Sob o olhar do
chavismo, a Venezuela segue vencendo
Observar, escutar e
analisar. Compreender a Venezuela demanda todos nossos sentidos. Devemos
também, realizar uma análise fundamentada no histórico de lutas sociais e
populares que moldaram seu processo político. Sob o olhar do chavismo a vitória
e posse do presidente Maduro, sustentada pelo poder popular, escancara o limite
da compreensão das lutas populares na América Latina a partir da crise do
conceito ideológico da democracia liberal.
No Brasil, o
primeiro debate que deve ser superado é o da interferência internacional na
realidade política e institucional da democracia venezuelana. Um discurso
perigoso em um mundo colapsado por uma crise de segurança internacional,
guerras e uma transição hegemônica. As forças progressistas latino-americanas
devem se posicionar contra políticas de ingerência internacional e isso está
longe de ser um conceito do socialismo do século XXI, e sim de acordo com os
princípios do direito internacional, no qual é essencial reafirmar o respeito à
soberania dos Estados, previsto na Carta das Nações Unidas, e o princípio da
não intervenção como um pilar fundamental das relações internacionais
contemporâneas.
Diversos políticos,
presidentes e ex-presidentes de direita, como Álvaro Uribe e Iván Duque,
reinvindicaram nos últimos dias a defesa da intervenção. A escalada dessas
desestabilizações internacionais colocam em vulnerabilidade a soberania de todo
o continente. A Venezuela não pode ser transformada em um terreno de disputa
geopolítica ou em um novo conflito internacional, sob o pretexto de
“restauração democrática” ou “defesa de direitos humanos”. A transição
hegemônica atual intensifica as disputas entre potências globais, e muitas
vezes instrumentaliza países periféricos para projetar poder e influenciar
dinâmicas regionais. Dessa forma a Venezuela, enquanto Estado soberano, deve
ser defendida contra políticas de ingerência que comprometem sua estabilidade
política, social e econômica.
Outro princípio
importante a ser reivindicado é o da autodeterminação dos povos — um princípio
do Direito Internacional — que busca assegurar a independência, a liberdade e o
direito de organização própria dos povos. Dessa forma, os processos domésticos
devem ser respeitados. A democracia venezuelana não pode ser analisada a partir
dos conceitos liberais, pois a Venezuela possui o direito à autodeterminação e
à soberania de seus processos e instituições. Trata-se de um modelo democrático
não liberal, socialista, sustentado por sua constituição e por inúmeros
processos consultivos, comunais, comunicativos e de politização.
A democracia
venezuelana, com todas as suas contradições e desafios, segue vitoriosa. A
fórmula de sucesso está no poder protagonista do povo enraizado e fortalecido
por relações populares internas, legitimadas pela constituição de 1999 do Hugo
Chávez e estruturada pela organização do poder comunal. O protagonismo do povo
venezuelano é constituído pela politização e organização em torno das comunas,
esse é o poder popular venezuelano.
As comunas, como
expressão concreta de poder popular, avançam na democratização da participação
popular e mais recentemente do orçamento, tendo acesso aos recursos dando força
a uma alternativa econômica baseada na auto suficiência e na cooperação. Essa
organização popular é fundamental para superar o “capitalismo dependente” e
criar uma base material e social para o socialismo.
A comunicação e a
política popular são outras ferramentas sociais centrais para enfrentar os
desafios impostos pelo bloqueio midiático e pelas tentativas de isolamento
internacional da Venezuela. É impressionante transitar entre dois universos: no
cenário internacional, o presidente Maduro é retratado como um pária e
antidemocrático, mas, ao pisar em solo venezuelano, no contexto político
doméstico, ele é um líder popular com grande capacidade de comunicação e
mobilização do povo venezuelano.
Devemos lembrar que
a transição ao socialismo em sociedades periféricas, têm as massas populares
como papel fundamental na transformação social e as contradições do capitalismo
dependente. Assim, é necessário adotar uma lente crítica para compreender a
Revolução Bolivariana como um processo dialético de luta pela soberania e pela
construção de uma alternativa socialista em uma sociedade marcada pela
dependência estrutural e pela dominação imperialista.
O bloqueio
midiático internacional, às sanções econômicas e às pressões de governos
estrangeiros contrários ao socialismo bolivariano reforça a tese de que as
elites dominantes, tanto internacionais quanto nacionais, atuam para manter a
ordem dependente e impedir a consolidação de experiências alternativas de
desenvolvimento. A guerra econômica promovida contra a Venezuela é um exemplo
concreto dos ataques e da dominação imperialista. Essas sanções econômicas
tiveram como objetivo sufocar o projeto socialista e inviabilizar
economicamente a população venezuelana.
A Venezuela, no
entanto, caminha para sua recuperação econômica. Tem sido bem-sucedida em criar
mecanismos alternativos às sanções, o que se mostrou fundamental graças à
cooperação no contexto de um novo mundo multipolar, com apoios diretos de
países como Rússia, China e Irã. Venezuela é a economia que mais cresce na
América do sul, de acordo com a Comissão Econômica para América Latina e o
Caribe (Cepal), um crescimento de 6,2% do PIB em 2024. Esse crescimento foi
possível porque o país superou a “doença holandesa” — caracterizada pela
dependência do petróleo — por meio de uma substituição de importações forçada
pelas sanções econômicas. Além disso, alcançou soberania alimentar ao aumentar
sua produção agrícola de forma exponencial.
Hugo Chávez
reinterpretou o papel do Estado e das massas populares no contexto
latino-americano. Chávez utilizou o aparato estatal para consolidar uma frente
popular revolucionária, fundamentada em um discurso anti-imperialista e na
democratização econômica e política do país. Os ensinamentos de Hugo Chávez
seguem vivos e o olhar do chavismo acompanha todo o processo histórico de
resistência.
Na comunicação
política, a Venezuela também tem muito a nos ensinar. O ato de jurar lealdade
ao projeto chavista, como o movimento “Juro com Maduro”, exemplifica de forma
material a mobilização das massas populares como força motriz da transformação
social. No dia 10 de janeiro, perante um isolamento internacional e um grande
ataque midiático, o presidente Nicolás Maduro aprofundou seu compromisso
dialético entre o Povo e o Governo no ato “Juro com Maduro”. A participação
ativa do povo em um projeto socialista é fundamental para garantir que o
processo de transformação não seja apenas estatal, mas também uma revolução das
estruturas sociais e culturais. A prática de jurar com o governo reflete um
compromisso mútuo, em que o governo se posiciona como representante legítimo
das demandas populares e as massas assumem a responsabilidade coletiva de
defender e construir a revolução. Milhares de venezuelanos, juraram com Maduro
lealdade à luta socialista.
Nicolás Maduro é o
herdeiro do projeto socialista e anti-imperialista de Chávez, mas atualiza o
discurso e a prática política para incluir a luta antifascista como elemento
central. Muito atentos aos movimentos da extrema direita no continente, a
Venezuela rapidamente entende as novas condições históricas, como o avanço de
forças conservadoras e autoritárias em nível global, representadas pela
ascensão de líderes como Jair Bolsonaro e Javier Milei. Se atualizam para uma
luta anti-imperialista e antifascismo, e reforçam o papel das massas
organizadas, incluindo partidos políticos, comunas e movimentos sociais, na
defesa da soberania e na luta contra as novas expressões de dominação.
É urgente que as
forças progressistas latino-americanas atualizem suas análises e compreendam
que com a vitória de Trump, não existe a opção de que o império seja aliado
contra a extrema direita na região. Hoje os EUA representam o imperialismo e o
fascismo, e isso se concretiza como sua política externa e opção de poder para
perpetuar a hegemonia norte-americana perante a ameaça de um mundo multipolar.
Frente a isso, devemos criar um cordão antifascista, a construção de uma frente
antifascista para resistir às ofensivas da extrema direita, do capital
internacional e das elites locais.
A Revolução
Bolivariana representa um exemplo vivo da luta pela soberania em sociedades
periféricas, enfrentando a dominação imperialista e as contradições internas do
capitalismo dependente. A atualização do discurso chavista para incorporar o
antifascismo reflete a capacidade do projeto bolivariano de adaptar-se às
condições históricas, sem perder de vista seus princípios fundamentais de
justiça social e emancipação popular. Assim, é urgente entender que a Revolução
Bolivariana não é apenas um processo político, mas um exercício contínuo de
resistência e transformação, onde povo e governo se entrelaçam em uma luta
comum contra as forças do capital e pela construção de uma sociedade mais justa
e igualitária.
¨
Trump
vs. Maduro, 2º round: o que os EUA querem da Venezuela?
Assessores de Trump
revelaram à Axios sob condições de anonimato no sábado (18) que o presidente
eleito, que passou boa parte de seu primeiro mandato tentando derrubar o
presidente venezuelano Nicolás Maduro, não perdeu sua obsessão em relação à
nação latino-americana. A Sputnik explica o que está em jogo no confronto
iminente.
·
O
que Trump quer?
# A Venezuela tem muito petróleo. Na verdade, com
mais de 300 bilhões de barris de reservas comprovadas, o país tem o maior
estoque de petróleo inexplorado da Terra.
# Algumas empresas
de energia dos EUA e da Europa têm permissão para operar na Venezuela, mas
Washington gostaria de desregulamentar suas atividades, reduzir os
impostos sobre os lucros e expandir a produção.
# Além do petróleo,
a Venezuela tem uma vasta riqueza mineral
inexplorada e
de terras raras, minério de ferro, ouro, bauxita, diamantes e o metal
tecnológico coltan, que o falecido líder venezuelano Hugo Chávez apelidou de
"ouro azul".
·
Competição
geopolítica
Além dos recursos,
a febre de Trump pela
Venezuela pode
estar relacionada à sua obsessão com o "destino manifesto" de
Washington e uma versão do século XXI da Doutrina Monroe. Quer uma, quer outra
está repleta de riscos para as nações do Hemisfério Ocidental que buscam
escapar da hegemonia dos EUA.
# A Venezuela
está fora da órbita dos EUA desde o final dos anos 1990 e forjou parcerias
econômicas e de segurança estreitas com a China, o Irã e a
Rússia.
# O governo Bush
tentou dar um golpe em Chávez em 2002. Em 2018, o ex-assessor de Trump John
Bolton rotulou a Venezuela, Cuba e Nicarágua de "Troika da
Tirania", sinalizando os planos de Washington de pressionar por uma
mudança de regime.
# Em 2019, os
EUA aplicaram sanções esmagadoras
à gigante petrolífera venezuelana
PDVSA, apreendendo bilhões em ativos no exterior e tentando sufocar
as exportações.
# Em 2020,
uma tentativa bizarra de um grupo de mercenários de sequestrar Maduro,
apelidado de "Baía dos Leitões", deu comicamente
errado,
deixando seis mercenários mortos e 91 capturados, incluindo 2 norte-americanos.
Com Trump se
cercando de falcões hostis à Venezuela como Marco Rubio e Mike
Waltz, nuvens de tempestade estão se formando para uma nova rodada de
confronto entre Washington e Caracas.
¨
Venezuela - a depender dos russos,
já está dentro, no jogo. Só falta combinar com o “adversário”. Por Maria Luiza
Franco Busse
Dez
dias separam a posse de dois presidentes no continente americano. Entretanto,
não é a demarcação temporal que caracteriza a distância entre as repúblicas do
sul e do norte em questão, mas o sentido contrário em que estarão sendo
governadas a partir deste janeiro de 2025. Na República Bolivariana da
Venezuela, Nicolás Maduro Moros assume o terceiro mandato presidencial
reafirmando o compromisso de aprofundar a democracia direta de protagonismo
popular iniciada há 26 anos pelo então presidente Hugo Chavez Frias. No Estados
Unidos da América, Donald Trump volta em segundo mandato prometendo continuar a
política de fazer a América grande outra vez.
Em
1998, Hugo Chávez se elegeu presidente prometendo refundar o país a partir de
nova constituição e reverter a Lei dos hidrocarbonetos devolvendo à Venezuela a
propriedade sobre as jazidas de petróleo e o direito exclusivo do Estado à
atividade de exploração. A constituição referendada pela vontade popular foi promulgada
pela Assembleia Nacional e daí nasceu a República Bolivariana da Venezuela.
Chávez foi reeleito três vezes e faleceu de câncer no exercício do mandato em
2013. Nicolás Maduro era o vice-presidente, e corre que as últimas palavras de
Chávez foram o pedido para que os venezuelanos votassem em Maduro.
A
morte de Chávez reascendeu a esperança da oligarquia de voltar ao poder e ao
regime democrático que destinava o Estado a atender os interesses exclusivos da
classe burguesa. Mas, qual. Nos quatorze anos de afirmação da soberania interna
e externa, o poder popular não arredou pé das ruas para garantir seu
protagonismo vencendo as recorrentes tentativas da direita e da extrema-direita
de derrubar o governo e as violentas ações terroristas dessas mesmas oposições
sempre auxiliadas por mercenários externos, sob soldo do imperialismo, que
resultaram em muitas mortes de cidadãs e cidadãos venezuelanos.
Maduro
tomou posse dia 10 de janeiro com o slogan de campanha “Eu juro com Maduro,
pelo futuro”. Depois de formalizar o rito em cerimônia na Assembleia Nacional,
o então presidente seguiu para a avenida lateral ao Palácio Miraflores, região
central de Caracas, onde era esperado por mais de dois milhões de pessoas. Eram
locais, caravanas de outros estados, e representantes de cerca de 125
delegações estrangeiras vindas da Asia, África, Europa, Américas do norte, sul
e caribe. Já instalado no palco, o que se assistiu foi o presidente jurando
seus compromissos junto com a multidão e dando posse ao povo. De mão erguida,
pediu aos presentes que repetissem seu gesto e as palavras que iria proferir.
“Juro, como povo bolivariano e chavista; juro, em nome dos libertadores e
libertadoras da América; juro, por Guaicapuro; juro, por Pedro Camejo, ‘El
Negro Primero’; juro, pelo general-em-chefe Ezequiel Zamora; juro, por nosso
comandante supremo Hugo Chávez, lealdade absoluta ao projeto histórico de
Bolivar; juro, continuar o processo de construção de uma Venezuela potente, de
um novo modelo econômico que nos dê prosperidade, de um modelo social de
socialismo e igualdade ; juro, consolidar o poder popular; juro, consolidar a
fusão popular militar-policial; e eu juro, combater como guerreiros pela paz
qualquer conspiração fascista saia por onde saia; juro, combater, lutar, até vencer
o fascismo e as conspirações imperiais; e eu juro, defender o direito da minha
pátria à paz e ao futuro; hoje, juro com Maduro, hoje eu juro pela pátria.
Ficam vocês juramentados e empossados. Exército de luz para avançar nos anos
que virão.”
O que
se passa na república bolivariana da Venezuela não é aventura nem bravata. É o
cumprimento do programa revolucionário participativo de protagonismo popular e
ao mesmo tempo representativo no que diz respeito às funções administrativas
corriqueiras dos estados democráticos. E a julgar pelos poderes do povo, o
processo está assegurado nos seis anos de mandato que termina em 2031. Maduro
já começou a trabalhar instalando comissão para debater uma nova constituinte a
ser submetida a referendo popular e chamou todos os 10 partidos para tratar das
próximas eleições para os executivos estadual e municipal, e para o
legislativo. Seria infame dizer que a revolução bolivariana está madura, mas
que dá vontade, dá, pois é assim que ela se apresenta nas práticas diárias e se
manifesta nas urnas.
Em
relação à governança de Donald Trump, o que se conhece são seus desejos
declarados de anexar a Groenlândia, o Canadá e o Canal do Panamá. Voltando à
Maduro, o presidente anunciou que vai instalar um destacamento da Guarda
Nacional Bolivariana em Essequibo. Também aguarda se tornar membro pleno do
BRICS+. Enquanto a demanda não se efetiva, seguem os acordos e as melhores
relações com China e Rússia. A propósito, a delegação russa na posse era das
mais animadas, formada por 67 jovens assessores e parlamentares do partido
Rússia Unida. A depender dos russos, a Venezuela já está dentro, no jogo. Só
falta combinar com o “adversário”.
Fonte: Por Amanda
Harumy, na Opera Mudi/Sputnik Brasil/Brasil 247
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