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brasileiros que lutaram pelo fim da escravidão no Brasil
O
Dia da Consciência Negra é comemorado nesta quarta-feira (20/11). E é um dia em
que se lembra também a luta de brasileiros contra a escravidão.
Em
1888, a princesa Isabel, filha do imperador do Brasil Pedro 2º, assinou a Lei
Áurea, decretando a abolição - sem nenhuma medida de compensação ou apoio aos
ex-escravizados.
A
decisão veio após mais de três séculos de escravidão, que resultaram em 4,9
milhões de africanos traficados para o Brasil, sendo que mais de 600 mil
morreram no caminho.
Mas
a abolição no Brasil está longe de ter sido uma benevolência da monarquia. Na
verdade, foi resultado de diversos fatores, entre eles, o crescimento do
movimento abolicionista na década de 1880, cuja força não podia mais ser
contida.
Entre
as formas de resistência, estavam grandes embates parlamentares, manifestações
artísticas, até revoltas e fugas massivas de escravizados, que a polícia e o
Exército não conseguiam - e, a partir de certo ponto, não queriam - reprimir.
Em 1884, quatro anos antes do Brasil, os Estados do Ceará e do Amazonas
acabaram com a escravidão, dando ainda mais força para o movimento.
A
disputa continuou no pós-libertação, para que novas políticas fossem criadas
destinando terras e indenizações aos ex-escravizados - o que nunca ocorreu.
Conheça
abaixo as histórias de seis brasileiros protagonistas na luta pelo fim da
escravidão:
• Luiz Gama, o
ex-escravizado que se tornou advogado
Luiz
Gonzaga Pinto da Gama nasceu em 1830, em Salvador, filho de mãe africana livre
e pai branco de origem portuguesa. Quando o menino tinha quatro anos, sua mãe,
Luísa, teria participado revolta dos Malês, na Bahia, pelo fim da escravidão.
Uma
reviravolta ocorreu quando Gama tinha dez anos: ficou sob cuidados de um amigo
do pai, que o vendeu como escravizado. O menino "embarcou livre em
Salvador e desembarcou escravizado no Rio de Janeiro", escreve a socióloga
Angela Alonso no livro Flores, Votos e Balas, sobre o movimento abolicionista.
Depois, foi levado para São Paulo, onde trabalhou como escravizado doméstico.
"Aprendi a copeiro, sapateiro, a lavar e a engomar roupa e a
costurar", escreveu o baiano.
Aos
17 anos, Gama aprendeu a ler e escrever com um estudante de direito. E
reivindicou sua liberdade ao seu proprietário, afinal, nascera livre, livre
era.
Em
São Paulo, Gama se tornou rábula (advogado autodidata, sem diploma) e criou uma
nova forma de ativismo abolicionista: entrava com ações na Justiça para
libertar escravizados. Calcula-se que tenha ajudado a conseguir a liberdade de
cerca de 500 pessoas.
Gama
usava diversos argumentos para obter a alforria. O principal deles era que os
africanos trazidos ao Brasil depois de 1831 tinham sido escravizados
ilegalmente. Isso porque naquele ano foi assinado um tratado de proibição do
tráfico de pessoas escravizadas. Mais de 700 mil pessoas tinham entrado no país
nessas condições. Apenas em 1850 o tráfico de escravizados foi abolido
definitivamente.
"As
vozes dos abolicionistas têm posto em relevo um fato altamente criminoso e
assaz defendido pelas nossas indignas autoridades. A maior parte dos escravos
africanos (...) foram importados depois da lei proibitiva do tráfico promulgada
em 1831", disse Gama na época.
O
advogado ainda entrou com diversos pedidos de habeas corpus para soltar
escravizados que estavam presos, acusados, sobretudo, de fuga. Ainda trabalhou
em ações de liberdade, quando o escravizado fazia um pedido judicial para
comprar sua própria alforria - o que passou a ser permitido em 1871, em um dos
artigos da Lei do Ventre Livre.
Luiz
Gama morreu em 1882, sem ver a abolição. Seu funeral, em São Paulo, foi seguido
por uma multidão. "Quanto galgara Luís Gama, de ex-escravo a morto
ilustre, em cujo funeral todas as classes representavam-se. Comércio de porta
fechada, bandeira a meio mastro, de tempos em tempos, um discurso; nas sacadas,
debruçavam-se tapeçarias, como nas procissões da Semana Santa", relata
Alonso.
Na
hora do enterro, alguém gritou pedindo que a multidão jurasse sobre o corpo de
Gama que não deixaria morrer a ideia pela qual ele combatera. E juraram todos.
• Maria
Tomásia Figueira Lima, a aristocrata que lutou para adiantar a abolição no
Ceará
Filha
de uma família tradicional de Sobral (CE), Maria Tomásia foi para Fortaleza
depois de se casar com o abolicionista Francisco de Paula de Oliveira Lima. Na
capital, tornou-se uma das principais articuladoras do movimento que levou o
Estado a decretar a libertação dos escravizados quatro anos antes da Lei Áurea.
Segundo
o Dicionário de Mulheres do Brasil, ela foi cofundadora e a primeira presidente
da Sociedade das Cearenses Libertadoras que, em 1882, reunia 22 mulheres de
famílias influentes para argumentar a favor da abolição.
Ao
fim de sua primeira reunião, elas mesmas assinaram 12 cartas de alforria e, em
seguida, conseguiram que senhores de engenho assinassem mais 72.
As
mulheres conseguiram, inclusive, o apoio financeiro do imperador Pedro 2º para
a iniciativa. Juntamente com outras sociedades abolicionistas da época, elas
organizaram reuniões abertas com a população, promoviam a libertação de
escravizados em municípios do interior do Ceará e publicavam textos nos jornais
pedindo a abolição em toda a província.
Maria
Tomásia estava presente na Assembleia Legislativa no dia 25 de março de 1884,
quando foi realizado o ato oficial de libertação dos escravizados do Ceará, que
deu força à campanha abolicionista no país.
• André
Rebouças, o engenheiro que queria dar terras aos libertos
André
Rebouças nasceu na Bahia, em 1838, em uma família negra, livre, e incluída na
sociedade imperial. Quando jovem, estudou engenharia e começou a trabalhar na
área. Foi responsável por diversas obras de engenharia importantes no país,
como a estrada de ferro que liga Curitiba ao porto de Paranaguá. Conquistou
posição social e respeito na corte. A Avenida Rebouças, importante via em São
Paulo, é uma homenagem a André e a seu irmão Antonio, também engenheiro.
Em
uma das obras de que participou, outro engenheiro pediu que Rebouças libertasse
o escravizado Chico, que era operário e tinha sido responsável pelos trabalhos
hidráulicos. "Foi quando sua atenção recaiu sobre o assunto", escreve
Angela Alonso, também em Flores, Votos e Balas. Chico foi, então, libertado.
"Sou
abolicionista de coração. Não me acusa a consciência ter deixado uma só ocasião
de fazer propaganda para a abolição dos escravos, e espero em Deus não morrer
sem ter dado ao meu país as mais exuberantes provas da minha dedicação à santa
causa da emancipação", discursou certa vez Rebouças, na presença do
imperador Pedro 2º.
Na
década de 1870, Rebouças se engajou na campanha pelo fim da escravidão.
Participou de diversas sociedades abolicionistas e acabou se tornando um dos
principais articuladores do movimento. Um de seus papéis foi fazer lobby - uma
ponte entre os abolicionistas da elite e as instituições políticas, para quem
executava obras de engenharia.
As
ideias de Rebouças incluíam não apenas o fim da escravidão. Ele propunha que os
libertos tivessem acesso à terra e a direitos, para serem integrados, não
marginalizados. "É preciso dar terra ao negro. A escravidão é um crime. O
latifúndio é uma atrocidade. (...) Não há comunismo na minha nacionalização do
solo. É pura e simplesmente democracia rural", proclamou Rebouças.
O
engenheiro também se opunha ao pagamento de indenização para os senhores de
escravizados em troca da liberdade - para Rebouças, isso seria uma forma de
validar que uma pessoa fosse propriedade da outra.
Apoiador
da monarquia e da família real brasileira, Rebouças foi ainda um dos
responsáveis pela exaltação da Princesa Isabel como patrona da abolição.
• Adelina, a
charuteira que atuava como 'espiã'
Filha
bastarda e escravizada do próprio pai, Adelina passou a vender charutos que ele
produzia nas ruas e estabelecimentos comerciais de São Luís (MA). Suas datas de
nascimento e morte não são conhecidas. Seu sobrenome, também não.
Como
escravizada criada na casa grande, Adelina aprendeu a ler e escrever.
Trabalhando nas ruas, assistia a discursos de abolicionistas e decidiu se
envolver na causa.
De
acordo com o Dicionário da Escravidão Negra no Brasil, de Clóvis Moura (Edusp),
Adelina enviava à associação Clube dos Mortos - que escondia escravizados e
promovia sua fuga - informações que conseguia sobre ações policiais e
estratégias dos escravistas.
Aos
17 anos, Adelina seria alforriada, segundo a promessa que seu senhor fez a sua
mãe. Mas, segundo o Dicionário, isso não aconteceu.
• Dragão do
Mar, o jangadeiro que se recusou a transportar escravizados para os navios
O
jangadeiro e prático (condutor de embarcações) Francisco José do Nascimento
(1839-1914), um homem pardo conhecido como Dragão do Mar, foi membro do
Movimento Abolicionista Cearense, um dos principais da província, a primeira do
Brasil a abolir a escravidão.
Em
1881, o Dragão do Mar comandou, em Fortaleza, uma greve de jangadeiros que
transportavam os negros e negras escravizados para navios que iriam para outros
Estados do Nordeste e para o Sul do Brasil. O movimento conseguiu paralisar o
tráfico negreiro por alguns dias.
Com
o comércio de escravizados impedido nas praias do Ceará, Nascimento foi
exonerado do cargo, segundo o registro de Clóvis Moura. E se tornou símbolo da
batalha pela libertação dos escravizados.
Depois
da abolição, ele tornou-se Major Ajudante de Ordens do Secretário Geral do
Comando Superior da Guarda Nacional do Estado do Ceará e morreu como
primeiro-tenente honorário da Armada, em 1914.
• Maria
Firmina dos Reis, a primeira escritora abolicionista
A
maranhense Maria Firmina (1825-1917) era negra e livre, "filha
bastarda", mas formou-se professora primária e publicou, em 1859, o que é
considerado por alguns historiadores o primeiro romance abolicionista do
Brasil, Úrsula. O livro conta a história de um triângulo amoroso, mas três dos
principais personagens são negros que questionam o sistema escravocrata.
A
escritora assinava o livro apenas como "Uma maranhense", um
expediente comum entre mulheres da época que se aventuravam no mercado
editorial, e só agora começa a ser descoberto pelas universidades, segundo a
professora de literatura brasileira da Universidade Federal de Minas Gerais
(UFMG) Constância Lima Duarte.
Maria
Firmina também publicava contos, poemas e artigos sobre a escravidão em
revistas de denúncia no Maranhão.
De
acordo com o Dicionário de Mulheres do Brasil: de 1500 Até a Atualidade (Ed.
Zahar), ela criou, aos 55 anos de idade, uma escola gratuita e mista para
crianças pobres, na qual lecionava. Maria Firmina morreu aos 92 anos, na casa
de uma amiga que havia sido escravizada.
Fonte:
BBC News Brasil
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