terça-feira, 12 de novembro de 2024

Diana Assunção: Preparar para enfrentar o ajuste fiscal que seguirá fortalecendo a direita e a extrema direita

As eleições de 2024 mostram o retrato de um país entregue ao Centrão e à extrema direita pelas mãos do governo Lula através da manutenção das reformas do golpe institucional e do próprio governo Bolsonaro, das emendas parlamentares, do financiamento das privatizações e da inclusão de partes destes setores como base do próprio governo. Administrando o capitalismo brasileiro de joelhos ao grande capital, enchendo o bolso do agronegócio com o Plano Safra e sustentando a direita e a extrema direita o governo Lula e o PT, com apoio do PSOL que é parte do governo, agora potencializa novos ataques à nossa classe. O primeiro ajuste fiscal pela via do Arcabouço Fiscal que cortou da saúde e da educação agora é o pêndulo para o governo cortar tudo que for necessário para manter essa meta fiscal. Foi assim com o ataque ao BPC - um corte no benefício de um salário mínimo pago a idosos e PCDs em situação de extrema pobreza -, que contou com voto da maioria dos parlamentares do PSOL, e agora com o novo pacote de cortes anunciado por Haddad e Tebet.

É sintomático que dois dias após estes resultados eleitorais, Tarcísio de Freitas, com quem o governo Lula mantém um pacto direto via BNDES financiando a privatização dos serviços públicos, fez um leilão de 17 escolas públicas, mais uma vez financiado com dinheiro federal. A justiça, por enquanto, suspendeu o leilão, mas a fúria privatista segue como vimos no depoimento do Deputado estadual bolsonarista Lucas Bove dizendo que “Vai privatizar tudo e que os sindicalistas metroviários vão perder o emprego”. Não fosse menos irônico, quase no mesmo dia vimos o governo do PT em cena de semelhança impressionante privatizando o tratamento de água de esgoto no Piauí. É Tarcísio, ao lado de Nunes, fortalecido pela política de conciliação de classes do governo Lula, e se alçando como talvez a principal figura presidenciável para 2026 em um momento onde o PT começa a ter uma crise após derrotas eleitorais que esbarram na crise de sucessão.

A derrota do PSOL em São Paulo foi um símbolo do desastre da política do partido no último período. Suas correntes internas não sabem como explicar o fato de que Boulos teve exatamente o mesmo número de votos de 2020 sendo que fez uma campanha mais de direita, com muito mais dinheiro, com muito mais alianças com partidos burgueses. É uma derrota amarga para muitos setores que depositavam em Boulos uma esperança de derrotar Nunes eleitoralmente, mas é também uma oportunidade de, depois da experiência de 2 anos de governo de Frente Ampla com Lula, buscar explicações mais profundas sobre a política de conciliação de classes e como chegamos até aqui, como apontou a professora Grazi Rodrigues no Congresso do sindicato dos trabalhadores municipais da educação em São Paulo. Neste momento os trabalhadores precisam debater um plano de lutas que não pode depender de sindicatos que se submetem a essa política do governo federal, pois é necessário se enfrentar com isso.

Não há mais tempo para perder com o discurso do “mal menor” que está sucessivamente levando a classe trabalhadora e a juventude a derrotas. De mal menor em mal menor quem está se fortalecendo é a direita e a extrema direita, e quem está sofrendo as consequências é a classe trabalhadora, os negros, as mulheres, a juventude e o povo pobre. É preciso tirar lições destes processos e dar um passo adiante no sentido de romper com o atrelamento a uma política que atua por dentro dos limites da institucionalidade, apoiando-se nos setores que, já no último período, se colocaram a lutar, enfrentando os efeitos do Arcabouço Fiscal, como foram os técnicos e docentes das universidades federais, do Ibama e ICMBio, e são agora os trabalhadores da saúde do Rio de Janeiro e do INSS, enfrentando repressão e corte de ponto do governo. O governo de Frente Ampla atua para impedir o surgimento de qualquer alternativa que supere o PT pela esquerda e hoje o PSOL tem sido um importante obstáculo nesse caminho. Cobrindo pela esquerda, dentro do governo, todas as políticas de conciliação de classes com um verniz que às vezes tenta parecer “combativo”, mas que na prática repete as velhas fórmulas reformistas, com maior ou menor febre lulista entre suas correntes. Por isso demos uma forte batalha no terreno eleitoral com as candidaturas comunistas do MRT encabeçadas por Grazi Rodrigues, Letícia Parks e Marcello Pablito com a Bancada Comunista em São Paulo, Flávia Valle em Belo Horizonte, Carol Santos no Rio de Janeiro, Luno Pires em Porto Alegre e Matheus Correia e Flavia Telles com a Bancada Revolucionária em Campinas.

Por isso é preciso construir um caminho de independência de classe que aposte na auto-organização da classe trabalhadora e dos movimentos sociais e considere que não há nenhum outro caminho para derrotar a extrema direita que não seja batalhar por um programa da classe trabalhadora, e não cedendo às alianças para assumir o programa de outra classe, como fez Guilherme Boulos em toda sua campanha, por exemplo agitando a bandeira de Marçal sobre “empreendedorismo”. A Frente de Esquerda e dos Trabalhadores - Unidade, na Argentina, encabeçada pelo PTS com Myriam Bregman e Nicolas Del Caño, é um exemplo categórico de parlamentarismo revolucionário que se opõe aos conchavos e acordos por fora da luta de classes, como estamos vendo na luta estudantil que tem nestes parlamentares um ponto de apoio fundamental. Com o PTS, vemos uma esquerda que combate na luta de classes a extrema direita de Milei, com total independência política das variantes burguesas como o peronismo e o kirchnerismo, no objetivo de construir um partido revolucionário da classe trabalhadora. Trata-se do oposto do PSOL, que está no governo burguês de Lula-Alckmin, vive como a sombra do PT e sobrevive por dentro da institucionalidade. Como apontou Letícia Parks em debate na PUC-SP, a diferença entre PSOL e FIT-U neste caso é entre água e óleo, não se misturam porque são projetos completamente distintos. Neste caso vale dizer que o PSOL, além da campanha vexatória de Guilherme Boulos, também apoiou com entusiasmo Fuad Noman, do reacionário PSD em Belo Horizonte, que serviu em Batalhão de tortura da ditadura militar, como apontou a Comissão da Verdade, e entrou como vice do PT (com uma militante do MES, corrente interna de Sâmia Bomfim, Luciana Genro e Robaina no PSOL) na prefeitura de Pelotas, com apoio de ninguém menos que o governador Eduardo Leite do PSDB. Alguns exemplos de que o PSOL não tem absolutamente nada a ver com independência de classe e se enterrou no caminho da institucionalidade.

Para enfrentar o conjunto dos ataques que se mantém como herança do golpe institucional e do governo Bolsonaro e preparar a nossa classe para o novo ajuste fiscal de Lula e Haddad é preciso colocar na ordem do dia uma batalha nos sindicatos para enfrentar a subordinação das centrais sindicais e dos sindicatos ao governo federal, que submetem a luta dos trabalhadores ao apoio ao governo Lula. É necessário fortalecer um polo independente e classista, que em cada assembleia, local de trabalho e estudo, construa nas bases o rechaço ao conjunto destes ataques. Essa é a batalha que viemos dando como MRT nos sindicatos em que compomos as diretorias, como no Sindicato dos Trabalhadores da USP, no Sindicato dos Metroviários de São Paulo, na Subsede APEOESP Santo André, no Sindicato dos Petroleiros do Rio de Janeiro e como parte da CSP-Conlutas, além de nossa atuação na base de professores municipais e estaduais em distintos estados, rodoviários, bancários, técnicos de universidades federais, trabalhadores terceirizados, precarizados e fabris. Também é o que norteia nossa atuação no Centro Acadêmico de Bacharelado das Ciências Humanas (CABCH) na UFABC e em diversas universidades do país, onde damos essas batalhas como Faísca Revolucionária, como na luta histórica da UERJ, que tem importantes lições para o movimento estudantil. É fundamental colocar um plano de luta imediato que prepara nossa classe pra enfrentar estes ataques. Na UFMG colocamos de pé, através de um chamado da juventude Faísca, uma chapa de Oposição de Esquerda Unificada para as eleições de DCE, junto com PSTU, CST e PCBR, a partir do chamado que fizemos e em base a um programa de independência de classe baseado na tradição de auto-organização dos estudantes, que é um exemplo nacional para enfrentar as burocracias estudantis e também o movimento estudantil institucionalizado do PSOL e da UP, que como vimos na UERJ, ajudaram a eleger a Reitoria do PT e PSOL, que atacou a permanência estudantil e colocou a Tropa de Choque na universidade para reprimir a luta dos estudantes.

Contra o discurso do empreendedorismo, de Marçal a Boulos, levantamos com toda força as bandeiras da unidade das fileiras operárias, seguindo a luta pela efetivação dos trabalhadores terceirizados sem necessidade de concurso público ou processo seletivo, e lutando por direitos plenos a todos os trabalhadores terceirizados e uberizados, como estamos fazendo na USP em luta intransigente para igualar os direitos com os terceirizados, como por exemplo na defesa do direito ao uso dos ônibus circulares. Fazemos um chamado a todos os setores a tomarem para si o Manifesto contra a terceirização e precarização do trabalho, impulsionado junto com intelectuais como Ricardo Antunes e Jorge Luiz Souto Maior, para seguir colocando na ordem do dia a luta por unir a nossa classe, batalha que a cada dia ampliamos, como no Sindicato de Petroleiros, onde se realizou uma mesa para abrir este importante debate na categoria.

Levantamos com força a luta por Justiça para Marielle e Anderson, participando em todos os momentos dessa luta, e agora nos atos no julgamento dos executores, onde foram condenados, com nossas companheiras Carolina Cacau e Carol Santos e outros militantes. Enfim, depois de 6 anos de muita luta, com os familiares em especial resistindo, começamos a arrancar a punição aos responsáveis. Uma conquista muito importante. E seguiremos na luta por justiça, pela punição dos mandantes desse crime bárbaro e dos militares que dirigiam a Intervenção Federal no Rio, o que somente avançaremos com a força da mobilização.

Junto com o Esquerda Diário, a Casa Marx, o Instituto Casa Marx, as Edições ISKRA estamos impulsionando as jornadas internacionais “Por um futuro comunista”, com vários grupos da Fração Trotskista, reunindo inúmeros intelectuais para debater estes temas nacionais e todos os debates que dizem respeito à necessidade de uma luta intransigente por outro futuro, que seja de enfrentamento direto com essa sociedade capitalista. Vemos uma expressão cabal da barbárie desse sistema com o genocídio palestino pelo Estado de Israel, que avança também contra o Líbano, e por isso defendemos uma saída anti-imperialista e internacionalista, pela unidade da classe trabalhadora e dos povos oprimidos do mundo contra esse massacre. Isso significa, aqui no Brasil, exigir o rompimento imediato das relações com Israel que o governo Lula mantém, mesmo após mais de um ano de massacre televisionado, assim como o rompimento das relações de nossas universidades com empresas e universidades sionistas, enfrentando as perseguições das reitorias, como na USP, contra aqueles que se levantam em defesa da Palestina. E como levanta nossa organização-irmã Left Voice nos Estados Unidos, defendemos uma posição de independência da classe trabalhadora nas eleições da próxima semana no coração do imperialismo. Nem Harris nem Trump: ambos apoiam o genocídio palestino, atacam os imigrantes e a classe trabalhadora estadunidense e do mundo em prol dos grandes capitalistas.

 

¨      Movimentos sociais e partidos de esquerda lançam manifesto contra pressão do mercado sobre Haddad e Tebet por ajuste fiscal

Movimentos sociais, sindicatos e partidos de esquerda, como PT, Psol, PDT e PCdoB, divulgaram, neste domingo, um manifesto crítico às medidas de ajuste fiscal defendidas pelo mercado financeiro e pela mídia, e que podem vir a ser encampadas no todo ou em parte pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad, e pela ministra do Planejamento, Simone Tebet. O documento destaca a ameaça que essas medidas representam para políticas públicas essenciais em saúde, educação e infraestrutura, além de impactos negativos para trabalhadores, aposentados e programas de investimento. Nesta segunda-feira, uma plataforma digital será lançada para coletar adesões individuais.

A íntegra do manifesto, que denuncia as pressões de setores privilegiados da sociedade, segue abaixo:

MERCADO FINANCEIRO E MÍDIA NÃO PODEM DITAR AS REGRAS PARA O PAÍS

Temos acompanhado, com crescente preocupação, notícias e editoriais na mídia que têm o objetivo de constranger o governo federal a cortar “estruturalmente” recursos orçamentários e outras fontes de financiamento de políticas públicas voltadas para a saúde, a educação, os trabalhadores, aposentados e idosos, bem como os programas de investimento na infraestrutura para o crescimento do país.

São pressões inaceitáveis que partem de uma minoria privilegiada por isenções de impostos e desonerações injustas e indecentes; dos que manipulam a fixação das maiores taxas de juros do planeta e que chantageiam o governo e o país, especulando com o dólar e nas bolsas de valores.

No momento em que o governo federal, eleito para reconstruir o país, vem obtendo resultados significativos na recuperação do nível de emprego, do salário e da renda da população, tais avanços são apresentados como pretexto para forçar ainda mais a elevação da taxa básica de juros, quando o país e suas forças produtivas demandam exatamente o contrário: mais crédito e mais investimento para fazer a economia girar.

O poder financeiro, os mercados e seus porta-vozes na mídia agitam o fantasma de uma inexistente crise fiscal, quando o que estamos vivendo é a retomada dos fundamentos econômicos, destruídos pelo governo anterior. Onde estavam esses críticos quando Bolsonaro e Guedes romperam os orçamentos públicos e a credibilidade do Brasil? Onde estavam quando a inflação caminhava para 12%?

Agora querem cortar na carne da maioria do povo, avançando seu facão sobre conquistas históricas como o reajuste real do salário-mínimo e sua vinculação às aposentadorias e ao BPC, o seguro-desemprego, os direitos do trabalhador sobre o FGTS, os pisos constitucionais da Saúde e da Educação.

E nada falam sobre o maior responsável pelo crescimento da dívida pública, que é a taxa de juros abusiva e crescente. Nada falam sobre as desonerações de setores que lucram muito sem gerar empregos, inclusive a mídia; a imoral isenção de impostos sobre lucros e dividendos nem sobre a recusa de taxar grandes fortunas, por parte de uma maioria do Congresso que se apropria de fatias cada vez maiores do Orçamento.

Chega de hipocrisia e de chantagem! Cortar recursos de quem precisa do Estado e dos investimentos públicos só vai levar o país de volta a um passado de exclusão e injustiça que os movimentos sociais e o povo lutam há tempos, todos os dias, para transformar numa sociedade melhor e mais justa.

Assinam:

Frente Brasil Popular, Frente Povo sem Medo, MST, MTST, CUT, INTERSINDICAL, CONTAG, CNTE, CONTEE, CMP, MTC, INESC, MBP, MPA, MNU, MAM, MMM, Sem Direitos, Frente de Evangélicos pelo Estado de Direito, PT, PDT, PSOL, PCdoB, Instituto de Finanças Funcionais para o Desenvolvimento (IFFD), Rede MMT Brasil, Transforma Unicamp, Subverta, Fogo no Pavio, Sindicato dos Servidores De Ciência, Tecnologia, Produção e Inovação em Saúde Pública (ASFOC/SN), Confederação Nacional dos Trabalhadores em Seguridade Social (CNTSS), Federação Nacional das/os Assistentes Sociais, CANDACES, Federação de Sindicatos de Trabalhadores Técnicos Administrativos em Instituições de Ensino Superior Públicas do Brasil (FENAPSI), Federação Nacional dos Psicólogos, Associação Brasileira de Ensino de Ciências Sociais (Abecs), Fineduca, ABGLT, Rua, Juventude Manifesta, Resistência, ANPAE, FNPE, Confederação Sindical Educação dos Países de Língua Portuguesa (CPLP), Associação Rede Unida, Associação Brasileira de Saúde Coletiva - ABRASCO, Associação Brasileira de Economia da Saúde (ABReS), Frente Pela Vida

 

Fonte: Por Diana Assunção, em Esquerda Diário/Brasil 247

 

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