terça-feira, 26 de novembro de 2024

Heleno, Braga Netto: o que pode acontecer com militares indiciados

 Para os militares indiciados pela Polícia Federal por tentativa de golpe de Estado, as consequências de um eventual processo e condenação penal podem afetar sua posição na estrutura das Forças Armadas.

Mas isso só vai ocorrer em caso de uma eventual condenação criminal definitiva, ou seja, uma decisão pela punição deles em que não houver mais recursos.

Nesta quinta-feira (21), a Polícia Federal indiciou 37 pessoas por tentativa de golpe de Estado em 2022. No grupo, havia pelo menos 25 com ligações com as Forças Armadas. Um dos indiciados é o ex-presidente Jair Bolsonaro.

Para que haja condenação, o indiciamento da PF precisa se transformar em uma denúncia da Procuradoria-Geral da República e esta, por sua vez, deve ser acolhida pelo STF e resultar em uma condenação sem a possibilidade de recursos, após julgamento.

Se isso acontecer — e se a pena de prisão for maior que dois anos — o Superior Tribunal Militar pode ser chamado a se manifestar e declarar os militares indignos do oficialato, o que causa a perda de posto e patente.

<><> Crimes

Os crimes atribuídos a eles pela polícia federal têm penas superiores a dois anos:

▶️ abolição violenta do Estado Democrático de Direito: acontece quando alguém tenta "com emprego de violência ou grave ameaça, abolir o Estado Democrático de Direito, impedindo ou restringindo o exercício dos poderes constitucionais". A pena varia de 4 a 8 anos de prisão.

▶️golpe de Estado: fica configurado quando uma pessoa tenta "depor, por meio de violência ou grave ameaça, o governo legitimamente constituído". A punição é aplicada por prisão, no período de 4 a 12 anos.

▶️organização criminosa: crime cometido por quem promove, constitui, financia ou integra, “pessoalmente ou por interposta pessoa, organização criminosa”. Pena de 3 a 8 anos. A organização criminosa a “associação de 4 (quatro) ou mais pessoas estruturalmente ordenada e caracterizada pela divisão de tarefas, ainda que informalmente, com objetivo de obter, direta ou indiretamente, vantagem de qualquer natureza, mediante a prática de infrações penais cujas penas máximas sejam superiores a quatro anos, ou que sejam de caráter transnacional”.

<><> Tramitação

O indiciamento acontece quando a polícia atribui a uma pessoa ou a um grupo a prática de crimes, no âmbito de uma investigação penal. As conclusões da PF devem seguir para a Procuradoria-Geral da República, que pode arquivar ou caso ou apresentar uma denúncia, que é uma acusação formal na Justiça.

Se houver denúncia da PGR e ela for aceita pelo Supremo Tribunal Federal (STF), os indiciados se tornam réus e passam a responder a uma ação penal.

Esse processo passa por coleta de provas e de depoimentos. Na sequência, os ministros decidem se condenam ou absolvem os réus, fixando uma pena para cada um.

No caso dos militares, se esta pena privativa de liberdade for maior que dois anos, a Constituição prevê a possibilidade de declará-los indignos do oficialato.

Cabe ao Superior Tribunal Militar decidir sobre a Declaração de Indignidade para o Oficialato, se o tribunal receber uma representação nesse sentido do Ministério Público Militar. O STM não vai decidir sobre o crime em si, sobre as circunstâncias do ocorrido - mas sim avaliar se a indignidade para o Oficialato pode ser aplicada à situação.

Se não houver mais recursos ao pronunciamento do STM, o comandante da força ao qual o militar é vinculado será comunicado, para as providências. A indignidade para o oficialato provoca a exclusão do militar dos quadros. Os dependentes do militar, no entanto, ainda recebem pensão referente ao agente, mesmo com ele em vida. O procedimento é conhecido como "morte ficta".

 

•                                    Padre de Osasco é um dos indiciados pela PF; saiba quem é

Entre os 37 indiciados nesta quinta-feira (21) pela Polícia Federal no inquérito sobre a tentativa de golpe de Estado no país está o padre católico José Eduardo de Oliveira e Silva, da Diocese de Osasco, na Grande São Paulo.

Em fevereiro, ele foi alvo da operação Tempus Veritatis, da Polícia Federal. A operação cumpriu 33 mandados de busca e apreensão e quatro mandados de prisão preventiva contra pessoas acusadas de participação na elaboração da tentativa de golpe de estado no Brasil, em janeiro do ano passado.

O religioso é conhecido nas redes sociais por gravar vídeos no Youtube discutindo guerra cultural, aborto e a influência ruim das músicas e divas pop na vida de crianças e adolescentes,

O relatório final do inquérito, que tem mais de 800 páginas, foi concluído no início da tarde desta quinta e vai ser entregue ao Supremo Tribunal Federal (STF).

O padre José Eduardo é citado como integrante do núcleo jurídico do esquema. Segundo o ministro Alexandre de Moraes, o núcleo assessorava os membros do suposto plano de golpe de estado na elaboração de minutas de decretos com fundamentação jurídica e doutrinária que atendessem aos interesses golpistas.

De acordo com a Polícia Federal, o padre supostamente participou de uma reunião no dia 19 de novembro de 2022, com Filipe Martins e Amauri Feres Saad – outros dois indiciados- como indicam os controles de entrada e saída do Palácio do Planalto.

O encontro, segundo o inquérito da PF, fazia parte de uma série de discussões convocadas pelo ex-presidente Jair Bolsonaro para "tratativas com militares de alta patente sobre a instalação de um regime de exceção constitucional."

Filipe Martins era ex-assessor especial de Bolsonaro e foi preso pela PF em fevereiro.

Durante a operação em fevereiro, o padre José Eduardo de Oliveira e Silva foi informado pela PF que terá que cumprir medidas cautelares para não ser preso.

Entre elas, a proibição de manter contato com os demais investigados da operação, o compromisso de não se ausentar do país e entrega de todos os passaportes (nacionais e estrangeiros) no prazo de 24 horas.

Em nota, o advogado Miguel Vidigal afirmou que não recebeu nenhum relatório disponível. "Temos uma nota da Polícia Federal com alguns nomes indiciados."

"Menos de 7 dias depois de dar depoimento à Polícia Federal, meu cliente vê seu nome estampado pela Polícia Federal como um dos indiciados pelos investigadores. Os mesmos investigadores não se furtaram em romper a lei e tratado internacional ao vasculhar conversas e direções espirituais que possuem garantia de sigilo e foram realizadas pelo padre.

Quem deu autorização à Polícia Federal de romper o sigilo das investigações? Até onde se sabe, o ministro Alexandre de Moraes decretou sigilo absoluto. Não há qualquer decisão do magistrado até o momento rompendo tal determinação.

A nota da Polícia Federal com a lista de indiciados é mais um abuso realizado pelos responsáveis da investigação e, tendo publicado no site oficial do órgão policial, contamina toda instituição e a torna responsável pela quebra da determinação do ministro."

<><> O que disse o padre José Eduardo

Por meio de nota em fevereiro, o padre negou que tenha participado de qualquer conspiração contra a Constituição Brasileira. Segundo o padre, como sacerdote católico "é chamado para auxílio espiritual não apenas dos frequentadores da minha paróquia, mas também de todos aqueles de alhures que espontaneamente me procuram com assuntos dos mais variados temas".

"Como é meu dever, preservo a privacidade de todos eles, visto que os dilemas que me apresentam são sempre de foro interno. Em relação ao referido 'inquérito dos atos antidemocráticos', minha posição sobre o assunto é clara e inequívoca: a República é laica e regida pelos preceitos constitucionais, que devem ser respeitados. Romper com a ordem estabelecida seria profundamente contrário aos meus princípios", disse José Eduardo.

"Abaixo de Deus, em nosso país, está a Constituição Federal. Portanto, não cooperei nem endossei qualquer ato disruptivo da Constituição. Como professor de teologia moral, sempre ensinei que a lei positiva deve ser obedecida pelos fiéis, dentre os quais humildemente me incluo. Estou inteiramente à disposição da justiça brasileira para qualquer eventual esclarecimento, recordando o dever de toda a sociedade de combater qualquer tipo de intolerância religiosa", completou.

"A única missão na minha vida é o meu trabalho sacerdotal. Por isso, preciso de um “tradutor” que me faça compreender os passos jurídicos decorrentes desta inusitada e inesperada situação e que me ajude a atender com precisão os pedidos do Poder Judiciário. Por isso, constituo meu “tradutor” o Dr. Miguel da Costa Carvalho Vidigal, advogado, que saberá dar respostas jurídicas pertinentes ao assunto. Ainda não obtivemos acesso aos autos, o qual esperamos obter nos próximos dias", declarou.

<><> Quem é o padre José Eduardo

O padre José Eduardo de Oliveira e Silva, da Diocese de Osasco, na Grande São Paulo. — Foto: Reprodução/Redes Sociais

Integrante da ala conservadora da Igreja Católica, o padre José Eduardo comemora 18 anos de sacerdócio em 2024. Ele é o vigário oficial da 'Paróquia São Domingos – o Pregador-, no bairro de Umuarama, em Osasco.

Doutor em Teologia Moral pela Pontifícia Universidade da Santa Cruz (Roma, Itália), o religioso grava vídeos no Youtube com críticas às cantoras Madonna e Luiza Sonza, por exemplo, e analisa a letra das músicas e o simbolismo de clipes de canções como “Campo de Morango”.

“É de uma baixaria que a gente fica realmente constrangido”, diz ele.

“Não é apenas a letra [das músicas] que diz coisas. Mas é a harmonia, o ritmo e a melodia. Uma música de amor que tem uma batida sensual, ela está falando de amor em termos libidinosos. Na melodia está embutida uma mensagem sexual que não está embutida na letra. [...]Se uma melodia não tem uma inspiração divina, ela tem uma inspiração humana ou demoníaca?”, argumentou o padre em vídeo gravado em 7 de agosto do ano passado.

Entre as pautas que o padre mais gosta de comentar é o aborto: “Você tem pessoas tão loucas que elas são abortistas e veganas. São a favor de que se matem os bebês no ventre de suas mães, mas são totalmente contra o extermínio de animais para o consumo”, declarou ele em outro vídeo.

Padre José Eduardo analisa capa da revista Vanitty Fair, dos EUA, com a cantora Madonna vestida de Nossa Senhora das Dores. — Foto: Reprodução/Youtube

<><> "Chatólicos"

O padre também frequenta canais e podcast de grande repercussão na extrema direita, como os produtos da produtora Brasil Paralelo e o canal do economista bolsonarista Rodrigo Constantino.

Nos textos em que mantém no seu site pessoal, o padre também alerta os fiéis católicos contra os colegas de igreja que ele chama de “chatólicos”.

Entre as características desse tipo de cristão, segundo o religioso, estão as seguintes:

“O fulano que se converteu ontem, mas já se considera o próprio martelo dos hereges; justificam toda agressividade, desde que ungida com uma pretensa defesa da fé, em nome da qual cometem calúnias e difamações, além de muita desonestidade intelectual; Participam da liturgia como censores, mais preocupados com os eventuais erros cometidos pelo celebrante que com a edificação de sua alma; vivem de sensacionalismo escatológico, assustando “os outros com revelações particulares e especulações irresponsáveis sobre o capiroto”, escreveu.

 

•                                    Influenciador argentino, ex-estrategista de Milei, é indiciado. Saiba quem é

O influencer argentino Fernando Cerimedo é o único estrangeiro entre os 37 indiciados pela Polícia Federal nesta quinta-feira (21) por tramarem um golpe de Estado no país.

A conclusão do inquérito aponta uma organização criminosa que atuou de forma coordenada na tentativa de golpe para manter Bolsonaro após derrota na eleição de 2022. A investigação começou no ano passado e foi concluída dois dias após a PF prender 4 militares e um policial federal acusados de tentar matar Lula, Alckmin e Moraes.

Cerimedo é um influencer de direita, dono de um canal chamado "La Derecha Diário" e próximo, entre outros, ao deputado Eduardo Bolsonaro (PL-SP).

Além de apoiar informalmente da campanha de Jair Bolsonaro (PL) à reeleição em 2022, ele atuou como consultor externo e coordenador de estratégia digital da campanha de Javier Milei à Presidência da Argentina, em 2023. Ao contrário de Bolsonaro, Milei saiu vencedor do pleito.

<><> Falsas alegações de fraudes

Em 2022, Cerimedo participou ativamente da campanha para descredibilizar a eleição da qual Bolsonaro saiu derrotado. Em uma "live", o influenciador apresentou alegações apócrifas e falsas sobre as urnas eletrônicas para justificar o fato de o candidato do PL ter tido menos votos que Lula.

Uma das alegações do vídeo, sem provas é a de que algumas das urnas, de fabricação anterior a 2020, não teriam sido auditadas. A informação é falsa, porém.

No mesmo vídeo, Cerimedo também diz que algumas urnas teriam dois programas rodando em paralelo, já que elas apresentam dois logs. A informação também carece de provas, já que mais de um log pode ser gerado por uma mesma máquina, caso o servidor da Justiça Eleitoral digita uma número errado no momento de inserir a senha, por exemplo.

Próximos passos

➡️ O indiciamento significa que a PF viu fatos suficientes para considerar que Bolsonaro, Braga Netto e Cid e os demais indiciados têm participação na trama golpista que tentou tirar o mandato do presidente eleito em 2022, Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

A PF apresentou o relatório com os indiciamentos para o Supremo Tribunal Federal (STF). Agora, o ministro relator do caso, Alexandre de Moraes, deve enviar o material para análise Procuradoria-Geral da República (PGR).

Se a PGR entender que há elementos suficientes que demonstram a participação nos atos, vai oferecer à Justiça uma denúncia contra os envolvidos. Só se a denúncia for acolhida pelo STF é que Bolsonaro e seus auxiliares virariam réus.

<><> O que a PF investiga?

Desde o ano passado, a PF investiga a tentativa de golpe de Estado e iniciativas nesse sentido que ameaçaram o país entre 2022 e 2023, após Lula ter sido eleito — vencendo Bolsonaro nas urnas — e até pouco depois de ele ter tomado posse.

A investigação remonta aos discursos de altas autoridades do governo Bolsonaro para descreditar a urna eletrônica e o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), e se estende até o fim de 2022.

Passa, portanto, pelas "minutas do golpe" encontradas na casa do ex-ministro Anderson Torres, no celular de Mauro Cid e na sede do PL em Brasília; e pelo plano, revelado pela operação Contragolpe na última terça (19), que previa inclusive o assassinato de autoridades.

Os atos golpistas de 8 de janeiro de 2023, embora também se relacionem a uma tentativa de derrubar Lula da Presidência da República, são investigados em um inquérito separado.

•                                    Veja a lista de todos os indiciados:

1.                                   Ailton Gonçalves Moraes Barros

2.                                   Alexandre Castilho Bitencourt da Silva

3.                                   Alexandre Rodrigues Ramagem

4.                                   Almir Garnier Santos

5.                                   Amauri Feres Saad

6.                                   Anderson Gustavo Torres

7.                                   Anderson Lima de Moura

8.                                   Angelo Martins Denicoli

9.                                   Augusto Heleno Ribeiro Pereira

10.                                 Bernardo Romão Correa Netto

11.                                 Carlos Cesar Moretzsohn Rocha

12.                                 Carlos Giovani Delevati Pasini

13.                                 Cleverson Ney Magalhães

14.                                 Estevam Cals Theophilo Gaspar de Oliveira

15.                                 Fabrício Moreira de Bastos

16.                                 Filipe Garcia Martins

17.                                 Fernando Cerimedo

18.                                 Giancarlo Gomes Rodrigues

19.                                 Guilherme Marques de Almeida

20.                                 Hélio Ferreira Lima

21.                                 Jair Messias Bolsonaro

22.                                 José Eduardo de Oliveira e Silva

23.                                 Laercio Vergilio

24.                                 Marcelo Bormevet

25.                                 Marcelo Costa Câmara

26.                                 Mario Fernandes

27.                                 Mauro Cesar Barbosa Cid

28.                                 Nilton Diniz Rodrigues

29.                                 Paulo Renato de Oliveira Figueiredo Filho

30.                                 Paulo Sérgio Nogueira de Oliveira

31.                                 Rafael Martins de Oliveira

32.                                 Ronald Ferreira de Araujo Junior

33.                                 Sergio Ricardo Cavaliere de Medeiros

34.                                 Tércio Arnaud Tomaz

35.                                 Valdemar Costa Neto

36.                                 Walter Souza Braga Netto

37.                                 Wladimir Matos Soares

<><> Veja íntegra da nota da PF sobre o indiciamento:

A Polícia Federal encerrou nesta quinta-feira (21/11) investigação que apurou a existência de uma organização criminosa que atuou de forma coordenada, em 2022, na tentativa de manutenção do então presidente da República no poder.

O relatório final foi encaminhado ao Supremo Tribunal Federal com o indiciamento de 37 pessoas pelos crimes de abolição violenta do Estado Democrático de Direito, golpe de Estado e organização criminosa.

As provas foram obtidas por meio de diversas diligências policiais realizadas ao longo de quase dois anos, com base em quebra de sigilos telemático, telefônico, bancário, fiscal, colaboração premiada, buscas e apreensões, entre outras medidas devidamente autorizadas pelo poder Judiciário.

As investigações apontaram que os investigados se estruturaram por meio de divisão de tarefas, o que permitiu a individualização das condutas e a constatação da existência dos seguintes grupos:

•                                    a) Núcleo de Desinformação e Ataques ao Sistema Eleitoral;

•                                    b) Núcleo Responsável por Incitar Militares à Aderirem ao Golpe de Estado;

•                                    c) Núcleo Jurídico;

•                                    d) Núcleo Operacional de Apoio às Ações Golpistas;

•                                    e) Núcleo de Inteligência Paralela;

•                                    f) Núcleo Operacional para Cumprimento de Medidas Coercitivas

Com a entrega do relatório, a Polícia Federal encerra as investigações referentes às tentativas de golpe de Estado e abolição violenta do Estado Democrático de Direito.

 

Fonte: g1
 

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