Luiz
Fernando Padulla: Paralelos entre a Revolução Cubana e a Libertação da
Palestina
Durante
uma live tive o prazer de descobrir o livro “Sierra Maestra – a revolução de
Fidel Castro”. Em uma conversa pelo chat com um dos
espectadores, eis que ele fala do livro escrito por seu pai, Armando Gimezes, o
primeiro livro escrito sobre a Revolução Cubana, ainda em 1959. E graças aos
sebos virtuais, garimpei e encontrei o mesmo.
Lendo-o,
é impossível não traçarmos paralelos com a luta do povo palestino. Transcrevo
alguns poucos trechos que poderiam ser facilmente relatos do atual levante da
resistência palestina e nas tentativas de limpeza étnica na Palestina. A prova
de que regimes ditatoriais e criminosos sempre agem de maneira espúria e
desumana:
Sierra Maestra era, no entanto, um novo ninho de Águias. De lá
alçariam seus voos para exterminar as serpentes da tirania. Um trono dos deuses
e heróis índios que os colonizadores espanhóis tentaram destruir. Era um
Prometeu que se libertava e que daria o fogo da vida e da luz democráticas aos
povos da América. Um vulcão em erupção, vomitando a ira cívica das populações
oprimidas. (...) Fidel Castro, encarnando a um só tempo as figuras de Bolívar,
Sucre, Juarez e Marti, levaria a derrota ao tirano e daria a maior demonstração
de espírito anticolonialista na América Latina.
Os
árabes e nativos da histórica Palestina também se erguem bravamente contra a
política colonialista europeia, sob a figura deturpada de falsos judeus e a
criminosa política nazisionista.
Em trinta dias, que durou a travessia de Camagüey,
alimentamo-nos somente onze vezes. Até uma égua crua tivemos que comer. Tudo,
porém, foi vitória. (Camilo Cienfuegos
relatado o envio de sua coluna à região de Las Villas)
Impossível
não vir à mente a população faminta de Gaza, desassistida de ajuda humanitária
impedida pelo exército de “Israel”. Além disso, as intempéries que os
revolucionários cubanos passaram também nos remetem ao eterno líder militar do
grupo Hamas, Yahya Ibrahim Al-Sinwar que, mostrando honradez e comprometimento
com seu povo, jamais se escondeu ou se omitiu da luta pela libertação, sendo
martirizado de forma covarde pelo exército nazisionista. E após sua autópsia,
contatou-se que há três dias não se alimentava, sem que isso fosse desculpa
para lutar.
Em 26 de julho, a rádio rebelde fazia um apelo à Cruz Vermelha,
no sentido de que ela conseguisse a devolução dos prisioneiros feridos (...). A
enérgica intervenção da Cruz Vermelha Internacional fez que Figarola, a
contragosto, aceitasse os prisioneiros feridos. Cada um deles era testemunha
viva da generosidade do Exército Rebelde.
Em
uma batalha, há guerreiros e covardes. Cubanos e palestinos sempre honraram os
princípios da humanidade, mostrando preocupação não apenas com a população
civil, mas igualmente aos inimigos feridos. O cuidado e zelo que os verdadeiros
heróis têm, provou-se não apenas durante a Revolução Cubana, mas igualmente na
Palestina, quando os próprios prisioneiros que foram libertos, disseram que
foram bem tratados, agradeceram aos camaradas do Hamas, apertaram-lhes às mãos,
sorriram e desejaram boa sorte, o que causou descontentamento nas Forças de
Ocupação de “Israel” que passaram a proibir tais declarações, censurando e até
mesmo ameaçando aqueles reféns que falassem a verdade sobre o tratamento humano
que receberam. Afinal, é justamente o oposto que as tropas nazisionistas de
“Israel” fazem ao torturar e até matar reféns com crueldade. E talvez por isso,
mesmo após várias tratativas, Netanyahu jamais optou por novas trocas de
reféns, deixando claro que sua intenção não é preservar a vida desses cidadãos,
mas continuar sua política de extermínio.
Os celerados da Força Aérea não deram trégua em seu trabalho.
Dias inteiros as asas negras voavam sobre a cidade martirizada. Começaram
bombardeando os subúrbios, as entradas da cidade, o edifício de Obras Públicas,
os bairros de Paez e Santa Catalina. Os rebeldes montaram metralhadoras
antiaéreas e caminhões e deslocavam-se para as zonas bombardeadas. O casario na
encosta do morro do Capiro foi totalmente destruído. Dentre as ruínas
elevava-se uma fumaça espessa e o odor de carne queimada. Logo bombardearam
Santa Clara. Iam escrever os homens da Força Aérea o mais horrível capítulo da
sua história de genocidas. Os velhos telhados da cidade saltavam para as ruas e
os edifícios eram arrojados para o ar. Não respeitaram clínicas e nem
hospitais. Na maternidade, onde médicos e enfermeiras deram o exemplo abnegado
do sentimento do dever, algumas mulheres deram à luz sob a metralha, enquanto
pavorosas “revienta manzanas” estremeciam o edifício e estilhaçavam os vidros
da sala de operações. Em alguns lugares, as crateras abertas pelo bombardeio
mediam até dez metros de diâmetro. (...) Entretanto, os cadáveres jaziam
espalhados por toda parte e os feridos agonizavam nas vias públicas. Quantos
pretenderam recolhê-los pagaram com a vida o generoso empenho. Os sicários de
Batista e delatores encurralados eram insensíveis a todas as considerações
humanas. O comando rebelde através da Cruz vermelha solicitou uma trégua, com o
único propósito de enterrar os mortos e conduzir os feridos a um lugar seguro.
Casillas deu uma resposta insolente: “Não há trégua!”
Alvos
não civis, como escolas e hospitais jamais devem ser atacados, sendo
classificados como crimes de guerra. No entanto, como é típico das ditaduras,
ainda que travestidas de democracia, nenhuma lei está acima de seus interesses
escusos de eliminação e limpeza étnica para a perpetuação de sua sanha golpista
e colonial. Em Gaza, os hospitais foram praticamente destruídos em sua
totalidade, além de enfrentarem uma grave escassez de suprimentos médicos e
pessoal por conta com cerco imposto pelo regime de “Israel”. Grávidas são
obrigadas a realizarem cesáreas sem anestesia, assim como pessoas que precisam
de amputações. Dezenas de recém-nascidos sucumbiram em UTIs neonatais por falta
de energia e suprimentos básicos. Pacientes que precisam realizar hemodiálise e
até aqueles que sofrem com câncer, morrem e outros aguardam a morte porque não
podem ser tratados de forma adequada. As escolas que abrigam os civis
deslocados de forma forçada de sus casas, também seguem sendo alvos de
bombardeios indiscriminados.
É
importante que salientemos que os crimes contra o povo palestino não começaram
em 7 de outubro de 2023. Eles vêm de longa data, há mais de 76 quando se
oficializou a criação do estado genocida de “Israel”. A atual incursão que já
ceifou mais de 43.700 vidas, além das mais de 10.000 que seguem debaixo dos
escombros, é mais um triste e revoltante capítulo da luta contra a opressão que
os palestinos sofrem desde então.
Mas
a cada dia que se passa, ainda que “Israel” escale seus crimes para o Líbano,
Síria, Irã e demais localidades, mais próximo do fim esse regime racista se
aproxima. Assim como em 2 de dezembro de 1956 o modesto iate Granma chegou em
Cuba com 81 cubanos destinados a derrotar a ditadura de Fulgêncio Batista e
libertar Cuba, em 7 de outubro de 2023 os guerrilheiros palestinos mostraram a
mesma determinação. E como toda revolução, mais pessoas foram se somando e
fortalecendo a luta.
Tal
como em Cuba, “Israel” teve seu poderoso exército desbaratado por
“guerrilheiros de chinelo”. Na liderança em Cuba, um jovem advogado (Fidel
Castro), um médico argentino (Ernesto Guevara), um ex-aprendiz de alfaiataria
(Camilo Cienfuegos), e milhares de operários, camponeses, estudantes e jovens
intelectuais que se somaram às fileiras revolucionárias. Na Palestina,
guerrilheiros honrados, que ignoram até mesmo a fome e todas as adversidades, e
contam com a solidariedade dos militantes do Hezbollah, além da irmandade dos
iemenitas, libaneses, iraquianos e iranianos.
O
estado farsante e genocida de “Israel” está com os dias contados. Em recente
relatório apresentado com números do Gabinete Central de Estatísticas de Israel
(CBS), revela-se um aumento no número de colonos israelense que optaram por
viver fora dos territórios ocupados, mesmo antes de o regime ocupante ter
lançado a sua guerra brutal em Gaza em 7 de outubro do ano passado. Estima-se
que mais de 500 mil colonos já fugiram da Palestina invadida.
De
acordo com essas informações, houve um aumento de 285% no número desses que
optaram por viver em outras partes, principalmente pelos desafios
socioeconômicos que afligem “Israel”. Curiosamente esse aumento se deu logo
após o retorno ao poder do primeiro-ministro Benjamin Netanyahu e sua trupe
assassina. Descontentes e preocupados com as tais reformas legislativas que
lhes dava maiores poderes, os colonos começaram a evadir.
Os
autores do relatório alertam ainda que há uma tendência crescente de migração,
o que poderá trazer consequências ainda piores para “Israel”, potencializando
ainda mais a atual crise política e de segurança nos territórios palestinos
ocupados, sendo a pior desde a invenção de “Israel”.
Outros
42% dos israelenses que estão vivendo na Palestina ocupada também admitem que
podem a região e regressar aos seus países de origem, justamente pelo
agravamento das condições econômicas, à crescente desigualdade e ao fracasso
das negociações com os palestinos.
A
derrota de “Israel” é iminente. Resta saber se tal como Fulgência Batista que
não apenas traiu seu povo, mas fugiu de forma covarde, Benjamin Netanyahu fará
o memo, afinal, sua vida debaixo de seu bunker não durará para sempre. E ao
sair, o Tribunal Penal Internacional já o aguarda para ser julgado por todos os
crimes contra a humanidade que cometeu.
Afinal,
ainda que “Israel” tenha o apoio do império (decadente) estadunidense, a
solidariedade mundial rompeu a bolha que a mídia corporativa tentou vender ao
povo em geral. As tentativas de intimidações e acusações de antissemitismo
desfazem-se como sal na água, e ganha corpo a verdade: a luta contra o
nazisionismo. Hoje, com a farsa revelada, todos sabem que os verdadeiros
terroristas se travestem com a Estrela de Davi, sendo financiados pelas bombas
dos Estados Unidos, Alemanha, Grã-Bretanha e outros países párias.
Páginas gloriosas eram escritas pelos revolucionários cubanos. A
bela ilha vivia momentos de dores e de grandes lutas. (...) Camponeses,
operários, intelectuais, homens de todos os credos políticos e religiosos se
uniam na grande batalha para a derrubada de um tirano. Grades interesses
econômicos estavam sendo ameaçados. A bandeira da revolução propunha-se a
revisar todos os acordos e exigia, no concerto das nações, um tratamento igual
ao dado às demais potências. (...) Por isso a imprensa latino-americana nada
divulgava. As agências telegráficas norte-americanas, subordinadas pela
tirania, escondiam tudo. O que era notícia trescalava a mentira, calúnia e
injúria. Deturpavam nos seus noticiários a verdade cubana. Ocultavam os crimes
bárbaros cometidos contra um povo. (...) A verdade permanecia encoberta. (...)
os diários de toda a América transcreviam os telegramas das agências noticiosas
norte-americanas.
E é
assim até hoje. Afinal, a mesma imprensa canalha reverbera até hoje os
revolucionários e povos oprimidos pelo imperialismo como “terroristas” e
“bárbaros”, chegando até divulgar informações falsas como os bebês decapitados
e queimados em fornos, ou até mesmo estupros que jamais ocorreram. A mesma
imprensa cúmplice do genocídio na Palestina que propaga as mentiras de que os
guerrilheiros do Hamas estariam escondidos em hospitais, ambulâncias e escolas
para justificar os massacres nessas que deveria ser zonas humanitárias e
protegidas pela lei internacional. E ao mesmo tempo, relutam e omitem a verdade
dos fatos. E quando fazem, de forma discreta e sucinta, minimizam a vida dos
palestinos assassinados de forma cruel e desumana, alegando que simplesmente morreram,
como se não houvesse um sujeito ativo que desencadeou essas mortes.
Cuba
conquistou sua soberania, mas segue isolada, embargada por sanções criminosas
do imperialismo que tenta sufocar seu povo para não deixar que o verdadeiro
espírito de solidariedade ofusque os interesses do capital. Mas Cuba e seu povo
resistem. Assim como a Palestina. Ambos determinados ao direito de existirem e
provarem que um mundo mais solidário e justo é possível. E essa é a luta.
Cuba
conquistou sua independência às custas de muita luta e sangue de inocentes,
vencendo a disputa das ideias e convocando seus apoiadores. O povo palestino
segue trilhando esse mesmo caminho. Um caminho que levará à vitória como apoio
e solidariedade dos verdadeiros humanistas e internacionalistas. O caminho de
uma Palestina livre e liberta. E cedo ou tarde, isso acontecerá!
¨
Um breve interregno ao
avanço fascista. Por Jeferson Miola
Em artigo na Folha [12/11], o autor de O
fim da história Francis Fukuyama avalia
que a eleição de Donald Trump “está inaugurando uma nova era na política dos
EUA e talvez no mundo como um todo. Os americanos votaram nele com pleno
conhecimento de quem Trump era e o que ele representava”.
Fukuyama
lembra que “quando Biden conquistou a Casa Branca [em 2020], parecia que as
coisas tinham voltado ao normal após uma desastrosa Presidência de um mandato
só” do tenebroso republicano.
A
ilusão logo se desfez. O governo ruinoso de Trump não foi um ponto fora da
curva. Na realidade, ponto fora da curva foi a vitória do democrata Joe Biden
em 2020.
“Após
a votação do dia 5 [de outubro passado], agora parece que a anomalia foi a
Presidência de Biden”, escreveu Fukuyama.
Na
mesma linha de raciocínio, no dia seguinte à eleição [6/11] a repórter Patrícia Campos Mello destacou que, “quando venceu em 2020, Joe Biden afirmou
que Trump havia sido ‘um momento de aberração’ na história dos Estados Unidos.
Cada vez mais, parece que o interlúdio foi Biden, e o futuro, pelo menos nos
próximos anos, tem a cara de Donald Trump”.
A
administração Biden teria significado, nesse sentido, apenas um breve
interregno ao avanço fascista, muito distante de significar o aniquilamento do
trumpismo e do extremismo. Da mesma maneira que a derrota do Bolsonaro em 2022
não significou o fim do fasci-bolsonarismo no Brasil.
Para
Fukuyama, a vitória de Trump “representa uma rejeição decisiva dos eleitores
americanos ao liberalismo e à maneira particular como a compreensão de uma
‘sociedade livre’ evoluiu desde os anos 1980”.
Ele
próprio, um intelectual do establishment que nos anos 1990
proclamou o triunfo definitivo e inexorável do neoliberalismo sobre o
socialismo e quaisquer alternativas anticapitalistas, hoje reconhece que
fenômenos como Trump vicejam devido, justamente, à “ascensão do neoliberalismo
ao longo do último meio século, uma doutrina que canonizou os mercados e
reduziu a capacidade dos governos de proteger aqueles prejudicados por mudanças
econômicas”.
“O
mundo ficou muito mais rico ao todo, enquanto a classe trabalhadora perdeu
empregos e oportunidades”, afirma.
Fukuyama
também considera como causa da sedução do eleitorado pelo extremismo “a
ascensão do identitarismo, ou do que se poderia chamar de liberalismo ‘woke’,
em que a preocupação progressista com a classe trabalhadora foi substituída por
proteções direcionadas para um conjunto mais restrito de grupos marginalizados:
minorias raciais, imigrantes, minorias sexuais e afins”.
Ele
opina que devido ao identitarismo, “a classe trabalhadora sentiu que os
partidos políticos de esquerda não estavam mais defendendo seus interesses, e
começou a votar em partidos de direita”, uma vez que “o poder do Estado [foi]
cada vez mais usado para promover resultados sociais específicos para esses
grupos”.
Independentemente
da valoração que se faça sobre o impacto das pautas identitárias, é duvidoso
atribuir a elas a razão determinante para o reflorescimento dos fascismos no
mundo e para o deslocamento social e eleitoral das massas populares em direção
à extrema-direita.
Neste
seu estágio de ultra-financeirização, o capitalismo neoliberal padece de uma
crise estrutural; é um sistema que se esgotou e que necessita aprofundar ainda
mais a barbárie humana, climático-ambiental e civilizatória para alcançar
níveis superiores de acumulação.
O
fascismo não é uma força antissistema, e tampouco um movimento anticapitalista.
É uma opção endógena do próprio sistema para a reconfiguração do capitalismo em
crise profunda quando há o requerimento de formas autoritárias e violentas de
gestão da barbárie neoliberal.
Enquanto
governos de esquerda e progressistas frustram as expectativas sociais fazendo a
gestão da crise neoliberal sem abalar os pilares desta crise –mantendo o Estado
mínimo, os serviços públicos mercantilizados, a superexploração do trabalho com
salários baixos, os direitos previdenciários, trabalhistas e sociais
destruídos–, a extrema direita capta a frustração e o desalento social com uma
mística salvacionista e antissistema.
O
cenário para a eleição de 2026 no Brasil adicionou desafios mais complexos a
partir do desenlace da eleição estadunidense. Assim como nos EUA, a
extrema-direita brasileira segue pujante, em ofensiva político-ideológica e com
capacidade de liderança sobre a direita partidária e todo espectro conservador
e reacionário.
As
oligarquias dominantes não hesitarão em se abraçar novamente ao fascismo, como
se abraçaram a Bolsonaro em 2018, se vislumbrarem a possibilidade de derrotar
Lula. Se conseguirem seu intento, assim como Biden nos EUA, Lula terá sido
apenas um breve interregno ao avanço fascista no Brasil.
Fonte:
Brasil 247
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