Francisco Fernandes
Ladeira: Bolsonarismo - de efeito colateral do golpe a efeito paralisante da
esquerda
Não há dúvidas
sobre os efeitos nefastos do bolsonarismo para a sociedade brasileira. Por meio
deste movimento de extrema direita, saíram do armário as viúvas da ditadura
militar, ressentidos contra a universidade pública, anti-intelectuais,
fanáticos religiosos e preconceituosos de todos os tipos.
Com todo fenômeno
social, o bolsonarismo não surgiu do nada. É consequência de seu contexto
histórico. No caso, se trata do efeito colateral do antipetismo, difundido
sobretudo pela grande mídia, de maneira mais contundente durante as jornadas de
junho de 2013 e do golpe de Estado de 2016.
Como o discurso
antipetista é essencialmente um discurso de ódio, só poderia ter gerado algo
similar: o bolsonarismo. Como bem sintetizou o presidente Lula: plantaram Aécio
e colheram Bolsonaro.
Se, como efeito
colateral do golpe, o bolsonarismo teve impacto muito negativo para a direita
tradicional, pois sequestrou a hegemonia desse espectro ideológico, por outro
lado, o bolsonarismo tem cumprido uma função ainda pouco debatida no espaço
público.
Além de hegemônico
na direita política, o bolsonarismo também conseguiu sequestrar o monopólio da
crítica ao status quo, posição histórica da esquerda. Claro que isso é feito de
maneira distorcida e delirante.
Diante desse
realidade, o receio de soar minimamente como bolsonarista, tem feito grande
parte da esquerda renunciar às suas costumeiras críticas às instituições
burguesas. O que é pior: passou a defender de forma ferrenha judiciário, mídia
hegemônica, indústria farmacêutica e a chamada democracia burguesa.
É fato que, pelo
menos desde a queda do Muro de Berlim, a esquerda, em âmbito global, cada vez
mais tem abandonado a luta de classes e adotado pautas difusas e identitárias.
Assim, comprou ideias falaciosas, como “fim da História”, “pós-moderno” ou “fim
da ideologia”.
No entanto, no
Brasil, a situação piorou nos últimos anos. Antes do bolsonarismo, de uma forma
ou de outra, a esquerda denunciava o golpismo da grande mídia, concebia o STF
como aparelho ideológico da dominação burguesa, questionava as Big Pharma e
apontava o fascismo como a face mais radicalizada da democracia burguesa.
Com os discursos
bolsonaristas sobre “extrema imprensa”, “ditadura do STF” e “negacionismo”, a
esquerda, vergonhosamente, renunciou à sua vocação crítica, passando a estar a
reboque da ideologia dominante.
Desse modo, é comum
que as forças progressistas saiam em defesa da imprensa hegemônica (o chamado
“jornalismo profissional”), terceirizem sua militância para o STF e embarquem
na suposta luta da “democracia (burguesa) contra o fascismo”. Está concretizada
a paralisia da esquerda.
Ou seja, a simples
existência do bolsonarismo, com seu suposto discurso crítico antissistema, já
tem sido suficiente para a esquerda ficar totalmente sob controle. Se, à
primeira vista, o bolsonarismo causou certo incômodo nos donos do poder, hoje é
um aliado estratégico para neutralizar qualquer tipo de oposição mais
contundente. Nem a maior distopia teria imaginado tal panorama.
¨ Nikolas
Ferreira é o “projeto da extrema-direita” para 2030, diz João Cezar de Castro
Rocha
A possível ascensão de novos
nomes da direita brasileira tem sido alvo de debates cada vez mais intensos. Em
entrevista ao programa Boa Noite 247, o professor João Cezar de Castro Rocha
afirmou que “Nikolas Ferreira é o projeto da extrema-direita para 2030”. Em
suas palavras, o parlamentar eleva a discussão sobre o que denomina
“extrema-direita 24/7”, em referência ao caráter contínuo de campanha política
desempenhado por certos grupos.
Durante a conversa no Boa
Noite 247, o professor ressaltou a força de lideranças que, em sua maioria,
nasceram na década de 1990. “Isso é bem importante. Eu acho que é uma questão
demográfica e essa questão demográfica será decisiva em 2026. Você sabe em que
ano nasceu Nikolas Ferreira? 1995. André Fernandes e Bruno Engler nasceram em
1996, Lucas Pavanato em 1997. Há uma questão demográfica”, destacou. Segundo
ele, a extrema-direita “triunfa porque viver em campanha é o próprio da
extrema-direita. Eles não fazem campanha nos dois ou três meses anteriores a
uma eleição majoritária, eles fazem campanha vinte e quatro horas por dia, sete
dias por semana, trezentos e sessenta e cinco dias por ano”.
Outro ponto de reflexão foi
a atuação das igrejas evangélicas, especialmente na comunicação em Libras
(Língua Brasileira de Sinais). O professor lembrou que, na posse do então
presidente Jair Bolsonaro, Michelle Bolsonaro “inovou de duas formas. Ela fez
discurso e ela fez discurso em libras”. Essa iniciativa, segundo ele, evidencia
uma estratégia de mobilização religiosa que vem sendo praticada há pelo menos
duas décadas no Brasil: “As igrejas evangélicas no Brasil, de todas as
denominações, há pelo menos duas décadas, preparam fiéis que aprendem a falar
libras”.
O tema do futuro de Jair
Bolsonaro também foi abordado. “Eu acho muito difícil que o Bolsonaro se torne
elegível uma vez mais, e mais difícil ainda que ele consiga escapar da prisão”,
afirmou João Cezar de Castro Rocha, referindo-se a processos que tramitam contra
o ex-presidente. Segundo o professor, entretanto, a provável ausência de
Bolsonaro no cenário eleitoral não deve enfraquecer a extrema-direita, que já
estaria “projetando o cenário” com outros nomes e estratégias.
Ele também chamou a atenção
para o contexto internacional. “A extrema direita brasileira estará
profundamente reenergizada […] a partir do dia 20 de janeiro, com a posse de
Donald Trump e com o papel importantíssimo que Elon Musk desempenhará”,
afirmou. Para ele, Musk teria o objetivo de desmontar barreiras institucionais,
abrindo caminho para projetos autoritários nos Estados Unidos e, por
consequência, influenciando outros países, como o Brasil. “É muito claro o
projeto agora. Neste instante, enquanto estamos falando, Elon Musk está tentando
influenciar a eleição na Inglaterra e na Alemanha. […] Imagine o que acontecerá
no Brasil em 2026.”
O professor sublinha que a
esquerda deve entender as dinâmicas da extrema-direita se quiser reagir de
forma eficiente. “Porque a esquerda perdeu a sua capacidade de militância desse
jeito permanente, de estar nas comunidades, de fazer trabalho nas bases…”,
disse. No contexto brasileiro, esse fator — somado ao universo digital — indica
uma tendência de crescimento de lideranças jovens, como Nikolas Ferreira, André
Fernandes, Bruno Engler e Lucas Pavanato.
Para João Cezar de Castro
Rocha, a estratégia bolsonarista consiste em manter a “chama acesa” enquanto se
busca um espaço de barganha política. Entretanto, ele avalia que o núcleo duro
do bolsonarismo, “embora não vá dizê-lo”, já trabalha com a hipótese de
Bolsonaro não participar do pleito de 2026. Nesse cenário, novos nomes ganham
força como alternativas para a condução do projeto conservador.
¨ Extrema direita termina 2024 com menos
força política e na mira da Justiça
O ano de 2024 foi marcado por investigações
policiais, escândalos políticos e mobilizações golpistas, envolvendo líderes e
apoiadores da extrema-direita no Brasil. As operações da Polícia Federal e decisões do
Superior Tribunal Federal (STF) impactaram figuras proeminentes, enquanto a
agenda política do setor, atrelada ao bolsonarismo, sofreu derrotas
significativas nas eleições municipais.
Já no começo do ano, em 8 de fevereiro, a
Polícia Federal deflagrou a Operação Tempus Veritatis, investigando uma
tentativa de golpe de Estado atribuída ao ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e
aliados como o general Walter Braga Netto e Valdemar Costa Neto, presidente do
PL. O objetivo seria reverter os resultados das eleições de 2022.
Na mesma operação, a Polícia Federal
prendeu, ainda, dois ex-auxiliares do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL): o ex-assessor
para Assuntos Internacionais da Presidência Filipe Martins e o ex-ajudante de
ordens coronel Marcelo Câmara.
Filipe Martins era considerado um dos
mentores do chamado “gabinete do ódio” — grupo que usava as redes sociais para
disseminar desinformações e mentiras sobre pautas consideradas importantes para
o bolsonarismo e também para atacar inimigos do ex-presidente com notícias
falsas.
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Matar o presidente
Em julho, surgiram as primeiras denúncias
públicas sobre o envolvimento de militares como os coronéis Mario Fernandes e
Hélio Ferreira Lima em planos golpistas. As denúncias agravaram a crise
institucional e reforçaram o clima de desconfiança entre as Forças Armadas e o
governo.
No dia 21 de novembro, ocorreu o episódio
que pode marcar para sempre o bolsonarismo. A Polícia Federal apresentou ao STF
um relatório detalhado que resultou no indiciamento de 37 pessoas, incluindo Jair Bolsonaro, por crimes
de conspiração e tentativa de golpe de Estado. A acusação
baseou-se em uma série de evidências reunidas ao longo de dois anos de
investigações.
O plano criminoso envolvia um suposto
complô para assassinar o presidente Luiz Inácio Lula da
Silva,
o vice-presidente Geraldo Alckmin (PSB) e o ministro do STF Alexandre de
Moraes. A conspiração teria sido organizada em células secretas formadas por
ex-militares e apoiadores radicais ligados ao entorno político de Bolsonaro.
Segundo as investigações, reuniões
clandestinas foram realizadas em diferentes estados para planejar os ataques.
Além de execuções planejadas, o esquema previa uma ruptura institucional
seguida da imposição de um regime autoritário controlado por uma junta militar.
Documentos apreendidos detalharam estratégias que incluíam atentados
simultâneos em Brasília e São Paulo.
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Militares presos
Peça-chave para a derrocada da
extrema-direita em 2024, o tenente-coronel Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Jair
Bolsonaro, foi
preso no dia 22 de março deste ano, no contexto da Operação Venire da Polícia
Federal, que investigava fraudes em cartões de vacinação contra a covid-19.
Nesta oportunidade, o militar teve seus celulares apreendidos.
Cid foi apontado como operador estratégico
de uma rede clandestina que articulava atos antidemocráticos e ações de
desestabilização das instituições brasileiras. A ordem de prisão foi emitida
após meses de monitoramento de suas comunicações, que revelaram seu papel ativo
no planejamento de ataques a autoridades públicas e na promoção de
desinformação.
As investigações indicaram que ele era
responsável pela gestão de uma rede de comunicação segura usada
para coordenar atividades ilegais, incluindo o planejamento de atentados contra
líderes políticos como Luiz Inácio Lula da Silva, Geraldo Alckmin e o ministro
do STF, Alexandre de Moraes.
O ex-ajudante de ordens de Bolsonaro foi
solto no dia 3 de maio e, em 19 de novembro de 2024, foi convocado para prestar
novos depoimentos à Polícia Federal e ao STF para esclarecer contradições e
omissões em suas declarações anteriores, especialmente relacionadas a um
suposto plano golpista que incluía o assassinato de autoridades.
As revelações feitas por Mauro Cid levaram
à histórica prisão do general Walter Braga Netto, no dia 14 de
dezembro deste ano. O militar oi ministro da Defesa em 2019 e, também, candidato
a vice na chapa liderada por Jair Bolsonaro, que concorreu à presidência da
República, em 2022.
Durante seus depoimentos, Cid detalhou
reuniões secretas realizadas entre membros do alto escalão das Forças Armadas e
líderes políticos alinhados à extrema-direita, nas quais Braga Netto teria
desempenhado um papel central na articulação de uma suposta tentativa de golpe
de Estado para impedir a posse de Luiz Inácio Lula da Silva.
O general enfrenta acusações graves
relacionadas a uma suposta conspiração para impedir a posse do presidente
eleito Luiz Inácio Lula da Silva após as eleições de 2022. As investigações
conduzidas pela Polícia Federal indicam que ele teria desempenhado um papel
central na organização e financiamento do plano golpista que envolvia o
assassinato de Lula, Alckmin e Moraes.
Além disso, Braga Netto é acusado de
obstrução de justiça por supostamente interferir nas investigações em curso
sobre a tentativa de golpe. Relatórios indicam que ele teria buscado
informações sobre acordos de colaboração premiada de outros envolvidos, visando
dificultar a obtenção de provas pelas autoridades.
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Eleições
As urnas mostraram que a extrema-direita
brasileira sofreu rejeição da população durante as eleições municipais de 2024.
O resultado eleitoral escancarou um desempenho aquém do esperado, especialmente
nas capitais do país.
O Partido Liberal (PL), do ex-presidente
Jair Bolsonaro, governará apenas quatro capitais: Rio Branco (AC), Cuiabá (MT),
Maceió (AL) e Aracaju (SE). Legenda com o maior número de candidatos nas
capitais, os direitistas sofreram derrotas importantes e chamou a atenção a
queda significativa na popularidade de nomes históricos ligados ao
bolsonarismo, muitos dos quais já ocuparam posições de destaque no governo
federal.
Em Belo Horizonte, o candidato Bruno Engler
(PL) foi derrotado por Fuad Noman (PSD) na disputa pela prefeitura. Engler, que
contou com a presença de Jair Bolsonaro em atos de campanha, alcançou pouco
mais de 46% dos votos válidos, não conseguindo reverter a vantagem do
adversário no segundo turno.
Em Goiânia, o ex-presidente também apoiou
enfaticamente Fred Rodrigues (PL), que foi derrotado por Sandro Mabel (União).
Rodrigues obteve 44,47% dos votos válidos, encerrando sua campanha sem
conseguir atrair apoio suficiente para superar a ampla coligação formada pelo
candidato vitorioso.
Evandro Leitão (PT) venceu uma disputa
acirrada em Fortaleza, derrotando André Fernandes (PL) por uma margem inferior
a 15 mil votos. Leitão terminou com 50,38% dos votos válidos, enquanto Fernandes,
apoiado pela extrema-direita, obteve 49,62%, protagonizando uma das eleições
mais apertadas deste ciclo eleitoral.
A derrota mais significativa para o PL
ocorreu em João Pessoa, onde o ex-ministro da Saúde de Bolsonaro, Marcelo
Queiroga (PL), alcançou apenas 36,09% dos votos válidos, sendo amplamente
superado pelo candidato da oposição, que contou com uma campanha estruturada e
forte apoio de lideranças locais.
Outras derrotas importantes ocorreram em
Manaus, onde Capitão Alberto Neto (PL) ficou com 45,41% dos votos válidos; em
Belém, onde Delegado Eder Mauro (PL) obteve 43,64%, e em Palmas, onde Janad
Valcari (PL) encerrou a disputa com 46,97% dos votos. Essas derrotas
evidenciaram uma queda de popularidade da extrema-direita nas capitais brasileiras,
marcando um ciclo eleitoral desfavorável ao bolsonarismo.
Fonte: Jornal GGN/Brasil
247/Brasil de Fato
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