Luís
Nassif: Jango, Lacerda, JK e os Kids Pretos dos anos 70
A
tentativa de golpe militar desvendada pela Polícia Federal tem tudo a ver com o
golpe dentro do golpe que levou ao AI-5 (Ato Institucional número 5), de 13 de
dezembro de 1968.
Na
época, o ditador Costa e Silva tinha tombado com um AVC. O vice-presidente era
Pedro Aleixo. Em vez da sucessão normal, houve um golpe de estado articulado
pelos três comandantes militares, que assumiram o poder e assinaram o AI-5,
fechando o Congresso, suspendendo o habeas corpus para crimes considerados de
motivação política, implantando censura prévia à imprensa, à música, ao teatro
e às manifestações culturais e procedendo a uma perseguição implacável contra
os opositores ao regime.
O
golpe planejado por Braga Neto visava dar o comando a uma Junta Militar, sem a
participação de Jair Bolsonaro, alterar o processo de decisão do Alto Comando
do Exército – que tinha 5 generais contra o golpe – e articular manifestções de
rua em apoio ao novo regime. O comando da junta seria do general Augusto
Heleno, que serviu a Silvio Frota – o general que articulou um golpe com
Ernesto Geisel e foi demitido.
Essa
disputa com Bolsonaro fica nítido no documento do golpe – com embasamento
jurídico de Ives Gandra Martins. Bolsonaro queria que fosse incluído um item
prevendo novas eleições. Mas os militares de Braga Neto preferiam a Junta
Militar no comando.
As
semelhanças não ficam apenas nisso.
As
hipóteses aventadas de assassinato de Lula, Alckmin e Alexandre de Moraes
guardam enormes semelhanças com as mortes de dissidentes no início dos anos 70
– especialmente do ex-presidente João Goulart, de Carlos Lacerda e Juscelino
Kubistcheck, além de Zuzu Angel e do educador Anisio Teixeira.
Jango,
Lacerda e JK articulavam a Frente Ampla, uma frente civil, juntando
ex-adversário políticos, para tentar trazer de volta a democracia.
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As 3 mortes de presidenciáveis
Juscelino
foi morto em 22 de agosto de 1976. Oficialmente, a causa foi um acidente de
carro na Rodovia Presidente Dutra, em Resende (RJ), mas as circunstâncias do
ocorrido levantaram questionamentos, especialmente no contexto político da
época, marcado pela repressão do regime militar (1964-1985).
JK
viajava de carro de São Paulo para o Rio de Janeiro em um Opala dirigido por
seu motorista, Geraldo Ribeiro. O veículo teria colidido com uma carreta após
um pneu furar ou uma ultrapassagem mal-sucedida, resultando na morte imediata
de ambos.
No
entanto, a narrativa oficial foi criticada por falhas na investigação e pela
ausência de testemunhos consistentes. Lea Vidigal, advogada, montou um grupo
formado por estudantes e professores da USP e do Mackenzie para investigar as
circunstâncias da morte.
Um
ponto que ficou mal explicado na reprodução dos fatos antes da morte de
ex-presidente é uma parada que fez, saindo da Dutra, no Hotel-Fazenda
Villa-Forte cujo proprietário era o brigadeiro Newton Junqueira Villa-Forte,
amigo do general Golbery do Couto e Silva e um dos criadores do Serviço
Nacional de Informação (SNI).
Segundo
depoimento do filho de Villa-Forte, Gabriel, que estava presente naquela tarde
de domingo, o hotel estava vazio e o ex-presidente ficou lá por quase duas
horas, depois ele e o motorista voltaram para a estrada e poucos minutos depois
aconteceu o acidente. Um depoimento feito pelo manobrista do hotel, e
registrado na época, destacou que o motorista Geraldo Ribeiro estranhou o carro
assim que pegou para retomarem a viagem. O grupo de trabalho encontrou, ainda,
registros de um jornalista que esteve no local do acidente e viu as provas do
crime serem alteradas de madrugada pela perícia.
A
colisão com o ônibus também não teria acontecido. “Tem fotografias revelando que a traseira
esquerda do opala, onde a perícia disse que teria sido o ponto de colisão entre
o carro e o opala estava na íntegra no momento seguinte da colisão, mas, no dia
seguinte, a polícia fabricou outras fotos com a traseira esquerda avariada. Ou
seja, a avaria do opala que serviu de causa, digamos, do acidente, foi
produzida depois do acidente, em algum momento posterior”. Lea afirmou que existem cálculos matemáticos
feitos para reproduzir o acidente na época demonstrando que as provas oficiais
produzidas para fechar o caso foram “primitivas” e que claramente “adulteram o
local do acidente”.
A
morte de João Goulart (Jango) foi em 6 de dezembro de 1976, na cidade de
Mercedes, na Argentina, 4 meses apóas a morte de JK. Na época, estava em plena
atividade a Operação Condor, juntando a repressão de vários países
latino-americanos, particularmente as do Chile, Brasil e Argentina.
Oficialmente,
a causa da morte foi registrada como um ataque cardíaco, mas as suspeitas foram
de envenenamento através de remédios – uma das táticas expostas nas
articulações para assassinar Lula.
Em
2008, o ex-agente uruguaio Mario Neira Barreiro afirmou que o ex-presidente foi
morto por pílulas adulteradas com veneno, substituídas entre os seus
medicamentos regulares. Barreiro alegou que a operação foi planejada por
militares brasileiros com apoio de outros regimes.
Cinco
meses depois foi a morte de Lacerda, em 21 de maio de 1977, aos 63 anos.
Oficialmente a causa de sua morte foi atribuída a um ataque cardíaco, mas houve
inúmeras dúvidas sobre as causas reais.
Relatos
sobre a autópsia de Lacerda e a investigação oficial reforçaram as especulações
de que poderia haver algo além de causas naturais.
Embora
nunca tenham surgido provas conclusivas que confirmem assassinato ou
conspiração, a morte de Carlos Lacerda continua a ser objeto de debate entre
historiadores e analistas políticos.
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O caso Zuzu Angel
No
mesmo período, em 14 de abril de 1976, houve a morte de Zuzu Angel, estilista e
ativista brasileira. Ela faleceu em um acidente de carro na Estrada da Gávea,
no Rio de Janeiro, mas há amplas evidências de que sua morte foi resultado de
um atentado orquestrado pelos órgãos de repressão da ditadura militar no
Brasil.
Zuzu
tinha contatos com parlamentares norte-americanos, especialmente por meio de
sua ligação com a família de Stuart, cujo pai, Norman Angel Jones, era cidadão
norte-americano. Esse vínculo deu a Zuzu acesso a instituições políticas nos
Estados Unidos, onde ela fez denúncias formais contra a repressão no Brasil.
Zuzu
trabalhou com organizações como a Amnesty International e outras entidades que
documentavam crimes políticos durante a ditadura. Essas instituições ajudaram a
dar visibilidade ao caso de Stuart Angel como parte de uma campanha mais ampla
contra desaparecimentos forçados na América Latina.
Usando
sua posição como estilista de renome, Zuzu também envolveu artistas,
jornalistas e outras figuras da alta sociedade no exterior para amplificar sua
causa. Em um de seus desfiles em Nova York, ela utilizou roupas com estampas de
pássaros enjaulados e outros símbolos de repressão, chamando atenção para a
situação no Brasil.
Zuzu
Angel vinha sofrendo ameaças por sua atuação contra o regime. Na madrugada de
14 de abril de 1976, ela perdeu o controle de seu carro, um Karmann Ghia, e
colidiu com um muro em um trecho perigoso da estrada. Relatórios posteriores
indicam que o carro foi provavelmente sabotado.
Entre
as evidências de que não foi um simples acidente:
• Zuzu havia
relatado a amigos e familiares que, caso algo lhe acontecesse, seria
responsabilidade da ditadura.
• Investigadores
independentes e, anos mais tarde, a Comissão Nacional da Verdade (2011-2014)
concluíram que sua morte foi um atentado.
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Os órgãos de repressão
O
regime militar estruturou uma vasta rede de repressão política para combater
opositores, incluindo intelectuais, políticos e ativistas.
Órgãos
principais envolvidos:
•
DOI-CODI (Destacamento de Operações de Informações – Centro de Operações de
Defesa Interna): Centros de repressão, tortura e execução de presos políticos.
•
SNI (Serviço Nacional de Informações): Principal órgão de inteligência, que
monitorava cidadãos considerados subversivos, incluindo políticos e
intelectuais.
•
CENIMAR (Centro de Informações da Marinha): Atuava na vigilância e repressão de
opositores.
•
CISA (Centro de Informações de Segurança da Aeronáutica): Envolvido em casos de
tortura e desaparecimento de presos políticos.
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Métodos utilizados pelo regime:
1. •
Assassinatos forjados como suicídios ou acidentes (e.g., Vladimir Herzog, Zuzu
Angel, Anísio Teixeira).
•
Desaparecimento forçado de opositores (e.g., Rubens Paiva, Stuart Angel).
•
Execuções sumárias de guerrilheiros ou dissidentes políticos (e.g., Carlos
Lamarca, Marighella).
2.
Operação Condor
A
Operação Condor foi uma aliança entre regimes militares da América do Sul
(Brasil, Chile, Argentina, Uruguai, Paraguai e Bolívia) para coordenar a
repressão contra opositores políticos em nível internacional.
• A
operação permitia que os regimes trocassem informações, prendessem e até
eliminassem exilados políticos.
•
Políticos como João Goulart (Jango) e Juscelino Kubitschek (JK), mortos em
circunstâncias suspeitas, são apontados como possíveis vítimas de ações
coordenadas no âmbito da Operação Condor.
3.
Grupos paramilitares e milícias clandestinas
1.
Além
das forças oficiais, havia grupos clandestinos e paramilitares que atuavam em
nome ou com a anuência do regime:
•
Esquadrões da Morte: Grupos organizados por agentes de segurança, conhecidos
por execuções sumárias. Lideranças como o delegado Sérgio Paranhos Fleury
estavam entre os envolvidos.
•
Esses grupos frequentemente eliminavam opositores do regime ou pessoas vistas
como “ameaças à ordem”.
1. Contexto
geopolítico e apoio internacional
O
regime militar brasileiro contava com apoio direto e indireto dos Estados
Unidos, no contexto da Guerra Fria.
•
Escola das Américas: Instituição dos EUA que treinou militares
latino-americanos em técnicas de contrainsurgência, incluindo tortura e
repressão. Muitos agentes brasileiros foram treinados lá.
• O
governo norte-americano via os intelectuais e políticos de esquerda como uma
ameaça comunista, fornecendo suporte aos regimes militares para neutralizar
essas figuras.
• De dom Pedro
2° a Bolsonaro, atentados políticos no Brasil
Ao
longo da história, o Brasil foi palco de diversos atentados políticos. Esses
ataques buscavam derrubar regimes, governantes ou conseguir apoio para a
manutenção da ditadura. A DW listou alguns dos episódios mais marcantes dessa
história.
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Pelo fim da monarquia
O
episódio ficou conhecido como Atentado de Julho e repercutiu tanto na imprensa
local quanto na europeia. Em 15 de julho de 1889, o imperador brasileiro dom
Pedro 2° (1825-1891) saía do concerto da violinista italiana Giulietta Dionesi
(1878-1911) no Teatro Sant'Anna, hoje Teatro Carlos Gomes, no centro do Rio. Um
homem estava à sua espera.
Bem-vestido,
ele gritava pedindo o fim da monarquia e a instituição do regime republicano.
Até aí, tudo poderia estar dentro da normalidade, já que a pressão era grande
para a derrubada do antigo regime naquele momento. Porém, o homem sacou um
revólver e disparou contra a carruagem do imperador.
Ninguém
foi atingido. O atirador fugiu mas, horas depois, acabou capturado e
reconhecido — estava em um bar, embriagado, e se vangloriava para a freguesia
que, não só tinha atirado contra o imperador, como estava disposto a fazer
novamente, acertando melhor a mira.
Identificado
como Adriano Augusto do Valle, um imigrante português desempregado de 20 anos
de idade, sem ligação com o movimento republicano, o atirador acabou sendo
liberado. O próprio imperador decidiu que era melhor deixar para lá para evitar
uma repercussão ainda maior no caso que, em sua leitura, precipitaria novos
atentados.
Alguns
meses depois, mais um político do alto escalão estaria no alvo. Pouco após a
Proclamação da República, em 15 de novembro de 1889, um atirador desconhecido
disparou contra José da Costa Azevedo (1825-1904), o Barão de Ladário. No
Segundo Império, ele ocupava o posto de ministro da Marinha e o ataque foi
atribuído a algum republicano radical. Azevedo se feriu, mas escapou com vida.
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Da República Velha ao Estado Novo
Em
5 de novembro de 1897, o presidente Prudente de Morais (1841-1902) foi a um
evento para recepcionar as forças militares vitoriosas da Revolta de Canudos,
ocorrida na Bahia. Jovem praça, do 10º Batalhão da Infantaria, Marcelino Bispo
de Melo (1875-1898) apontou uma garrucha em sua direção. Mas não conseguiu
dispará-la.
O
ministro da Guerra, marechal Carlos Machado de Bittencourt (1840-1897), e o
chefe da casa militar, coronel Luiz Mendes de Moraes (1850-1914), buscaram
conter o revoltoso. Com uma faca, ele feriu o coronel e matou o marechal.
Com
a popularidade em baixa, o governador da Bahia José Marcelino de Sousa foi
ferido levemente por uma arma de fogo em 1906, quando estava a bordo do vapor
Mauricio Wanderley, retornando de Nazaré a Salvador. O caso nunca foi
completamente apurado. O senador José de Aquino Tanajura (1831-1918) era
apontando como mandante, algo que ele sempre negou.
O
Atentado da Rua Tonelero foi a tentativa de assassinato do jornalista e
político Carlos Lacerda (1914-1977), na madrugada de 5 de agosto de 1954, no
Rio. O episódio é apontado como o ponto alto da crise política que levaria ao
suicídio do presidente Getúlio Vargas (1882-1954) 19 dias mais tarde.
O
pistoleiro foi o mestre de obras Alcino João do Nascimento (1922-2014). Ele não
conseguiu matar Lacerda — mas deixou o jornalista ferido. O major-aviador
Rubens Florentino Vaz (1922-1954), que fazia a segurança de Lacerda, foi
alvejado no peito e morreu. Um guarda municipal também foi ferido.
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Ditadura
O
Atentado ao Aeroporto dos Guararapes, no Recife, foi uma ação provavelmente
orquestrada pela Ação Popular (AP), organização de esquerda que lutou contra a
ditadura no Brasil — embora alguns acreditem que tenha sido feita por um grupo
isolado de dentro da AP. A ideia era matar o marechal Artur da Costa e Silva
(1899-1969), ministro do Exército e apontado como o nome para a sucessão
presidencial do regime.
No
dia 25 de julho de 1966, era prevista a chegada de Costa e Silva ao Recife —
mas de última hora ele fez o trajeto, de João Pessoa até lá, por terra, e não
por avião. Uma bomba explodiu no saguão do aeroporto logo depois do desembarque
do voo onde estaria Costa e Silva. Catorze pessoas ficaram feridas e duas
morreram: o jornalista e secretário de governo de Pernambuco Edson Régis de
Carvalho (1923-1966) e o almirante reformado Nelson Gomes Fernandes (?-1966).
O
caso do Riocentro, ocorrido na noite de 30 de abril de 1981, foi um ataque
terrorista planejado por setores do próprio Exército Brasileiro com o objetivo
de incriminar grupos de esquerda. Cerca de 20 mil pessoas estavam no Centro de
Convenções Riocentro para o show em comemoração ao Dia do Trabalhador.
A
série de explosões causaria uma tragédia. Mas uma execução desastrada
desmantelou a operação. Uma das bombas explodiu longe do alvo, outra detonou
antes da hora — danificando os demais explosivos. Por fim, as vítimas foram
dois dos próprios militares terroristas. O sargento Guilherme Pereira do
Rosário morreu na hora. O capitão Wilson Dias Machado ficou gravemente ferido.
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Marielle e Bolsonaro
O
ano de 2018 ficou marcado por dois atentados políticos no Brasil. O primeiro
deles matou a tiros a então vereadora carioca Marielle Franco (1979-2018) e o
seu motorista, Anderson Gomes, em 14 de março daquele ano, no Rio.
O
caso gerou ampla comoção nacional e repercussão em todo o mundo. Depois de um
longo processo de investigação, no dia 24 de março de 2024, foram presos como
mandantes do atentado os irmãos empresários e políticos Domingos Brazão e
Chiquinho Brazão, além do delegado Rivaldo Barbosa.
No
dia 6 de setembro de 2018, quando o então candidato à presidência Jair
Bolsonaro fazia campanha em Juiz de Fora, ele levou uma facada na barriga. O
ferimento foi grave. Bolsonaro precisou ser submetido a quatro cirurgias.
O
autor do ataque, o servente de pedreiro Adélio Bispo de Oliveira, foi preso em
flagrante. Bolsonaro seria eleito presidente da República menos de dois meses
depois.
Fonte:
Jornal GGN/DW Brasil
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