Como
denúncia de fraude na eleição e opositor carismático levaram população de
Moçambique às ruas
"Há
quinze anos, Moçambique era
projetado pelo Fundo Monetário Internacional [FMI] como um país que, a esta
altura, seria de rendimento médio. Hoje, estamos mergulhados em uma crise
tremenda, sem perspectivas."
A
declaração do cientista político e professor Adriano Nuvunga, diretor do Centro
Para a Democracia e os Direitos Humanos (CDD),
em Maputo, de certa forma resume a insatisfação dos moçambicanos que
transbordou para as ruas do país nas últimas semanas.
Desde
a divulgação do resultado das eleições presidenciais, em 21 outubro, milhares
de pessoas têm saído em passeatas ou batido panelas de dentro de suas casas
quase que diariamente.
Eles
acusam as autoridades do país de fraudar o resultado que declarou como
vencedor, com 70% dos votos, o candidato governista Daniel Chapo, da Frente de
Libertação de Moçambique (Frelimo), partido que governa o país há 50 anos,
desde a independência de Portugal.
Missões
de observação eleitoral, como a da União Europeia, têm pedido mais transparência do
governo na divulgação dos resultados, que, segundo os observadores, tiveram
"irregularidades durante a contagem".
Os
atos, convocados pelo candidato opositor, que ficou em segundo nas eleições,
Venâncio Mondlane, um líder evangélico do partido Podemos, têm sido reprimidos
pelas forças de segurança.
Segundo
organizações de defesa dos direitos humanos no país, como o CDD, mais de 50
pessoas já morreram durante os atos e milhares ficaram feridas.
Mas,
além da disputa em torno dos resultados das eleições deste ano, as
manifestações no terceiro maior país de língua portuguesa do mundo (depois de
Brasil e Angola) têm levado às ruas uma revolta com a
situação econômica do país, explica o cientista político Fidel Terenciano,
diretor da ONG Instituto para o Desenvolvimento Econômico e Social (Ides).
"As
manifestações apontam claramente que os níveis de descontamento social,
econômico e político aumentaram em grande escala nos últimos tempos", diz
Terenciano.
"As
pessoas estavam à procura de uma válvula de escape para conseguirem sair à rua
e contestar esses apertos que sentem em relação à vida."
·
Eleição contestada por
um líder 'carismático'
Logo
após a divulgação do resultado pela Comissão Nacional de Eleições (CNE), os
moçambicanos começaram a sair às ruas.
Muitos
se dizem insatisfeitos com as sucessivas gestões da Frelimo, o movimento que
lutou pela Independência e encerrou o domínio de mais de 400 anos de Portugal,
em 1975, na chamada "luta armada de libertação nacional".
A
organização surgiu como um movimento guerrilheiro de esquerda contra o domínio
português e foi fundada em 1962, na fusão de grupos políticos moçambicanos
constituídos no exílio, especialmente na Tanzânia.
A
Frelimo teve o apoio de países com governos antiocidente como China e a então
União Soviética.
Com
a independência, virou um partido político de fato, de tendência marxista, e assumiu o poder da nova nação como a única legenda.
Mas
os tempos de paz nesse país que precisava se reconstruir e se firmar como nova
nação duraram pouco.
No
início dos anos 1980, o país passou a viver um novo conflito armado, dessa vez
entre a Frelimo e a Resistência Nacional de Moçambique (Renamo), um movimento
de caráter anticomunista que tinha o apoio de países vizinhos que temiam a
ideologia de esquerda, como a Rodésia — atual Zimbábue — e a África do Sul, sob
o regime do apartheid.
A
guerra civil durou até 1992, quando foi firmado um acordo de paz e o país
passou a ter um regime multipartidário.
As
primeiras eleições aconteceram em 1994, com vitória da Frelimo. O movimento de
esquerda foi declarado vencedor de todas as eleições seguintes, com frequentes
acusações de fraudes na contagem de votos.
Em
todos os pleitos, Frelimo e Renamo protagonizaram a disputa. Mas, em 2024, uma
nova figura surgiu: Venâncio Mondlane, um carismático líder evangélico que até
pouco tempo atrás não era conhecido nacionalmente.
Segundo
a CNE, Daniel Chapo, da Frelimo, foi eleito presidente com 70% dos votos. Ele
seria o primeiro presidente do país nascido após a independência e tem um
discurso em que pede "união".
Já
Mondlane teria recebido 20% dos votos. O político é ex-membro da Renamo, mas,
após desavenças internas, se filiou ao Podemos.
No
Brasil, ele é simpático ao ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), a quem já chamou
de "homem de Deus" e "esperança do Brasil".
Segundo
opositores do governo e organizações de acompanhamento eleitoral, a CNE hoje é
quase totalmente controlada pela Frelimo, apesar de a oposição ter alguns
representantes.
O
consórcio eleitoral Mais Integridade, formado
por diversos grupos da sociedade civil, faz acusações de cadastramento de
eleitores fantasmas e pessoas que depositaram votos de papel mais de uma vez
nas urnas.
Outro
grupo de acompanha a política de Moçambique, o Centro de Integridade Pública (CIP) disse que esta eleição foi "a mais fraudulenta desde 1999
porque a Frelimo tem assumido o controle de todo o processo eleitoral".
De
acordo com Adriano Nuvunga, os números da Frelimo causaram choque porque, mesmo
em tempos de crescimento econômico, o partido não havia conquistado 70% dos
votos.
"Isso
insulta a cabeça de qualquer moçambicano. Todas eleições de Moçambique foram
fraudulentas desde 1999, isso não há dúvida", diz.
Para
Nuvunga, Venâncio Mondlane se tornou um fenômeno porque conseguiu romper a
dicotomia entre Frelimo e Renamo que dominava o país, dando voz a uma
insatisfação da população.
Mondlane
tem feito as convocações pela internet e não tem aparecido publicamente,
alegando temer por sua segurança depois que seu assessor e advogado foram
mortos enquanto se preparavam para contestar os resultados em Maputo, capital
do país. O governo negou uma ligação política com as mortes.
A
oposição e as missões de observação cobram que a CNE apresente atas de boletins
de urna, detalhadas por mesas de votação.
Um
impasse parecido ao da Venezuela, em que o
órgão eleitoral não apresentou detalhes após apontar a reeleição de Nicolás
Maduro.
Em
uma coletiva de imprensa, uma porta-voz da Frelimo disse que há "um
movimento de tirar do poder os partidos que libertaram alguns países do
continente africano, através do golpe de Estado e que pode ser o caso de
Moçambique".
O
partido disse que o país tem "recursos naturais que alguns países
cobiçam".
Desde
o início da onda de manifestações, as redes sociais como WhatsApp, Instagram e
Facebook têm sido restringidas no país, segundo o monitor de internet
Netblocks. As redes de dados móveis também oscilaram.
O
governo não comentou as alegações de que teria restringido deliberadamente o
acesso à internet para dificultar a capacidade dos manifestantes de se
coordenarem.
A
BBC News Brasil tentou contato com a Frelimo e a CNE, mas não obteve resposta
até a publicação desta reportagem.
Em
comunicado à imprensa, o governo de Moçambique disse que "reconhece o
direito [de protesto] consagrado na Constituição da república e nos demais
instrumentos legais, todavia deplora o envolvimento de crianças e tentativa de
subversão da ordem democrática".
O
Ministério das Relações Exteriores do Brasil disse que vê com preocupação a
violência após eleições e recordou "o direito à liberdade de reunião e de
manifestação".
·
Índices entre os
piores do mundo
Os
protestos em Moçambique têm diminuído nos últimos dias de tamanho, mas causam
impactos econômicos, como o fechamento da fronteira com a África do Sul. Isso
em um país que já tem sofrido com a situação econômica.
Segundo
o Banco Mundial, Moçambique experimentou um forte crescimento econômico até
2016, com uma taxa média de crescimento superior a 7%.
No
entanto, crises relacionadas ao endividamento do governo, a ciclones que
destruíram parte da já precária estrutura do país e a pandemia de covid-19
reverteram a redução da pobreza.
O
Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) de Moçambique é o 11º pior do mundo
dentre 193 países.
O
PIB per capita (a riqueza produzida no país divida pelo número de habitantes) é
o 6º pior do mundo, segundo o Banco Mundial.
A
expectativa de vida é de apenas 58,3 anos, quase 20 a menos do que o Brasil,
No
índice de percepção de corrupção da ONG Transparência Internacional, o país
aparece em 145 de 180 países.
Esses
índices baixíssimos, segundo o cientista político Adriano Nuvunga, têm se
refletido nas manifestações, onde as pessoas também levam cartazes reclamando
das condições de vida no país, a falta de emprego e de oportunidades aos mais
jovens.
"O
Estado de Moçambique está em crise financeira. Milhões de moçambicanos ficaram
pobres e desempregados, especialmente os jovens. Eles não têm como projetar um
futuro com alguma dignidade e, por isso, apontam o dedo para Frelimo como
causador disso", justifica Nuvunga.
Moçambique
possui amplos recursos naturais, incluindo fontes abundantes de água, energia,
recursos minerais, pedras preciosas e depósitos de gás natural, recentemente
descobertos na sua costa e explorados por empresas estrangeiras.
Há
uma expectativa do Banco Mundial que esses campos de gás, quando em pleno
funcionamento, possam transformar a economia do país até 2029.
Mas
a população local reclama que tem visto pouco dessa riqueza ou investimento
passar para a comunidade.
A
localização geográfica de Moçambique também é considerada estratégica.
Quatro
dos seis países com que faz fronteira não têm litoral, portanto dependem de
portos moçambicanos para acesso os mercados globais
Moçambique
ainda tem passado por um grave conflito desde 2017 no norte do país, na
província de Cabo Delgado, uma região rica justamente em gás.
Um
movimento insurgente islâmico tem tentado controlar a região, levando a uma das
maiores crises de deslocamento de pessoas da África, com mais de 1 milhão de
moradores locais forçados a deixar suas casas.
Em
ataques violentos, dezenas de pessoas já foram decapitadas.
¨
Claudia Sheinbaum se
une a Trump em apelo por paz na Ucrânia
A presidente
mexicana, Claudia Sheinbaum, juntou-se nesta quarta-feira ao apelo à paz entre
a Rússia e a Ucrânia feito pelo presidente eleito dos Estados Unidos, Donald
Trump, ao comentar a permissão concedida a Kiev para usar armas ocidentais de
longo alcance contra a Rússia.
"Um
apelo à paz e para todos os países, esta escalada não ajuda, temos de fazer um
apelo à paz, até o presidente Trump fez um apelo à paz entre a Ucrânia e a
Rússia, o que também considero importante", afirmou a chefe de Estado em
coletiva de imprensa.
Sheinbaum
fez o comentário a uma pergunta em sua primeira entrevista coletiva após
participar da Cúpula de Líderes do G20, realizada recentemente no Rio de
Janeiro, Brasil, onde propôs alocar 1% dos gastos militares no mundo para um
programa de reflorestamento social.
No
último dia 15 de novembro, o recém eleito presidente dos EUA, Donald Trump,
afirmou que sseu governo não poupará esforços para acabar com o conflito na
Ucrânia.
"Vamos
trabalhar no Oriente Médio e vamos trabalhar muito arduamente na Rússia e na
Ucrânia, isso tem de parar, a Rússia e a Ucrânia têm de parar", afirmou
Trump em um jantar de gala organizado pelo Instituto de Política America First.
O
vencedor das eleições presidenciais dos EUA não explicou o seu plano para
conseguir a cessação das hostilidades. No passado, Trump prometeu repetidamente
resolver o conflito dentro de 24 horas.
No
domingo passado, o jornal americano The New York Times noticiou que Biden
autorizou pela primeira vez a Ucrânia a atacar a Rússia com mísseis americanos
de longo alcance.
O
chefe de política externa da União Europeia, o espanhol Josep Borrell, afirmou
que Washington autorizou ataques num raio de 300 quilômetros.
Na
terça-feira (19), o presidente russo, Vladimir Putin, aprovou um atualização na
doutrina nuclear do país. Nela, Moscou, embora considere as armas nucleares
como um meio de dissuasão e seu uso uma medida extrema, poderia recorrer ao uso
de armas nucleares, caso receba informações confiáveis sobre o lançamento de
mísseis balísticos dirigidos contra seu território ou de seus aliados.
Desde
24 de fevereiro de 2022, a Rússia continua uma operação militar especial na
Ucrânia, cujos objetivos são proteger a população de "um genocídio do
regime de Kiev" e enfrentar os riscos para a segurança nacional colocados
pelo avanço da Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN) para o leste.
As
tropas ucranianas são apoiadas militarmente pela OTAN, com os Estados Unidos na
linha de frente.
Em
meados de junho, Putin formulou as condições-chave para iniciar negociações de
paz. Em particular, que a Ucrânia retirasse as tropas dos territórios russos
(Donetsk, Lugansk, Kherson e Zaporozhie), desistisse de aderir à OTAN e
mantivesse um status neutro, não alinhado e não nuclear; e que todas as sanções
contra a Rússia sejam levantadas.
¨
'Chocante': EUA vetam
nova resolução de cessar-fogo em Gaza no Conselho de Segurança da ONU
Os
Estados Unidos vetaram um projeto de resolução do Conselho de Segurança da
Organização das Nações Unidas (ONU) que apela a um cessar-fogo "imediato,
incondicional e permanente" na Faixa de Gaza e à libertação de todos os
reféns, informa um correspondente da Sputnik nesta quarta-feira (20)
O
embaixador russo na ONU, Vasily Nebenzya, condenou a ação como
"chocante", enquanto o vice-embaixador norte-americano, Robert Wood,
defendeu o veto, afirmando que os EUA não poderiam apoiar um cessar-fogo
"incondicional".
O
novo rascunho de resolução foi preparado pelos dez membros não permanentes do
Conselho de Segurança (CSNU). Em particular, o texto exigiu "um
cessar-fogo imediato, incondicional e permanente, que deve ser respeitado por
todas as partes", e também reiterou sua demanda pela "libertação
imediata e incondicional de todos os reféns".
A
resolução havia sido aprovada por 14 dos 15 membros do CSNU. Apenas os EUA
foram contrários.
Além
disso, o documento rejeitava "qualquer tentativa de matar de fome os
palestinos" e exigia o fornecimento imediato de ajuda humanitária à
população civil no enclave, necessária para a sobrevivência. O texto também
defendia a importância de facilitar "a entrada total, rápida, segura e
desimpedida de ajuda humanitária na escala necessária" em Gaza.
Desde
o início da escalada do conflito palestino-israelense, o Conselho de Segurança
da ONU tem tentado repetidamente ajudar a parar os combates no enclave.
Projetos de resolução, incluindo os de autoria russa, sobre um cessar-fogo em
Gaza foram vetados pelos membros ocidentais liderados pelos Estados Unidos.
Documentos
aprovados pelo Conselho de Segurança com uma demanda quase idêntica, parar os
combates durante o mês do Ramadã, foram considerados não vinculativos por
Washington. O Conselho de Segurança, no entanto, adotou quatro resoluções, a
última das quais criada a partir do plano fracassado do presidente dos EUA, Joe
Biden, de um cessar-fogo gradual na Faixa de Gaza.
O
novo texto, rejeitado pelos EUA, exigiu entre outras coisas que as partes nas
hostilidades implementassem "totalmente, incondicionalmente e sem
demora" a Resolução 2735, o plano de Biden para um cessar-fogo em fases.
O
documento também detalhou o papel da Agência das Nações Unidas de Assistência
aos Refugiados da Palestina no Oriente Próximo (UNRWA) separadamente. Os
autores chamaram a agência de "a espinha dorsal da resposta
humanitária" em Gaza e pediram às partes que a deixassem "cumprir seu
papel".
O
rascunho de resolução também exigiu que as partes cumprissem suas obrigações
sob o direito internacional em relação aos detidos e pediu "total
conformidade" com o direito internacional humanitário, particularmente com
relação à proteção de civis e objetos civis.
<><>
Secretaria-geral da ONU lamenta veto dos EUA
A
Organização das Nações Unidas (ONU) lamenta que o Conselho de Segurança não
tenha adotado uma resolução sobre um cessar-fogo em Gaza depois que os Estados
Unidos bloquearam o rascunho do documento, disse Stéphane Dujarric, porta-voz
do secretário-geral, António Guterrez.
"Este
é outro exemplo da lamentável falta de consenso que vemos no Conselho de
Segurança entre os Estados-membros e, francamente, a falta de implementação de
resoluções anteriores sobre Gaza", disse Dujarric durante um briefing.
O
secretário-geral da ONU continuará a apoiar todos os esforços para ver o fim do
conflito em Gaza, alcançar a libertação incondicional de todos os reféns e
implementar a solução de dois Estados, acrescentou o porta-voz.
Fonte:
BBC News/Sputnik Brasil
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