terça-feira, 26 de novembro de 2024

'Brasil não tem interesses claros, apesar de ter retórica', diz Rubens Barbosa sobre pauta ambiental

Antes mesmo de assumir o mandato, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva buscou meios de se posicionar como uma liderança na pauta ambiental. Em novembro de 2022, foi à Conferência do Clima da ONU (COP-27), em Sharm el-Sheik, no Egito, e discursou em defesa do meio ambiente após sair vitorioso nas eleições. Dois anos depois, o presidente brasileiro não foi à COP-29, em Baku, e o País está sendo representado pelo vice-presidente Geraldo Alckmin.

Ex-embaixador do Brasil nos Estados Unidos e presidente do Instituto de Relações Internacionais e Comércio Exterior (Irice), Rubens Barbosa considera que, apesar da postura ativa na área, o Brasil ainda não é um líder global na pauta ambiental. Segundo ele, falta ao País clareza nas políticas para a área. Barbosa cita que o País evita temas importantes.

"A gente está evitando uma série de políticas. Não regulamenta o mercado de carbono, a transição energética está muito dúbia. E a coisa mais flagrante é a irritação de que a gente não tenha ainda quem vai coordenar a COP-30 (em Belém, no Pará)", diz.

Em agosto, o governo lançou a Política Nacional de Transição Energética (PNTE). A expectativa é de captar até R$ 2 trilhões em investimentos em dez anos. Na ocasião, o ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, afirmou que há previsão de R$ 700 bilhões no Novo PAC (Programa de Aceleração do Crescimento) para investimento na área. Apesar disso, o presidente fala recorrentemente sobre a decisão de explorar novas frentes de petróleo. Em entrevistas, já chegou a admitir que sua postura é contraditória, mas que, enquanto a transição energética não resolve o problema, o País precisa ganhar dinheiro com o combustível fóssil.

LEIA A ENTREVISTA:

•                                    Como o senhor avalia a posição do Brasil em termos globais em relação à pauta ambiental?

O Brasil raramente está no centro dos acontecimentos. Agora nós estamos no centro dos acontecimentos na questão do meio ambiente, da mudança do clima, na questão da transição energética, e na questão da segurança alimentar, que tem a ver com o clima também. O Brasil tem uma posição hoje de poder assumir esse debate. Acho que a posição do Brasil é muito forte, é a prioridade. O presidente declarou isso quando assumiu que a mudança do clima, a transição energética, a segurança alimentar, eram prioridades do governo. Eu vejo o Brasil como uma função muito ativa. Agora, a reunião do G20 e a reunião da COP-30 ano que vem mostram a importância que esses temas têm para a política econômica e a política externa do Brasil.

•                                    É possível afirmar que o Brasil é o grande líder do Sul Global nesta pauta?

Eu não disse que o Brasil era um líder global, falei que esses temas eram prioritários para o Brasil. O Brasil deveria ser (líder), mas nós não somos, porque não temos políticas efetivas nessas áreas. A Europa tem uma posição muito mais ativa do que o Brasil, por exemplo, em relação ao meio ambiente. Todos os países europeus têm uma posição de líderes realmente.

Agora, no Brasil, acho que falta definir prioridades dentro dessas áreas. Você tem problemas políticos, de organização interna, aqui no Brasil, e uma falha na (percepção da) necessidade de o Brasil assumir a liderança, porque esses temas são muito importantes por causa da Amazônia, da produção agrícola, da matriz limpa. O País teria uma posição importante, se tivesse uma visão clara dos objetivos e dos interesses que tem nessas áreas. O Brasil não tem interesses muito claros, apesar de ter retórica.

A gente não tem objetivos claros para defesa dos interesses brasileiros. A gente está evitando uma série de políticas. Não regulamenta o mercado de carbono, a transição energética está muito dúbia. E a coisa mais flagrante é a irritação de que a gente não tem ainda quem vai coordenar a COP-30. Estamos quase no fim do ano e não tem ninguém para assumir esse lugar. Há uma hesitação do governo nessas três áreas que impede que o Brasil efetivamente ocupe uma posição de liderança no mundo.

•                                    O senhor mencionou a falta de indicação da presidência da COP-30. Como essa lacuna pode influenciar as discussões na COP-29?

Devia ter nomeado já. A COP-29, no Azerbaijão, vai discutir a questão do financiamento. Se não resolver lá, esse assunto vai ser transferido aqui para o Brasil e vai ser o mote. Em Cali (na COP da Biodiversidade), a questão do financiamento também não foi resolvida. A ausência de uma autoridade brasileira para ser responsável pela coordenação disso tudo enfraquece a posição do Brasil. O presidente não foi em Cali, não vai no Azerbaijão, são problemas que influem na percepção externa sobre a posição do Brasil.

•                                    O governo tem um discurso dúbio em relação ao petróleo. Isso prejudica nas negociações climáticas?

Acho que não prejudica em nada. O Brasil deveria defender seu interesse nisso. A França tem uma posição muito forte no meio ambiente e ela está explorando o petróleo nessa região. Os americanos com a Shell, os ingleses estão explorando na Guiana. A Noruega explora petróleo lá no Mar do Norte. Há um discurso e há uma prática. A prática é diferente da retórica no mundo inteiro. Não adianta o Brasil querer tomar uma posição muito dura em tudo sem ver qual é o nosso interesse. Tem de ser feita uma análise do interesse brasileiro, balanceando o interesse da preservação do meio ambiente, da redução das emissões, e a questão dos combustíveis fósseis. A gente tem de ser realista. Não adianta defender uma posição abstrata quando o mundo inteiro está em outra. A Noruega explora o petróleo, faz um fundo e apoia soluções de meio ambiente. Aqui a gente pode fazer a mesma coisa.

•                                    Como a vitória de Donald Trump para a presidência dos Estados Unidos pode impactar nas negociações climáticas?

Vai ser muito complicada essa parte de mudança do clima, meio ambiente, transição energética. Essa discussão vai perder prioridade nos Estados Unidos. O Trump é a favor da exploração de petróleo, do gás. Já no primeiro mandato não deu importância (à questão ambiental), saiu do Acordo de Paris. Isso pode se refletir até na reunião do ano que vem aqui no Brasil, mas está um pouco cedo para fazer prognósticos.

•                                    O Brasil negocia em bloco na COP, muitas vezes com países como China e Índia. Como garantir os interesses desses grupos e ao mesmo tempo ter uma postura em defesa do meio ambiente?

O Brasil tem de defender seus interesses independentemente desses blocos e desses países. Todo mundo hoje defende o seu próprio interesse. Esse tema não entra muito nos BRICs (Bloco economias emergentes, como Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul) até porque a China é o maior poluidor e o Brasil, por causa das queimadas na Amazônia, está sendo um grande emissor também.

•                                    A questão das queimadas pode fragilizar o Brasil nas discussões da COP-29?

Não, mas o Brasil vai ser criticado por isso. As queimadas não só no bioma amazônico, mas no Pantanal, foram algo muito ruim para o Brasil às vésperas da COP.

•                                    Isso pode dificultar a obtenção de financiamento?

Acho que não. Acho que a gente tem de insistir nisso. É uma pauta que está lá e, se não resolver no Azerbaijão, o risco que a gente corre é que a COP do Brasil seja limitada a esse programa: Amazônia e financiamento, que não é a agenda da COP. O Brasil tem uma agenda muito maior.

 

•                                    O paradoxo climático do Brasil. Por Carlos Bocuhy

O Brasil está apresentando contradições na governança climática, que refletem situações paradoxais. A indefinição e os conflitos no sistema econômico, bem como seus reflexos governamentais, contrastam fortemente com o anúncio das metas climáticas do país.

O governo brasileiro acaba de anunciar a redução das emissões de gases de efeito estufa (GEE) até 2035, prevendo um índice de incerteza superior a 10%. Segundo os governantes, as emissões cairão entre 59% e 67% até 2035, com base em 2005.

Além da alta incerteza numérica, as metas anunciadas são insuficientes, abaixo das recomendadas pelo Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC) das Nações Unidas e pelo primeiro Balanço Global do Acordo de Paris, que recomendam cortes de 60% até 2035 em relação às emissões de 2019.

Se o cálculo brasileiro tomasse como ano base 2019, a redução atualmente proposta equivaleria de 39% a 50%, portanto a ideia atual do Brasil está consideravelmente abaixo dos valores preconizados pelo IPCC.

Mas a indefinição brasileira é infinitamente maior. Primeiro, porque os planos de investimento federais em combustíveis fósseis, até 2027, atingem a alta cifra de R$18,31 bilhões destinados à exploração de petróleo e gás, segundo informa a Agência Nacional do Petróleo (ANP), ultrapassando em cerca de 15% o investimento previsto para energia limpa.

O Projeto de Lei Orçamentária Anual de 2025 prevê uma redução de 18% nos recursos destinados à transição energética, de acordo com análise realizada pelo Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc). O montante, que era de R$ 4,44 bilhões em 2024, caiu para R$3,64 bilhões no próximo ano.

Os pronunciamentos do Ministério de Minas e Energia têm sinalizado a ambição de tornar o Brasil um dos maiores produtores de petróleo do mundo com a exploração das reservas do pré-sal. O convite para participar como observador da Organização dos Países Produtores de Petróleo (Opep) foi comemorado dentro de setores menos progressistas do governo.

Recentemente, Alexander Silveira, o ministro de Minas e Energia declarou: “A exploração de novos recursos em óleo e gás pode gerar um capital de cerca de R$5 trilhões entre 2031 e 2050. Mas, se interrompermos os investimentos em exploração e produção, poderemos perder até R$4 trilhões em arrecadação nesse horizonte. E não dá para excluir os recursos do petróleo da equação que financia a transição energética”. Silveira defende uso dos recursos do petróleo para reduzir a conta de energia — Ministério de Minas e Energia

Financiar a transição energética com o uso de petróleo é uma contradição simplesmente inaceitável. Para complicar as coisas, o Ministério da Agricultura e Pecuária afirma que o setor agrícola do Brasil deve crescer 15,5% nos próximos 10 anos. A pecuária, uma das maiores responsáveis por GEE no cômputo das emissões brasileiras, cresceu 29,2% no último ano, com o rebanho bovino somando 46,4 milhões de cabeças. 

A agropecuária responde por cerca de 12% das emissões de GEE no planeta. No Brasil, do total de emissões, aproximadamente 28% têm origem nas atividades de agricultura e pecuária. “O metano é o principal gás emitido pelos bovinos durante a digestão via eructação, ou seja, o arroto. Pecuária carbono zero: produção à base de pastagens é a raiz da solução – Epagri

Na última semana, o governo anunciou a habilitação de mais 19 frigoríficos para exportação de carne para a África do Sul, sendo oito para carne bovina. Brasil habilita 19 novos frigoríficos para exportação de carnes à África do Sul

As recentes declarações dos setores de petróleo e pecuária, por si só, implodem os planos de redução de emissões brasileiras que, só para lembrar, não incluem em seu cálculo as emissões das queimadas, chamadas “naturais”, que, em 2023 e 2024, devastaram o Brasil.

As emissões por desmatamento na floresta amazônica caíram 37%, de 1,074 bilhão de toneladas de gás carbônico equivalente para 687 milhões de toneladas. Por outro lado, os dados do Sistema de Estimativas de Emissões de Gases de Efeito Estufa (SEEG) do Observatório do Clima mostram que, apesar da desaceleração na Amazônia, a devastação dos demais biomas resultou na emissão de 1,04 GtCO2e brutas em 2023.

O levantamento aponta que as emissões por desmatamento e queima de biomassa em 2023 aumentaram 23% no Cerrado, 11% na Caatinga, 4% na Mata Atlântica e 86% no Pantanal. No Pampa, essas emissões caíram 15%, mas o bioma responde por apenas 1% do total. O Brasil reduziu em 12% emissões de gases do efeito estufa em 2023.

Percebe-se, no âmbito do governo, discursos antagônicos.  Não há plano de descarbonização que de fato venha a intervir na realidade. A redução não está presente nas intenções declaradas pelos setores mais estratégicos para a redução de emissões, especialmente na área do agronegócio, o maior responsável por alterações negativas no uso do solo e nas emissões de sua atividade, como a pecuária. 

O que se vê é literalmente business as usual, os negócios como sempre foram, e de outro lado, a posição formal brasileira com promessas de redução de emissões que não se fundamentam em uma realidade multissetorial.

A lição de casa dos brasileiros para superar os desafios climáticos é conhecida: em primeiro lugar, eliminar imediatamente o desmatamento na Amazônia e nos demais biomas, com fiscalização implacável, o que não vem ocorrendo. Deve-se estimular e contar imediatamente com o apoio do Judiciário na reparação dos danos ambientais, além de promover os necessários projetos de recuperação de áreas degradadas.

O governo deve também sair da ‘ladainha’ de comparar o índice do desmatamento atual com o de anos atrás, quando a situação climática e do ponto de não retorno da Amazônia era diferente. Faz-se necessário considerar a mais valia ecológica dos bens ambientais remanescentes.

O Brasil ainda deve demonstrar capacidade para acelerar as transformações fiscais e alavancar as políticas públicas, apoiando tecnologias amigáveis. Mas, sem sinalizar com a devida materialidade econômica que sua prioridade é a transição ecológica, não conseguirá atrair cooperação e investimentos internacionais – nem movimentar adequadamente a capacidade interna de investimento.

O governo federal do Brasil precisa realinhar sua economia na direção da sustentabilidade. É necessário coordenar e alinhar as ações de suas pastas e setores para sair do pântano das contradições, cumprindo sua promessa de gestão ambiental interministerial, se quiser sinalizar que, de fato, irá protagonizar no cenário climático o que seu DNA de florestas e biodiversidade exige. Se não enfrentar de frente seus desafios, as promessas serão apenas promessas.

 

•                                    A humanidade renega a crise climática e ultrapassa um novo limite de emissões em 2024

Um jarro de água fria em plena Cúpula do Clima, ou melhor, abrasadora. A organização independente Global Carbon Project (GCP), especializada em quantificar as emissões de gases de efeito estufa provenientes da queima de combustíveis fósseis, divulgou sua mais recente pesquisa. A edição de 2024 do Global Carbon Budget projeta, a um mês e meio do fim do ano, emissões totais anuais provenientes de combustíveis fósseis de 37,4 bilhões de toneladas de dióxido de carbono (CO₂). Trata-se de um aumento de 0,8% em relação a 2023 — com uma margem de erro possível que vai de encerrar o ano com uma redução de 0,3% até um aumento de 1,9% —, o que representa um novo recorde inédito no pior momento possível.

No ano limite em que, segundo o Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC), a humanidade deveria alcançar o pico de emissões para ter alguma chance de não ultrapassar um aquecimento médio global de 1,5°C, não só se atingiu um novo recorde histórico, como também “não há nenhum sinal” de que o mundo tenha alcançado o pico de emissões provenientes da indústria fóssil, alerta a equipe responsável pela pesquisa apresentada nesta quarta-feira. Conforme lamenta o professor Pierre Friedlingstein, do Instituto de Sistemas Globais de Exeter, coordenador do estudo, “ainda não vemos sinais de que a queima de combustíveis fósseis tenha atingido seu ponto máximo”.

Os números são, na verdade, ainda mais preocupantes, pois as emissões resultantes das chamadas “mudanças no uso da terra” — que incluem o desmatamento causado por humanos e pela agroindústria — representam 4,2 bilhões de toneladas adicionais de CO₂ (GtCO₂). Isso significa que emitiremos para a atmosfera 41,6 bilhões de toneladas de CO₂, um bilhão a mais que no ano passado, período que já havia sido recorde.

Mais carvão, mais petróleo e mais gás em plena aceleração da crise climática Apesar dos amplos avanços na descarbonização, as emissões dos três principais combustíveis fósseis aumentarão em 2024. A projeção do GCP é de que as emissões de carvão cresçam 0,2%, sendo este combustível responsável por 41% das emissões atribuídas aos combustíveis fósseis; as de petróleo aumentem 0,9%, sendo sua queima responsável por 32% das emissões; e as de gás subam 2,4%, com 21% das emissões fósseis totais atribuíveis a este combustível.

Por outro lado, as emissões da indústria de cimento, que representam 4% das globais, deverão cair 2,8% em 2024, principalmente devido à redução na União Europeia, embora devam aumentar na China, nos Estados Unidos e na Índia, segundo a pesquisa.

Por blocos econômicos, embora a UE — responsável por 7% das emissões globais — reduza suas emissões em 3,8% este ano, os Estados Unidos, com 13% do total anual, reduzirão apenas 0,6%. A China, principal potência poluente com 32% das emissões globais anuais, deve aumentar suas emissões em 0,2%, embora a projeção permita um cenário de redução residual. Outro grande emissor, a Índia, onde se gera 8% dos gases de efeito estufa, deve aumentar essas emissões em 4,6% em 2024. No restante do mundo, que representa 38% das emissões globais, a previsão é de aumento de 1,1%.

O GCP destaca a crescente importância da aviação e do transporte marítimo no inventário de emissões: espera-se que suas emissões aumentem 7,8%, embora ainda estejam abaixo dos níveis de 2019.

<><> Uma concentração de gases inédita na história humana

O relatório, elaborado por pesquisadores de mais de 80 instituições ao redor do mundo, incluindo as universidades de Exeter e East Anglia (Reino Unido), a Ludwig-Maximilian de Munique (Alemanha) e o Centro CICERO para Pesquisa Climática Internacional (Noruega), faz um balanço das emissões dos últimos dez anos. Embora se observe certa estabilidade na última década em relação ao total de gases de efeito estufa lançados na atmosfera, a realidade é que eles continuam a aumentar, e a década anterior (2004-13) foi marcada por um forte crescimento das emissões, com cerca de 2% de aumento anual. Esses números fazem com que o nível de concentração de CO₂ na atmosfera continue a crescer.

Há apenas duas semanas, a Organização Meteorológica Mundial (OMM) alertou para o novo recorde de concentração de gases de efeito estufa no ano passado: uma média anual de 420 partes por milhão (ppm) no caso do CO₂. A isso se somam concentrações de superfície de 1.935 partes por bilhão (ppb) de Metano (CH₄) e 336,9 ppb de óxido nitroso (N₂O). Esses são aumentos de 151%, 265% e 125%, respectivamente, em relação aos níveis pré-industriais.

“Durante 2023, as emissões de CO₂ causadas por enormes incêndios florestais e uma possível redução na absorção de carbono pelas florestas, combinadas com emissões permanentemente elevadas de CO₂ devido à queima de combustíveis fósseis para sustentar atividades humanas e industriais, impulsionaram o aumento observado nas concentrações”, apontava o Boletim Anual da OMM sobre Gases de Efeito Estufa. Jamais na história da humanidade a atmosfera esteve tão carregada desse tipo de gases, emitidos ainda com especial rapidez: em vinte anos, as concentrações de CO₂ aumentaram 11,4%. E prevê-se que os níveis de CO₂ atmosférico alcancem 422,5 partes por milhão em 2024, 2,8 ppm a mais que em 2023 e 52% acima dos níveis pré-industriais.

<><> Copo meio cheio

Apesar dos números desanimadores, o GCP vê espaço para esperança. “Apesar de mais um aumento nas emissões globais este ano, os dados mais recentes mostram evidências de uma ação climática generalizada, com a crescente penetração de energias renováveis e carros elétricos substituindo os combustíveis fósseis e a redução das emissões de desmatamento nas últimas décadas, confirmada pela primeira vez”, destaca Corinne Le Quéré, professora de pesquisa da Royal Society na Escola de Ciências Ambientais da Universidade de East Anglia.

Na mesma linha, o doutor Glen Peters, do Centro CICERO de Oslo, aponta que “há muitos sinais de progresso positivo a nível de país, e uma sensação de que o pico nas emissões globais de CO₂ fóssil é iminente”. Um total de 22 países, com uma contribuição conjunta de 23% das emissões globais de CO₂ fóssil, reduziram suas emissões na década de 2014-2023. Além disso, os países integrantes da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), no grupo dos mais ricos, aumentaram suas taxas de redução de emissões na última década, passando de 0,9% para 1,4% em comparação com a década anterior. No grupo dos países não pertencentes à OCDE (excluindo a China), os aumentos de emissões passaram de 4,9% na década 2004-2013 para 1,8% na de 2014-2023.

No entanto, Peters adverte que “o pico global ainda é esquivo” e destaca que “a ação climática é um problema coletivo, e embora estejam ocorrendo reduções graduais de emissões em alguns países, os aumentos continuam em outros”.

Outra das notas positivas é que, a nível mundial, as emissões derivadas da mudança no uso da terra diminuíram 20% na última década, embora se preveja que aumentem em 2024 neste aspecto. Embora a remoção permanente de CO2 por meio da reflorestação e da florestação (novas florestas) esteja compensando emissões, ela está fazendo isso apenas para cerca de metade das emissões da desflorestamento permanente.

Além disso, o GCP envia uma mensagem direta aos defensores do tecno-otimismo: "Os níveis atuais de remoção de dióxido de carbono baseados em tecnologia (excluindo os métodos baseados na natureza, como a reflorestação) representam apenas cerca de uma milionésima parte do CO2 emitido pelos combustíveis fósseis", enfatizam.

 

Fonte: Agencia Estado/Le Monde/El Salto

 

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