aos profissionais que acompanham o
caso.
A integração da IA a esses dispositivos é mais um
recurso que tem se mostrado bastante eficiente, sugerindo ajustes e novos
exercícios, o que facilita a personalização das terapias.
No âmbito internacional, neurocientistas como
Grégoire Courtine, do Centro NeuroRestore, na Suíça, lideram pesquisas com
implantes de microchips na coluna para restaurar funções motoras. A iniciativa,
embora ainda em fase experimental, revela a amplitude das possibilidades
tecnológicas na reabilitação.
O desenvolvimento de tecnologias que combinam
estimulação elétrica e robótica aponta para um futuro em que as lesões
medulares poderão ser tratadas com muito mais eficácia, devolvendo autonomia e
funcionalidade aos pacientes.
A introdução de exoesqueletos e dispositivos
vestíveis para uso em casa poderá transformar o tratamento, promovendo maior
autonomia e funcionalidade.
Assim como a bicicleta ergométrica, que era
exclusividade de centros de reabilitação no passado e hoje está em muitas
residências, é de esperar que os
exoesqueletos venham a ter custos acessíveis e que se tornem parte do cotidiano
de muitas pessoas.
Além disso, estamos implementando iniciativas como
os “Walking Clubs”, onde pacientes podem treinar e socializar em um ambiente
descontraído, sem a pressão de um tratamento formal. Isso reforça a ideia de
que reabilitação vai além do físico; é também social e emocional.
A pesquisa brasileira tem
um papel central nesse processo.
Estamos na vanguarda do desenvolvimento de
dispositivos acessíveis, com potencial para reduzir custos e ampliar o acesso.
Esses esforços colocam o Brasil como referência em reabilitação de alta complexidade.
Estamos no caminho certo, mas é necessário acelerar
a ampliação do alcance dessas tecnologias. O futuro da reabilitação é uma
construção coletiva, onde ciência, tecnologia e cuidado humano se encontram
para transformar vidas. Com o envelhecimento da população e o aumento de
condições que afetam a funcionalidade, é essencial que governos e instituições
de saúde invistam em tecnologias que garantam maior eficácia e acessibilidade.
Fonte: Por Linamara
Rizzo Battistella em Conversation Brasil
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