Estudo
aponta aumento alarmante de desastres climáticos no Brasil nos últimos anos
Um novo estudo realizado
pela Aliança Brasileira pela Cultura Oceânica, com apoio do governo brasileiro
e da Unesco, revelou que o Brasil tem enfrentado um número crescente de
desastres climáticos nos últimos anos, informa a Folha de S. Paulo. O relatório, divulgado na
sexta-feira (27), aponta que, entre 2020 e 2023, a média anual de desastres
climáticos no país foi de 4.077, quase o dobro dos 2.073 desastres registrados
anualmente durante as duas décadas anteriores (2000-2019).
Segundo o estudo, a
crescente intensidade e frequência desses eventos refletem os impactos das
mudanças climáticas no Brasil. "Os desastres climáticos têm se tornado
mais frequentes e intensos nas últimas décadas, refletindo os impactos das
mudanças climáticas", afirma o relatório. O levantamento, conduzido pelo
braço de pesquisa da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), descreve a situação
como um "cenário alarmante", que inclui secas, enchentes, tempestades
violentas, temperaturas extremas, ciclones e deslizamentos de terra.
O estudo também observa uma
correlação entre o aumento desses desastres e o aquecimento das temperaturas da
superfície oceânica, apontando que fenômenos como secas e enchentes recordes em
2024 são contribuições adicionais para os desafios climáticos enfrentados pelo
Brasil. O relatório enfatiza que os prejuízos econômicos causados por esses
desastres também aumentaram consideravelmente. De 1995 a 2023, os danos
financeiros causados por desastres climáticos no país foram estimados em
R$547,2 bilhões.
Temperatura
da Terra aumenta 1,5°C e escancara urgência climática
O ano de 2024 está prestes a
entrar para a história como o mais quente já registrado, marcando também o
primeiro período em que a temperatura média global superou 1,5°C acima dos
níveis pré-industriais. A informação é do Observatório Copernicus, da União
Europeia, que monitora as alterações climáticas globais, informa a Folha de S. Paulo.
O limite de 1,5°C foi
acordado no Acordo de Paris, em 2015, como um teto para evitar consequências
desastrosas das mudanças climáticas, como o desaparecimento de países insulares
e impactos irreversíveis em ecossistemas. Embora o resultado de 2024 seja
alarmante, os especialistas afirmam que a superação desse marco ainda não significa
que o objetivo global foi abandonado. Para considerar que o limite foi
definitivamente violado, seriam necessários vários anos com os termômetros
acima desse patamar, explica o observatório.
Contudo, cientistas como
Paulo Artaxo, físico e membro do Painel Intergovernamental sobre Mudanças
Climáticas (IPCC), acreditam que o aquecimento global a 1,5°C não é mais uma
meta viável. “É mais do que óbvio que segurar o aquecimento em 1,5°C já não é
mais possível”, afirma o professor da USP. Artaxo aponta que esforços devem
agora se concentrar na limitação do aumento a 2°C, ressaltando a importância da
COP30, que será realizada em Belém, no Brasil, em 2025.
<><> Cenário de
emissões em alta
Os dados mais recentes
confirmam que o planeta segue em uma trajetória preocupante. Em 2023, as
emissões globais atingiram um recorde de 57,1 gigatoneladas de CO₂ equivalente, um aumento de 1,3% em relação ao ano
anterior. Segundo Thelma Krug, ex-vice-presidente do IPCC, o aumento contínuo
das emissões é um reflexo direto da persistência no uso de combustíveis
fósseis. “A lógica é simples: aumento de emissões implica aumento de
concentração de gases, que, por sua vez, implica aumento de temperatura”,
explica Krug.
Ela destaca que o corte nas
emissões ainda é tecnicamente possível, mas exige medidas urgentes e
abrangentes. "O fato de superarmos temporariamente o 1,5°C não significa
que já ultrapassamos a barreira do Acordo de Paris. Ainda há esperança de
limitar o aumento da temperatura média global a 1,5°C até o fim do século. O
problema é que as coisas estão ficando muito mais difíceis", pontua.
<><> Impacto
global e papel do Brasil
No Brasil, as ações para
conter o aquecimento global têm ficado aquém do necessário, segundo Artaxo. Ele
alerta para a falta de políticas públicas eficazes, especialmente na
preservação de ecossistemas. “O Brasil precisa de uma política consistente para
parar a destruição dos nossos ecossistemas, dos quais dependemos tanto —
inclusive para o agronegócio, em termos de serviços ecossistêmicos que produzem
a chuva no Brasil central”, afirma.
Eventos climáticos extremos,
como as chuvas intensas no Rio Grande do Sul e as secas severas na Amazônia,
evidenciam os impactos locais do aquecimento global. Embora previsíveis em
termos de tendências, a frequência e intensidade desses fenômenos superam
projeções anteriores, mas não invalidam os modelos climáticos.
<><> Rumo à
COP30: mitigar para sobreviver
A COP30 será uma
oportunidade crucial para reposicionar o debate global sobre mitigação
climática. Com a diplomacia brasileira no centro das negociações, espera-se que
a agenda inclua compromissos mais firmes para reduzir as emissões de gases de
efeito estufa e avançar na transição para fontes de energia limpa.
Embora o cenário pareça
desafiador, cientistas insistem que a mobilização internacional pode reverter
trajetórias mais catastróficas. “Com muito esforço, particularmente dos países
desenvolvidos e dos países produtores de petróleo, podemos limitar o
aquecimento a uma média global de 2°C, o que seria altamente desejável”,
conclui Artaxo.
O momento exige que líderes
globais se comprometam com ações concretas. A inação, alertam os especialistas,
coloca o planeta em risco iminente de ultrapassar pontos de não retorno. A
COP30 pode ser a última chance para evitar que os piores cenários climáticos se
tornem realidade.
¨ Amazônia
Legal enfrenta maior número de incêndios em quase duas décadas
A Amazônia Legal registrou,
em 2024, o maior número de incêndios florestais em 17 anos, revelam dados
divulgados pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe). De acordo com
informações levantadas pelo governo e confirmadas pelo serviço de monitoramento
atmosférico Copernicus, os incêndios atingiram níveis alarmantes, com 140.328
focos detectados por satélite, um aumento de 42% em relação aos 98.634
registrados em 2023. Este é o maior número desde 2007, quando foram
contabilizados 186.463 focos de incêndio, informa a AFP, em reportagem
repercutida pelo jornal O Globo.
A crise ambiental é agravada
por uma seca histórica que afeta a região desde 2023. Segundo o Copernicus, a
combinação de mudanças climáticas induzidas pela ação humana e o fenômeno
climático El Niño criou as condições ideais para a proliferação das queimadas.
Além disso, especialistas apontam que grande parte dos incêndios foi provocada
intencionalmente, como forma de desmatamento para abrir áreas para a
agricultura. A fumaça resultante cobriu cidades importantes como Brasília, Rio
de Janeiro e São Paulo, causando poluição intensa por semanas consecutivas.
<><> Contraste
entre incêndios e desmatamento
Embora os incêndios tenham
alcançado números alarmantes, o Inpe destacou um dado positivo: o desmatamento
na Amazônia, no período de 12 meses até agosto de 2024, caiu mais de 30%,
atingindo o menor patamar em nove anos. Esse dado reflete os esforços do
governo federal na preservação do bioma. O presidente Lula (PT), que assumiu a
proteção da floresta como uma prioridade, implementou políticas para reduzir o
desmatamento e tem colocado o Brasil como protagonista na agenda climática
global. Em novembro, Belém será sede da Conferência Climática COP30 da ONU,
reforçando o papel do país no enfrentamento das mudanças climáticas.
<>< Impactos no
clima e alertas científicos
Os incêndios e o
desmatamento contínuo levantam preocupações sobre o papel da Amazônia no
equilíbrio climático global. Cientistas alertam que o bioma está em uma
encruzilhada perigosa: se a destruição persistir, a floresta pode atingir um
ponto de inflexão, tornando-se uma fonte líquida de emissões de carbono, em vez
de um sumidouro. Isso aceleraria ainda mais as mudanças climáticas, colocando
em risco ecossistemas e comunidades em todo o planeta.
¨ Por
que os morcegos da Mata Atlântica estão cheios de metais tóxicos no corpo
Os morcegos desempenham um papel fundamental na saúde
dos ecossistemas florestais enquanto polinizadores, dispersores de sementes e
controle de insetos considerados pragas agrícolas. Mas de acordo com uma nova pesquisa, os morcegos e os
serviços ecossistêmicos que oferecem estão ameaçados na Mata Atlântica, bioma
altamente fragmentado, onde grande parte das áreas naturais foram degradadas
pela atividade agrícola e a mineração, aumentando a exposição da vida selvagem
a metais pesados tóxicos.
Cientistas da Universidade Estadual de Santa Cruz, na
Bahia, retiraram amostras de pelos de morcegos de áreas variadas no estado –
incluindo pastagens, monoculturas de eucalipto e café e agrofloresta de cacau –
e testaram o material para a presença de três metais: chumbo, manganês e cobre.
“Descobrimos que os morcegos que vivem em áreas cuja
paisagem é dominada pela agricultura intensiva ou por pastagens têm níveis mais
altos de metais tóxicos no organismo, especialmente chumbo e manganês”, revela
Julián Barillaro, líder do estudo e pesquisador de Ecologia da conservação na
Universidade de Santa Cruz. Segundo ele, isso provavelmente se deve ao uso
de agrotóxicos e
combustíveis que contêm chumbo. A redução do habitat natural também pode ser
uma das causas do aumento dessa exposição.
Outros fatores, como as diferentes espécies e o sexo
dos morcegos, não afetaram a bioacumulação, levando os autores a crer que os
animais entraram em contato direto com os metais pesados ao descansarem em
arbustos ou árvores contaminadas e depois se limparem. Para avaliar os níveis
de exposição nas diferentes monoculturas serão necessários mais estudos, diz
Barrilaro, uma vez que algumas espécies de morcegos se movimentam bastante pelo
território e podem ir de plantação em plantação.
Em comparação, os pesquisadores descobriram que os
morcegos das áreas de agrofloresta de caucau, com maior cobertura de floresta
natural, apresentaram menor nível de contaminação, embora alguns tivessem
níveis elevados de cobre, provavelmente devido ao uso de fungicidas.
Essa descoberta é importante, pois sugere que a
agricultura orgânica do cacau, que substitui os agrotóxicos por métodos de
manejo menos danosos ao ambiente, pode ser benéfica tanto para os fazendeiros quanto
para a biodiversidade, diz Barillaro. “Demonstramos que uma paisagem com mais
agrofloresta é mais amigável aos morcegos do que uma paisagem de monocultura”,
afirma.
“Essas descobertas são muito importantes para a
conservação dos morcegos, bem como de outras espécies, pois comprovam que as
monoculturas com uso intensivo de contaminantes podem afetar os animais por
contato direto, não só por meio das frutas, mas também pela água”, diz Ana
Luiza Destro, pesquisadora de pós-doutorado do Departamento de Bioquímica e
Biologia Molecular da Universidade Federal de Viçosa, que não esteve envolvida
no estudo.
Cacao agroforest in the Atlantic Forest. These
agricultural systems saw lower levels of lead and manganese contamination but
higher copper in some bats. The study underlines the finding that, of the
agricultural landscapes studied, organic certified cacao farming can be the
most beneficial to the health of bats and possibly other wildlife, says Julián
Barillaro. Image courtesy of Martin Cervantes.
<><>
Poluição diversa
Em outro estudo publicado no
início deste ano, Destro e colegas descobriram que morcegos frugívoros expostos
a poluentes tóxicos gerados pela mineração de bauxita e minério de
ferro na Mata Atlântica sofriam impactos diretos na saúde. Os morcegos dessas
áreas altamente impactadas acumulavam metais como alumínio, ferro e bário no
organismo, e apresentaram evidências de danos ou inflamação no fígado, rins,
cérebro e músculos, o que os pesquisadores atribuíram a esses contaminantes. Os
morcegos de áreas de extração de minério de ferro apresentaram níveis ainda
maiores de contaminação.
“Além da contaminação pelo aumento de metais no
ambiente, o impacto sobre os animais também está intimamente ligado à perda de
habitat e de fontes de alimento. Estas últimas, por sua vez, afetam a saúde dos
animais, o que pode ampliar os efeitos nocivos dos contaminantes”, diz Destro.
As monoculturas agrícolas também limitam o habitat e a disponibilidade de
alimentos, possivelmente produzindo um efeito similar.
Barillaro diz que os danos fisiológicos encontrados nos
estudos das áreas de mineração corroboram as preocupações levantadas em seu
artigo: “juntos, esses estudos enfatizam que as ameaças significativas que os
morcegos sofrem em decorrência das atividades humanas, e a necessidade urgente
de políticas para combater não só a poluição direta, mas também a degradação de
habitat, além de promover o manejo sustentável das paisagens.”
Embora seja desafiador ligar essas descobertas aos
impactos mais amplos sobre o ecossistema e a saúde humana, ambos os
pesquisadores dizem que é muito provável que o ambiente esteja poluído com
toxinas, e isto é um risco potencial para outras espécies e para os seres
humanos.
“Se o ambiente está contaminado, se os animais estão
contaminados, isso inevitavelmente atingirá os seres humanos”, diz Destro.
“Seja pela cadeia alimentar, pela ingestão de água contaminada ou mesmo pela
inalação do ar.”
“Este estudo mostra que há muitos metais pesados [nas
áreas degradadas] capazes de afetar a saúde humana, principalmente das pessoas
que trabalham diretamente nas plantações”, concorda Barillaro. A exposição a
esses metais pode ser ainda maior se os trabalhadores não dispuserem de
equipamento de proteção individual. O chumbo é especialmente preocupante tanto
para os morcegos quanto para
os humanos, pois é mais
nocivo e está ligado a uma série de condições graves de saúde.
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Consequências mais amplas
As descobertas de ambos os estudos apontam para os
riscos às populações de morcegos e aos serviços ecossistêmicos que eles
oferecem aos seres humanos. Os morcegos não só desempenham um papel fundamental
na regeneração das florestas por meio da polinização de plantas ou dispersão de
sementes como também são essenciais no controle de pragas. Pesquisas sugerem que os
morcegos, juntamente com as aves, são muito importantes para as plantações de
cacau.
Diante de outras pressões como a perda de habitat e o
acesso a alimentos, a poluição pode aumentar o risco de extinções locais. E
isso pode gerar outras consequências: uma pesquisa feita nos EUA e publicada
no começo do ano estabeleceu uma ligação entre o declínio geral das populações
de morcego e o aumento do uso de inseticidas agrícolas com o crescimento da
mortalidade infantil humana nas áreas afetadas.
Na Mata Atlântica, o papel dos morcegos pode ser
especialmente importante, uma vez que o bioma, sitiado por áreas degradadas,
enfrenta o desmatamento severo há décadas, colocando em risco espécies de árvores e da fauna.
Sem populações de morcegos saudáveis, a resiliência dos fragmentos
remanescentes de floresta pode ser impactada, afetando sua regeneração, dizem
os pesquisadores. “Se a saúde desses animais estiver ameaçada, as florestas e
sua capacidade de se regenerar também estarão cada vez mais em risco”, explica
Destro.
Proteger as florestas remanescentes, adotar práticas de
agricultura sustentável, como a agrofloresta de cacau, priorizar a regeneração
da floresta tropical e minimizar o uso de agrotóxicos são todos passos
essenciais para ajudar as espécies de morcegos, diz Barillaro. Abordagens mais
sustentáveis de mineração e medidas para reduzir a poluição por rejeitos também
são necessárias.
Embora ambos os estudos tenham se concentrado em áreas
altamente fragmentadas da Mata Atlântica, é provável que o padrão de
bioacumulação de toxinas encontrado seja semelhante em outras regiões tropicais
degradadas pela agricultura e pela mineração no mundo, acrescenta Barillaro.
“Isto provavelmente está acontecendo com os morcegos e outras espécies de vida
selvagem em outros locais onde há transformação do uso do solo, degradação e
monocultura, porque nessas áreas [os animais] estão potencialmente mais
expostos a contaminantes.”
Fonte: Brasil
247/Mongabay
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