Juros, dólar e bitcoin: o
que o mercado espera de Donald Trump e quais os impactos para o Brasil
Eleito presidente dos Estados
Unidos em novembro de 2024, Donald Trump tomou posse
oficialmente nesta segunda-feira (20), em um evento no Capitólio, em Washington
DC.
Em
seu primeiro discurso como 47º presidente
do país,
o republicano anunciou a assinatura de uma série de medidas que, segundo ele,
vão levar à "restauração completa da América". No campo econômico,
disse que irá derrotar a inflação e confirmou a aplicação de tarifas para
importação.
"Em
vez de tributar os nossos cidadãos para enriquecer outros países, iremos impor
tarifas e tributar países estrangeiros para enriquecer os nossos
cidadãos", afirmou, sem detalhar a proporção das cobranças.
O
republicano também informou que, em um de seus primeiros atos, irá declarar
emergência nacional na fronteira sul do país. "Todas as entradas ilegais
serão imediatamente interrompidas e iniciaremos o processo de devolução de
milhões de estrangeiros criminosos aos locais de onde vieram", disse.
O
mercado financeiro e as principais economias globais monitoravam de perto, já
durante a corrida eleitoral, as possíveis medidas do novo presidente. Agora,
com Trump no poder, a atenção é redobrada.
Especialistas
ouvidos pelo g1 destacam que
o cenário é de incertezas na economia e de
potencial fortalecimento do dólar.
Medidas
como o aumento de tarifas de importação e sua política anti-imigração podem
gerar mais inflação nos EUA. Além disso, a renúncia de impostos para
favorecer as empresas americanas é vista como um risco para as contas públicas
do país.
Esses
são apenas dois motivos que indicam que o Federal Reserve (Fed) terá mais
dificuldade de controlar os preços, mantendo os juros elevados nos
EUA.
Na
última reunião, em dezembro, o Fed citou "perspectivas
econômicas incertas" para justificar a redução da velocidade dos
cortes nas taxas de juros. Também deu sinais de que seria mais cauteloso dali em
diante.
Juros
mais altos fazem os títulos públicos americanos renderem mais. Investidores se
animam, levam recursos para os EUA e o dólar se valoriza frente a outras
moedas. Esse conjunto de eventos altera o fluxo de
investimentos no mundo todo.
No
Brasil, os efeitos já se mostraram claros mesmo antes da posse. A moeda
americana estava cotada a R$ 5,74 em 5 de novembro, dia da eleição
norte-americana. Alcançou os R$ 5,81 em 22 de novembro.
Dias
depois, apoiado pela reação negativa do mercado
sobre o pacote de corte de gastos anunciado pelo governo
brasileiro, o
dólar chegou pela primeira vez na história aos R$ 6.
Para
economistas, a tendência é que a moeda americana permaneça nesse patamar. O
último boletim Focus, relatório do Banco Central (BC) que reúne as projeções de
mais de 100 instituições financeiras, mostra que a expectativa é de dólar a R$ 6
até o fim de 2025.
Para
não piorar a situação do câmbio e com taxas mais altas por lá, também é
necessário que o BC suba a taxa básica de juros brasileira, desacelerando a
economia e encarecendo o crédito no país. O Focus também prevê a Selic a
15% ao ano em 2025.
Assim,
quem também sofre é o Ibovespa, principal índice de ações da bolsa de valores
brasileira, que perdeu a marca de 130 mil pontos desde a eleição de Trump.
Impactado também pelo desgosto do mercado com as contas públicas
brasileiras, o índice está agora na casa dos
122 mil pontos.
A
exceção é o bitcoin. Como mostrou o g1 em agosto, Trump virou um
entusiasta dos criptoativos e indicou que promoverá um ambiente regulatório
mais favorável para as criptomoedas. Na esteira do otimismo, a principal cripto
do mundo superou a cotação de US$ 100
mil pela primeira vez na história.
Veja abaixo, em três
pontos, o que mercado espera de Trump neste segundo mandato.
·
Inflação
e alta dos juros
Um
dos principais temores do mercado financeiro e de grandes economias globais é o
potencial inflacionário do governo de Donald Trump. Ou seja, o quanto as
medidas do presidente devem gerar alta nos preços de produtos e serviços no
país.
Os
receios partem, em especial, de duas promessas do republicano durante a
campanha eleitoral: a de elevar tarifas sobre importação e a de deportar imigrantes em massa.
Caso
as tarifas mais altas se confirmem — em especial na guerra comercial com a
China —, a importação deve ficar mais cara e a população norte-americana deve
passar a consumir mais produtos internos, explica Marcos Moreira, sócio da WMS
Capital.
"Isso
tende a acelerar a atividade econômica do país. Consequentemente, se você tem
um consumo interno mais aquecido, terá maior inflação", diz.
Enquanto
isso, a deportação em massa de imigrantes, se confirmada, afetará o mercado de
trabalho dos EUA, diminuindo a oferta de trabalhadores no país. "Isso faz
os salários aumentarem, gerando inflação", explica a professora Carolina
Moehlecke, coordenadora do mestrado de Relações Internacionais da FGV.
Com
salários mais altos, a tendência é que o consumo aumente. Mas, com menos
trabalhadores, pode haver uma redução da oferta. Os dois fatores fazem os preços
de bens e serviços subirem.
Moehlecke
lembra, contudo, que o real impacto das políticas de deportação e tarifárias
dependerá da efetividade da implementação das propostas.
"Trump
vai realmente aplicar uma tarifa geral de 20% nas importações como indicou em
alguns momentos da campanha? Ele vai deportar o número de imigrantes que
prometeu? A gente não sabe", diz.
Como mostrou o g1 em dezembro, a "ameaça
tarifária" é uma estratégia antiga e conhecida do republicano para tentar
vantagens em negociações bilaterais. É uma forma de tentar colocar outros
países em desvantagem em uma negociação.
Em
2018, por exemplo, Trump chegou a anunciar a criação de taxas para a
importação de aço e alumínio, dois dos produtos que estão no rol de exportações
brasileiras para os norte-americanos.
Pouco
tempo depois, os países negociaram um esquema
de cotas de importação, que permitiam a venda dos produtos com isenção ou
redução de tarifa até um determinado limite.
Na dúvida, o mercado
se antecipa. Apenas
pela perspectiva de que a inflação pode subir e o Fed seja obrigado a reverter
o ciclo de cortes dos juros, já se iniciam as apostas.
O
rendimento das Treasuries (os títulos públicos americanos) tiveram um salto
entre o fim de setembro de 2024, durante a corrida eleitoral, e o início de
2025.
·
As
taxas com vencimento em dois anos saíram de 3,54% para 4,28%;
·
Já
as com vencimento em 10 anos passaram de 3,73% para 4,63%.
Trump
manifestou, inclusive, sua atenção sobre a inflação. Em seu primeiro discurso,
criticou a taxa atual (2,9% em 12 meses) e afirmou que irá garantir aos membros
de seu gabinete condições para atuarem no combate à elevação do índice de
preços do país.
"[Vamos]
derrotar o que foi uma inflação recorde e reduzir rapidamente custos e preços.
A crise inflacionária foi causada por gastos excessivos massivos e pela
escalada dos preços de energia. E é por isso que hoje também declararei uma
emergência energética nacional", disse.
·
Dólar
e economia americana mais fortes
O
economista-chefe da Lev, Jason Vieira, destaca que Trump é historicamente
pró-mercado e que deverá ser "mais fácil" fazer negócios no país. Ele
projeta que a taxa de desemprego nos EUA deverá seguir em queda, enquanto a
atividade econômica deverá ter um impulso ainda maior.
"Com
a redução de gastos públicos, pode ser que haja um cenário de inflação menos
impulsionada por meios monetários e mais impulsionada, efetivamente, pela
atividade econômica", diz. "Então, você tira o peso de uma inflação,
coloca na outra, e fica no zero a zero."
Segundo
o analista, o cenário trazido pelo presidente republicano favorece o mercado
financeiro, com melhora na bolsa de valores e no dólar, beneficiando o país.
Desde
a eleição de Trump, o índice Nasdaq avançou
6,45%, hoje a 19.630,20 pontos. Já o S&P 500 subiu 3,70%,
a 5.996,71 pontos, enquanto o Dow Jones ganhou 2,99%,
a 43.487,59 pontos.
"Para nós [no
Brasil], é complicado", diz. Há uma grande movimentação de
recursos em direção ao dólar e aos Estados Unidos, e pode ser que
isso se preserve por um período mais longo por conta do mandato de Trump,
acrescenta o economista.
Para
a bolsa brasileira, portanto, o ano tende a ser mais difícil. André Galhardo,
economista-chefe da Análise Econômica, diz que o movimento clássico dos
investidores brasileiros em um ambiente como esse é abrir mão de suas posições dentro do
mercado de ações e ir para os títulos de renda fixa.
"Sob
esse aspecto, podemos esperar um ano um pouco mais turbulento para a bolsa de
valores", diz. Ainda segundo o economista, o protecionismo de Trump pode
afetar algumas empresas brasileiras.
"A
nossa expectativa é que o aumento das tensões comerciais possa prejudicar o ritmo
de crescimento da China, que tende a demandar menos commodities. Empresas como
a Vale, de grande peso no Ibovespa, acabam sofrendo e puxando o índice pra
baixo", conclui.
Por
outro lado, Carolina Moehlecke, da FGV, lembra que um dólar mais forte com o
"efeito Trump" pode beneficiar alguns setores. "É bom para as
exportações, porque ficam mais competitivas. Por outro lado, os produtos
importados ficam mais caros. Isso também pode pressionar a nossa
inflação."
"Por
se tratar de Trump, é impossível uma previsão concreta para todo o mandato.
Mas, para o primeiro ano, o cenário é de inflação alta, juros ainda elevados,
dificuldades para o Brasil cortar suas taxas e um dólar mais valorizado em
relação ao real", acrescenta.
·
Bitcoin
em ascensão
A
eleição de Donald Trump fez o mercado de criptoativos disparar. O bitcoin,
criptomoeda mais famosa do mundo, surfou a onda otimista e
superou a cotação de US$ 100 mil pela primeira vez na história.
A
moeda digital chegou à casa de US$ 109 mil nesta
segunda-feira (20), conforme a plataforma CoinMarketCap, recorde histórico.
Antes
crítico dos criptomoedas, Trump mudou de tom durante sua
campanha,
financiada em parte por grupos do setor. Passou, então, a prometer fazer dos
Estados Unidos "a capital mundial do bitcoin e das criptomoedas".
Para especialistas, o
ativo digital deve seguir em alta — ao menos neste primeiro ano de
governo. José
Cassiolato, sócio da RGW Investimentos, explica que o bitcoin era considerado
um ativo muito exposto às taxas de juros. E que, agora, o cenário mudou.
Segundo
ele, a criptomoeda tendia a ficar mais atrativa quando investimentos
tradicionais rendiam menos. Ou seja, quando os juros nos EUA estavam baixos, a
procura pelo bitcoin aumentava, fortalecendo a moeda digital.
"Quando
os juros foram a zero, ele se valorizou muito. Em
2023, quando as taxas norte-americanas subiram
a 5%,
ele se desvalorizou", lembra. "Agora, esse paradigma
foi quebrado. Os juros estão historicamente altos e, mesmo assim, o bitcoin
está supervalorizado."
Um
dos pontos que explicam a mudança é a agenda regulatória da moeda representada
por Trump. Segundo Cassiolato, o novo presidente faz ficar para trás a imagem
de que o Estado é contra o ativo digital, ou de que ele representaria uma
ameaça para o próprio dólar.
O
especialista reforça que, agora, o bitcoin tende a atuar contra o "colapso
do sistema", e não mais se beneficiar dele. "O universo de finanças
descentralizadas vive uma época de ouro. Deverá ter uma agenda regulatória
muito positiva e irá crescer de forma significativa ao longo da gestão de
Trump."
Marcos
Moreira, sócio da WMS Capital, ressalta que também é preciso entender se o
republicano irá, de fato, utilizar o bitcoin para compor as reservas
norte-americanas, como afirmou em campanha.
"Isso,
sem sombra de dúvidas, acarretaria em uma demanda maior pelo criptoativo.
Consequentemente, o preço subiria cada vez mais."
"Além
disso, outras economias podem seguir o mesmo caminho. Afinal, os EUA são
referência global. O movimento também poderia contribuir para uma alta ainda
mais elevada do bitcoin", conclui.
¨
‘Brasil e EUA têm trajetória de cooperação e respeito mútuo’, diz Lula
sobre posse de Trump
O presidente brasileiro Luiz Inácio Lula publicou uma mensagem em suas
redes sociais nesta segunda-feira (20/01) felicitando o norte-americano Donald Trump, que assumiu seu segundo mandato como
presidente dos Estados Unidos.
Em seu texto, Lula disse que “em nome do governo brasileiro, cumprimento
o presidente Donald Trump pela sua posse. As relações entre o Brasil e os Estados Unidos são marcadas por uma trajetória de cooperação, fundamentada no
respeito mútuo e em uma amizade histórica”.
“Nossos países nutrem fortes laços em diversas áreas, como o comércio, a
ciência, a educação e a cultura. Estou certo de que podemos seguir avançando
nessas e outras parcerias”, acrescentou o brasileiro.
Ao finalizar sua mensagem, Lula desejou a Trump “um mandato exitoso, que
contribua para a prosperidade e o bem-estar do povo dos Estados Unidos e um
mundo mais justo e pacífico”.
Putin e
Sheinbaum
Outros dois mandatários que lançaram comunicados oficiais sobre a
cerimônia de posse nos Estados Unidos foram o russo Vladimir Putin e a mexicana
Claudia Sheinbaum.
No caso do mandatário russo, a declaração foi enfocada na questão do
conflito armado que o país enfrenta há quase três anos com a Ucrânia, nação vizinha que tem contado com o apoio bélico
e financeiro dos Estados Unidos durante todo esse período.
Segundo Putin, seu país está “aberto ao diálogo para buscar uma solução
concreta para esta situação, que seja baseada no respeito aos interesses
legítimos de todas as pessoas e de todas as nações que vivem na região”. Em
seguida, enfatizou que o início desse diálogo deve “levar em consideração as
novas realidades regionais” após os três anos de guerra entre russos e
ucranianos.
No caso da líder mexicana, a mensagem foi direcionada aos mexicanos
apreensivos com uma possível aplicação de políticas de deportação massiva já nos primeiros meses do novo governo.
Segundo Sheinbaum, “todos e todas devemos esperar com tranquilidade e
com a certeza de que o nosso governo não deixará ninguém para trás”.
A presidenta enfatizou que o México “conta com uma ampla rede consular
que já está preparada para atuar. Estamos aguardando com calma e assim que
foram anunciadas as novas políticas temos certeza que conseguiremos estabelecer
as vias de comunicação e cooperação adequadas, e vamos poder auxiliar todos os
nossos concidadãos”.
“Aqueles que voltarem ao México contarão com programas integrais de
ajuda, mas os esforços dos nossos funcionários consulares também estarão
voltados a orientar e apoiar aqueles que desejam ficar. As mexicanas e mexicanos
são muito importantes para a economia dos Estados Unidos e a administração
Trump sabe disso”, completou Sheinbaum.
Fonte: g1/Opera Mundi
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