quarta-feira, 20 de novembro de 2024

Edmar Bula: Como as eleições nos EUA moldam o futuro, as inovações e os desafios globais?

A vitória de Donald Trump reflete o descontentamento de muitos eleitores com o status quo e a desconexão percebida entre o sistema político e a classe trabalhadora. Trump, branco e rico, atraiu eleitores brancos sem diploma universitário, que se sentem marginalizados pelas políticas progressistas e pela sua elitização. Sua retórica populista e nacionalista, focada em imigração, segurança e economia, ressoou com força em oposição aos democratas, especialmente entre aqueles que se sentem inseguros economicamente e nostálgicos por uma estabilidade passada.

Considerando o resultado da eleição, a América elegeu quem mais soube criar identidade e pertencimento com a população em seu discurso, promovendo fortes conexões com valores contemporâneos e sob a perspectiva da realidade social dos americanos. Se é assim que funciona a democracia, Trump foi um mestre na comunicação, por mais que eu ou você discordemos de suas propostas. Ele dialogou democraticamente com diferentes tribos e ofereceu a elas o que queriam ouvir. Kamala, por sua vez, carregou à exaustão todo o peso e significado da rejeição ao atual governo. Sua imagem não se descolou de Biden, que ainda lhe emprestou a crise imigratória e a inflação, âncoras que impediram a conquista de estados fundamentais, alguns deles tradicionalmente democratas.

Além disso, a relação polarizadora de Trump com a mídia fortaleceu a imagem de “anti-establishment” e consolidou-o como o “defensor dos interesses do povo comum”. Se foi esse povo que promoveu sua vitória em estados-chave e se o voto do homem branco, mais velho e sem formação superior, o levou até a linha de chegada, quem saiu vitorioso, na verdade, foi o pacote conservador, misógino, racista e fundamentalista. A caixa de Pandora foi aberta e isso não é nada bom, porque uma pequena minoria de grandes grupos (aqueles que, de fato, mandam no mundo) com muito poder financeiro investe forte para garantir seus privilégios. A caixa pertence a eles, mas as mazelas ficam para os habitantes do planeta.

O resultado das eleições nos EUA também deve redefinir o futuro do ecossistema de inovação, afetando áreas como tecnologia, energia limpa e biotecnologia. Uma administração de Kamala provavelmente priorizaria investimentos em sustentabilidade, com foco em energias renováveis e infraestrutura verde, além de uma regulamentação robusta para a inteligência artificial, visando à transparência e à segurança. Em contraste, com a vitória de Trump, deve ser favorecida a desregulamentação e fortalecidas as indústrias tradicionais, como energia convencional e mineração de criptomoedas, promovendo um ambiente menos restritivo para o setor tecnológico, mas com menos supervisão em segurança e privacidade, e com traços de uma política de controle das massas pela manutenção da miséria, seja ela qual for.

Diante disso, gosto muito da ideia de um mundo multipolar. Por exemplo, uma aproximação entre o Brasil e a China, e a adesão à Nova Rota da Seda, como parte de uma estratégia para fortalecer o Sul Global e contrabalançar a influência dos EUA, pode ser um caminho, pois oferece oportunidades de investimento e diversificação de parcerias econômicas. Outro caminho seria apostar no fortalecimento dos BRICS, o que talvez promovesse maior independência econômica e política para os países emergentes. Enfim, essa visão reflete uma tendência global de buscar um sistema mais equilibrado e menos centralizado nas potências ocidentais, o que ressoa não somente com as aspirações de muitas nações.

Em relação ao Brasil, é de se esperar um esfriamento nas relações bilaterais, mesmo com a forte tradição diplomática e comercial entre os dois países. Não há afinidade alguma entre Trump e Lula. Ambos estão em margens opostas de um oceano ideológico cada vez mais extremo e agudo. As personalidades são díspares, o que pode prejudicar ainda mais o diálogo. Os imigrantes certamente sofrerão um forte abalo, e, com ideias tão divergentes, não há meios para chegar a uma conclusão que seja suficiente para ambos. Também não podemos nos esquecer de que o lado dependente da economia é o nosso, o que piora ainda mais a situação.

As eleições nos Estados Unidos afetam o mundo todo. As políticas republicanas prometem um impacto profundo. A resposta dos democratas ao avanço da extrema direita foi, como no Brasil, pífia, mas ainda é decisiva para o futuro do país. Nos próximos dias, todas as nações serão espectadoras das primeiras ações de Trump e, para muitas delas, será inevitável ficar chocados, assim como tantos líderes globais, diante desse novo episódio histórico.

 

¨      O que se pode esperar do governo Trump 2

Após o republicano Donald Trump vencer as eleições nos Estados Unidos, os contornos de seu novo governo começaram a tomar forma.

O presidente eleito anunciou quase uma dúzia de indicações, nos primeiros passos para preencher sua equipe na Casa Branca e nos principais departamentos governamentais.

Trump também fez comentários para a imprensa e nas redes sociais que destacam quais serão suas prioridades ao assumir o cargo em janeiro, com foco especial em imigração e política externa.

Após um início às vezes caótico em seu primeiro mandato, Trump está preparando o terreno para seu próximo mandato com um plano mais claramente definido - e com equipe pronta para colocá-lo em prática.

·        Um time de imigração linha-dura

Algumas das nomeações recentemente anunciadas por Trump sugerem que a promessa de campanha do presidente eleito de deportar milhões de migrantes indocumentados que vivem nos EUA não é exagero.

Stephen Miller, conselheiro próximo e redator de discursos de Trump desde 2015, é a escolha de Trump para vice-chefe de gabinete da Casa Branca para políticas. Ele provavelmente moldará quaisquer planos para deportações em massa - e reduzirá a imigração ilegal e legal.

Durante o primeiro mandato de Trump, Miller esteve envolvido no desenvolvimento de algumas das políticas de imigração mais rigorosas do governo.

Thomas Homan, diretor interino da Agência de Imigração e Fiscalização Aduaneira no primeiro mandato de Trump, apoiou a política do presidente de separar famílias indocumentadas detidas na fronteira EUA-México. Agora ele está de volta com um portfólio ainda mais amplo, como o "czar da imigração" de Trump.

"Vou comandar a maior força de deportação que este país já viu", disse Homan em uma conferência conservadora em julho.

Críticos alertaram que o plano de deportação em massa de Trump poderia custar mais de US$ 300 bilhões (R$ 1,7 tri).

Em uma entrevista à NBC News na semana passada, no entanto, o presidente eleito disse que o custo não era um problema.

"Quando as pessoas mataram e assassinaram, quando os traficantes destruíram países, e agora eles vão voltar para esses países porque não vão ficar aqui", disse ele. "Não tem preço."

·        Posição dura sobre a China

Muitos conservadores acreditam que a China representa a maior ameaça à dominância global contínua dos EUA, tanto econômica quanto militar.

Enquanto Trump tem sido mais circunspecto, limitando a maioria de suas críticas à China ao campo do comércio, ele está lotando sua equipe de política externa de críticos vocais da China.

O presidente eleito escolheu o congressista da Flórida Mike Waltz, um coronel aposentado do Exército, como seu conselheiro de Segurança Nacional – um importante cargo de política externa na Casa Branca.

Waltz disse que os EUA estão em uma "guerra fria" com a China e foi um dos primeiros membros do Congresso a pedir um boicote dos EUA às Olimpíadas de Inverno de Pequim de 2022.

Em outubro, a congressista Elise Stefanik, escolhida por Trump para embaixadora dos EUA na ONU, acusou a China de "interferência eleitoral flagrante e maliciosa" em meio a relatos de que hackers apoiados pela China teriam tentado coletar informações dos telefones do ex-presidente.

Embora Trump ainda não tenha nomeado oficialmente sua escolha para secretário de Estado, o senador da Flórida Marco Rubio – outro crítico da China – parece ser o principal candidato ao cargo.

Em 2020, Rubio foi sancionado pelo governo chinês após ter pressionado por medidas para punir a nação por sua repressão aos manifestantes pró-democracia em Hong Kong.

As relações EUA-China tiveram diversos momentos difíceis durante o primeiro mandato de Trump, em meio a disputas comerciais e à pandemia de covid-19.

O governo Biden, que manteve muitas das tarifas de Trump sobre a China e impôs algumas novas, apenas acalmou um pouco as águas. Agora parece que o próximo governo Trump continuará de onde o último parou.

·        O novo papel de Musk

Enquanto a lista de indicados políticos de Trump cresce, há outro grupo que permanece pequeno — e extremamente influente.

Elon Musk, o homem mais rico do mundo, tem sido uma presença em tempo integral na sede de transição de governo de Trump em Mar-a-Lago.

De acordo com relatos da imprensa, ele está aconselhando o presidente eleito sobre indicados para o gabinete e até mesmo se juntou a uma conversa entre Trump e o presidente ucraniano Volodymyr Zelensky na semana passada.

Na terça-feira à noite, Trump anunciou que estava designando Musk para trabalhar com o empreendedor de tecnologia e ex-candidato presidencial republicano Vivek Ramaswamy em um "departamento de eficiência governamental" encarregado de identificar novos cortes no orçamento.

Musk regularmente ofereceu suas opiniões políticas em sua plataforma de mídia social X, incluindo o endosso da candidatura do senador da Flórida Rick Scott para ser o próximo líder da maioria no Senado.

O comitê de ação política de Musk gastou cerca de US$ 200 milhões (R$ 1,4 bilhões) para ajudar a campanha presidencial de Trump, e ele promete continuar a financiar os esforços do grupo para promover a agenda do presidente eleito e ajudar os candidatos republicanos nas próximas eleições para o Congresso.

Enquanto isso, resta saber onde Robert F Kennedy Jr., outra figura-chave, se posicionará.

Trump disse que planeja dar ao ex-democrata e cético em relação à vacina, que abandonou sua candidatura independente e apoiou o republicano, um papel em seu plano para tornar a América "saudável" novamente.

"Ele quer fazer algumas coisas, e vamos deixá-lo fazer isso", disse Trump em seu discurso de vitória eleitoral.

<><> O que se sabe e o que falta saber sobre futuro cargo de Musk

Donald Trump conquistar um segundo mandato na Casa Branca, os contornos de sua nova presidência começam a tomar forma. O presidente eleito já anunciou quase uma dúzia de nomes que formarão sua equipe na Casa Branca. Um dos nomes anunciados foi o da pessoa mais rica do mundo: Elon Musk.

Trump anunciou que o bilionário vai trabalhar em um novo Departamento de Eficiência Governamental, com o objetivo de "desmantelar a burocracia governamental", impulsionar "uma reforma estrutural em larga escala" e cortar gastos.

Musk liderará este departamento com o empresário da tecnologia e ex-candidato presidencial republicano Vivek Ramaswamy.

Mas ainda não está claro como será este órgão e nem sua duração.

Musk e Ramaswamy receberam o prazo de julho de 2026 para realizar este trabalho. Entretanto, não se sabe se seus cargos também expirariam nessa data.

Na rede social X (ex-Twitter), da qual é dono, Musk comemorou a nomeação com frases como "Tornando o governo divertido novamente!" e "As pessoas não têm ideia do quanto isso vai fazer diferença".

O bilionário também escreveu que "todas as ações do Departamento de Eficiência Governamental serão publicadas on-line para haver máxima transparência".

De acordo com relatos da imprensa americana, o bilionário tem aconselhado o republicano sobre indicados para o gabinete e até mesmo se juntou a uma conversa entre Trump e o presidente ucraniano Volodymyr Zelensky na semana passada.

O comitê de ação política de Musk gastou cerca de US$ 200 milhões (mais de R$ 1,1 bi) na campanha presidencial de Trump, e ele promete continuar a financiar os esforços para promover a agenda do presidente eleito e ajudar os candidatos republicanos nas próximas eleições para o Congresso.

O CEO (diretor executivo) da Tesla subiu ao palco em comícios republicanos e, nos últimos dias da campanha, sorteou US$ 1 milhão por dia entre eleitores de Estados-chave na eleição — um esquema que os críticos dizem ser equivalente a comprar votos e que foi contestado nos tribunais.

O bilionário de 53 anos estava com Trump em Mar-a-Lago, residência do ex-presidente na Flórida, na noite da eleição.

Nesta terça-feira, Trump anunciou também a nomeação de Pete Hegseth, apresentador do canal Fox News e veterano de guerra, como secretário de Defesa.

Enquanto isso, resta saber onde Robert F. Kennedy Jr., outra figura-chave, pousará.

Trump disse que planeja dar ao ex-democrata um papel para tornar os EUA "saudável" novamente. Robert F. Kennedy Jr. é ativista antivacinas e abandonou sua candidatura independente para apoiar o republicano.

"Ele quer fazer algumas coisas, e vamos deixá-lo fazer isso", disse Trump em seu discurso de vitória nas eleições.

No Congresso, os republicanos já conquistaram o Senado e estão se aproximando da maioria na Câmara dos Representantes.

·        Priorizar o poder presidencial sobre o Congresso

Com a posse de Trump, os republicanos têm o controle do Senado e ainda podem ganhar a Câmara de Deputados, embora por uma pequena margem. No entanto, as primeiras ações do presidente eleito sugerem que ele está mais preocupado em exercer seu poder presidencial do que em trabalhar com o Poder Legislativo.

Na semana passada, ele postou nas redes sociais que a liderança republicana do Senado deveria facilitar o caminho para mais "nomeações de recesso" presidenciais — permitindo que ele preencha cargos de alto escalão da administração sem a aprovação do Senado quando o Congresso não estiver em sessão.

A medida fortaleceria o poder presidencial ao minar o papel constitucional da Câmara de "aconselhar e consentir" com nomeações políticas.

Enquanto isso, o presidente eleito continua minando essas estreitas maiorias do Congresso.

Senadores que mudam para cargos administrativos podem ser rapidamente substituídos por nomeação do governador de seu Estado natal. Mas quaisquer vagas na Câmara — como as criadas pelas saídas de Stefanik e Waltz — exigem eleições especiais que podem levar meses para serem agendadas.

Alguns dos conselheiros de Trump, incluindo Musk, alertaram que o presidente eleito poderia estar colocando em risco sua agenda legislativa se tirasse muitos republicanos das duas Casas para colocá-los em seu governo.

Mesmo nas melhores circunstâncias, a aprovação de novas legislações no Congresso leva tempo, esforço e compromisso. Ações executivas, como novas medidas de imigração, podem ser aprovadas com uma 'canetada' presidencial.

As ações de Trump indicam que ele está, pelo menos no momento, mais focado nessa segunda opção.

·        Recompensar os leais

Trump apenas começou a preencher as milhares de posições que acompanham uma nova administração presidencial, sem ainda incluir os burocratas de carreira de alto escalão que prometeu substituir.

Em 2016, como um novato político, ele teve que contar com mais republicanos do establishment para papéis-chave. Desta vez, ele tem uma riqueza de candidatos em potencial com históricos comprovados de apoio a ele. E, após oito anos de experiência na política, muitos dos aliados de Trump são do establishment republicano.

Na terça-feira, Trump nomeou a governadora de Dakota do Sul, Kristi Noem, como secretária de Segurança Interna, e o apresentador da Fox News e autor conservador Pete Hegseth como secretário de Defesa. Ambos são defensores ferrenhos de Trump desde o início.

Outros, como Rubio e Stefanik, foram críticos de Trump no início de sua primeira candidatura presidencial, mas agora passaram anos demonstrando que suas palavras duras ficaram no passado.

Rubio, que concorreu à Presidência contra Trump em 2016, ainda pode ter ambições em relação à Casa Branca, no entanto.

Trump frequentemente se irritava com indicados que pareciam atraídos pelos holofotes durante seu primeiro mandato, e até mesmo os relacionamentos mais calorosos podiam dar errado.

Ele pode estar premiando lealdade com suas primeiras indicações, mas as pressões de governar acabarão revelando se seu segundo mandato terminará diferente do primeiro.

 

Fonte: Le Monde/BBC News Mundo

 

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