sexta-feira, 24 de janeiro de 2025

Monica Hirst: Um “pacificador” armado até os dentes

Pode até ser que o Trump 2.0 signifique uma de-escalada das guerras e conflitos deflagrados em diferentes pontos do planeta, muito especialmente no Oriente Médio e na Europa Oriental. Mas não há dúvida de que assistiremos um incremento de políticas de mão dura, coerção militar e securitização generalizada da agenda internacional dos Estados Unidos.

O elenco de Ordens Executivas assinadas por Trump 2.0 nas primeiras 24 horas de sua presidência mostra uma concentração em decisões que fazem uso, como primeira alternativa, de atributos duros de poder. De saída, observa-se um alcance amplo dos conteúdos deste elenco, o que se associa com uma necessidade de demonstração imediata de monopólio da força, à disposição do emprego deste recurso pela nova administração desde um sentido vertical. Outra característica que se repete nas decisões formalizadas é a borrosa separação entre política doméstica e internacional; entre segurança interna e externa. Com este propósito uma ordem executiva, curta e direta, determina o pleno alinhamento do Departamento de Estado, do Departamento de Defesa e a Agência de Segurança interna (Homeland  Security) à premissa de América Primeiro.  

As clonadas palavras do Secretário de Estado Marco Rubio, indicaram seu estado de prontidão (uma espécie de “yes sir” com som de obediência militar) ao declarar que sua política externa atenderia a três objetivos essenciais: fazer os Estados Unidos mais fortes, mais seguros e mais prósperos. Tornar esta tripla missão no mantra da política externa americana significará deixar de lado uma atuação guiada por valores e ideais e buscar dando máxima prioridade aos interesses nacionais, em todas suas manifestações e preferencialmente aqueles vinculados ao mundo privado. 

O tema migratório ganhou um sentido emblemático para a soltura da cavalaria nesta direção. A militarização da fronteira sul e a decretação de uma situação de emergência nacional implicou delegar ao Departamento de Defesa e à Guarda Nacional uma ampla responsabilidade nãos ações de contenção aos “bárbaros”. O Pentágono deverá elaborar um plano que assegure “selar as fronteiras, manter a soberania, a integridade territorial e a segurança dos Estados Unidos, repelindo todas as formas de invasão.” Assim, o que se conhece como a agenda interméstica, que domina as relações dos EEUU com o seu principal vizinho ao Sul se tornará um corolário da política de defesa e de segurança interna. Se estabeleceu também uma estreita ponte entre a securitização da política migratória de Trump e a designação de carteis de narcotráfico como grupos terroristas. As ramificações entre narcotraficantes que atuam em solo nacional e organizações criminais transnacionais- com menção a algumas de origem latino-americanas como Trém de Aragua e Las Maras Salvatrucha(MS 13)- passarão a ser alvo de ações militares para além das fronteiras. O Comando Militar do Norte, que já estende seus tentáculos até o México, deverá contribuir para dar cabo das responsabilidades que esta nova categorização envolverá.

As primeiras declarações do novo Secretário de Estado também revelam a intenção de mostrar os dentes no cenário mundial. Não é casual que o Estados Unidos tenha logo tomada a providência de se retirar de âmbitos nos quais prevalecem mesas de diálogo que prescindem da demonstração de poder militar, como o Acordo de Paris e a Organização Mundial de Saúde e mesmo algumas agências da OCDE. Na realidade, o multilateralismo em suas diversas possibilidades, é considerado um campo inútil, contraproducente e ameaçador à soberania para os novos ocupantes da Casa Branca. Em consequência deve-se esperar que os próximos quatro anos sejam de expressivos bilateralismos, sejam para escalar conflituosidade ou selar lealdades. Tratar-se-á de uma lógica binária de amigos e inimigos, parceiros e cancelados, agraciados e descartados. As ações dos EUA trumpista serão guiadas por equações estratégicas elementais, que buscarão controlar riscos por meio da coerção militar e trabalhem com resultados rápidos. 

O fim das hostilidades Hamas-Israel representa um primeiro teste. Para o governo Trump é essencial que Paz e petróleo encontrem um ponto de equilíbrio beneficioso para os Estados Unidos e seus parceiros no Oriente Médio. Energia é a meta imperial, Arabia Saudita o laço bilateral estelar e Israel a ficha leal-dependente, que será bem agraciada por aceitar, mesmo a contragosto, fazer o jogo do senhor. Esta simples equação até poderá tornar factível retomar uma negociação para alcançar a solução dos dois Estados. Sempre e quando seja para tornar um terceiro mais fortes, seguro e próspero. 

 

¨      O Show de Trump: Política, Poder e Performance Midiática. Por Sara York

O evento de Donald Trump se transformou, mais uma vez, em um espetáculo midiático. Ao redor do mundo, sua figura polariza opiniões, com um certo segmento da mídia dedicado a amplificar sua narrativa e suas ações. A cobertura do evento pela GloboNews é um exemplo disso, oferecendo mais tempo a Trump do que muitas emissoras americanas deram em seu próprio país. Isso levanta uma questão: estamos dando mais poder a Trump do que ele realmente tem? Ou será que o show está sendo, de fato, a grande atração, enquanto a realidade política permanece em segundo plano?

<><> You`re fired! O Poder Real de Trump e o Sistema Político Americano

A política americana, longe de ser uma estrutura simples de analisar, apresenta nuances complexas no momento atual. A Suprema Corte dos Estados Unidos é majoritariamente conservadora, o que dá a Trump uma vantagem simbólica, mas isso não significa que ele tenha total liberdade para implementar suas políticas sem resistência. Na verdade, a maioria do Congresso Nacional, embora com uma minoria pequena na Câmara dos Deputados, é em grande parte conservadora, enquanto no Senado, Trump possui uma base mais sólida. No entanto, apesar disso, ele enfrenta um sistema político que, mesmo com suas inclinações conservadoras, não mudou totalmente por causa de um "sistema chato", como muitos chamam.

Essa situação política ambígua levanta um ponto importante: apesar da aparente força de Trump, o sistema americano continua robusto e resistente a mudanças radicais, especialmente em um contexto em que a Procuradoria Geral dos Estados já se manifestou, com alguns estados como Alabama adotando uma postura conservadora clara. O que ocorrerá nos próximos meses, com o envolvimento dos estados e a manifestação de outras entidades políticas, será crucial para observar se o "grande show" de Trump será eficaz em alterar as estruturas de poder que já existem.

<><> Cartéis como Entidades Terroristas: Uma Proposta Polêmica

Durante o evento, uma das propostas que chamou a atenção (talvez a única que seja útil em algum cenário) foi a de classificar cartéis e milícias como entidades terroristas. Essa ideia, embora controversa, gerou um acalorado debate, principalmente no que diz respeito a sua aplicação no Brasil.

Trump, sempre provocador, levantou o tema em um contexto de combate ao narcotráfico no México e ao domínio de grupos criminosos em diversas partes do mundo. A proposta que ele sugeriu foi ousada: considerar como terroristas organizações como os cartéis de drogas e, inclusive, as milícias e facções criminosas que dominam partes do território brasileiro. Segundo ele, esses grupos, com poder territorial e influência, deveriam ser classificados como terroristas, uma vez que atuam de maneira semelhante a grupos extremistas.

Para o Brasil, essa proposta poderia ser ainda mais impactante. De um lado, uma medida que poderia realmente ser útil no combate ao narcotráfico e ao crescente poder das milícias no país; de outro, um perigo de se banalizar o conceito de "terrorismo" para fins políticos, potencialmente colocando em risco a liberdade de expressão e o direito à oposição. A sugestão de Trump levanta questões sobre os limites do poder do Estado e a definição do que constitui realmente um "terrorista".

<><> A Política de Trump: Show e Realidade

Para quem acompanhou o evento de perto, ficou claro que Trump sabe muito bem como criar um "show" em torno de suas declarações. Ele tem o dom de transformar qualquer ato governamental em um espetáculo midiático. A maneira como ele apresentou o decreto foi um exemplo disso. Em vez de seguir a tradicional formalidade política, Trump chamou jornalistas para assistir ao ato de assinatura e deu destaque a cada palavra proferida. "Muito importante", dizia ele a cada assinatura, destacando a importância do que estava fazendo, mesmo que, em muitos casos, fosse apenas um gesto simbólico, sem grande impacto prático imediato.

O discurso que se seguiu à assinatura de diversos atos executivos foi no estilo característico de Trump: carregado de promessas, palavras fortes e um show de personalidade. A questão que fica no ar, entretanto, é: até que ponto essas medidas realmente significam mudanças significativas ou se são apenas mais uma camada no espetáculo que ele sempre soube criar?

<><> O "Show de Trump" e a Performance Midiática

Ao longo de sua carreira política e midiática, Trump tem mostrado uma habilidade impressionante para transformar qualquer situação em um espetáculo. Seu programa de TV, "O Aprendiz", foi um exemplo clássico de como ele soube manipular a imagem pública, com a icônica frase "You're fired!" ("Você está demitido!") virando uma marca registrada de sua personalidade pública. Neste programa, ele usava sua autoridade para demitir os participantes com um tom de autoridade absoluto, acompanhada de uma performance calculada para cativar a audiência. Era um show de poder e controle, que funcionava muito bem para manter a atenção do público e, ao mesmo tempo, gerar uma imagem de líder decisivo.

Essa mesma abordagem foi repetida em suas interações políticas. Durante eventos públicos e discursos, Trump se tornou um verdadeiro "showman", usando a mídia para reforçar sua imagem de liderança, sem necessariamente fazer algo concreto para justificar toda a atenção recebida. O grande evento que ele promoveu recentemente não foi diferente. Em vez de uma discussão substancial sobre políticas ou resultados, a cobertura foi quase uma performance, com Trump repetindo sua fórmula conhecida.

<><> O Espetáculo Internacional: Uma Pergunta Irrelevante e a Conexão com o Brasil

E, como se fosse parte de seu próprio show, algo inusitado aconteceu durante a coletiva de imprensa: uma jornalista da GloboNews, de maneira completamente desconectada da realidade americana, fez uma pergunta sobre o Brasil a Trump. Essa interação foi vista por muitos como uma tentativa de gerar uma repercussão desnecessária, alimentando ainda mais o espetáculo ao focar em um tema que não estava em pauta. O que o Brasil tem a ver com Trump? A resposta, provavelmente, é pouco ou nada. O ex-presidente dos Estados Unidos, como bem sabemos, dificilmente demonstrou interesse sobre a política brasileira durante seu governo.

Essa intervenção da GloboNews levanta um ponto interessante: será que a mídia, ao alimentar esse espetáculo, não está contribuindo para dar mais poder a Trump do que ele de fato tem? Por que focar em questões irrelevantes, como o Brasil, quando o evento estava claramente centrado em assuntos internos dos Estados Unidos? Ou, como sugerem alguns, seria isso apenas uma tentativa de fortalecer a narrativa de Trump e manter sua imagem em alta? Em qualquer um dos casos, a pergunta feita sobre o Brasil parece mais uma tentativa de dar palco a um espetáculo midiático do que um questionamento realmente relevante para os interesses globais.

<><> Entre o Espetáculo e o Poder Real

O "show de Trump" continua, e, ao que parece, ele está mais forte do que nunca. Contudo, devemos questionar até que ponto esse show está realmente refletindo seu poder político real ou se ele está apenas explorando as brechas do sistema para manter uma imagem de força que, muitas vezes, não corresponde à realidade das suas ações políticas. Sua habilidade para criar uma performance midiática é inegável, mas a grande questão que fica é: quanto desse espetáculo é de fato política, e quanto é apenas ilusão?

A reação dos estados, a manifestação das Procuradorias e o comportamento do Congresso e da Suprema Corte serão fundamentais para determinar se, de fato, Trump tem poder para realizar as transformações que promete. Até lá, o "show" continuará, e cabe a nós observar e questionar, para não cairmos na armadilha de dar mais importância ao espetáculo do que à política verdadeira.

 

Fonte: Brasil 247

 

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