Câncer de
próstata: mulheres trans têm menor risco, mas dados são insuficientes
A
campanha Novembro Azul é voltada para a conscientização sobre o câncer de
próstata e ressalta a importância do cuidado com a saúde do homem. Porém,
mulheres trans e travestis também devem estar atentas ao risco de desenvolver o
tumor.
“Mulheres
trans e travestis têm risco de câncer de próstata por uma razão específica:
elas têm próstata”, afirma Ubirajara Barroso Jr., urologista da rede D’Or São
Luiz e chefe do Departamento de Cirurgia Afirmativa de Gênero da Sociedade
Brasileira de Urologia (SBU), à CNN.
O
especialista explica que esse risco se mantém mesmo entre aquelas que
realizaram a cirurgia de redesignação sexual. “Na cirurgia, não mexemos na
próstata que está por dentro, perto da bexiga. Então, as mulheres trans têm
risco de câncer de próstata porque, biologicamente, nasceram com próstata”,
explica.
De
acordo com Denis Jardim, líder nacional da especialidade de tumores urológicos
da Oncoclínicas, a próstata costuma ser mantida na cirurgia de redesignação
sexual porque sua retirada poderia aumentar o risco de incontinência urinária e
outras complicações do sistema urinário.
No
entanto, os dados sobre a incidência de câncer de próstata em mulheres trans e
travestis ainda são escassos, segundo o especialista.
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“Se
formos olhar as diretrizes de recomendação, dados de incidência, sobre como
diagnosticar, valores de PSA, a evolução do tratamento, entre outras, são
poucos estudos [que incluem a população transgênero]”, afirma Jardim à CNN.
“Têm
surgido alguns estudos mais recentes sobre o tópico. Talvez um dos principais
foi o publicado este ano na Prostate of Cancer and Prostatic Disease. Mas, de
fato, precisamos de uma maior conscientização e mais dados para ter afirmações
definitivas sobre esse cenário”, completa.
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Transição hormonal reduz o risco?
Apesar
de os dados ainda serem insuficientes, os especialistas afirmam que o risco de
câncer de próstata em mulheres trans é menor do que em homens cisgêneros,
principalmente entre aquelas que fizeram tratamento hormonal com inibição de
testosterona.
“No
estudo publicado no Prostate of Cancer and Prostatic Disease, o risco foi
aproximadamente duas vezes menor nas mulheres transgêneros nas idades entre 50
e 64 anos comparado com homens cisgêneros. Essa redução de risco pode variar a
depender, óbvio, da idade e também de quando foi iniciado o processo de
transformação hormonal”, afirma Jardim.
De
acordo com o especialista, a testosterona é um dos principais estimuladores do
câncer de próstata. “Então, como a transição hormonal envolve bloquear a
testosterona e, muitas vezes, suplementar estrógenos, vemos que esse é um dos
fatores que faz com que o câncer de próstata tenha uma incidência reduzida em
mulheres transgêneros”, explica.
“No
entanto, alguns estudos argumentam que se esse tumor de próstata acontecer,
ainda em menor incidência, ele pode ter um comportamento um pouco mais grave,
por justamente ter acontecido em um ambiente com o estrógeno mais alto”,
completa.
Além
disso, segundo Barroso Jr., o risco é menor quando o tratamento hormonal com
inibição de testosterona é feito em idade mais jovem. “Cada vez mais observamos
que as mulheres trans fazem a transição [hormonal] mais velhas, quando já houve
uma ação hormonal da testosterona suficiente para o risco ser equivalente [a
homens cisgêneros]. É possível que, daqui a uns anos, passemos a observar o
aumento da incidência de câncer de próstata por conta de uma transição mais
tardia”, afirma.
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Ainda não há diretriz específica para o rastreamento do câncer de próstata em
mulheres trans
Justamente
por ainda não haver estudos com evidências suficientes sobre a incidência e
mortalidade por câncer de próstata em mulheres trans e travestis, ainda não há
diretrizes específicas para essa população a respeito do rastreamento para o
tumor.
“Nós
devemos estimular que o rastreamento seja similar aos dos homens cis, que é a
visita ao urologista a partir dos 50 anos, para aqueles que não têm história
familiar de câncer, e a partir de 45 anos para quem teve parente de primeiro
grau com câncer de próstata”, orienta Barroso Jr.
O
rastreamento do câncer de próstata é feito através do toque retal e do exame de
sangue para avaliar a dosagem do PSA (antígeno prostático específico). Essa é
uma proteína produzida pela próstata que, em níveis elevados, pode indicar
alguma doença na glândula, incluindo o câncer.
Além
do toque retal e da dosagem do PSA no sangue, também podem ser incluídos no
rastreamento exames como ultrassom da próstata e ressonância magnética. A
confirmação do diagnóstico é feita através da biópsia da próstata por via
trans-retal ou trans-perineal, guiada por exames de imagem.
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Dificuldade de acesso ao diagnóstico precoce e tratamento adequado ainda é
realidade
O
diagnóstico precoce do câncer de próstata é fundamental para o sucesso do
tratamento e maior chance de cura. No entanto, entre a população transgênero, o
acesso a essa detecção em estágio inicial ainda é difícil.
“Existem
vários fatores relacionados à dificuldade do acesso ao diagnóstico precoce.
Alguns deles estão relacionados ao próprio entendimento. Para muitas mulheres
trans que fazem a cirurgia [de redesignação sexual], não existe o entendimento
de que a próstata ainda está lá. Por isso, existe uma necessidade de
conscientização”, observa Jardim.
Além
disso, fatores socioeconômicos também podem dificultar o acesso ao diagnóstico
e tratamento adequado para o câncer de próstata. “Em algumas situações existe
uma maior marginalização, uma dificuldade socioeconômica de algumas mulheres
transgêneros que sabemos que também pode ser uma barreira no acesso de
diagnóstico e prevenção em saúde”, acrescenta o especialista.
O
preconceito também é um fator para essa dificuldade. “Infelizmente, há muito
preconceito ainda com relação aos transgêneros, de maneira que existem inúmeras
barreiras. Primeiro, as mulheres trans têm receio muitas vezes de irem a
lugares públicos por conta de ofensas, por conta de violência. Os locais de
atendimentos pelo SUS são locais cheios, muitas vezes lugares com filas
bastante extensas, não confortáveis, o que gera espera longa, gera um ambiente
de estresse”, considera Barroso Jr.
Outro
ponto, na opinião de Barroso, é o despreparo de centros médicos para atender a
população trans. “Muitos não usam o nome social e há médicos que,
eventualmente, não estejam preparados e não saibam como lidar, por exemplo, com
as mulheres trans ou tem objeção de consciência, não querem realizar
atendimento por preconceitos”, completa.
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Novembro Azul deve incluir mulheres trans, defendem especialistas
Os
especialistas afirmam que a campanha Novembro Azul deve incluir a população
trans e aumentar a conscientização sobre os riscos do câncer de próstata em
mulheres trans e travestis.
“É
igualmente importante ter um maior preparo de toda a equipe médica, sociedade
médica, seja oncologia, urologia ou médico da família, a ter mais treinamento
de como lidar com essas mulheres, seja através de cursos ou congressos, para
que, enfim, essas mulheres sejam melhores acolhidas no sistema de saúde”,
aponta Jardim.
“Os
médicos em geral, principalmente os médicos urologistas e também os
ginecologistas que lidam com a população trans, além de toda equipe
multiprofissional que lida com essa população — seja psicólogos,
endocrinologista, cirurgiões plásticos e assistentes sociais — devem, de alguma
maneira, orientar e perguntar se os pacientes já buscaram um médico para
avaliação da próstata”, completa Barroso Jr.
Fonte:
CNN Brasil
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