Cortes de
gastos: o que se sabe e o que ainda falta saber sobre as medidas anunciadas
pelo governo
Após
quase um mês de espera, a equipe econômica detalhou nesta quinta-feira (28)
quais devem ser as medidas de contenção de despesas para que o governo consiga
cumprir com as metas estabelecidas pelo arcabouço fiscal — que reúne as regras
de equilíbrio para as contas públicas.
O
governo está em busca do déficit zero em 2024 e 2025 — ou seja, de igualar
receitas e despesas para não aprofundar a dívida federal. De 2026 em diante, a
meta é de pequeno superávit.
O
ministro da Fazenda, Fernando Haddad, lançou então um pacote que prevê economia
estimada em R$ 327 bilhões para os próximos cinco anos, mudando regras de
programas sociais e de gastos com salários da máquina pública.
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Abaixo, veja um resumo do que foi anunciado:
• Um limite na regra de
crescimento real do salário mínimo, em linha com o arcabouço fiscal;
• Mudanças na
aposentadoria de militares;
• Redução no número de
pessoas que têm direito ao abono salarial;
• Endurecimento das regras
para quem recebe o Benefício de Prestação Continuada (BPC);
• Reforço à fiscalização
sobre quem tem direito ao Bolsa Família;
• Regulamentação de uma
lei que coíba “supersalários” de servidores públicos.
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Entenda adiante o que se sabe e o que falta saber sobre os principais pontos
anunciados.
#
Salário mínimo
➡️ O QUE SE SABE?
No
caso do salário mínimo, a proposta do governo é a de colocar um limite na
correção do valor, a depender do desempenho da economia.
• O reajuste do salário
mínimo deve ser sempre de aumento real — ou seja, acima da inflação;
• O governo havia proposto
que o mínimo fosse corrigido pela inflação, considerando o Índice Nacional de
Preços ao Consumidor (INPC), mais o índice de crescimento real do Produto
Interno Bruto (PIB) do país em dois anos.
• Com a nova trava, esse
ganho poderá ter um aumento real entre 0,6% e 2,5% — os mesmos limites
estabelecidos no próprio arcabouço fiscal para as despesas públicas.
Na
coletiva desta quinta-feira, Haddad explicou que, se daqui cinco ou dez anos
houver algum ano em que o PIB cair, há um piso para que o salário mínimo suba
ao menos os 0,6%. Por outro lado, se o aumento for muito grande do PIB, há o
teto de 2,5% acima da inflação.
“Isso
tende a representar uma economia de aproximadamente R$ 4 bilhões em 2025 e R$
10 bilhões em 2026”, disse a economista-chefe da B.Side Investimentos, Helena
Veronese, em nota.
➡️ O QUE FALTA SABER?
A
principal dúvida que fica é sobre quando a medida passará a valer. Assim como o
restante do pacote anunciado pelo governo, a proposta ainda precisa passar pelo
crivo do Congresso Nacional.
#
Bolsa Família
➡️ O QUE SE SABE?
A
equipe econômica vai enviar ao Congresso um projeto de lei que propõe novas
regras para o Bolsa Família, visando trazer mais controle ao governo sobre quem
é beneficiado pelo programa social.
• O objetivo é garantir
que o programa de transferência de renda chegue a quem realmente precisa;
• Para isso, uma das
principais regras é que todos os beneficiários do Bolsa Família precisarão
passar por uma biometria obrigatória tanto para a inscrição quanto para a
atualização cadastral
• A atualização,
inclusive, passa a ser obrigatória para todo cadastro que esteja atualizado há
24 meses ou mais.
• A checagem por biometria
e atualizações cadastrais mais frequentes será válida para todos os programas
sociais, não apenas o Bolsa Família.
O
governo também endureceu as regras para cadastramento de famílias unipessoais
(de uma única pessoa) no programa. Agora, haverá restrição para municípios com
percentual de unipessoais acima do disposto em regulamento, de 16%, e as
inscrições dessas pessoas deverão ser feitas obrigatoriamente em seus
domicílios.
Com
essas medidas, o governo espera economizar R$ 17 bilhões até 2030, sendo R$ 5
bilhões entre 2025 e 2026.
➡️ O QUE FALTA SABER?
Apesar
da economia esperada pelo governo, não há mais detalhes de quantas famílias
podem ser retiradas do programa social por incompatibilidade com as regras.
Também é preciso definir quando as novas regras valerão. Isso depende da
tramitação no Congresso.
#
Abono Salarial
➡️ O QUE SE SABE?
Outra
proposta foi limitar o pagamento de abono salarial apenas para quem tem um
salário mensal de R$ 2.640, para diminuir o número de pessoas que têm direito
ao abono salarial.
Esse
valor será corrigido anualmente pela inflação, até chegar a 1,5 salário mínimo,
quando ficará fixado nesse valor proporcional. A expectativa é que isso
aconteça em 2035.
“É
como se fosse uma regra de transição de um benefício que, em certo sentido de
ser à luz de vários programas que foram criados [e que são] superiores a ele do
ponto de vista social”, disse o ministro Haddad.
Para
receber o benefício, é preciso que o trabalhador esteja cadastrado no PIS ou no
Pasep há pelo menos cinco anos e que tenha trabalhado pelo menos 30 dias no ano
anterior.
Pelas
regras atuais, os trabalhadores que recebem, em média, até dois salários
mínimos mensais (R$ 2.824) têm direito a receber o abono salarial.
➡️ O QUE FALTA SABER?
A
medida depende também de aprovação no Congresso. Não se sabe, portanto, a
partir de quando estará vigente, nem se a regra final será essa.
#
Benefício de Prestação Continuada (BPC)
➡️ O QUE SE SABE?
As
medidas propõem um endurecimento das regras para as pessoas que recebem o
Benefício de Prestação Continuada (BPC), de forma a obrigar a atualização de
cadastros que estejam desatualizados há mais de 24 meses e para benefícios
concedidos administrativamente sem Código Internacional de Doenças (CID).
💬 Segundo Haddad, as medidas vêm após o governo registrar uma
série de problemas na concessão do BPC, como casos em que o benefício é
concedido sem clareza atestada ou quando é concedido por uma liminar sem o
laudo pericial ou detalhamento do CID.
“Estamos
estabelecendo critérios legais que dão ao gestor público mais conforto na
certeza de que o benefício vai chegar a quem realmente precisa e é contemplado
pelo texto constitucional”, disse Haddad.
➡️ O QUE FALTA SABER?
Ainda
não se sabe a quais serão os prazos de adequação dos cadastros. Além disso, o
governo diz que os esforços estão voltados para realizar todas as perícias
médicas já em 2025, mas ainda não detalhou de que forma isso será feito.
#
Emendas parlamentares
➡️ O QUE SE SABE?
A
inclusão das emendas parlamentares no pacote de cortes de gastos, segundo
Haddad, refletirá apenas o cumprimento do acordo firmado entre governo,
Legislativo e Supremo Tribunal Federal.
A
proposta determina que:
• O valor das emendas não
poderá aumentar mais do que 2,5% acima da inflação de um ano para o outro,
seguindo o que estabelece o arcabouço fiscal;
• Que 50% delas serão
destinadas para a saúde pública, obrigatoriamente;
• E que haverá bloqueio de
emendas proporcionalmente aos bloqueios do Poder Executivo, limitado a 15% do
total das emendas (R$ 7,5 bilhões em 2025).
A
expectativa é que com as regras para as emendas, o governo tenha uma economia
de R$ 14,4 bilhões em 2025 e 2026 e de R$ 39,3 bilhões até 2030.
➡️ O QUE FALTA SABER?
Também
falta um cronograma das alterações das regras, e se, de fato, essa será a
dimensão dos bloqueios depois de aprovação dos parlamentares.
#
Forças armadas
➡️ O QUE SE SABE?
Haddad
afirmou que fez um acordo com as forças armadas do país para endereçar medidas
de ajuste fiscal, com impacto de R$ 2 bilhões ao ano.
Entre
os principais pontos estão:
• Acabar com a morte
ficta, que é um benefício concedido aos dependentes de militares expulsos das
forças armadas;
• Estabelecer um limite
para a transferência de pensão;
• Estabelecer uma idade
mínima progressiva, chegando a 55 anos em 2030, com uma regra de transição,
para o militar ter direito à reserva remunerada;
• Fixar pelo teto de 3,5%
da remuneração a contribuição do militar para o plano de saúde até janeiro de
2026.
➡️ O QUE FALTA SABER?
Ainda
não se sabe a partir de quando as novas regras passariam a valer.
#
Supersalários de servidores públicos
➡️ O QUE SE SABE?
O
ministro Haddad disse que o governo vai retomar as conversas com o Congresso
sobre os supersalários, algo que tentaram no ano passado, mas sem avanços.
Haddad
defende publicamente que uma reforma administrativa deveria começar pela
revisão dos supersalários — que, na prática, são os rendimentos com o trabalho
de servidores públicos que ultrapassam o teto de R$ 44.008,52 mensais.
➡️ O QUE FALTA SABER?
Haddad
disse que o Congresso está aberto a retomar as discussões sobre o tema, mas não
há informações sobre quando isso aconteceria.
Em
2021, a Câmara aprovou um projeto que prevê o fim dos supersalários, mas o
texto está parado no Senado. Antes disso, a Câmara demorou cinco anos para
votar o projeto.
A
proposta define quais os pagamentos que podem ultrapassar o teto, como auxílios
para alimentação e transporte. Porém, não há detalhes de quanto isso
economizaria para os cofres públicos.
#
Reforma sobre o Imposto de Renda
➡️ O QUE SE SABE?
Além
do pacote de cortes de gastos, o governo federal também anunciou pontos que
deve encaminhar sobre a reforma sobre o Imposto de Renda. Segundo Haddad, a
proposta é de um aumento na isenção do IR para os contribuintes que ganham até
R$ 5 mil.
A
estimativa é que a proposta gere um aumento de R$ 35 bilhões em renúncias
fiscais. A medida, no entanto, já conta com ações para compensar a perda no
texto a ser entregue ao Congresso.
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São três ações principais:
• A instauração de uma
alíquota mínima no Imposto de Renda para os contribuintes que ganham R$ 50 mil
por mês ou mais;
• O fim da isenção de IR
de moléstia grave para aposentadoria e pensão de quem ganha mais que R$ 20 mil
por mês; e
• Travas estabelecidas
pela equipe econômica para evitar evasão fiscal (quando o contribuinte deixa de
pagar o imposto).
Segundo
Dario Durigan, secretário-executivo do Ministério da Fazenda, a maior parte da
compensação se dará pelo tributo mínimo que vai incidir para quem ganha a
partir de R$ 50 mil por mês, ou seja, R$ 600 mil por ano.
• Essa alíquota deve
aumentar progressivamente para aqueles que têm rendimento a partir desse valor,
até chegar aos 10% para quem tem renda acima de R$ 1 milhão.
• O tributo ainda incide
sobre toda a renda anual, incluindo dividendos, juros sobre capital próprio,
aluguéis e trabalho remunerado.
A
mudança não afeta os trabalhadores de carteira assinada e que, por isso, já
pagam uma alíquota maior, de 27,5% de imposto de renda. A medida ainda precisa
ter o aval do Congresso Nacional e, se aprovada até o ano que vem, deve entrar
em vigor somente em janeiro de 2026.
➡️ O QUE FALTA SABER?
Além
do aval do Congresso, o detalhamento do cálculo e de quais travas foram estabelecidas
pela equipe econômica para evitar a evasão fiscal ainda devem ser mais
detalhados.
Ainda
há dúvidas se haverá alguma mudança na tabela progressiva do IR, de qual será o
escalonamento de imposto para quem ganha mais de R$ 5 mil e há incertezas sobre
se as medidas serão de fato compensadas ou podem gerar algum impacto aos cofres
públicos.
“Apesar
de reforçar na sua fala que a medida pressupõe uma neutralidade tributária, já
que viria acompanhada de uma compensação, não está claro, em números, como isso
aconteceria”, diz Helena Veronese, da B.Side.
Em
relação à taxação dos mais ricos, ainda não está claro quais serão as alíquotas
para cada faixa de renda até chegar a R$ 1 milhão, quando a alíquota cheia, de
10%, será cobrada.
• Governo coloca água no
chope de Haddad e no próprio chope
O
governo acabou colocando água no chope do ministro Fernando Haddad e no próprio
chope ao anunciar o pacote de corte de gastos combinado com uma promessa de
campanha de Lula: isenção do Imposto de Renda para quem ganha até R$ 5 mil por
mês.
O
corte chegou com atraso de três meses. E, por conta desse tempo, foi divulgado
em meio a dúvidas sobre o poder do ministro da Fazenda e da capacidade de
Haddad em convencer Lula. O anúncio não passou segurança ao mercado financeiro
de que o governo tinha interesse real em controlar o crescimento da dívida.
Além
disso, o governo ainda não pode garantir o que prometeu porque depende de
aprovação do Congresso.
Já
o anúncio da isenção do IR em 2026 é um ato que antecipa o tom do discurso da
campanha de reeleição, focado no público em que o governo mais precisa ampliar
o apoio, daqueles que ganham entre três a cinco salários mínimos, exatamente os
beneficiados pela medida.
Essa
é a faixa da população que sofre os impactos quando os juros aumentam, o
crédito fica mais caro e a inflação, que já está incomodando bem, piora.
O
governo até buscou um meio do caminho, mas tem um problema crônico de
comunicação, o noticiário virou a expectativa não atingida em relação ao ajuste
fiscal e isso tem um resultado muito ruim.
E,
então, a ideia de "desajuste" fica muito exposta a partir da forma,
do timing, do atraso e das próprias consequências de um ajuste.
Proposta
e reação
A
proposta anunciada por Haddad na quarta e detalhada nesta quinta-feira (28)
prevê um corte de gastos de R$ 70 bilhões em 2025 e 2026. Entre as ações, estão
uma limitação para o crescimento do salário mínimo, restrição para o abono
salarial e uma alíquota de até 10% de imposto para pessoas que ganham mais de
R$ 600 mil por ano.
Além
do pacote de corte, o governo também propôs isentar o Imposto de Renda para
quem ganha até R$ 5 mil por mês. Atualmente, o limite de isenção é de R$ 2.824.
A medida é popular, mas vai na contramão de um ajuste fiscal.
No
mercado financeiro, o anúncio combinado repercutiu mal e o dólar fechou em alta
nesta quinta-feira, renovando o maior valor nominal da história: R$ 5,9891. Ao
longo do pregão, a moeda americana bateu os R$ 6 pela primeira vez na história.
Na máxima do dia, chegou a R$ 6,0029.
Fonte:
g1
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