Influenciadora
relata efeitos do vício em jogo do aviãozinho
O
vício em jogos online é doença mental séria que pode trazer graves
consequências para a pessoa viciada. Rafaela Silva, de 21 anos, é um exemplo.
Em 2021, ela conheceu o Aviator, também conhecido como “jogo do aviãozinho”,
que funciona com várias rodadas de apostas.
Em
pouco tempo, a influenciadora passou a ter comportamentos cada vez mais
agressivos com todos ao seu redor, para alimentar a sua vontade de fazer lances
cada vez mais altos no jogo.
Naquele
ano, Rafaela passou a receber uma média de R$ 6 mil por noite com o jogo, um
dinheiro que vinha “de forma fácil”. A jovem paulista tinha acabado de
completar a maioridade e se mudado do interior de São Paulo, onde morava com os
pais, para Minas Gerais.
Em
Minas, ela começou a trabalhar com plataformas de conteúdo adulto. “Eu comecei
a trabalhar com conteúdo adulto e ganhava muito dinheiro”, disse à revista
Marie Claire.
Foi
justamente na plataforma adulta que Rafaela viu propagandas do jogo do
aviãozinho e resolveu tentar a sorte pela primeira vez. No começo, ela ganhava
de 1 mil a 2 mil reais por semana com o jogo. Mas, com o passar do tempo, o que
era lucro passou a ser prejuízo.
No
auge do vício, Rafaela chegou a abandonar sua carreira como criadora de
conteúdo adulto e passou a apenas apostar no jogo do aviãozinho, que passou a
ser a sua única fonte de renda. Em dois meses, ela juntou R$ 35 mil, mas acabou
perdendo tudo em novas apostas. Com
isso, ela voltou para a casa dos pais em São Paulo.
O
seu pai tentou lhe ajudar e chegou a emprestar R$ 4 mil para Rafaela. Ela
apostou o valor e, do valor inicial, só sobraram R$ 50.
Em
meados de novembro de 2023, o vício atingiu seu ápice. Rafaella voltou a Minas
Gerais e passou a ameaçar amigos e os pais para receber dinheiro para jogar.
Ela tomava remédio para dormir e, quando acordava, só queria jogar. E foi assim
até dezembro.
Isso
só mudou quando sua mãe foi lhe buscar e levá-la de volta para o interior de
São Paulo. E assim iniciou um processo de tratamento com psicólogo e
psiquiatra.
Após
ter passado pelo tratamento, a influenciadora está há quase um ano sem jogar.
No entanto, até hoje ela sofre com abstinência pelo jogo. “Às vezes meu corpo
‘formiga’, chega a tremer. É uma sensação horrível. Quando eu comecei a perder
o dinheiro, tive problema nos nervos da tremedeira. Durante a abstinência,
também já tive dor de barriga, de cabeça, queimação no estômago, entre outras
coisas horrível”, finalizou.
• A rotina
traumatizante dos moderadores de redes sociais: 'Sacrifico minha saúde mental
pelos outros'
A
BBC conheceu de perto, nos últimos meses, um mundo oculto e sombrio. Nele, é
possível encontrar o que há de pior, mais tenebroso e mais perturbador no
conteúdo online.
Grande
parte deste conteúdo é ilegal. Decapitações, assassinatos em massa, abuso
infantil, discurso de ódio – tudo isso acaba nas caixas de entrada de um
exército global de moderadores de conteúdo.
Você
certamente não ouve falar deles com frequência. O trabalho dessas pessoas é
analisar e, quando necessário, excluir conteúdo denunciado por outros usuários
ou assinalado automaticamente pelas ferramentas da tecnologia.
A
segurança na internet vem se tornando uma questão cada vez mais relevante. As
empresas de tecnologia enfrentam pressões para remover rapidamente o material
nocivo que é postado online.
No
entanto, apesar da grande quantidade de pesquisas e investimentos em soluções
tecnológicas para ajudar neste processo, até o momento, a palavra final ainda
fica, em grande parte, a cargo de moderadores humanos.
Os
moderadores costumam ser funcionários de empresas terceirizadas, mas seu
trabalho é analisar conteúdo postado diretamente nas grandes redes sociais,
como o Instagram, o TikTok e o Facebook.
Os
moderadores ficam espalhados pelo mundo.
Conversei
com vários deles para a série da BBC Rádio 4 The Moderators, disponível em
inglês no site BBC Sounds. Eles moram principalmente no leste africano e todos
já deixaram seus cargos desde então.
Suas
histórias são angustiantes. Algumas das nossas gravações eram chocantes demais
para irem ao ar. Às vezes, meu produtor Tom Woolfenden e eu terminávamos uma
gravação e simplesmente ficávamos parados, em silêncio.
"Se
você pegar seu celular e for ao TikTok, irá ver uma série de atividades,
danças, sabe... coisas alegres", conta o ex-moderador Mojez, de Nairóbi,
no Quênia. Ele trabalhava com conteúdo do TikTok.
"Mas,
por trás disso, eu moderava pessoalmente centenas de vídeos horríveis e
traumatizantes."
"Eu
assumi aquilo para mim. Deixei que minha saúde mental absorvesse o golpe para
que os usuários comuns pudessem prosseguir com suas atividades na
plataforma", ele conta.
Existem
em andamento diversas ações judiciais alegando que o trabalho destruiu a saúde
mental desses moderadores. Alguns dos antigos profissionais do leste africano
se reuniram e formaram um sindicato.
"De
fato, a única coisa que me impede de assistir a uma decapitação quando entro em
uma plataforma de rede social é que há alguém sentado em um escritório, em
algum lugar, assistindo àquele conteúdo para mim e analisando para que eu não
precise ver", conta Martha Dark, responsável pela organização ativista
Foxglove, que apoia as ações judiciais.
Em
2020, a Meta – na época, conhecida como Facebook – concordou em pagar um acordo
de US$ 52 milhões (cerca de R$ 300 milhões) para moderadores que desenvolveram
problemas de saúde mental devido a esse trabalho.
O
processo judicial foi aberto por uma antiga moderadora dos Estados Unidos
chamada Selena Scola. Ela descreveu os moderadores como "guardiões de
almas", devido à quantidade de vídeos a que eles assistem, mostrando os
momentos finais da vida das pessoas.
Todos
os ex-moderadores com quem conversei usaram a palavra "trauma" para
descrever o impacto do trabalho sobre eles. Alguns tinham dificuldade para
dormir e se alimentar.
Um
deles contou sobre um colega que entrava em pânico ao ouvir um bebê chorar.
Outro disse que tinha dificuldades para interagir com sua esposa e os filhos,
devido aos abusos infantis que ele havia presenciado online.
Eu esperava
que eles dissessem que este é um trabalho tão extenuante, mental e
emocionalmente, que nenhum ser humano deveria estar a cargo dele. Pensei que
eles fossem apoiar totalmente a automação completa do setor, com a evolução de
ferramentas de inteligência artificial para desempenhar esta tarefa em larga
escala.
Mas
não. O que surgiu, com muita força, foi o imenso orgulho dos moderadores pelo
papel que eles desempenharam para proteger o mundo dos danos online.
Eles
se consideram um serviço de emergência fundamental. Um deles declarou que
queria um uniforme e um distintivo, comparando-se com um bombeiro ou
paramédico.
"Nem
um só segundo foi mal empregado", disse alguém que chamamos de David. Ele
pediu para permanecer anônimo.
David
trabalhou com material usado para treinar o chatbot viral de IA ChatGPT,
fazendo com que ele fosse programado para não regurgitar esse horrível
material.
"Tenho
orgulho dos indivíduos que treinaram este modelo para ser o que ele é hoje em
dia", declarou. Mas a própria ferramenta que David ajudou a treinar
poderá, um dia, concorrer com ele.
Dave
Willner é o ex-chefe de confiança e segurança da OpenAI, a empresa criadora do
ChatGPT. Ele afirma que sua equipe construiu uma ferramenta de moderação
rudimentar, baseada na tecnologia do chatbot. Esta ferramenta, segundo ele,
conseguiu identificar conteúdo prejudicial com índice de precisão de cerca de
90%.
"Quando
eu meio que finalmente percebi, 'oh, isso vai funcionar', honestamente me
engasguei um pouco", ele conta. "[As ferramentas de IA] não ficam
entediadas. Elas não ficam cansadas, não ficam chocadas... elas são
infatigáveis."
Mas
nem todos estão certos de que a IA seja uma bala de prata para os problemas do
setor de moderação online.
"Acho
que é problemático", afirma o professor de comunicação e democracia Paul
Reilly, da Universidade de Glasgow, no Reino Unido. "Claramente, a IA pode
ser uma forma binária e bastante obtusa de moderar conteúdo."
"Ela
pode acabar bloqueando excessivamente a liberdade de expressão e, é claro, pode
deixar passar nuances que moderadores humanos seriam capazes de
identificar", explica ele.
"A
moderação humana é essencial para as plataformas. O problema é que não há
moderadores suficientes e o trabalho é incrivelmente prejudicial para os
profissionais."
Nós
também entramos em contato com as empresas de tecnologia mencionadas na série.
Um
porta-voz do TikTok declarou que a empresa sabe que a moderação de conteúdo não
é uma tarefa fácil e procura promover um ambiente de trabalho solidário para
seus funcionários. Suas medidas incluem a oferta de apoio clínico e a criação
de programas de apoio ao bem-estar dos moderadores.
O
TikTok destaca que os vídeos são inicialmente analisados por tecnologia
automatizada que, segundo a empresa, remove um grande volume de conteúdo
prejudicial.
Já
a OpenAI – a empresa responsável pelo ChatGPT – declarou reconhecer o trabalho
importante e, às vezes, desafiador dos profissionais humanos que treinam a IA
para identificar essas fotos e vídeos.
Um
porta-voz da empresa acrescentou que, junto com seus parceiros, a OpenAI
executa políticas de proteção ao bem-estar das suas equipes.
Por
fim, a Meta – proprietária do Instagram e do Facebook – afirma exigir que todas
as suas empresas parceiras forneçam apoio presencial, 24 horas por dia, com
profissionais treinados. Ela destaca que os moderadores podem personalizar suas
ferramentas de análise, para desfocar as imagens sensíveis.
• Oniomania: a
Black Friday é um vilão para os compradores compulsivos?
A
Black Friday, evento que ocorre anualmente no mês de novembro, é aguardada com
entusiasmo por muitos consumidores, que aproveitam as ofertas e promoções para
adquirir produtos planejados ao longo do ano. No entanto, para algumas pessoas,
as promoções podem se tornar um verdadeiro desafio. Em vez de aproveitar de
forma estratégica as ofertas, elas se veem dominadas por um impulso de compra
incontrolável, uma condição conhecida como Oniomania, ou Transtorno do Comprar
Compulsivo (TCC).
A
Oniomania é caracterizada por uma necessidade incessante de comprar, muitas
vezes sem uma justificativa real ou financeira. Quem sofre desse transtorno
sente um alívio ou prazer momentâneo ao adquirir novos itens, mas logo após as
sensações de arrependimento, culpa e de ter perdido o controle vem à tona.
A
psicóloga Tatiana Filomensky, coordenadora do grupo de atendimento a
compradores compulsivos no Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas de
SP, explica ao Terra que a principal diferença entre o consumo normal e o
compulsivo não está apenas no valor gasto, mas nas consequências emocionais e
pessoais que o comportamento traz para o indivíduo.
"As
pessoas acabam não fazendo ponderações entre a vontade de comprar e as
possibilidades. É uma necessidade de aquisição excessiva em que você acaba
colocando em risco muitas vezes as finanças e as relações porque acaba
envolvendo mentiras, você começa a esconder o que comprou e acaba afetando a
família. É um problema que vai afetar de alguma maneira as pessoas com quem
você convive e vão percebendo o seu descontrole com a quantidade de coisas que
você consome. Na população geral, não há uma diferença significativa entre os
gêneros. E, normalmente, as pessoas buscam tratamento após os 30 ou 40 anos,
quando os efeitos do transtorno começam a impactar mais fortemente a vida
financeira e emocional da pessoa", comenta a especialista.
Além
disso, o TCC não ocorre de forma isolada e frequentemente está associado a
outros transtornos. "É bastante comum que o transtorno esteja relacionado
a um quadro de depressão, especialmente devido às tentativas frustradas de
controlar o impulso de comprar, o que gera uma sensação de angústia e
frustração. A ansiedade também está presente, já que a pessoa se preocupa com
as consequências financeiras, com o medo de ser descoberta ou de não conseguir
pagar as dívidas", explica.
Tatiana
Filomensky enfatiza ainda que a compulsão por
compras não está ligada ao poder aquisitivo da pessoa. Isto é, o
transtorno não tem relação direta com o quanto a pessoa ganha, podendo afetar indivíduos de várias classes sociais.
Descrito
pela primeira vez na década de 1990, o transtorno das compras compulsivas está
sendo cada vez mais estudado nos dias atuais, devido à facilidade de compras
com o uso de tecnologia. Há uma tendência crescente de que ele seja classificado
como um transtorno comportamental, semelhante à dependência de jogo, sendo
incluído em futuras edições da CID (Classificação Internacional de Doenças),
conforme explica a especialista.
A
diferença entre o consumo normal e o compulsivo não está apenas no valor gasto,
mas nas consequências emocionais e pessoais que o comportamento traz para o
indivíduo.
Para
quem sofre com o TCC, a Black Friday pode ser um desafio extra. "É um
momento delicado, onde o desejo de adquirir mais produtos pode se intensificar.
Para quem tem dificuldades de controle, o senso de urgência e o medo de perder
uma oferta podem ser fatores de risco. Mas isso não significa que a Black
Friday seja o vilão da história", completou a psicóloga.
Para
ajudar os compradores compulsivos a lidarem melhor com as promoções, Tatiana
recomenda fazer um planejamento, como, por exemplo, realizar uma pesquisa de
preços, criar uma lista de desejos e estabelecer um orçamento são fundamentais
para evitar compras impulsivas. E, se possível, evite ficar exposto ao estímulo
das promoções, desabilite notificações de aplicativos e redes sociais que podem
aumentar a ansiedade.
A
psicóloga ainda sugere que as pessoas em tratamento ou que já reconhecem o
transtorno no seu comportamento procurem apoio. "Se você sentir que está
perdendo o controle, é fundamental buscar ajuda. Não hesite em procurar um
profissional de saúde mental para apoio. O tratamento pode ajudar a entender
melhor as emoções que levam à compulsão e oferecer ferramentas para um consumo
mais consciente", ressalta.
A
Black Friday pode ser aproveitada de forma saudável, desde que você tenha
consciência dos seus limites e se planeje. Essa semana de promoções pode ser
aproveitada sem estresse ou endividamento desnecessário. E é sempre bom
ressaltar que o consumo não deve ser uma fuga para as emoções negativas, mas
uma escolha consciente e ponderada.
Fonte:
Redação Terra/BBC News
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