terça-feira, 26 de novembro de 2024

Por que a relação entre China e Brasil é estratégica para o futuro do Sul Global?

Na tarde de terça-feira, horário local, o presidente Xi Jinping chegou a Brasília e iniciou sua visita de Estado ao Brasil. Após dois importantes encontros multilaterais – a reunião da APEC e a Cúpula do G20 –, as interações entre China e Brasil também atraíram grande atenção da mídia internacional.

Segundo relatórios, espera-se que China e Brasil promovam o comércio e a cooperação em diversas áreas, como agricultura, infraestrutura, energia e aeroespaço, fortaleçam o alinhamento das estratégias de desenvolvimento dos dois países, consolidem a confiança política mútua entre as partes e ampliem o caráter estratégico, inovador e de liderança de suas relações bilaterais.

China e Brasil são dois grandes países em desenvolvimento nos hemisférios oriental e ocidental. Ambos possuem vastos territórios e populações expressivas, além de serem membros do BRICS.

Naturalmente, China e Brasil compartilham muitos temas em comum no que se refere ao desenvolvimento nacional e ao progresso das condições de vida de seus povos, entre outros aspectos.

O mais representativo é o compromisso de ambos os líderes com a redução da pobreza, uma das tarefas mais urgentes. O presidente Xi descreveu o trabalho de redução da pobreza como “uma grande tarefa que estou determinado a cumprir”, enquanto o presidente brasileiro Luiz Inácio Lula da Silva referiu-se à solução da fome como “cumprir a missão de vida”.

Isso reflete a realidade de que, embora os países em desenvolvimento tenham suas próprias particularidades, todos compartilham o desejo comum de buscar desenvolvimento e uma vida melhor.

Diante do cenário internacional atual, seria possível que os países em desenvolvimento aproveitem plenamente suas vantagens de retardatários por meio da cooperação igualitária e da assistência mútua, traçando assim um novo caminho de desenvolvimento compartilhado?

China e Brasil têm demonstrado, na prática, que esse caminho não apenas é viável, mas também possui um enorme potencial para o futuro. Como disse o presidente Xi, um pássaro mais fraco pode começar cedo e voar alto. Nações influentes em desenvolvimento, como China e Brasil, abriram uma nova via de cooperação baseada em benefício mútuo e destino compartilhado, servindo como uma poderosa inspiração para os países do “Sul Global” que buscam a modernização.

Nesse contexto, a cooperação aprimorada e ampliada entre os dois países carrega um significado profundo que vai além do nível bilateral.

A cooperação mutuamente benéfica entre China e Brasil é altamente convincente. Por 15 anos consecutivos, a China tem sido o maior parceiro comercial do Brasil e uma de suas principais fontes de investimento estrangeiro.

Segundo estatísticas chinesas, as importações anuais da China do Brasil ultrapassaram US$ 100 bilhões nos últimos três anos.

O escopo de seus interesses compartilhados continua a se expandir, com destaques notáveis em agricultura, infraestrutura, desenvolvimento verde e inovação tecnológica.

Apesar de estarem separados por aproximadamente 18.800 quilômetros, sendo “os países mais distantes”, sua relação transcendeu divisões hemisféricas e civilizacionais, alcançando aprendizado mútuo e prosperidade compartilhada.

Eles também se tornaram um modelo de cooperação e resultados positivos no caminho da modernização entre dois países em desenvolvimento e duas nações do “Sul Global”.

Mais importante ainda, a cooperação China-Brasil é guiada por aspirações elevadas. Tome-se como exemplo a redução da pobreza – ambas as nações estão determinadas a enfrentar desafios que até mesmo países desenvolvidos têm dificuldade em resolver e estão dispostas a compartilhar suas soluções com outros.

Isso confere à parceria uma relevância global e contemporânea, potencialmente marcando um marco significativo na verdadeira ascensão do “Sul Global”.

À medida que ampliamos os impactos estratégicos de nossa cooperação mutuamente benéfica, expandimos seu escopo e exploramos novos caminhos, mais projetos exemplares que se alinham às tendências do momento e trazem benefícios duradouros às populações estão surgindo.

As dimensões da cooperação “Sul-Sul” serão enriquecidas e ampliadas, proporcionando um alicerce mais forte para a paz e a estabilidade globais.

Como “grandes jogadores” entre os países em desenvolvimento, a cooperação entre China e Brasil tem atraído atenção significativa da opinião pública ocidental. Algumas vozes prematuramente classificam essa parceria como uma tentativa de “contrabalançar os EUA”, o que não apenas é incorreto, mas também bastante limitado.

Essa visão reflete uma profunda insegurança entre certas elites ocidentais e sua imaginação restrita quanto às possibilidades infinitas para o desenvolvimento humano. Essas vozes estão destinadas a ficar para trás diante da ascensão coletiva do “Sul Global”.

Na recente foto oficial tirada durante a cúpula do G20 no Rio, os líderes da China, África do Sul, Brasil e Índia estavam juntos, e alguns comentaristas interpretaram isso como um sinal de que o futuro dos países do “Sul Global” está no horizonte.

Abraçando esse futuro visível, China e Brasil atuarão corajosamente como “pioneiros” e “surfistas das ondas”, usando sua profunda amizade e estreita cooperação para escrever um capítulo ainda mais notável para o “Sul Global”.

¨      Do G20 ao Cinturão e Rota: Brasil e China inauguram nova era de alianças

A visita do presidente chinês Xi Jinping à América Latina não apenas inaugura um novo capítulo nas relações da China com o continente, mas também destaca o compromisso chinês em promover a cooperação e amplificar a voz das nações do Sul Global, afirmaram especialistas.

Xi deixou Brasília na última quinta-feira após participar da 19ª Cúpula de Líderes do G20 e realizar uma visita de Estado ao Brasil. Altos funcionários brasileiros acompanharam sua despedida no aeroporto.

No trajeto até o aeroporto, representantes da comunidade chinesa, instituições e estudantes acenaram com bandeiras da China e do Brasil em ambos os lados da estrada, celebrando o sucesso da visita de Xi.

Durante sua estadia, o presidente Xi e o presidente Luiz Inácio Lula da Silva anunciaram a elevação das relações China-Brasil, comprometendo-se a construir uma “comunidade com futuro compartilhado”, baseada em um mundo mais justo e sustentável. Também concordaram em alinhar a Iniciativa do Cinturão e Rota às estratégias de desenvolvimento do Brasil.

O porta-voz do Ministério das Relações Exteriores da China, Lin Jian, destacou na quinta-feira que os dois líderes fizeram um balanço das relações sino-brasileiras ao longo de cinco décadas, concordando que estas atravessam seu melhor momento histórico. Além disso, reafirmaram seu caráter estratégico e de longo prazo, representando um exemplo de progresso mútuo e cooperação entre grandes países em desenvolvimento.

Segundo Lin, a elevação das relações bilaterais e a sinergia estratégica permitirão aos dois países consolidar conquistas passadas, iniciar os próximos “50 anos dourados” e servir como modelo para nações do Sul Global que buscam unidade e maior representatividade na governança global.

Xi Jinping também destacou que 2025 marcará o 10º aniversário do Fórum China-CELAC e expressou a disposição da China em trabalhar com o Brasil e outros países da América Latina para elevar a cooperação a novos níveis.

Especialistas chineses afirmaram que a viagem de Xi à América Latina reflete o compromisso da China em promover o desenvolvimento e a colaboração no Sul Global. Eles ressaltaram que a China está se posicionando como um ator central na promoção da paz, segurança e desenvolvimento global.

Em discurso escrito para a Cúpula de CEOs da APEC 2024, Xi enfatizou que os princípios de “planejar juntos, construir juntos e beneficiar juntos” devem prevalecer, com a ampliação da voz do Sul Global e a garantia de direitos iguais, oportunidades e regras justas para todos os países na cooperação econômica internacional.

Na Sessão I da 19ª Cúpula do G20, Xi defendeu uma maior integração entre países em desenvolvimento, destacando a importância de construir um ambiente global aberto, inclusivo e não discriminatório para a cooperação econômica. Ele ressaltou a necessidade de apoio ao desenvolvimento digital, inteligente e verde para reduzir a lacuna entre o Norte e o Sul.

Yang Xiyu, pesquisador sênior do Instituto Chinês de Estudos Internacionais, observou que a parceria sino-latino-americana representa um modelo de desenvolvimento autônomo e recíproco, contrastando com a dependência de potências ocidentais. Essa colaboração inspira outros países do Sul Global a buscar relações horizontais mutuamente benéficas e reforça a transição para uma nova ordem multipolar.

Além disso, Ronnie Lins, economista brasileiro e diretor do Centro de Pesquisa e Negócios China-Brasil, destacou que o fortalecimento dos laços econômicos, culturais e tecnológicos entre a China e a América Latina tem potencial para formar um bloco mais coeso, capaz de enfrentar desafios globais como desigualdade, sustentabilidade e inovação.

A diplomacia chinesa também busca estabilizar relações com grandes potências, como Estados Unidos, Rússia e Europa. Essas interações não só afetam relações bilaterais, mas também têm implicações diretas para a estabilidade internacional, reforçando o compromisso da China com a promoção da paz e do desenvolvimento globais.

Sob a liderança de Xi Jinping, a China está promovendo uma diplomacia de vizinhança baseada em amizade, benefício mútuo e inclusão, criando um ambiente diplomático pacífico e estável. De acordo com Xu Bu, presidente do Instituto de Desenvolvimento Internacional e Estudos de Segurança da Universidade de Jiangsu, essas ações estão traçando um caminho para o fortalecimento da cooperação regional e global.

Ao priorizar a revitalização conjunta com o Sul Global, fortalecer os laços com seus vizinhos e estabilizar as relações com grandes potências, a China está consolidando sua posição como um ator-chave no cenário internacional, escrevendo um novo capítulo em sua diplomacia com características chinesas.

<><> Brasil não entrar na Rota da Seda é carta na manga na relação comercial com a China, diz Bárbara Motta

Após os encontros de presidentes durante o G20, e a visita de Xi Jinping a Brasília, o terceiro episódio do podcast de política internacional do Brasil de Fato, O Estrangeiro, abordou o estreitamento da relação comercial entre Brasil e China, explorando o contexto da transição hegemônica mundial e os 37 novos acordos entre os dois países.

Bárbara Motta, coordenadora do Observatório de Política Exterior do Brasil (OPEB) ressaltou que "[a transição hegemônica] é um momento de bastante instabilidade, mas que abre uma série de brechas. O governo brasileiro está sendo inteligente e precisa continuar sendo para usar esse contexto para destravar coisas que seriam inegociáveis com a China; por exemplo, investimentos com transferência de tecnologia".

Para Motta, é importante que a diplomacia brasileira continue com uma dinâmica de autonomia, para que a relação comercial com a China não se traduza em dependência econômica do lado brasileiro. E essa atitude pode ser vista na decisão do Brasil de não entrar para a nova Rota da Seda.

"Talvez não entrar na Rota da Seda hoje seja, inclusive, a garantia de uma certa carta na manga. Para, em um futuro próximo, a curto ou médio prazo, o Brasil se fazer valer dessa carta na manga para estreitar ou conseguir algum tipo de acordo comercial com a China", explica a pesquisadora.

Outro ponto levantado durante o episódio foi a integração regional e o papel que o Brasil busca desempenhar como líder regional da América do Sul, e como a relação pode afetar esta dinâmica. "Acho que é importante o Brasil manter essa autonomia para que a gente não só mantenha uma posição de potência regional, mas que também tenhamos a capacidade de dizer não para projetos que não sejam benéficos para o país e/ou para a região e sua integração regional", complementa Motta.

Transferência tecnológica beneficia o Brasil

No âmbito comercial, durante a visita de Xi Jinping ao Palácio do Planalto, os dois países firmaram 37 novos acordos nesta semana, que estreitam ainda mais as relações comerciais entre ambos. Isto, adicionando o acordo de máquinas chinesas que vêm para o Brasil, já em andamento, como colheitadeiras, plantadeiras e adubadeiras, entre outras.

"Isso pode beneficiar tanto a industrialização no Brasil, porque os países estão conversando para não só importar as máquinas, mas trazer fábricas para o Brasil, e fabricá-las aqui. E também porque essas máquinas diminuem a penosidade do trabalho dos camponeses", complementou o corresponde do Brasil de Fato na China, Mauro Ramos.

"Existe muita expectativa de ambos os lados de que isso tenha um potencial cada vez maior, se expanda cada vez mais", explica Bárbara Motta. "Acho que vai ser esse um dos principais elementos a favorecer o Brasil a dar um salto do ponto de vista da composição da sua matriz de exportação, a gente exportando produtos de maior valor agregado, seja para a China ou outros países do mundo".

"Essa transferência de tecnologia é importante não só do ponto de vista das relações do Brasil para fora, mas também do Brasil para dentro. Pensar em outro modo de produção agrícola, outro modo de engajamento com as estruturas econômicas nacionais e internacionais", explicou a coordenadora do OPEB. Para ela, estes acordos, para o Brasil, são bons para a relação comercial com a potência asiática para "conseguir, de fato, pensar em estratégias alternativas, que não sejam essas estratégias vigentes, para combater a fome".

 

¨      Como o BRICS está desafiando o neocolonialismo

O mundo está testemunhando uma transição da unipolaridade para a multipolaridade, afirmou Dmitry Peskov, porta-voz do Kremlin, durante um evento da Sputnik em Nova Déli, Índia. A mudança, segundo ele, é impulsionada por iniciativas como o BRICS, que desafiam sistemas de poder dominados e combatem práticas neocoloniais.

No evento intitulado “Novas avenidas para cooperação entre a mídia indiana e russa: impulsionando os laços entre pessoas entre a Índia e a Rússia”, Peskov destacou que a nova ordem mundial deve ser baseada em “respeito mútuo, rejeitar quaisquer sinais de neocolonialismo e remover ameaças a diferentes países.”

Ele argumentou que é essencial permitir que nações resolvam seus próprios problemas sem interferências externas.

De acordo com Peskov, o BRICS desempenha um papel crucial ao combater tentativas de implementar sistemas neocoloniais. Como exemplo, ele citou a pressão sem precedentes, e muitas vezes “imperdoável”, que a Índia enfrenta dos Estados Unidos.

Em contraste, ele elogiou a postura da Rússia, que não busca “dar sermões” à Índia sobre questões como seu desacordo fronteiriço com a China, assim como não interfere nas políticas chinesas em relação à Índia.

“A Rússia valoriza seu relacionamento com a Índia e a China. Quando a Rússia diz mundo multipolar, é isso mesmo. A Rússia não interfere em assuntos regionais e nem a América deveria”, destacou Peskov.

O porta-voz do Kremlin reforçou que o BRICS exemplifica um modelo de cooperação que rejeita o controle unilateral e promove soluções conjuntas para desafios globais.

Essa abordagem desafia diretamente o que ele descreveu como o comportamento intervencionista dos Estados Unidos, particularmente em situações como a crise na Ucrânia.

Sobre a postura dos EUA, Peskov afirmou que a Rússia está aberta a uma proposta de paz do presidente eleito Donald Trump para o conflito na Ucrânia.

Ele, no entanto, acusou o governo Biden de “defender a guerra, não a paz”, referindo-se a recentes autorizações para ataques profundos em território russo.

Por fim, Dmitry Kiselev, diretor-geral da Rossiya Segodnya, grupo-mãe da Sputnik, comentou sobre a tensão entre Rússia e OTAN, destacando que a resposta de Vladimir Putin incluiu uma nova doutrina nuclear.

Essa política considera ataques de estados não nucleares apoiados por potências nucleares como atos de agressão conjunta.

Com o fortalecimento do BRICS e sua rejeição ao neocolonialismo, o bloco se posiciona como um pilar na transição para um mundo multipolar, redefinindo as dinâmicas de poder globais e promovendo uma governança mais equitativa.

 

Fonte: Global Times/O Cafezinho/Brasil de Fato

 

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